Arquivo da categoria: Línguas minoritárias

No Brasil, não se fala só português!

Você já ouviu alguém dizer que é um milagre vivermos em um país tão grande e, mesmo assim, todos falarmos a mesma língua? Essa noção fortalece o mito de que o Brasil é um país monolíngue, onde só uma língua – a portuguesa – é falada. 

Em nosso país, temos uma vasta diversidade linguística. Segundo o professor e pesquisador Cléo Altenhofen (2013), existem cerca de 270 línguas faladas no território brasileiro: 219 línguas indígenas e 51 de imigração, como o pomerano, o italiano, o japonês, entre outras. Portanto, podemos afirmar que vivemos em um país plurilíngue – isto é, um lugar no qual várias línguas e culturas estão em contato. 

Fonte: Arquivo pessoal de Bruno Oliveira

Ao longo da história, essa diversidade nem sempre foi reconhecida e legitimada tanto pelas instituições governamentais quanto pela população em geral. Além disso, de acordo com a professora e pesquisadora Isabella Mozzillo (2008), a ideia de que o português é a única língua do Brasil faz com que as outras línguas sofram repressão. Sendo assim, precisamos refletir sobre a importância de reconhecer e valorizar todas as línguas, a fim de minimizar os danos sociais e culturais sofridos por essas comunidades linguísticas. 

É a partir da mudança de nossas atitudes que poderemos pensar em formas adequadas de reconhecer e promover a pluralidade linguística e cultural dos brasileiros. Não basta somente falarmos sobre as palavras de origens indígenas em um dia específico (por exemplo, no dia 19 de abril); também não é suficiente a valorização das culturas de imigrantes e suas respectivas línguas exclusivamente em festivais de tradições. Torna-se necessário levar, frequentemente, essas pautas para as escolas, universidades, assembleias e mídias digitais. 

Entretanto, não devemos apenas “dar voz” para as diversas comunidades de fala; o principal é “dar ouvidos” e incentivar o plurilinguismo para que o nosso país seja um espaço que entenda a sua história e suas riquezas linguística e cultural. Para os pesquisadores Angela Baalbaki e Thiago Andrade (2016), é importante a criação de políticas para legalizar e legitimar línguas de grupos minoritários, para que suas histórias também façam parte do que pensamos enquanto “Brasil”. 

Por fim, após a leitura, lhe pergunto: é só português?

Referências
ALTENHOFEN, C. V. Bases para uma política linguística das línguas minoritárias no Brasil, 2013. In: NICOLAIDES, C.; SILVA, K. A.; TILIO, R.; ROCHA, C. H. (Org.). Política e Políticas Linguísticas. Editora Pontes, 2013. p. 93-113.
ALTENHOFEN, C. V. Política lingüística, mitos e concepções lingüísticas em áreas bilíngües de imigrantes (alemães) no Sul do Brasil. Revista internacional de lingüística iberoamericana, n. 1, v. 3, p. 83-93, 2004.
BAALBAKI, A. C. F.; ANDRADE, T. S. Plurilinguismo em cena: processos de institucionalização e de legitimação de línguas indígenas. Revista de Estudos do Discurso, Imagem e Som – Policromias, v. 1, n. 1, p. 1-19, 2016.
OLIVEIRA, G, M. Brasileiro fala português: Monolinguismo e Preconceito Linguístico. In: SILVA, F. L.; MOURA, H. M. M. (orgs.). O direito à fala: a questão do preconceito linguístico. Florianópolis: Insular, 2002.
MOZZILLO, I. O mito da pureza linguística confrontado pelo conceito de code-switching. In: GT – Plurilinguismo e Contato Linguístico. Anais do CELSUL. 2008.

Autor: Bruno Oliveira, graduado em Licenciatura em Letras – Português e Inglês pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel). Atualmente, é aluno do mestrado em Aquisição, Variação e Ensino, na mesma universidade.

O português também é uruguaio!

Mas a língua do Uruguai não é o espanhol? Para responder essa pergunta, primeiro é importante dizer que não necessariamente um país se constitui apenas por uma língua. Por exemplo, no Brasil, embora o português seja a língua oficial, e, por isso, muitos o identifiquem como um país monolíngue, mais de 200 línguas são faladas, de acordo com os pesquisadores Tommaso Raso, Heliana Mello e Cléo Altenhofen (2011). No Uruguai, não é diferente. Nas comunidades fronteiriças do norte, o português, historicamente, também foi bastante falado. E sabe por quê?

Muitos mitos indicam que o motivo do português ser falado no norte do Uruguai é a presença de brasileiros e de seus meios de comunicação. No entanto, a história é bem mais antiga e tem início lá no século XIX, quando a República Oriental do Uruguai ainda nem tinha esse nome.

O português é falado no norte do Uruguai devido às raízes históricas da época colonial e vem sendo transmitido como língua de herança por gerações. A pesquisadora Ana Maria Carvalho (2006) explica que, no século XIX, o Brasil ocupava grande parte do território uruguaio, como mostra a imagem abaixo, e era visto como um rival na disputa de terras.

Fonte: RONA, José Pedro. El dialecto “fronterizo” del norte del Uruguay. Montevideo. Adolfo Linardi, 1965.

