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Descolonização linguística: para o ensino de Literaturas Africanas de Línguas Africanas

A problemática da estandardização, oficialização e inserção de línguas africanas no sistema educativo varia muito nos diferentes países africanos. De acordo com o Ethnologue, há poucas línguas africanas oficializadas, ensinadas nas escolas e universidades como línguas de ensino. Por exemplo, em Moçambique, há aproximadamente 42 línguas autóctones, mas apenas 3 institucionalizadas. Mas, segundo um relato, o poder moçambicano tem uma vontade política de implementar 23 línguas nacionais no sistema educativo. No Gabão, é uma outra história. Além do fato de o francês ser a única língua oficial do país, não há verdadeiras políticas linguísticas públicas para a integração das línguas nacionais no sistema  educativo.

Hoje, existem disciplinas de Literaturas Africanas de Língua Portuguesa no Brasil na universidade e na escola. Em vários outros países africanos, é ensinada a Literatura francófona, que inclui trabalhos produzidos por africanos francófonos, que é ensinada também na França, no Canadá, e assim por diante, e, a Literatura anglófona (literatura inglesa, nigeriana, ganesa, americana etc.). Sabemos que algumas línguas africanas são ensinadas também fora da África como o iorubá no Brasil, o wolof, o mandika e o bambara na França e na Rússia. Porém, disciplinas ou o ensino de Literaturas Africanas de Línguas Africanas propriamente dito (aqui não incluímos países como a Etiópia, que possui uma longa tradição de escrita autóctone) têm pouca visibilidade tanto na África quanto fora. Por quê?

A meu ver, para que haja o ensino oficial ou em massa das literaturas em línguas africanas, deveríamos, antes de tudo, perguntar onde estão as obras escritas em línguas e nos gêneros tradicionais africanos. Os registros mencionam a existência das literaturas em línguas africanas, que possuem uma longa história (desde o Egito antigo), e podemos citar algumas obras um pouco antigas como Feqer eske meqabe (O amor até a morte) da literatura amárica etíope (BUREAU, 1979), ou mais contemporâneas, como a obra bilíngue Cantares dos Ovimbundu do autor angolano Basílio Tchikale (2011), escrita na língua umbundu, E sok mɛ ná di mɔɔ-dhyeeb ɛ (Quando eu era criança), Tye bɛkwyel di ɛ, nɛ esee bɛ dii sɛ ɛ (Atividades típicas da nosso país), e Esesa mɛtse mɛgɔ (Histórias engraçadas), na língua bekwel, de um grupo de escrita criativa em língua bekwel no Congo, entre outros (MARTIN-GRANEL, 1992).

No entanto, percebemos que, apesar da existência dessas obras escritas em línguas africanas, constatamos que essas literaturas autóctones ainda têm um longo caminho para adquirir uma grande visibilidade nos domínios acadêmicos e escolares. E, para que se implemente um ensino democratizado das Literaturas Africanas clássicas e contemporâneas de línguas africanas no continente e fora, os autores africanos precisam produzir tais literaturas quantitativa e qualitativamente. Hoje, no Brasil, essa iniciativa é promovida por plataformas tais como a Revista NJINGA & SEPÉ, da Universidade de Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (UNILAB), que recebe produções científicas e literárias escritas em qualquer língua africana. Ela tem uma primeira edição na qual encontramos literatura em várias línguas africanas, dentre as quais a poesia na língua bekwel (EDOUHOU, 2021).

