Descrição e norma: abordagens linguísticas

Português é muito difícil!

Não é incomum essa formulação ocorrer entre estudantes, pessoas da mídia e (alguns) professores. Dentre os motivos, estão as escolas, o gargalo educacional no ensino básico e a finalidade desses estudos desaguarem no vestibular. E, quando se fala de língua e linguagem em veículos de comunicação, parte-se da norma: é certo falar assim, é errado falar daquele jeito (“porque a língua não permite tal uso”).

Esse olhar desconsidera que a língua é viva. Que ela muda. Que é, enfim, um objeto complexo. A impressão que se tem é que apenas a norma, a “lei gramatical” chega a público. Quando uma análise linguística “foge” de olhar à norma, a finalidade é outra: ao invés de dizer que tal formulação é errada, busca-se descrever os processos de sua ocorrência.

A Linguística consiste no estudo científico do objeto língua. Aqui são citadas duas abordagens, normativa e descritiva, mas existem tantas outras. A Linguística tem pouco mais de um século de existência, tendo como ponto inicial a publicação da obra Curso de Linguística Geral, de Ferdinand de Saussure, em 1916. Isso não significa que não houvesse reflexão sobre línguas e linguagens antes disso, mas o livro foi um divisor de águas em que houve, pela primeira vez, uma delimitação do objeto de estudo dessa ciência: a Linguística deveria estudar a estrutura, a língua, as regularidades: as normas.

Nesse primeiro momento, deixava-se de fora a linguagem, os aspectos individuais, históricos e sociais dos falantes. Com o tempo, linguistas notaram a necessidade de olhar para aquilo que Saussure havia ignorado: a língua era muito mais do que estrutura.

De acordo com Perini (2007, p. 21): “Não há a menor base linguística para a distinção entre ‘certo’ e ‘errado’ – o linguista se interessa pela língua como ela é, e não como deveria ser”.

Assim, os jeitos de se olhar para a língua e a linguagem são múltiplos, a depender do interesse do pesquisador. Só existimos enquanto seres de linguagem, é por ela que significamos o mundo. Com isso, busca-se considerar aspectos para além do certo e do errado, ou seja, para além da norma.

 

REFERÊNCIAS:

PERINI, Mario. Princípios de linguística descritiva: introdução ao pensamento gramatical. Parábola: São Paulo, 2007.

SAUSSURE, Ferdinand de. Curso de Linguística Geral. Cultrix, São Paulo: 2009.

 

Autor: Gabriel Agustinho Piazentin
Graduado em Linguística pela Unicamp e em Jornalismo pela Unimep. É aluno do mestrado em Divulgação Científica e Cultural, da Unicamp, tendo como objeto de pesquisa a divulgação científica da Linguística. Atualmente, também, é voluntário no Cursinho Popular Podemos+, em Piracicaba, onde dá aula de redação.

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