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Poliglota, multilíngue, plurilíngue: qual termo devo usar?

Você conhece algum poliglota? O termo “poliglota” é frequentemente usado no cotidiano por pessoas leigas em Linguística. Podemos remontar a origem da palavra “poliglota” a duas palavras do grego: polu- (πολύ) e glotta (γλώσσα), que significam “muitas línguas”. O Dicionário de Aprendizes de Oxford para o Inglês define “poliglota” como “saber, usar e escrever em mais de uma língua”. Todavia, há debate sobre o número de línguas que um poliglota deve dominar com proficiência plena: quatro, cinco ou mais línguas? A mesma fonte ainda sugere “multilíngue” como sinônimo. 

Mas você sabia que esse conceito já foi superado pela Linguística? Atualmente, esse termo é considerado obsoleto, visto que passou a representar um falante idealizado de línguas estrangeiras altamente proficiente em todas ou na maioria das línguas que domina. Esse perfil corresponde a um número muito limitado de pessoas.

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Em contraposição, como explica o professor Bernardo Limberger (2018), o termo multilinguismo vem sendo utilizado na Psicolinguística e na área de Aquisição de Terceira Língua para designar o uso de três ou mais línguas. O falante multilíngue pode apresentar comportamentos linguísticos ainda mais complexos que aqueles observados em contextos de bilinguismo, caracterizado pelo uso de duas línguas. As pesquisadoras Britta Hufeisen e Ulrike Jessner (2019) mencionam que o multilinguismo é um fenômeno social e individual complexo, que envolve processos de aquisição, manutenção, atrito (perda gradual de habilidades linguísticas) e perda de línguas. 

Todavia, de acordo com o professor Cléo Altenhofen (2013), em estudos de caráter mais social, o multilinguismo é abordado de forma distinta, sendo usado em referência à diversidade linguística presente nas sociedades. Nessa mesma conjuntura, ele define outro conceito: o de plurilinguismo, entendido como uma habilidade individual que engloba a pluralidade linguística e cultural e que emerge no multilinguismo. Para os pesquisadores Tej Bhatia e William Ritchie (2013), o conceito de plurilinguismo pode ser também utilizado com termo abrangente com referência ao indivíduo que usa várias línguas. 

Portanto, é importante definir de qual perspectiva você parte — se da Sociolinguística ou da Psicolinguística/Aquisição de Terceira Língua. É fundamental destacar que, independentemente disso, as pessoas que usam várias línguas no seu cotidiano não são poliglotas, mas sim multilíngues ou plurilíngues. Esses conceitos englobam uma diversidade de características pessoais e coletivas relacionadas à aprendizagem e à aquisição de línguas. Ao caracterizarmos o falante dessa forma, não se idealiza a sua proficiência, não se questionam habilidades linguísticas nem se isolam questões sociais, psicológicas e linguísticas que influenciam o uso das línguas. 

Referências
ALTENHOFEN, C. V. Migrações e contatos linguísticos na perspectiva da geolinguística pluridimensional e contatual. Revista Norte@mentos, v. 6, n. 12, p. 31-52, 2013.
BHATIA, Tej K.; RITCHIE, William C. The Handbook of Bilingualism and Multilingualism. 2. ed. Chichester, UK: Blackwell Publishing, John Wiley & Sons, 2013. p. 1-22.
HANSEN, A. What Is the Difference Between a Polyglot and a Multilingual Person? Spanish Academy, 2020.
HUFEISEN, B; JESSNER, U. Lecture 3: The psycholinguistics of Multiple Language Learning and Teaching. In: Singleton, D. M. Aronin, L. Twelve Lectures on Multilingualism. Bristol: Multilingual Matters, 2019. p. 65-100.
LIMBERGER, B.  K. Processamento da leitura multilíngue e suas bases neurais: um estudo sobre o hunsriqueano. 2018. Tese de doutorado em Linguística, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, 2018. 

Autora: Giovana Canez Valerão, graduada em Letras – Português e Espanhol pela Universidade Federal de Pelotas, mestranda em Letras no Programa de Pós-Graduação em Letras (PPGL) da mesma universidade, é responsável pela página @hallyucoreanoemultilinguismo no Instagram.