Peça “Além da visibilidade” traz debate sobre acessibilidade nas instituições de ensino

Elenco é composto quase inteiramente por alunos com deficiência e neurodivergentes do IFSUL de Pelotas         

Por Luís Esteves Garcez         

Na tarde de quarta-feira, dia 27 de novembro, estive no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Sul-rio-grandense (IFSul) de Pelotas, para assistir a primeira apresentação da peça “Além da Visibilidade”, realizada por alunos e funcionários do estabelecimento. Abordando os assuntos de acessibilidade em instituições de ensino e capacitismo institucional, os atores, todos com alguma deficiência ou neurodivergência (com exceção da diretora da peça, que também atuou), retrataram o primeiro dia de aula de uma turma com diversos alunos com necessidades especiais no IFSul.

Tendo chegado ao local mais ou menos uma hora antes da peça começar, pude assistir o último ensaio, quando observei uma situação ironicamente metalinguística. Na metade da peça, os atores encenam o primeiro contato deles com o alarme do IFSul. Na peça, o som do alarme é retratado pelo grito de uma das atrizes. Esse grito causa uma crise de pânico na sua colega deficiente visual, com sensibilidade auditiva, e ela precisa ser acalmada pelos colegas.

Durante o ensaio que assisti, esse alarme tocou três vezes, em menos de meia hora, e por mais que o grito de Rafaela Oleiro tenha sido estridente durante sua atuação na peça, voz humana alguma poderia atingir a intensidade assustadora do alarme do IFSul. Além de alto, é exageradamente longo. Nesses três momentos que o alarme soou, eu pude ver como ele realmente afeta aqueles atores com deficiência “fora do palco”, e assistir a overdose sensorial que ele causou em alguns daqueles alunos fez com que a cena que representou isso na peça tivesse uma carga emocional a mais para mim.

Além do problema do alarme, a falta de piso tátil em todo o campus também é criticada na peça, em uma cena que demonstra a dificuldade que um cego enfrenta quando aquele piso que ele está usando para se guiar simplesmente acaba. Imagine que você está caminhando e, em certo ponto do trajeto, o chão termina e dá lugar para um abismo infinito. Suponho que o sentimento seja parecido. A postura de professores sem devido treinamento e empatia para lidar com alunos especiais também é representada, e esse talvez seja o pior dos problemas, e o mais difícil de solucionar. Um alarme pode ser trocado em um dia, pisos especiais podem ser instalados em questão de semanas, mas treinar todo um corpo docente para não só interagir. como ensinar pessoas com diversas deficiências, é uma tarefa árdua que não depende só da direção, mas também do profissional.

 

O elenco de “Além da Visibilidade”: Patrícia Montone, Bruno José Garcia, Tânia Madeira, Luiza Belea, Luís Pedro Gonçalves Luiza Vitória Barbosa e Rafaela Oleiro           Foto: Luísa Bohn

 

A diretora de “Além da Visibilidade”, Patrícia Montone, além de dirigir e atuar na peça, também é psicopedagoga e faz assistência no IFSul para alunos com deficiência auditiva e visual. Ela entrou para o time do IFSul há apenas cinco meses, mas trabalhou durante 13 anos com crianças com deficiência. Após a peça, me encontrei com Patrícia, ela me contou que, nesses cinco meses lá dentro, apesar do IFSul de Pelotas ter uma demanda grande para inclusão e acessibilidade e fazer o possível para atender as necessidades especiais dos alunos, escutou de muitos alunos com necessidades especiais um relato de invisibilidade social. Os cegos e os surdos se sentem evitados pelos colegas e ignorados por alguns professores.

Com as histórias de discriminação e exclusão que ouviu, Patrícia decidiu organizar uma peça para mostrar o que os estudantes com deficiência do IFSUL passam lá dentro, em que todas as cenas foram relatos pessoais que aconteceram com os atores. Com o objetivo de questionar se a inclusão é realmente vivida pelos que precisam dela ou se ela é apenas uma teoria no nosso dia a dia. A peça, nas palavras da diretora, foi feita para que aqueles estudantes pudessem expressar o descontentamento que eles sentem com essa realidade, com a possibilidade de tocar no coração dos alunos e professores na audiência.

Patrícia montou o elenco convidando alunos que ela acreditou que pudessem retratar com emoção para o público essas experiências das pessoas com deficiência e neurodivergências. Com o trabalho de dirigir cinco alunos com diferentes deficiências (surdez, cegueira, TDAH e baixa visão) em mãos, teve receio que pudesse ser uma tarefa muito difícil, mas comenta que foi uma experiência muito fácil e que todos pegaram o roteiro muito rápido. Talvez porque todos aqueles atores não estavam “atuando” por completo, mas sim sendo eles mesmos, retratando a própria vida. A peça não tem data certa para ser encenada novamente, mas Patrícia me contou que pretende se sentar com a direção de outras instituições para a possibilidade de “Além da Visibilidade” acontecer novamente, em outras escolas e faculdades pelotenses.