Fonte: https://cultura.culturamix.com/literatura/literatura-africana

Referências
BUREAU, J. T. Leiper Kane, Ethiopian Literature in Amharic. In: L’Homme, 1979, tome 19, n. 1. p. 152-153, 1979.
EDOUHOU, P. A. Voltar às fontes da mãe. Njinga & Sepé: Revista Internacional de Culturas, Línguas Africanas e Brasileiras São Francisco do Conde (BA), v. 1, n. 1, p. 282-288, jan./jun. 2021.
ELIBIYO, M. Z. Rapidolangue ou Flop des langues gabonaises à l’école. Paris: Edilivre-Aparis, 2016.
MARTIN-GRANEL, N. GERÁRD, A. Littératures en langues africaines. In: Cahiers d’études africaines, v. 32, n. 126, p. 343-346, 1992.
TCHIKALE, B. Cantares dos Ovimbundu. Luanda: Kilombelombe, 2011.

Autor: Peresch Aubham Edouhou
Falante de bekwel, ikota e francês, possui graduação em Letras – Português e Inglês pela Universidade Federal de Pelotas (2019). Atualmente é mestrando em Letras (Estudos da Linguagem) pela Universidade Federal do Rio Grande (FURG) e escreve poemas em línguas africanas.

“Programa de índio”: literatura indígena, por que não?

Se queremos, de fato, que nossas crianças existam como cidadãos, que escrevam hoje suas próprias histórias, compreendendo o passado e, assim, saibam alinhar o futuro desejado, precisamos criar juntos momentos de troca de conhecimentos, debate e reflexão. A escola é um dos importantes espaços para isso.

Assim, perder a oportunidade de lançar para eles iscas que os levem a explorar temas como identidades e diversidade cultural… é muito mais do que distração. Não lhes apresentar as diferentes visões de mundo através da literatura é tirar deles a chance de se apropriarem de suas memórias.

Instigada por essa ideia, eu, como professora, escolhi o livro Nós – Uma antologia de literatura indígena (Maurício Negro) para o Projeto de Leitura do 4º ano de minha escola. O livro é organizado a partir histórias sobre dez povos indígenas, acompanhadas por lindas imagens de Maurício Negro, seguidas pela história do povo em que elas circulam, por um glossário e pela biografia de seus autores/autoras. A partir do encontro com essas narrativas, inquietações nas crianças pipocaram: “Se há mais de 250 línguas indígenas (IPOL, 2016), por que só se fala português? O que os portugueses têm a ver com isso? Por que indígena e não índio? Por que eles são tão selvagens?”

Fonte: https://www.companhiadasletras.com.br/detalhe.php?codigo=41243

Uma educação para o reconhecimento do outro, dos diferentes grupos sociais e culturais é o que defende a professora Vera Candou (2008). Queremos, também, uma educação que confirme (àqueles que nem desconfiam) a existência de um outro. Aliás… do OUTRO…com valores, culturas, línguas, visões de mundo, ou seja, com sua história que deve ser conhecida e respeitada.

Pôr em cena temas fundamentais e hoje silenciados, deletados dos planejamentos pedagógicos e camuflados nos livros didáticos, é nosso desafio. Ampliar vozes e visibilidade dos povos indígenas traz – de fato – sentido ao fazer do professor comprometido com a reconstrução de um mundo mais justo e solidário.

Referências
CANDAU, Vera Maria. Direitos humanos, educação e interculturalidade: as tensões entre igualdade e diferença. Revista Brasileira de Educação, v. 13, n. 37, p. 47, 2008.
IPOL. Línguas do Brasil. Disponível em: http://ipol.org.br/tag/linguas-do-brasil/. Acesso: 20 abr. 2021.
MAHER, T. M. Ecos de resistência: políticas linguísticas e línguas minoritárias no Brasil. In: NICOLAIDES, C.; SILVA, K. A.; TÍLIO, R; ROCHA, C. H. (Org.) Política e Políticas Linguísticas. Campinas: Pontes, 2013. p. 117-134.