Para se diferenciar no processo de construção de sua nação, o Uruguai buscava eliminar o português do país. Para isso, diversas políticas monolíngues foram implementadas. Entre elas, destacamos a própria construção de Montevidéu como centro de referência hispânico e o ensino apenas de espanhol nas escolas públicas.

Diante dessa ideologia, para a estudiosa Ana Maria Carvalho (2006), o uso do português era “visto como resistência à unidade nacional e traição aos valores da pátria” e, por isso, criou-se uma predisposição em dizer que o espanhol era a língua do governo e da identidade uruguaia, ficando o português uruguaio com status de língua marginalizada.

Atualmente, como resultado das políticas monolíngues implementadas ao longo dos séculos, o português uruguaio é bem menos falado. Por outro lado, existem pesquisas e projetos que buscam resgatar o idioma e utilizá-lo como recurso para um processo de educação bilíngue.

Referências
CARVALHO, Ana Maria. Políticas lingüísticas de séculos passados nos dias de hoje: o dilema sobre a educação bilingüe no norte do Uruguai. Language Problems & Language Planning, v. 30, n. 2, p. 149–171.
RASO, Tommaso; MELLO, Heliana; ALTENHOFEN, Cléo V. Os contatos linguísticos e o Brasil: Dinâmicas pré-históricas, históricas e sociopolíticas. In: MELLO, Helina; ALTENHOFEN, Cléo V.; RASO, Tommaso. Os contatos linguísticos no Brasil. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2011. p. 13-56.

Autora: Caroline Gonçalves Feijó-Quadrado. Licenciada em Letras e Mestre em Educação pela Universidade Federal do Pampa – campus Jaguarão. Doutoranda em Letras pela Universidade Federal de Pelotas.

Lançamento da série “Viver no Brasil falando Hunsrückisch: Extras”

Três anos após o lançamento do documentário “Viver no Brasil falando Hunsrückisch”, é lançada uma minissérie documental com extras, que propõe uma visão aprofundada em alguns tópicos específicos da língua hunsriqueana.

A partir de excertos de entrevistas do Inventário do Hunsrückisch como Língua Brasileira de Imigração (IHLBrI), em um primeiro momento não selecionados para compor o documentário “Viver no Brasil falando Hunsrückisch“, foi elaborada uma série de vídeos com cenas inéditas gravadas pela equipe do projeto. A série apresenta diferentes modalidades de entrevista, como relatos pessoais, traduções da Lista de Swadesh e conversas livres.

O primeiro episódio, lançado no Canal do Projeto ALMA-H no Youtube no dia 09/01/2022, traz a entrevista na íntegra realizada com Sílvio Meincke. Em tom de relato biográfico, Sílvio fala sobre sua formação em São Leopoldo, no Instituto Pré-Teológico e, posteriormente, na Escola Superior de Teologia (EST). Sílvio comenta também a respeito de seus anos como pastor e professor da EST e nos conta como a língua alemã permeou sua vida.

Apesar de Sílvio já ter aparecido no documentário, dessa vez, temos a oportunidade de conhecer toda sua história, sem os cortes que foram feitos pela produção a fim de adaptar seu relato à narrativa construída pelos roteiristas. Tais cortes, por um lado, são necessários para criar uma corrente de discurso coerente para o espectador, mas, por outro lado, suavizam diferentes visões e opiniões sobre a língua Hunsrückisch.

O segundo episódio, que foi ao ar no domingo dia 16/01/22, trouxe a entrevista gravada com Nair e Rosemarie em Linha Brasil – Nova Petrópolis, Rio Grande do Sul. Com base na Lista de Swadesh, que contempla cem vocábulos de uso cotidiano, a dinâmica dessa entrevista consistiu em os pesquisadores dizerem as palavras em português, deixando para as entrevistadas a tarefa de as traduzir para sua língua materna.

Além das interessantes respostas fornecidas pelas entrevistadas (que nem sempre concordam uma com a outra), esse episódio também traz momentos muito divertidos, quase sempre resultados de pequenas falhas na comunicação (como na pergunta sobre bom/pão) e é encerrado com uma mostra da alma artística hunsriqueana.

No terceiro episódio da série de extras, Helga Winck, Flavia Terezinha Winck e Joaci Terezinha Staudt (Lomba Grande – Novo Hamburgo, Rio Grande do Sul, Brasil) traduzem a Lista de Swadesh de forma bem-humorada, demonstrando seus conhecimentos acerca de diferentes variedades dialetais. As entrevistadas, com vasto repertório linguístico, abordam os hábitos linguísticos da sua região e seus próprios por meio de diversos exemplos e comentários. No que tange à legendagem dos vídeos, o code-switching entre português e Hunsrückisch, outra faceta do plurilinguismo regional, representou um desafio extra para a tradução.

Imagem do terceiro episódio

Aliás, um dos aspectos mais especiais da série (assim como no próprio documentário) é o cuidado com as legendas. Disponíveis estão quatro opções de língua: original (hunsrückisch e português), português, alemão e inglês.

