O clássico e o popular… no Egito Antigo!

Observe a placa egípcia na foto. Quando esse objeto foi feito, há exatos 2037 anos atrás, o reino egípcio já existia há mais de 3000 anos. Três mil anos!

Fonte: o autor. Foto tirada no Kunsthistorisches Museum, em Viena, na Áustria. A estela de An-Em-Her foi feita para um alto-sacerdote de Ptah no ano de 217 a.C. O texto foi talhando em baixo-relevo numa peça de calcário.
Fonte: O autor. Foto tirada no Kunsthistorisches Museum, em Viena, na Austria. A estela de An-Em-Her foi feita para um alto-sacerdote de Ptah no ano de 217 a.C. O texto foi talhado em baixo-relevo numa peça de calcário.

A língua egípcia, assim como acontece com todas as línguas do mundo, foi mudando ao longo dos séculos, e é certo que um egípcio que trabalhou na construção da Grande Pirâmide, lá pelo ano 2570 a.C., não conseguiria compreender a pessoa que colocou essa placa aí na parede no ano 217 a.C.

Da mesma forma, um romano da época das lutas no Coliseu não conseguiria se comunicar fluentemente com um falante de português, francês ou espanhol, apesar de essas línguas modernas serem basicamente a mesma língua dos romanos, que foi mudando e se dividindo nos últimos 2000 anos.

A escrita clássica (hieróglifos) da língua egípcia é bastante complexa e era conhecida apenas pela elite. Usava um sistema de ideogramas (um símbolo = um conceito, mas sem informação fonológica), em combinação com sinais determinativos (sem pronúncia, mas com função gramatical) e fonéticos (um símbolo = um som). O sistema chegou a ter mais de 5000 sinais diferentes. A maioria do povo, fora da corte real e dos templos, sempre usou formas alternativas, algumas derivadas ou simplificadas dos hieróglifos, outras completamente paralelas ao sistema oficial.

De volta à placa da foto, abaixo do texto solene em hieróglifos, vemos uma linha e meia de uma escrita cursiva que hoje chamamos de demótico (do grego “dēmotikós”, ‘popular’). O texto maior está na língua e escrita clássica (é como se hoje escrevêssemos um texto importante em latim, como faz a Igreja Católica). Já a pequenina linha na parte de baixo traz um resumo do texto na língua egípcia como era falada em 217 a.C., para os que não sabiam ler na língua escrita clássica.

A escrita demótica entrou em contato com o alfabeto grego (assim como a língua egípcia falada ‘encontrou’ a língua grega antiga) e esse contato deu origem ao copta, a forma mais moderna da língua egípcia. O copta ainda era falado até pouco tempo atrás – hoje ainda existe como língua litúrgica na Igreja Ortodoxa Copta.

 

Autor: Renan C. Ferreira
Graduado em Letras – Licenciatura em Língua Inglesa e Literatura (2010) e Mestre em Letras – Estudos da Linguagem (2018) pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel). Atualmente desenvolve sua pesquisa de Doutorado sobre Relativismo Linguístico e a Cognição Bilíngue na mesma instituição. Faz parte do grupo de pesquisa Línguas em Contato e atua como professor de língua inglesa há 13 anos.

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