O português também é uruguaio!

Mas a língua do Uruguai não é o espanhol? Para responder essa pergunta, primeiro é importante dizer que não necessariamente um país se constitui apenas por uma língua. Por exemplo, no Brasil, embora o português seja a língua oficial, e, por isso, muitos o identifiquem como um país monolíngue, mais de 200 línguas são faladas, de acordo com os pesquisadores Tommaso Raso, Heliana Mello e Cléo Altenhofen (2011). No Uruguai, não é diferente. Nas comunidades fronteiriças do norte, o português, historicamente, também foi bastante falado. E sabe por quê?

Muitos mitos indicam que o motivo do português ser falado no norte do Uruguai é a presença de brasileiros e de seus meios de comunicação. No entanto, a história é bem mais antiga e tem início lá no século XIX, quando a República Oriental do Uruguai ainda nem tinha esse nome.

O português é falado no norte do Uruguai devido às raízes históricas da época colonial e vem sendo transmitido como língua de herança por gerações. A pesquisadora Ana Maria Carvalho (2006) explica que, no século XIX, o Brasil ocupava grande parte do território uruguaio, como mostra a imagem abaixo, e era visto como um rival na disputa de terras.

Fonte: RONA, José Pedro. El dialecto “fronterizo” del norte del Uruguay. Montevideo. Adolfo Linardi, 1965.

Para se diferenciar no processo de construção de sua nação, o Uruguai buscava eliminar o português do país. Para isso, diversas políticas monolíngues foram implementadas. Entre elas, destacamos a própria construção de Montevidéu como centro de referência hispânico e o ensino apenas de espanhol nas escolas públicas.

Diante dessa ideologia, para a estudiosa Ana Maria Carvalho (2006), o uso do português era “visto como resistência à unidade nacional e traição aos valores da pátria” e, por isso, criou-se uma predisposição em dizer que o espanhol era a língua do governo e da identidade uruguaia, ficando o português uruguaio com status de língua marginalizada.

Atualmente, como resultado das políticas monolíngues implementadas ao longo dos séculos, o português uruguaio é bem menos falado. Por outro lado, existem pesquisas e projetos que buscam resgatar o idioma e utilizá-lo como recurso para um processo de educação bilíngue.

Referências
CARVALHO, Ana Maria. Políticas lingüísticas de séculos passados nos dias de hoje: o dilema sobre a educação bilingüe no norte do Uruguai. Language Problems & Language Planning, v. 30, n. 2, p. 149–171.
RASO, Tommaso; MELLO, Heliana; ALTENHOFEN, Cléo V. Os contatos linguísticos e o Brasil: Dinâmicas pré-históricas, históricas e sociopolíticas. In: MELLO, Helina; ALTENHOFEN, Cléo V.; RASO, Tommaso. Os contatos linguísticos no Brasil. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2011. p. 13-56.

Autora: Caroline Gonçalves Feijó-Quadrado. Licenciada em Letras e Mestre em Educação pela Universidade Federal do Pampa – campus Jaguarão. Doutoranda em Letras pela Universidade Federal de Pelotas.

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