Por fim, o quarto e último episódio da primeira temporada (sim, teremos no mínimo mais uma temporada da nossa minissérie!) também apresenta uma tradução da Lista de Swadesh, desta vez em Linha Schwerin/Linha Andrade de Neves – Santa Cruz do Sul, Rio Grande do Sul, Brasil. Os entrevistados, Albino, Martina, Naiane, Douglas, Ronaldo e Lidiane Franz, interromperam sua rotina de trabalho para gentilmente atender os entrevistadores Angélica Prediger e Gabriel Schmitt.

Imagem do quarto episódio

De maneira geral, a série oferece detalhes da comparação entre português e hunsrückisch e uma parte da variação interna do hunsrückisch pode ser depreendido pela comparação entre as entrevistas. Esperamos que futuros pesquisadores que forem utilizar a Lista de Swadesh possam se inspirar nas entrevistas do IHLBrI, também para evitar algumas confusões e imprecisões, que pela nossa inexperiência à época, nos passaram batidos.

Ficha Técnica

Direção:
Gabriel Schmitt

Legendas:
Gabriel Schmitt
Sofia Froehlich Kohl
Geronimo Loss Bergmann

Textos e traduções:
Sofia Froehlich Kohl

Revisão:
Jussara Maria Habel
Angélica Prediger
Siegwalt Lindenfelser

Entrevistadores:
Jussara Maria Habel
Angélica Prediger
Gabriel Schmitt

Coordenação: Cléo Vilson Altenhofen (PPGL/UFRGS)

Entrevistados:
Sílvio Meincke
Nair Fröhlich
Rosemarie
Helga Winck
Flavia Terezinha Winck
Joaci Terezinha Staudt
Albino Franz
Martina Franz
Naiane Franz
Douglas Franz
Ronaldo Franz
Lidiane Franz

A série é um produto do IHLBrI (Inventário do Hunsrückisch como Língua Brasileira de Imigração), coordenado por Cléo Vilson Altenhofen (ALMA-H/UFRGS) e Rosângela Morello (IPOL).

Produção: Inventário do Hunsrückisch como Língua Brasileira de Imigração, com apoio do IPHAN.

Autor: Gabriel Schmitt, graduado em Licenciatura Letras e Alemão pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Atualmente é aluno do Mestrado Europeu em Lexicografia (EMLex), com pesquisa em dicionários dialetológicos e de línguas minoritárias.

Documentação de línguas indígenas brasileiras: uma necessidade para além dos estudos linguísticos

A Linguística Documental é o campo de estudos dedicado à documentação de registros (falados ou escritos) e revitalização de línguas minoritárias e/ou ameaçadas de extinção. Apesar de haver resquícios de documentação linguística no Brasil desde o século XVI, com os missionários e viajantes europeus relatando e registrando (por meio de cartas, listas de palavras, sermões, gramáticas etc.) as línguas indígenas faladas no litoral do Brasil, foi a partir dos anos 1990 que a área alcançou o status de disciplina.

De acordo com a linguista e antropóloga brasileira Bruna Franchetto (2004), no Brasil, todas as línguas indígenas são consideradas minoritárias e, devido a isso, surge a urgente necessidade de se documentar e preservar essas línguas para que, dessa maneira, as memórias linguística, histórica, sociocultural e afetiva desses povos sejam preservadas.

Fonte; https://www.imaginie.com.br/temas/a-extincao-de-linguas-indigenas-no-brasil/

Para que uma documentação linguística seja realizada, é necessário que a/o profissional responsável pela coleta de registros falados e/ou escritos numa determinada comunidade disponha de um leque de ferramentas (gravadores, câmeras, caderno de campo e computadores, por exemplo) que auxiliam em todas as etapas do processo, desde antes da documentação até as etapas pós-documentação. Todas as ferramentas devem ser checadas antes de serem utilizadas, e o uso deve ser feito com discernimento sem deixar de lado os aspectos éticos envolvidos no processo de documentação, uma vez que a privacidade e o protagonismo das comunidades indígenas devem ser respeitados.

Segundo a linguista Cilene Campetela e demais pesquisadores (2017), muitos projetos foram e têm sido idealizados em diversas instituições públicas do país com o intuito de documentar e garantir a preservação de línguas ameaçadas de extinção, sobretudo as línguas indígenas. Com isso, professores e alunos, por meio da elaboração de estudos e projetos, têm cada vez mais despertado o interesse de outras pessoas no que se refere a esse campo de estudos tão necessário que é o campo da Linguística Documental.

Mesmo com esses esforços, é notório que são muitos os fatores que se apresentam como obstáculos ao processo de documentação, a exemplo das questões econômicas e socioculturais que nos permeiam. Ainda assim, é necessário resistir, pois só assim teremos disponíveis políticas e projetos de documentação e revitalização que, como sugere o título deste texto, é uma necessidade que vai muito além dos estudos linguísticos.

Referências
CAMPETELA, C. et al. Documentação linguística, pesquisa e ensino: revitalização no contexto indígena do norte do Amapá. Revista LinguíStica, Rio de Janeiro, v. 13, n. 1, p. 151-167, jan. 2017.

FRANCHETTO, B. Línguas indígenas e comprometimento linguístico no Brasil: situação, necessidades e soluções. Cadernos de Educação Escolar Indígena, Cáceres, v. 3, n. 1, p. 9-26, 2004.

