A adoção do documento “Áreas de Cooperação Prática 2024–2028”, durante a 2ª Reunião do Comitê Conjunto de Cooperação Setorial Brasil-ASEAN, em Jacarta, marca um novo patamar na relação entre o Brasil e os países do Sudeste Asiático.
A iniciativa, formalizada em 2023 com o estabelecimento da Parceria de Diálogo Setorial, estabelece áreas prioritárias de cooperação nos eixos político, econômico, sociocultural e multissetorial. O documento visa alinhar os interesses do Brasil com os objetivos da ASEAN Community Vision 2025, fortalecendo os laços com um bloco que já figura como o terceiro maior parceiro comercial do país, com uma corrente de comércio superior a US$ 33 bilhões (Brasil, 2024).
Entre 2024 e 2028, os temas de cooperação envolvem desde o combate ao crime transnacional e segurança cibernética até ações voltadas para o comércio, inovação, energias renováveis, igualdade de gênero e cidades inteligentes. O mecanismo de acompanhamento prevê revisões periódicas e relatórios anuais, permitindo ajustes estratégicos conforme as prioridades evoluam (Poder 360, 2025). Esse novo arcabouço institucional será complementado pelo lançamento da Frente Parlamentar Brasil-ASEAN, previsto para junho de 2025. A frente terá como foco ampliar as exportações brasileiras à Ásia, fortalecer a diplomacia econômica e promover o engajamento do Legislativo em iniciativas multilaterais e comerciais.
A importância da ASEAN como destino das exportações brasileiras é evidente: com um PIB agregado de US$ 3,8 trilhões e uma população de 682 milhões de pessoas, a região superou o Mercosul como terceiro principal destino das exportações brasileiras em 2023. Produtos como petróleo, soja, minério de ferro e carnes lideram a pauta exportadora, que apresentou crescimento médio anual de 19,8% entre 2019 e 2023, acima da média nacional. A região também abriga investimentos expressivos, especialmente de Singapura, com destaque para projetos nos setores de café, agronegócio e hotelaria. Por outro lado, o Brasil ainda enfrenta desafios, como barreiras tarifárias e a baixa participação nas importações do bloco (1,7%) (APEX, 2024a).
O Vietnã se destaca como um dos mercados mais promissores da região. Com quase 100 milhões de habitantes e um comércio bilateral com o Brasil de US$ 6,7 bilhões em 2023, o país asiático já é um dos principais destinos de commodities brasileiras, como milho, soja e carne (APEX, 2024b). A presença brasileira tem crescido, com investimentos em logística e couro, mas a pauta exportadora segue concentrada em produtos de baixo valor agregado. A realocação de empresas para fora da China e o crescimento urbano e da renda tornam o Vietnã um alvo estratégico, embora barreiras regulatórias e concorrência de países com acordos comerciais em vigor ainda limitem avanços.
A ApexBrasil e o Ministério das Relações Exteriores têm ampliado a atuação para consolidar a presença brasileira na Ásia, com ações como a instalação de escritórios em Xangai e Singapura e a preparação para a Exposição Universal em Osaka em 2025. Com mais de 2.000 oportunidades mapeadas na ASEAN e mais de 700 na Oceania, há grande potencial de expansão comercial em setores como combustíveis, alimentos e manufaturados (APEX, 2024c). O fortalecimento dessas relações também depende da diversificação da pauta exportadora e da atração de mais investimentos da região para o Brasil.
Dado o exposto, a consolidação da relação Brasil-ASEAN representa um movimento estratégico de diversificação de mercados, com impactos diretos nas políticas comercial, diplomática e de investimentos de ambas as partes. A guerra comercial entre China e Estados Unidos reforça essa estratégia ao oferecer ao Brasil a oportunidade de reduzir sua dependência dessas potências e ampliar parcerias em outras regiões. A recente entrada da Indonésia no BRICS+ abre um canal relevante de diálogo e comércio com o maior país do Sudeste Asiático, enquanto a aproximação de Malásia, Tailândia e Vietnã com o conjunto de países do Sul Global amplia as perspectivas de cooperação regional. Nesse contexto, a articulação entre planejamento institucional, atuação parlamentar e interesse da iniciativa privada pode posicionar a ASEAN como uma alternativa estratégica para o Brasil no processo de diversificação de sua presença econômica e diplomática na Ásia.
Referências
APEXBRASIL. ASEAN emerge como um dos principais destinos das exportações brasileiras. Brasília: APEX Brasil, 2024c. Disponível em: <https://apexbrasil.com.br/br/pt/conteudo/noticias/ASEAN-emerge-como-um-dos-principais-destinos-das-exportacoes-brasileiras.html#:~:text=Em%202023%2C%20a%20ASEAN%20foi,estrat%C3%A9gica%20no%20com%C3%A9rcio%20exterior%20brasileiro.&text=Conforme%20indicado%20pelo%20estudo%2C%20os,qu%C3%ADmicos%2C%20aeronaves%2C%20autom%C3%B3veis>. Acesso em: 12 jun. 2025.
APEXBRASIL. Perfil de Comércio e Investimentos: ASEAN. Brasília: APEX Brasil, 2024a. Disponível em: <https://apexbrasil.com.br/content/apexbrasil/br/pt/solucoes/inteligencia/estudos-e-publicacoes/perfil-de-comercio-e-investimentos/perfil-de-comercio-e-investimentos-asean-2024.html>. Acesso em: 12 jun. 2025.
APEXBRASIL. Perfil de Comércio e Investimentos: Vietnã. Brasília: APEX Brasil, 2024b. Disponível em: <https://apexbrasil.com.br/content/apexbrasil/br/pt/solucoes/inteligencia/estudos-e-publicacoes/perfil-de-comercio-e-investimentos/perfil-de-comercio-e-investimentos—vietna—2024.html>. Acesso em: 12 jun. 2025.
BRASIL. Adoção do Documento “Áreas de Cooperação Prática” no âmbito da Parceria de Diálogo Setorial Brasil-ASEAN”. Brasil: Ministério das Relações Exteriores, 2023. Disponível em: <https://www.gov.br/mre/pt-br/canais_atendimento/imprensa/notas-a-imprensa/adocao-do-documento-201careas-de-cooperacao-pratica201d-no-ambito-da-parceria-de-dialogo-setorial-brasil-asean#aseancoop>. Acesso em: 12 jun. 2025.
COSTA, José Luis; LEITE, Augusto. Frente Brasil-ASEAN será lançada com foco na exportação à Ásia. Distrito Federal: Poder 360, 2025. Disponível em: <https://www.poder360.com.br/poder-congresso/frente-brasil-asean-sera-lancada-com-foco-na-exportacao-a-asia/#:~:text=A%20Frente%20Parlamentar%20Brasil%2DAsean,do%20bloco%20do%20sudeste%20asi%C3%A1tico>. Acesso em: 12 jun. 2025.
Glauco Winkel é pesquisador no Laboratório de Geopolítica, Relações Internacionais e Movimentos Antissistêmicos (LabGRIMA).