 

Professora Patrícia Montone decidiu organizar peça para mostrar dificuldades enfrentadas por estudantes com deficiência    Foto: Luísa Bohn

 

Outro objetivo que a “Além da Visibilidade” teve foi homenagear a tradutora e intérprete de LIBRAS e coordenadora do Núcleo de Apoio a Pessoas com Necessidades Específicas (NAPNE), Tânia Madeira, com quem também tive a oportunidade de conversar. Ela me contou que achou muito importante a apresentação para aqueles alunos, para que eles fiquem mais próximos de aceitarem sua própria deficiência, pois ela acredita que se não conseguimos nos aceitar, não conseguimos nos relacionar bem com os outros e nem com o ambiente onde estamos.

Perguntei para Tânia quais os maiores desafios que ela enfrentou nesses quatro anos em que dirige o NAPNE. Ela não precisou pensar muito para me responder que é a falta de profissionais qualificados para atender esse público. O IFSul tem, hoje, 157 alunos apresentando alguma necessidade específica, mas apenas três psicopedagogos. Um número que ela considera ser insuficiente para dar conta dessa demanda da instituição.

Também citei em nossa conversa o problema do alarme, que havia ficado em minha mente após a apresentação. Tânia respondeu que ela está tentando resolver essa questão desde que ela entrou para o NAPNE, quatro anos atrás. Ela comentou que, por reclamação de professores e de alguns alunos, não podem simplesmente não ter um alarme, pois ele é importante para muitos se organizarem, o que é compreensível. O plano atual do NAPNE é se livrar do único alarme e distribuir pelas salas e corredores diversos alarmes menos abrasivos, de menos intensidade, mas ainda não há data para essa mudança, pois é algo que depende de uma verba que a instituição não pode disponibilizar nesse momento.

Também conversamos sobre o piso tátil, e Tânia comentou que eles priorizaram a instalação dele em áreas onde alunos cegos têm aula e também nas áreas de acesso comum. Mas, pela instituição ser muito grande, atualmente é impossível colocá-lo em todos os corredores dos três andares, também por falta de verba. Ela também cita o que ela considera ser uma falha enorme de engenharia, que no segundo piso há uma entrada com acessibilidade para a biblioteca, onde não há piso tátil. Apesar desses problemas, Tânia admira a direção geral do IFSUL pelo acolhimento que ela provém ao NAPNE e pela facilidade de comunicação que os dois núcleos têm, e entende que muitos problemas não podem ser resolvidos só na base do “querer”.

Consegui trocar algumas palavras com uma das atrizes da peça, Rafaela Oleiro, estudante de Licenciatura em Computação que hoje cursa o quinto semestre e espera se formar em um ano e meio. Rafaela foi diagnosticada com Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) em 2020, mas vive com ele desde a infância. Ela tem uma longa história dentro do IFSul de Pelotas, já que cursou parte de seu ensino médio no curso de Eletrotécnica da instituição, entretanto, ela comenta que, na época, as coisas lá eram muito diferentes. Em 2016, quando botou os pés lá pela primeira vez, não existia na escola nenhuma psicopedagoga que pudesse perceber o problema que a adolescente sequer sabia que tinha. Ela comentou também que eram raros os professores que tentavam compreender as diferenças dos alunos, e os que faziam, faziam por conta própria, já que não havia estímulo da direção para tal. Enquanto isso, a maioria dos professores não tinha noção do que fazer com alguém diferente em sala de aula. A atriz me contou que, atualmente, no início de todo semestre letivo, todos os professores de seu curso fazem uma reunião com os psicopedagogos do IFSUL para conversar sobre os alunos especiais, e que a experiência dela lá dentro hoje em dia é muito melhor do que era na época do ensino médio.

“Tenho muito orgulho do lugar onde eu estudo, dá para ver quanto ele evoluiu em pouco tempo. Tenho orgulho do curso que eu faço, porque as pessoas lá são interessadas em inserir os alunos. O professor Álvaro Freitas de Lógica de Programação, por exemplo, repensou toda a cadeira dele para que ela se adequasse a um aluno cego e ele pudesse aprender aquilo com a mesma facilidade dos outros. ” Citou ela, alegre. Também afirmou para mim que Tânia Madeira mereceu aquela homenagem, porque ela está por trás de todas essas mudanças positivas que aconteceram nesses últimos anos, e que, nas palavras de Rafaela, ela é a “manda-chuva” que está por trás de todas essas pessoas com necessidades especiais, e é ela que vai para a luta por eles.