Indicações de sites que auxiliam na documentação de línguas indígenas do Brasil:
Biblioteca Digital Curt Nimuendajú
Museu do Índio – Funai
Museu Paraense Emílio Goeldi (MPEG)
Povos Indígenas do Brasil

Autor: João Gabriel Pereira da Silveira
Graduando em Letras-Bacharelado com ênfase em Estudos Linguísticos pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). É revisor bolsista da Coordenação de Gestão Editorial e Impacto Social (CGEI), vinculada à Pró-Reitoria de Extensão e Cultura da UFPE, e membro do Grupo de Estudos e de Pesquisa em Tradução e Tecnologia (Getradtec) da mesma instituição. E-mail: jgsilveira96@gmail.com.

Libras: língua, cultura e patrimônio do Brasil

No Brasil, ainda há a ideia de que a língua portuguesa é a única falada no país. Na verdade, temos outras diversas línguas que compõem a cultura brasileira. Uma delas é a Língua Brasileira de Sinais, conhecida como Libras.

Relacionada ao monolinguismo (uma só língua), há no imaginário social a ideia de que a aprendizagem de uma segunda língua quebra o estigma social de língua como unificadora da nação. Ao darmos continuidade a essa ideia, estamos contribuindo para o esquecimento de determinadas culturas que se relacionam com as línguas minoritárias.

A importância de aprender uma segunda língua contribui em diversos aspectos da vida social. Um erro comum é considerar a Libras uma linguagem e não uma língua; por isso, é relevante que se tenha orientação das necessidades comunicativas de pessoas surdas.

Em abril deste ano, há 19 anos, a Libras foi reconhecida como meio legal de comunicação e expressão dos surdos através da lei nº 10.436/2002, que garante ser papel do poder público o apoio e utilização de Libras como meio de comunicação.

Vemos a importância dessa ação com o relato da militante acadêmica surda do movimento Surdo não é somente de sujeitos surdos: “[…] a comunidade surda de fato não é só de sujeitos surdos, há também sujeitos ouvintes – membros de família, intérpretes, professores, amigos e outros – que participam e compartilham os mesmos interesses em comuns, em uma determinada localização”. (STROBEL, 2008, p. 30)

Outros agentes que promovam à cultura surda condições sociais e culturais nas esferas de comunicação e a valorização da Libras em interação com a cultura dominante (cultura dos ouvintes) fazem com que a identidade cultural do sujeito surdo se forme.

O desenvolvimento de ações culturais que fomentem a Libras é um importante papel para a continuidade no progresso da comunidade surda, é por meio do fortalecimento da cultura surda que é possível estabelecer novas conjunturas sociais. Um exemplo é o inventário da Libras, que promove a língua a patrimônio linguístico e cultural. Além disso, a Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos (FENEIS) é um importante órgão para a realização de práticas culturais que fomentem a integração de relações entre ouvintes e surdos.

Fonte: https://www.libras.com.br/divulgacao-libras

Referências
STROBEL, K. As imagens do outro sobre a cultura surda. Florianópolis: Editora UFSC, 2008.

Autora: Camila Franz, formada em Letras Licenciatura Português e estudante de Mestrado em Linguística, ambas pela Universidade Federal de Pelotas.

O contexto bilíngue na educação da comunidade surda

A sociedade brasileira é formada por mais de 200 milhões de pessoas, e, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia Estatística (IBGE, 2010), 5% dessa população tem algum grau de deficiência auditiva. Desse grupo, 2 milhões de pessoas possuem um nível severo de perda auditiva e 15% deles já nasceram com essa condição. Portanto, em comparação com o número de pessoas ouvintes, a população surda é um grupo minoritário, e resulta em uma comunidade linguística também minoritária, caracterizada pelo uso da Língua Brasileira de Sinais (Libras).

Fonte: https://www.gov.br/mdh/pt-br/ondh/centrais-de-conteudo/imagens/libras.png/view

Tudo bem, mas o que é a ‘língua de sinais’? Bem, a língua de sinais consiste em uma língua natural, visual-gestual, com gramática própria, usada pelos surdos para se comunicarem. Aqui no Brasil, ela coexiste com a língua portuguesa, logo, serve como base para a comunidade surda adquirir a modalidade escrita da língua majoritária. Além disso, por estarem em contato, elas propiciam um contexto bilíngue, como se verá a seguir.

Entre as diferentes concepções de bilinguismo, considera-se uma pessoa bilíngue quem se identifique ou seja identificado como adepta de duas línguas, ou seja, quem convive paralelamente com duas formas de comunicação e equilibra os seus usos de acordo com a necessidade da situação. Além disso, nesse espaço de interação, o surdo se relaciona também com duas culturas: a surda e a ouvinte. “Humm, mas como assim?” Um exemplo é quando o aluno surdo tem pais e amigos também surdos e, ao ingressar na escola, ele encontra professores, funcionários e/ou outros colegas ouvintes. Por isso, além de bilíngues, eles também são biculturais.

Ademais, será que há uma lei específica visando à educação desse grupo? Sim, a comunidade surda tem garantido por lei o acesso ao aprendizado do português. O decreto n° 5.626 (BRASIL, 2005) prevê a obrigatoriedade das instituições federais em ofertar o ensino de Libras e de língua portuguesa para alunos surdos desde a educação infantil, sendo a língua de sinais a primeira língua do aluno, e o português a sua segunda língua. A inclusão ainda deve ocorrer por meio da organização de escolas e classes de educação bilíngue com a presença não apenas de professores aptos para tal espaço, mas também de tradutores e intérpretes.