Links interessantes para estudo e debates em sala de aula:
https://www.companhiadasletras.com.br/detalhe.php?codigo=41243
https://www.facebook.com/mauricio.negro.5
https://pib.socioambiental.org/pt/P%C3%A1gina_principal https://www.blogdaletrinhas.com.br/conteudos/visualizar/Dos-varios-nos-que-enredam-as-literaturas-indigenas
https://lunetas.com.br/historias-indigenas/
https://www.facebook.com/FilmotecaIndigena/
https://revistapesquisa.fapesp.br/pela-sobrevivencia-das-linguas-indigenas/ed.273

Autora: Thaís de Almeida Rochefort
Graduada em Letras e Psicologia (UCPel), Mestre em Letras (UCPel), doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Letras da UFPel. Docente do Curso de Letras na UCPel, na Escola Mario Quintana (Profª de Português e Redação) e faz parte do Projeto “Remição de pena através da prática de leitura no Presídio Regional de Pelotas”, coordenado pela Profª Luciana Vinhas (UFPel).

HQ sinalizada: Séno Mókere Káxe Koixómuneti (Sol: a Pajé surda)

Desenvolver pesquisas na área dos quadrinhos, em especial, das HQs sinalizadas (CEZAR, 2019), trouxe-nos muitos desafios e, ao mesmo tempo, muita satisfação. Criar uma narrativa gráfica tendo como principal objetivo o desenvolvimento de um material bilíngue para surdos (Libras – português escrito) nos fez pensar no plurilinguismo brasileiro das línguas de sinais.

Ao escolhermos retratar a existência da língua terena de sinais, durante o processo histórico da comunidade, optamos por explorar as ilustrações a partir das características da cultura (pintura, ritual, cores) para minimizamos o uso da escrita das línguas majoritárias (português/terena escrito). Junto a isso, exploramos com os recursos tecnológicos (vídeos) a transmissão dos saberes também em Libras. Dessa forma, acreditávamos que conseguiríamos levar o gênero HQ para os surdos urbanos e para as escolas da Terra Indígena Cachoeirinha-MS (surdos e não surdos) com a intenção de despertar e valorizar as línguas de minorias. Cabe destacar que a escrita terena pode apresentar variação como: Sêno Mókere Káxe Koixomoneti, Séno Mókere Koéxoneti, entre outras. A variação aqui utilizada é da aldeia Cachoeirtinhao/MS escrita pela professora de língua terena Maiza Antonio residente nessa aldeia.

Trabalhar com diferentes línguas envolve se debruçar nos conhecimentos históricos (com e sem registros escritos), analisar a estrutura linguística e compreender os artefatos culturais que envolvem, em outras palavras, uma grande entrega à pesquisa. Foi o que fizemos nestes últimos três anos de pesquisa (2018-2020), na Universidade Federal do Paraná (UFPR) em parceria com a Universidade Federal de Grande Dourados (UFGD); o Instituto de pesquisa da Diversidade Intercultural (IPEDI), a Universidade Estadual Júlio de Mesquita Filho (Linbra-UNESP); a Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), o Laboratório de Mídias (UFJF) e a Gibiteca de Curitiba. Formamos uma grande equipe de pesquisadores nas línguas estudadas: terena oral, terena escrito, língua brasileira de sinais, língua de sinais terena, português escrito e língua inglesa.

A HQ foi divulgada primeiramente para os indígenas terena que contribuíram voluntariamente com a pesquisa que foi por eles mostrada nas aldeias terena (Vagner da Aldeia Água Branca, Aquidauana/MS, Kaliny da Aldeia Jaguapiru, Dourados/MS e Maiza da Aldeia Cachoeirinha, Miranda/MS) todos relataram um encantamento com a produção do material. A equipe de pesquisadores também salientou a originalidade de articular os recursos digitais com as ilustrações de Júlia Ponnick que generosamente aceitou não só ilustrar, mas se envolver com os estudos teóricos sobre a comunidade (SILVA, 2013; VILHALVA, 2012; SUMAIO, 2014; SOARES, 2018).

