Para responder a esta pergunta, inicialmente, devemos compreender o papel da linguagem como constituidora de sentidos, ou seja, capaz de nomear a tudo e a todos. Para tanto, as relações coloniais serão o ponto de partida. Especificamente, devemos nos remeter ao combate feito pelas comunidades europeias para apagar as línguas dos grupos dos territórios dominados, com base em referenciais ocidentais, europeus, brancos, patriarcais e cristãos.
O apagamento das línguas demonstrava o que poderia ou não ser validado para aqueles espaços. Os saberes e conhecimentos dos grupos dominados eram exterminados e forjava-se, com isso, marcas de dominação e racismo.
Os colonizadores europeus construíram nossas referências de línguas “importantes” e produziram estruturas hierárquicas através das línguas a fim de denominar aqueles que eram considerados outros. Os outros carregavam uma coloração de pele, um cabelo e um falar não europeu. Essas marcas fazem parte de um passado-presente que, a partir da linguagem, nos racializou e materializou as formas que conhecemos como racismo.
A branquitude, ao oprimir, nos impõe o conceito de raça e nos nomeia como negros por não termos as características dessa mesma branquitude. Essa marca linguística que “ganhamos” nos aparta dos demais; somos outros; a linguagem nos fez outros. Vozes de uma branquitude detentora do poder e capaz de nomear. Claro, as línguas são racistas! Não! Elas apenas apresentam as relações de poder construídas por aqueles que delas fazem uso.
Já fomos nomeados demais. Queremos que nossas vozes falem as nossas dores. Queremos que o movimento aconteça de dentro para fora e não o contrário. Com esse desejo e cruzando preconceito racial, social e linguístico, o termo racismo linguístico é criado como uma perspectiva de análise das construções de língua e linguagem daqueles que não compõem o espectro branquitude-poder. O termo dá nome ao livro do professor Gabriel Nascimento, lançado em 2019, Racismo Linguístico: Os subterrâneos da linguagem e do racismo.
Como nossas práticas estão contribuindo para a problematização desse tipo de racismo? Como nossos privilégios afetam a condição das demais pessoas? Conseguindo responder a essas perguntas ficará fácil saber se existe racismo linguístico.
Referência
NASCIMENTO, Gabriel. Racismo Linguístico: Os subterrâneos da linguagem e do racismo. Belo Horizonte: Letramento, 2019.
Autor: Maicon Farias Vieira
Licenciado em Letras – Português e Espanhol, especialista em Educação em Direitos Humanos, mestre em Educação e doutorando no Programa de Pós-Graduação em Letras da Universidade Federal de Pelotas, além de atuar como professor na rede municipal de educação de Pelotas.