Embora esse ensino seja assegurado por lei, a proposta nem sempre é colocada em prática na realidade de muitas escolas, pois existem inúmeras barreiras impedindo esse processo. Portanto, só será possível oferecer aos surdos um ensino bilíngue de qualidade quando algumas questões – como a formação de professores capacitados para ensinarem português como língua adicional; mudanças na forma de avaliação; e a produção de material didático voltado para as especificidades do aluno surdo – forem estudadas, planejadas e desenvolvidas com mais afinco e atenção.

Referências
BRASIL. Decreto nº 5.626, de 22 de dezembro de 2005. Regulamenta a Lei nº 10.436, de 24 de abril de 2002, que dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais – Libras, e o art. 18 da Lei nº 10.098, de 19 de dezembro de 2000. Diário Oficial da União, Brasília, 23 dez. 2005. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/decreto/d5626.htm. Acesso em: 20 nov. 2020.
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo Demográfico 2010: Características gerais da população, religião e pessoas com deficiência. Rio de Janeiro: IBGE, 2010. Disponível em: https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/periodicos/94/cd_2010_religiao_deficiencia.pdf. Acesso em: 20 nov. 2020.

Autora: Aline Mackedanz dos Santos – Acadêmica do curso de Letras – Português e Inglês – pela Universidade Federal de Pelotas.

 

Por que as pessoas insistem em falar outras línguas além do português?

Fonte: https://www.istockphoto.com/br/ilustra%C3%A7%C3%B5es/language-barrier

A resposta para a pergunta feita no título é bastante simples: porque falar a língua materna é um direito de todos. Estão erradas as pessoas que defendem o ideal de que no Brasil se deve apenas falar português. Ao analisarmos os dados em relação aos idiomas usados no País (SIMONS; FENNIG, 2020), verificamos a existência de 218 línguas utilizadas pela população. No entanto, a maior parte dessas não recebe a devida importância por serem línguas minoritárias.

Línguas minoritárias são aquelas faladas por pequenos grupos de pessoas, em um ambiente no qual a língua nacional é diferente. Esses idiomas servem como meio de comunicação em diversas comunidades (NARDI, 2004). É o caso das línguas de origem indígena, africana, alemã, italiana. Mesmo não tendo destaque, é fundamental que elas sejam protegidas da extinção.

Existem algumas iniciativas governamentais que buscam chamar a atenção para o valor dessas línguas como, por exemplo, as ações do Colegiado da Diversidade Linguística do Rio Grande do Sul (2018). O governo do Rio Grande do Sul considera a diversidade linguística como um patrimônio cultural, que reflete a história e a cultura dos povos que as falam. Também, entende que o conhecimento proveniente do domínio de um idioma auxilia os falantes nas possibilidades de mobilidade e acesso a culturas diversas – a cultura da sua comunidade e a cultura nacional. Compreende, ainda, que seu uso pode aumentar a potencialidade econômica e científica de seus falantes. Todas essas razões favorecem a manutenção das línguas minoritárias.

Fonte: https://www.ufrgs.br/projalma/documento-sobre-a-diversidade-linguistica/

Falantes e não falantes de línguas minoritárias devem exigir o desenvolvimento de planos destinados à garantia de existência desses idiomas. Estudos recentemente desenvolvidos enumeram uma série de estratégias de proteção às línguas minoritárias (HORST; KRUG; FORNARA, 2017). Espaços como o ambiente escolar, a comunidade e as famílias são os mais importantes para a conscientização de que essas línguas devem ser preservadas. Muito pode ser feito a partir de atividades de promoção dos idiomas, sendo alguns exemplos: oficinas, seminários, apresentações teatrais e musicais, desenvolvimento das habilidades escritas e orais, incentivo do uso das línguas em rádios locais, em momentos recreativos e na convivência familiar.

Em síntese, é preciso entender que falar uma língua minoritária não se trata de “insistir”, mas de exercer um direito.

Referências
SIMONS, G.; FENNIG, C. Ethnologue: Languages of the World. Dallas: SIL International, 2017. Disponível em: https://www.ethnologue.com/country/BR. Acesso em: 09 set. 2020.
NARDI, J. Línguas minoritárias e memórias. Resgate: Revista Interdisciplinar de Cultura, v. 12, n. 1, p. 117–134, 2004.
COLEGIADO DA DIVERSIDADE LINGUÍSTICA DO RIO GRANDE DO SUL. Diversidade linguística do RS: inventariar, reconhecer, salvaguardar, promover. Conselho Estadual de Cultura do RS. Documento. Porto Alegre, 2018.
HORST, C.; KRUG, M.; FORNARA, A. E. Estratégias de manutenção e revitalização linguística no Oeste Catarinense. Organon, v. 32, n. 62, p. 1–16, 2017.