A narrativa criada é um misto de ficção, fatos históricos de registros escritos e registros orais, transmitidos ao longo das gerações na comunidade terena. A história acontece antes do século XV, quando a personagem principal Káxe, a pajé surda, é chamada para o ritual típico de solicitar benção aos ancestrais ao nascer uma criança. Nesse momento, junto à benção, a pajé recebe a visão do futuro do povo terena por meio de imagens. Dessa forma, o desenvolvimento da narrativa perpassa os principais momentos históricos: desde o início do povo terena (Aruak) datado de antes do século XV, percorrendo o caminho geográfico que os terenas realizaram até se fixarem, em sua maior parte, na região do Mato Grosso do Sul.

Além do registro histórico, encontram-se os aspectos culturais bem marcados nas ilustrações como por exemplo as pinturas corporais, o artesanato, as plantações e a espiritualidade. Optamos a explorar as imagens ao invés da escrita em ‘’balões’’ em razão de priorizar a estrutura linguística das línguas de sinais, em outras palavras, visual-espacial.

Partimos da primeira pesquisa que descreve a existência da língua terena de sinais, que foi realizada pela pesquisadora e linguista Priscilla Alyne Sumaio Soares (2014; 2018). No entanto, há relatos e transmissões orais de que sempre existiram surdos (anciãos). Por este motivo, optamos por apresentarmos personagens se comunicando (sinalizando) ao longo da narrativa gráfica.

A narrativa encerra-se com o retorno do plano espiritual da pajé surda no ritual inicial de nascimento com a anciã transmitindo os ensinamentos em língua terena de sinais. A ideia transmitida é relatar o futuro do povo terena destacando sua principal característica de UNIÃO (ilustrado o sinal em língua terena de sinais).

Essa HQ impulsionou a criação de outros materiais que estão sendo realizados pela equipe envolvida, como o “Glossário Virtual Plurilíngue” em vídeos (terena de sinais, Libras) e escrita (terena e português) que tem como intuito refletir sobre a importância da língua de sinais ser a língua de instrução e transmissão dos saberes para surdos (Lei 10436/2002 – Decreto 5626/2005) e divulgar as outras línguas de sinais do Brasil que não dispõe de leis (SILVA; QUADROS, 2019).

A HQ será lançada pela editora Letraria e estará disponível para compra no site. Confira a tradução deste texto para a Libras neste link.

Boa leitura sinalizada!

Principais referências

BRASIL. Decreto-lei nº 5.626, de 22 de dezembro de 2005. Diário Oficial [da] República Federativa do brasil, Brasília, 23 de dez. 2005. Seção 1, p. 30.
BRASIL. Lei nº 10.436, de 24 de abril de 2002. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, 25 de abril de 2002. Acesso em: 10 mar. 2007.
CEZAR, K. P. L. HQ’s sinalizadas. Projeto de pesquisa institucional. Universidade Federal do Paraná, 2019-2020.
SILVA, D. Estudo lexicográfico da língua terena: proposta de um dicionário terena-português. 2013. 292 f. Tese (doutorado) – Universidade Estadual Paulista Julio de Mesquita Filho, Faculdade de Ciências e Letras (Campus de Araraquara), 2013.
SILVA, D. S.; QUADROS, R.M. Línguas de sinais de comunidades isoladas encontradas no Brasil. Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 5, n. 10, p. 22111-22127 oct. 2019.
SOARES, P. A. S. LÍNGUA TERENA DE SINAIS: análise descritiva inicial da língua de sinais usada pelos terena da Terra Indígena Cachoeirinha. Tese de Doutorado apresentada ao Programa de Pós Graduação em Linguística e Língua Portuguesa da Faculdade de Ciências e Letras – Unesp/Araraquara, como requisito para obtenção do título de Doutor em Linguística e Língua Portuguesa. Araraquara – São Paulo, 2018.
SUMAIO, P. A. Sinalizando com os terena: um estudo do uso da LIBRAS e de sinais nativos por indígenas surdos. 2014. 123 f. Dissertação (mestrado) – Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Faculdade de Ciências e Letras Campus de Araraquara, 2014.
VILHALVA, S. Mapeamento das Línguas de Sinais Emergentes: um estudo sobre as comunidades linguísticas Indígenas de Mato Grosso do Sul. 2012. 124 f. Thesis (MSc in Linguistics) – Programa de Pós-Graduação em Linguística – Centro de Comunicação e Expressão. Universidade Federal de Santa Catarina, 2009.
VILHALVA, S. Índios surdos: mapeamento das línguas de sinais no Mato Grosso do Sul. Petrópolis: Arara Azul, 2012.

