A gravura pode ser definida através da impressão, o ato de transferir ou o gesto de produzir uma marca. Numa evolução dos meios, a impressão pode ser reprodução seriada ou não, surge o desafio do pensamento, a de refletir sua dimensão antropológica, articulando a singularidade e universalidade.
A gravura no contexto contemporâneo conduz a um novo cenário; a impressão como um instrumento da arte. Com isso, novas linguagens repercutem numa gama de possibilidades, técnicas tradicionais que extrapolam limites e/ou se hibridizam se transformando em outra. Novos materiais e novas técnicas, tradicional com digital, outros meios se metamorfoseando num outro, criando novos processos, surgindo novas perguntas e reverberando em pesquisas poéticas com um adensamento do pensamento gráfico.
Os trabalhos da exposição são proposições que refletem esse cenário em que a especificidade da gravura, sua qualidade, é trazida em como ponto de tensão. Por isso, “Distinções e Distensões na Gravura” traduz a particularidade do ofício, a primazia do gesto único, numa pluralidade de processos obtendo caráter universal, produzindo questionamentos na arte contemporânea e, sobretudo, nas artes gráficas.
O gesto do desenho impresso, a linha contínua das monotipias de Ana Julia Vilela parece feita num impulso, como se não houvesse respiração, e assim ela emite a marca sobre metros de papel, trazendo uma pequena fissura para a galeria, um filete de cor que cruza o espaço.
Os corações de Andrezza Bayer que palpitam nesse espaço e sugerem uma percepção ao corpo que não vemos, o mesmo que conduz nossa vida por movimentos repetitivos, sempre presentes e nunca vistos, se mostram em imagens sucessivas impressas em vermelho e azul.
O corpo e a gestualidade também estão presentes no trabalho de Gabi Costa, mas aqui o corpo da artista é matriz e produz marcas que deixam sua presença no espaço da Galeria, produzindo ao mesmo tempo uma superfície velada, questionando a ausência desse corpo. E o processo da gravura trabalho de Jahan Leão carrega a presença por meio da ausência, tanto na imagem velada da impressão digital e a materialidade da tinta da serigrafia quanto na informação que carrega traduzindo a comunicação entre as árvores em uma linguagem visual.
Ao contrário das estratégias de apresentação, Leoa Pardal traz o conceito e o universo do lambe para a galeria, múltiplos que também se espalham pela cidade e também espelham a sociedade, ecoa a voz feminista entre muros e volantes, podendo estar em muitos lugares ao mesmo tempo.
Já Mariana Medeiros explora o lugar da memória e do afeto através de um registro da cidade onde nasceu, região montanhosa e mágica pela paisagem que é traduzida por sua atmosfera natural que a artista explora.
Renan Soares, por sua vez, também tem em seu trabalho o uso do lugar, mas refere-se ao espaço da galeria, o uso da arquitetura e a influência da presença, o branco e o negro, que marcam o vestígio da luz tornando-se a matéria do impalpável.
“Através desse breve panorama podemos observar o cruzamento entre os trabalhos reunidos, assim como técnicas e saberes, provando que a gravura percorre um caminho munido de desafios e rico em subjetividades, que esgaçam os limites na busca pela poesia”, observa a curadora.