Autora: Aline Behling Duarte
Possui graduação em Letras – Português/Inglês e respectivas Literaturas, na Universidade Federal de Pelotas (2012). Mestra em Letras pelo Programa de Pós-Graduação em Letras da Universidade Federal de Pelotas, na área de concentração – Estudos da Linguagem (2018). Atualmente é integrante do Laboratório de Psicolinguística, Línguas Minoritárias e Multilinguismo (LAPLIMM) e doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Letras da Universidade Federal de Pelotas, na linha de pesquisa Aquisição, variação e ensino.

 

 

Uma língua também pode morrer

Em 18 de janeiro de 1858, desembarcou em São Lourenço do Sul a primeira leva de imigrantes pomeranos oriundos da então Pomerânia. Apesar de todas as dificuldades, eles foram se estabelecendo nas terras do município, prosperando e abrindo o caminho para futuras levas. Além da cultura e das tradições, o grande tesouro que trouxeram para as terras brasileiras foi a língua, que hoje inclusive é dada como quase extinta no local onde se originou.

Lamentavelmente, o uso do pomerano tem diminuído também em terras brasileiras. A modernização e certas crenças parecem ser algumas justificativas para isso. Os mitos que envolvem a escolha da língua na qual uma criança deve ser criada podem ser os verdadeiros culpados da diminuição do uso desta língua tão única. Conforme a pesquisadora Isabella Mozzillo (2015), muitos pais acabam se convencendo que criar e educar uma criança em duas línguas simultaneamente pode ser prejudicial para o desenvolvimento da criança, quando na verdade pode ser prejudicial não incentivar o uso das duas línguas.

A escolha do convite de enterro para chamar atenção dos falantes pomeranos ocorre pelo grande e inquestionável respeito que os pomeranos têm pela morte, como estudado por Gislaine Maltzahn (2012). Além do mais, esse tipo de texto é muito conhecido na comunidade pomerana. A intenção é buscar a reflexão, já que, se continuarem acreditando nos mitos sobre a ensino de duas ou mais línguas para as crianças, os seus descendentes diretos já não serão mais herdeiros dessa língua e talvez nem da cultura pomerana. Também poderia trazer questionamentos sobre as mudanças necessárias para que a língua pomerana permaneça prestigiada e valorizada na sua própria comunidade. Afinal, o uso da língua pomerana não é importante apenas para a manutenção dela mesma. A língua é também a chave para a compreensão de muitos elementos culturais. Existem brincadeiras, receitas, tradições e costumes que só têm sentido completo se forem passados adiante com o uso da língua que identifica todas essas ações.

Por fim um questionamento: Se você recebesse um convite para enterro, de um ente querido, que só aconteceria daqui há alguns anos e entendesse que você poderia salvar esse ente, ou até mesmo prorrogar a sua existência por mais uma geração caso mudasse algumas convicções e não acreditasse em mentiras, o que você faria por este ente querido? Este ente é querido é a língua pomerana! Não podemos deixar que a língua seja extinta, como já ocorreu com outras 12 línguas brasileiras, segundo o Atlas das línguas em perigo, da UNESCO. A mudança necessária para a manutenção do pomerano está ao nosso alcance?

Referências:
MALTZAHN, Gislaine Maria. Família, ritual e ciclos de vida: estudo etnográfico sobre narrativas pomeranas em Pelotas (RS). 2012. 152 f. Dissertação (Mestrado em Ciências Humanas) – Universidade Federal de Pelotas, Pelotas, 2012.
MOZZILLO, Isabella. Algumas considerações sobre o bilinguismo infantil. Veredas – Revista de estudos linguísticos, v. 19, p. 147-157, 2015.

Autora: Gisleia Blank
Graduada em Letras – Português/Alemão pela UNISINOS (2011). Mestranda em Letras pelo PPGL da UFPel, integrante do Laboratório de Psicolinguística, Línguas Minoritárias e Multilinguismo. Atua principalmente como professora particular de Alemão.

HQ sinalizada: Séno Mókere Káxe Koixómuneti (Sol: a Pajé surda)

Desenvolver pesquisas na área dos quadrinhos, em especial, das HQs sinalizadas (CEZAR, 2019), trouxe-nos muitos desafios e, ao mesmo tempo, muita satisfação. Criar uma narrativa gráfica tendo como principal objetivo o desenvolvimento de um material bilíngue para surdos (Libras – português escrito) nos fez pensar no plurilinguismo brasileiro das línguas de sinais.

Ao escolhermos retratar a existência da língua terena de sinais, durante o processo histórico da comunidade, optamos por explorar as ilustrações a partir das características da cultura (pintura, ritual, cores) para minimizamos o uso da escrita das línguas majoritárias (português/terena escrito). Junto a isso, exploramos com os recursos tecnológicos (vídeos) a transmissão dos saberes também em Libras. Dessa forma, acreditávamos que conseguiríamos levar o gênero HQ para os surdos urbanos e para as escolas da Terra Indígena Cachoeirinha-MS (surdos e não surdos) com a intenção de despertar e valorizar as línguas de minorias. Cabe destacar que a escrita terena pode apresentar variação como: Sêno Mókere Káxe Koixomoneti, Séno Mókere Koéxoneti, entre outras. A variação aqui utilizada é da aldeia Cachoeirtinhao/MS escrita pela professora de língua terena Maiza Antonio residente nessa aldeia.