Autores:
Ivan de Souza: Acadêmico do curso de licenciatura em Letras Libras da Universidade Federal do Paraná (UFPR). Tradutor-intérprete de Libras. Pesquisador da iniciação científica (PIBIS/FA/UFPR). E-mail para contato: hiven89@gmail.com.
Kelly Cezar: Pós-doutora pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE). Doutora pelo Programa de Linguística e Língua Portuguesa da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (UNESP-FClar/Araraquara). Professora Adjunta da Universidade Federal do Paraná (UFPR), campus de Curitiba. Líder do projeto institucional “HQ’s sinalizadas”. Docente do curso de licenciatura em Letras Libras (UFPR). E-mail para contato: kellyloddo@gmail.com.

Língua e descolonização

Os séculos de colonização portuguesa no continente africano – e em Angola de forma específica – deixaram suas marcas: na língua falada, nos costumes, na história, nas memórias, na literatura. Nesse sentido, mesmo com a conquista da tão sonhada independência, é impossível retornar a uma época na qual os africanos ainda não haviam mantido contato com os europeus.

Um desses impactos consiste na questão da língua utilizada no país africano para a comunicação no cotidiano, para a produção de documentos oficiais ou para a escrita de obras literárias. Após a conquista da independência angolana, em 1975, a língua portuguesa – a língua do ex-colonizador, do opressor – foi adotada como idioma oficial do país. Muitos poderiam se questionar sobre as consequências da escolha, da preferência pela língua portuguesa: os idiomas africanos não poderiam ter primazia?

Estudiosos, como Laura Padilha (2002), apontam que o uso da língua portuguesa pelos angolanos não acontece de forma passiva. Dessa forma, o português, anteriormente sinal e evidência do colonizador, da escravidão e da opressão, torna-se uma importante ferramenta de revolução social, a partir da reinvenção e da renovação da língua do silenciador pelo silenciado. Uma vez usada pelos novos falantes de acordo com suas necessidades, a língua do dominador se volta contra a dominação. Faz parte dessa transformação do português a incorporação de palavras, expressões e estruturas sintáticas das línguas africanas – e, dessa forma, a língua europeia vai ganhando contornos angolanos.

As literaturas das ex-colônias portuguesas são chamadas por Pires Laranjeira (2000) de literaturas calibanescas, pois foram obrigadas a deglutir a literatura portuguesa, misturada com a brasileira, afro-americana, africanas etc., para criar algo só seu, para marcar a sua diferença. Assim, tendo em vista a importância da apropriação da língua portuguesa e da sua transformação em um idioma angolanizado para a solidificação da nação, fica claro o papel de destaque da literatura no processo. Como explica Edward Said (2011), o imperialismo se reforçou a partir de um discurso que o tornava algo natural e correto e a literatura em muito contribuiu para a propagação desse discurso. Dessa forma, a literatura igualmente assumiu o papel oposto de marcar a necessidade da independência, do reconhecimento dos povos africanos e da violência perpetrada sobre eles ao longo dos séculos de colonialismo.

Fonte:   Mayombe               Teoria Geral do Esquecimento         Mãe, Materno Mar                    Os transparentes 

 

Referências
LARANJEIRA, Pires (org.). Negritude africana de língua portuguesa: textos de apoio (1947-1963). Coimbra: Angelus Novus, 2000.

