Safra do Camarão 2025: desafios,impactos climáticos e sustentabilidade na pesca pelotense

Trapiche para pesca na colônia Z3, em Pelotas. Fotos Isaac Moraes / Especial Em Pauta

 

Por Bruna Garcia, Gabriele Brittes e Isaac Moraes / Especial Em Pauta

A pesca de camarão em Pelotas enfrenta um cenário de incertezas no ano de 2025, com desafios agravados pelas enchentes de 2024 e as mudanças climáticas que passamos ao longo dos anos. Na Colônia Z3, localizada a cerca de 25 km do centro de Pelotas, a principal fonte de sustento dos pescadores locais passa por incertezas e a expectativa é mista: por um lado, a esperança de uma safra positiva, e por outro, a preocupação que ainda os assola com os prejuízos causados pelas forças das águas que invadiram a colônia em maio e abril de 2024.

Nilmar Conceição, presidente do Sindicato dos Pescadores avalia danos da enchente. Fotos Isaac Moraes / Especial Em Pauta

Nilmar Conceição, presidente do Sindicato dos Pescadores da região, compartilha o panorama atual: “Já faz um ano que a gente não pesca o camarão, por conta das enchentes. A última safra favorável foi em 2021. De lá para cá, o clima e outros fatores naturais afetaram muito a pesca. Este ano, a expectativa é incerta, pois a natureza tem sido imprevisível.”
As enchentes de 2024 deixaram marcas profundas na paisagem e na vida dos pescadores. Nilmar lembra que, até o mês de janeiro, o local onde eles estavam pescando estava submerso: “Aqui onde estamos, a água chegou a dois metros de altura. Então, imagina como é difícil prever o que teremos de camarão. No passado, sabíamos mais ou menos o que esperar, mas este ano tudo é incerto.

As enchentes que atingiram a região da Lagoa dos Patos, a maior laguna costeira do Brasil, são um reflexo de um fenômeno mais amplo relacionado às mudanças climáticas globais. A combinação de chuvas intensas, aumento do nível do mar e eventos climáticos extremos, como ciclones e tempestades mais frequentes, têm afetado diretamente as áreas costeiras, alterando a dinâmica dos ecossistemas aquáticos. A Lagoa dos Patos, que é vital para a pesca de camarão em Pelotas, tem sofrido com esses eventos climáticos, causando inundações recorrentes que invadem áreas de pesca e destroem infraestruturas essenciais, como embarcações,
galpões e trapiches. No caso da Lagoa dos Patos, as chuvas intensas de 2024, aliadas ao acúmulo de água proveniente de outros rios e córregos, resultaram na grande elevação da laguna, devastando áreas residenciais e afetando diretamente a atividade dos pescadores na Colônia Z3.

A relação dos pescadores com a natureza sempre foi de dependência e respeito. No entanto, com as mudanças no clima, a rotina da pesca tem se tornado cada vez mais desafiadora. A comunidade pesqueira da Lagoa dos Patos, formada por mais de 3.000 pescadores licenciados, enfrenta um ciclo de incertezas, mas também de resiliência. “A gente vive disso, nossa renda é só dessa pesca. Se não tiver pesca, a vida fica muito difícil. E nós somos os primeiros afetados pelas mudanças climáticas, como aquecimento global, enchentes e seca”, diz Nilmar.

Adriana Chagas, pescadora, conta das dificuldades da profissão

Adriana Chagas, pescadora há mais de 30 anos, construiu sua trajetória na pesca artesanal após deixar a profissão de secretária e seguir os passos da família. Casada com um pescador e mãe de dois filhos que também atuam na pesca, ela se tornou uma figura reconhecida na Colônia Z3 não apenas pela atividade na pesca, mas também pelo bar que administra, ponto de encontro tradicional da comunidade. Prestes a se aposentar, Adriana destaca os desafios enfrentados pelas mulheres no setor, especialmente nos períodos de escassez. “O principal desafio é a frustração da safra. Quando não tem peixe, muitas mulheres que trabalham na limpeza dos camarões e peixes precisam buscar outras formas de renda, como serviços domésticos no centro da cidade. Isso impacta diretamente o sustento das famílias”, relata. Para ela, políticas públicas de incentivo poderiam garantir maior segurança para as pescadoras e para toda a comunidade pesqueira da região.
Além das dificuldades impostas pela natureza, os pescadores contam com o apoio de iniciativas como o programa Agro Família, promovido pela EMATER. Rodrigo Prestes, chefe da EMATER-RS em Pelotas, destaca a importância do apoio institucional em momentos como esse. “A instituição tem auxiliado os pescadores, oferecendo projetos que ajudam na recuperação das infraestruturas prejudicadas pelas enchentes. O programa Agro Família, por exemplo, oferece aos pescadores um financiamento de até R$15.000, com um rebate de 80%, para que possam recuperar suas embarcações e galpões, essenciais para o trabalho”, explica.

Para ele, a sustentabilidade da pesca é fundamental, e a EMATER está sempre envolvida em discussões sobre como equilibrar a pesca com a preservação ambiental. “Participamos de fóruns como o Fórum da Lagoa, onde discutimos as melhores práticas para garantir a sustentabilidade da atividade pesqueira”, completa Rodrigo.

Rodrigo Prestes, chefe da EMATER-RS em Pelotas

Enquanto os pescadores lutam para recuperar suas infraestruturas e superar os efeitos das enchentes, o prefeito de Pelotas, Fernando Marroni, aponta uma alternativa para melhorar a rentabilidade da pesca do camarão. Marroni sugere que, ao invés de vender o camarão in natura, como é feito tradicionalmente, a indústria pesqueira local poderia apostar na industrialização do produto, como o congelamento e embalagem. “Quando o camarão é embalado e congelado, ele se multiplica por cinco ou seis vezes no preço. Isso daria mais renda para os pescadores e reduziria a dependência do atravessador”, afirma o prefeito, enfatizando que a agregação de valor ao produto pode ser um caminho para garantir maior estabilidade financeira para a comunidade pesqueira.
Essa visão de industrialização não só ajudaria a aumentar os lucros dos pescadores, como também poderia transformar o setor pesqueiro de Pelotas em um modelo de sustentabilidade e inovação. No entanto, esse processo requer investimentos em infraestrutura e tecnologia, algo que os pescadores e as autoridades locais ainda buscam viabilizar. Para Nilmar, a sustentabilidade da pesca de camarão depende de uma integração entre a proteção ambiental e o fortalecimento da atividade econômica local. “Nós somos os primeiros a sofrer com as mudanças climáticas, mas também somos os primeiros a preservar o ambiente em que trabalhamos. A pesca é a nossa vida, e queremos que ela continue sendo uma fonte de sustento para as futuras gerações”, conclui Nilmar.
Em um momento de grandes desafios, o futuro da pesca de camarão em Pelotas ainda está em aberto. A colaboração entre os pescadores, as autoridades locais e as instituições de apoio como a EMATER pode ser a chave para garantir que a atividade pesqueira continue a prosperar, mesmo diante das adversidades impostas pelas mudanças climáticas. A esperança de uma safra de camarão positiva em 2025 é um reflexo da resiliência de uma comunidade que, apesar das dificuldades, não perde a fé no potencial de seu trabalho e de seu meio ambiente.

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