Trabalhar com diferentes línguas envolve se debruçar nos conhecimentos históricos (com e sem registros escritos), analisar a estrutura linguística e compreender os artefatos culturais que envolvem, em outras palavras, uma grande entrega à pesquisa. Foi o que fizemos nestes últimos três anos de pesquisa (2018-2020), na Universidade Federal do Paraná (UFPR) em parceria com a Universidade Federal de Grande Dourados (UFGD); o Instituto de pesquisa da Diversidade Intercultural (IPEDI), a Universidade Estadual Júlio de Mesquita Filho (Linbra-UNESP); a Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), o Laboratório de Mídias (UFJF) e a Gibiteca de Curitiba. Formamos uma grande equipe de pesquisadores nas línguas estudadas: terena oral, terena escrito, língua brasileira de sinais, língua de sinais terena, português escrito e língua inglesa.

A HQ foi divulgada primeiramente para os indígenas terena que contribuíram voluntariamente com a pesquisa que foi por eles mostrada nas aldeias terena (Vagner da Aldeia Água Branca, Aquidauana/MS, Kaliny da Aldeia Jaguapiru, Dourados/MS e Maiza da Aldeia Cachoeirinha, Miranda/MS) todos relataram um encantamento com a produção do material. A equipe de pesquisadores também salientou a originalidade de articular os recursos digitais com as ilustrações de Júlia Ponnick que generosamente aceitou não só ilustrar, mas se envolver com os estudos teóricos sobre a comunidade (SILVA, 2013; VILHALVA, 2012; SUMAIO, 2014; SOARES, 2018).

A narrativa criada é um misto de ficção, fatos históricos de registros escritos e registros orais, transmitidos ao longo das gerações na comunidade terena. A história acontece antes do século XV, quando a personagem principal Káxe, a pajé surda, é chamada para o ritual típico de solicitar benção aos ancestrais ao nascer uma criança. Nesse momento, junto à benção, a pajé recebe a visão do futuro do povo terena por meio de imagens. Dessa forma, o desenvolvimento da narrativa perpassa os principais momentos históricos: desde o início do povo terena (Aruak) datado de antes do século XV, percorrendo o caminho geográfico que os terenas realizaram até se fixarem, em sua maior parte, na região do Mato Grosso do Sul.

Além do registro histórico, encontram-se os aspectos culturais bem marcados nas ilustrações como por exemplo as pinturas corporais, o artesanato, as plantações e a espiritualidade. Optamos a explorar as imagens ao invés da escrita em ‘’balões’’ em razão de priorizar a estrutura linguística das línguas de sinais, em outras palavras, visual-espacial.

Partimos da primeira pesquisa que descreve a existência da língua terena de sinais, que foi realizada pela pesquisadora e linguista Priscilla Alyne Sumaio Soares (2014; 2018). No entanto, há relatos e transmissões orais de que sempre existiram surdos (anciãos). Por este motivo, optamos por apresentarmos personagens se comunicando (sinalizando) ao longo da narrativa gráfica.

A narrativa encerra-se com o retorno do plano espiritual da pajé surda no ritual inicial de nascimento com a anciã transmitindo os ensinamentos em língua terena de sinais. A ideia transmitida é relatar o futuro do povo terena destacando sua principal característica de UNIÃO (ilustrado o sinal em língua terena de sinais).

Essa HQ impulsionou a criação de outros materiais que estão sendo realizados pela equipe envolvida, como o “Glossário Virtual Plurilíngue” em vídeos (terena de sinais, Libras) e escrita (terena e português) que tem como intuito refletir sobre a importância da língua de sinais ser a língua de instrução e transmissão dos saberes para surdos (Lei 10436/2002 – Decreto 5626/2005) e divulgar as outras línguas de sinais do Brasil que não dispõe de leis (SILVA; QUADROS, 2019).

A HQ será lançada pela editora Letraria e estará disponível para compra no site. Confira a tradução deste texto para a Libras neste link.

Boa leitura sinalizada!

Principais referências

BRASIL. Decreto-lei nº 5.626, de 22 de dezembro de 2005. Diário Oficial [da] República Federativa do brasil, Brasília, 23 de dez. 2005. Seção 1, p. 30.
BRASIL. Lei nº 10.436, de 24 de abril de 2002. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, 25 de abril de 2002. Acesso em: 10 mar. 2007.
CEZAR, K. P. L. HQ’s sinalizadas. Projeto de pesquisa institucional. Universidade Federal do Paraná, 2019-2020.
SILVA, D. Estudo lexicográfico da língua terena: proposta de um dicionário terena-português. 2013. 292 f. Tese (doutorado) – Universidade Estadual Paulista Julio de Mesquita Filho, Faculdade de Ciências e Letras (Campus de Araraquara), 2013.
SILVA, D. S.; QUADROS, R.M. Línguas de sinais de comunidades isoladas encontradas no Brasil. Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 5, n. 10, p. 22111-22127 oct. 2019.
SOARES, P. A. S. LÍNGUA TERENA DE SINAIS: análise descritiva inicial da língua de sinais usada pelos terena da Terra Indígena Cachoeirinha. Tese de Doutorado apresentada ao Programa de Pós Graduação em Linguística e Língua Portuguesa da Faculdade de Ciências e Letras – Unesp/Araraquara, como requisito para obtenção do título de Doutor em Linguística e Língua Portuguesa. Araraquara – São Paulo, 2018.
SUMAIO, P. A. Sinalizando com os terena: um estudo do uso da LIBRAS e de sinais nativos por indígenas surdos. 2014. 123 f. Dissertação (mestrado) – Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Faculdade de Ciências e Letras Campus de Araraquara, 2014.
VILHALVA, S. Mapeamento das Línguas de Sinais Emergentes: um estudo sobre as comunidades linguísticas Indígenas de Mato Grosso do Sul. 2012. 124 f. Thesis (MSc in Linguistics) – Programa de Pós-Graduação em Linguística – Centro de Comunicação e Expressão. Universidade Federal de Santa Catarina, 2009.
VILHALVA, S. Índios surdos: mapeamento das línguas de sinais no Mato Grosso do Sul. Petrópolis: Arara Azul, 2012.