PADILHA, Laura Cavalcante. Novos pactos, outras ficções: ensaios sobre literaturas afro-luso-brasileiras. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2002.

SAID, Edward. Cultura e imperialismo. São Paulo: Companhia das letras, 2011.

Autora: Luara Pinto Minuzzi
Doutora em Letras pela PUCRS, com a tese “Escrever para tornar a escuridão mais bonita: um estudo sobre a construção simbólica da morte em quatro romances angolanos”. Atua como professora de Literatura e de Língua Portuguesa no Colégio Monteiro Lobato (Porto Alegre).

Funkeiros cults

Nas últimas semanas, a página do Facebook chamada Funkeiros Cults ganhou visibilidade, chamando a atenção dos jovens na rede social. A página combina literatura, em sua maioria clássica, com uma linguagem informal composta por gírias utilizadas nas periferias do nosso país. A página tem como objetivo quebrar o preconceito de que a literatura é consumida somente por uma classe social dominante ou por acadêmicos.

A página Funkeiros Cults passa a mensagem principal do livro apresentado no post em uma frase, utilizando gírias utilizadas nas periferias. Essa forma de se comunicar é motivo de preconceito na sociedade. A linguista Maria Marta Pereira Scherre relata que o preconceito linguístico seria um julgamento desrespeitoso em relação à fala de outra pessoa. Ela ainda afirma que existem algumas variedades linguísticas que sofrem mais preconceitos e que são geralmente associadas a um grupo de pessoas que possuem um menor reconhecimento na sociedade. Mas o que é uma variedade linguística? “Variedade linguística” é o termo utilizado para se referir a formas diferentes de utilizar a língua de um mesmo país. Essas variedades linguísticas resultam da variação de uma língua que ocorre devido a vários fatores, como por exemplo, a faixa etária, a escolaridade, a região, o contexto social e cultural.

De acordo com o linguista da Universidade de São Paulo, Ronald Beline, os grupos compostos por indivíduos que se comunicam de forma semelhante são denominados comunidades de fala. A variedade linguística presente em uma comunidade de fala se caracteriza por um vocabulário específico de um grupo social e é denominada “socioleto”. E é o socioleto do grupo do qual os funkeiros fazem parte que a página Funkeiros Cults usa para fazer as suas publicações. Podemos observar na página uma criatividade linguística do português, que deve ser valorizada como tal, porque todas as formas de comunicações são válidas.

 

REFERÊNCIAS:

ABRAÇADO, Jussara. Entrevista com Maria Marta Pereira Scherre sobre preconceito lingüístico, variação lingüística e ensino. Cadernos de Letras da UFF, n. 36, p. 11-26, 2008.

BATTISTI, Elisa. Redes sociais, identidade e variação linguística. In: FREITAG, Raquel Meister Ko (Organizadora). Metodologia de Coleta e Manipulação de Dados em Sociolinguística. São Paulo: Editora Edgard Blücher, 2014. p. 79-98.

BELINE, Ronald. A variação Lingüística. In: FIORIN, José Luiz. Introdução à Lingüística. São Paulo: Contexto, 2003. p. 121-139.

 

Autor: Thomas de Julio Hopfengartner
Graduando do curso de Licenciatura em Letras – Português e Alemão na Universidade Federal de Pelotas. Faz parte do projeto de extensão: “Ações de Conscientização Linguística” na mesma universidade.

Um mundo poético e multilíngue

De africâner a vietnamita. No Lyrikline, você pode encontrar poemas escritos e recitados em diversas línguas! Cada poema pode ser encontrado por poeta, gênero, tema, forma, língua ou aleatoriamente (conforme mostra a imagem abaixo). Além disso, algumas poemas contam com traduções.

Esse site é um projeto da Literaturwerkstatt, de Berlim, em cooperação com os seus parceiros internacionais. Aproveite para escutar rimas em várias línguas, tesouros poéticos que representam infinitas possibilidades de combinação de sons.

Fonte: Lyrikline