Autores:
Ivan de Souza: Acadêmico do curso de licenciatura em Letras Libras da Universidade Federal do Paraná (UFPR). Tradutor-intérprete de Libras. Pesquisador da iniciação científica (PIBIS/FA/UFPR). E-mail para contato: hiven89@gmail.com.
Kelly Cezar: Pós-doutora pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE). Doutora pelo Programa de Linguística e Língua Portuguesa da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (UNESP-FClar/Araraquara). Professora Adjunta da Universidade Federal do Paraná (UFPR), campus de Curitiba. Líder do projeto institucional “HQ’s sinalizadas”. Docente do curso de licenciatura em Letras Libras (UFPR). E-mail para contato: kellyloddo@gmail.com.

O que são línguas minoritárias?

Você já parou para pensar quantas línguas há no Brasil? Com quantas delas você já teve contato ou quantas fala? Provavelmente você já se deparou com alguma língua minoritária. Ao contrário do que muitas vezes pensamos, o português não é a única língua do Brasil. Como Maher (2013) aborda, há uma variedade de línguas em cada estado, que possuem sua cultura e sua história.

Ao acessar o site Ethnologue, podemos ver que  há mais de 100 línguas minoritárias no Brasil, dentre elas, a língua brasileira de sinais (Libras) e línguas indígenas como o kaingang, macuxi, terena, guajajara, guarani, entre outras. Há também línguas que foram trazidas para cá por meio de imigrantes, como o talian, polonês, alemão, ucraniano, pomerano, chinês e hunsriqueano.

Fonte: Criado pela autora no site https://www.mentimeter.com/

O português é a língua oficial do Brasil, usada pelo governo em seus documentos e leis, nas escolas, na televisão e no rádio. Mas há outras línguas que são usadas em diferentes contextos, como no comércio, na rua, em casa, em bares e eventos comunitários. De acordo com Altenhofen (2013), essas línguas são chamadas de minoritárias, pois pertencem a grupos que não são tão prestigiados social, cultural ou politicamente como os grupos de línguas majoritárias (línguas com maior prestígio, como o português no Brasil). Assim, as línguas minoritárias do país possuem status social mais baixo do que o português.

Algumas dessas línguas não são reconhecidas oficialmente, a maioria é falada em pequenos grupos ou em comunidades locais como o pomerano, que é mais presente, por exemplo, em Santa Maria do Jetibá (ES), São Lourenço do Sul, Arroio do Padre e Canguçu (RS). Algumas línguas minoritárias também podem ser incorporadas na escola, como no Mato Grosso, que adicionou o xavante ao seu currículo.

No entanto, por terem um status minorizado, algumas línguas minoritárias correm risco de extinção. Um dos motivos mais comuns é o fato de a maioria delas ser mais presente no contexto familiar e, com o passar das gerações, os filhos e netos vão, aos poucos, deixando de aprender a língua da família. Assim, é importante que haja esforços para a manutenção dessas línguas, por exemplo, por meio de campanhas de conscientização e ações de intervenção nas comunidades. Por isso, também é de grande relevância que haja estudos linguísticos sobre essas línguas, para que também seja possível analisar qual o tipo de ação adequada para a sua manutenção.

Se você deseja conhecer um pouco mais sobre as línguas minoritárias no mundo, poderá acessar os seguintes links: Wikitongues, Endangered Language Alliance, ILoveLanguages!, e Indigenous Tweets.

Referências
ALTENHOFEN, C. V. Bases para uma política linguística das línguas minoritárias no Brasil. In: NICOLAIDES, C.; SILVA, K. A.; TÍLIO, R; ROCHA, C. H. (Org.) Política e Políticas Linguísticas. Campinas: Pontes Editores, 2013. p. 93–116.
MAHER, T. M. Ecos de resistência: políticas linguísticas e línguas minoritárias no Brasil. In: NICOLAIDES, C.; SILVA, K. A.; TÍLIO, R; ROCHA, C. H. (Org.) Política e Políticas Linguísticas. Campinas: Pontes, 2013. p. 117-134.

Autora: Gabriela Wally Griep
Possui graduação em Letras – Português e Inglês pela Universidade Federal de Pelotas (2017). Atualmente é mestranda em Letras pela mesma instituição e integrante do Laboratório de Psicolinguística, Línguas Minoritárias e Multilinguismo (Laplimm). É professora de inglês há mais de dois anos em escola de idiomas.