 

“Eu senti que a peça foi especial, gostei de poder ser eu mesma e poder me expressar da maneira que eu sou. Me senti vista por meu problema ter sido mostrado lá. Me senti representada, por mim mesma, mas me senti.” – Rafaela Oleiro

 

O Brasil possui um sistema estudantil que hoje se esforça para ser aberto a todos, indiferente das necessidades especiais dos estudantes. Nosso sistema de cotas em vestibulares equilibra as chances dos cidadãos, garantindo que todos tenham oportunidades muito mais parecidas do que seriam sem esse sistema. O problema é essa facilidade da introdução ao aluno deficiente à instituição de ensino raramente vem junto de um acompanhamento especial a esse aluno durante sua jornada no mundo acadêmico. Não adianta diminuir a barreira de entrada se a barreira de permanência não for alterada, moldada de forma que esse aluno não sinta que todo dia de aula seja uma batalha impossível. Esse sistema, a longo prazo, não é eficiente, ele só mascara o problema, fazendo parecer que a educação brasileira é acessível a todos, quando na verdade, apenas 5% das pessoas com deficiência no Brasil terminaram o ensino superior.

Dados coletados pela Pesquisa Nacional de Saúde de 2021, realizada pelo IBGE, constam que temos pelo menos 17,3 milhões de pessoas com alguma deficiência no País. O sistema de cotas foi um grande passo à frente para prover oportunidades para essas pessoas, mas não é suficiente, especialmente quando nos referimos a alunos que não conseguem enxergar ou escutar, ou que possuem alguma dificuldade cognitiva ou motora. “Além da Visibilidade” crítica de forma leve e bem-humorada a falta de sentido em colocar esses estudantes nas instituições e larga-los lá dentro sem qualquer medida de acompanhamento que torne acessível para que eles, além de entrar, consigam sair de lá com um diploma na mão.

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“Ainda Estou Aqui”: às sombras de um golpe, ainda estamos aqui

Filme brasileiro conquistou as bilheterias nacionais e relembra das marcas de um passado não tão distante quanto gostaríamos     

Por Maria Eduarda Lopes      

 

Era 20 de janeiro de 1971, um feriado ensolarado no Rio de Janeiro, mas também o auge da Ditadura Militar no Brasil. Na casa de sua família no Leblon, o ex-deputado federal cassado pelo AI-1, Rubens Beyrodt Paiva, foi levado para prestar depoimentos no Quartel da 3ª Zona Aérea, após seis agentes armados com metralhadoras invadirem a sua residência. Nas próximas 24 horas, Rubens seria torturado até a morte nas localidades do DOI-Codi, enquanto seus filhos e esposa permaneciam detidos, incomunicáveis e angustiados, aguardando pela sua eterna volta. Rubens nunca mais seria visto por eles ou por mais ninguém.

Sua esposa, Maria Lucrécia Eunice Facciolla Paiva, mais conhecida como Eunice Paiva, passaria o resto da vida lutando por justiça, e se tornaria um símbolo da luta pelos direitos das vítimas da ditadura, formando-se uma ilustre advogada da causa indígena e dos direitos humanos. Essa é a história real em que o filme “Ainda Estou Aqui” se propõe a contar, baseada na obra literária homônima de mesmo título, escrita pelo caçula da família, Marcelo Rubens Paiva.

 

     A partir da obra do filho Marcelo Rubens Paiva o  filme reconstitui o drama vivido pela família de Eunice e Rubens Paiva         Foto: Reprodução/Memorial da Democracia

 

Lançado em 7 de novembro, data que também marca o aniversário de Eunice, o novo longa-metragem do cineasta Walter Salles tem levado milhares de brasileiros para as salas de cinema. Bateu o recorde de maior bilheteria nacional pós-pandemia durante suas quatro semanas de exibição, com mais de dois milhões de espectadores. Contando com um elenco consagrado e uma direção cinematográfica de renome, “Ainda Estou Aqui” nos retrata de maneira sensível uma trama infelizmente muito próxima da nossa realidade.

Walter Salles não é novato no que se propõe a fazer. Um dos cineastas mais bem sucedidos do mundo, com títulos como “Terra Estrangeira” e “Central do Brasil”, ele se reencontra com Fernanda Torres e Fernanda Montenegro para emplacar mais uma obra digna de premiações, sendo cotada pela crítica como representante brasileira no Oscar 2025.

Em “Ainda Estou Aqui”, Fernanda Torres dá vida de forma esplêndida à personagem de Eunice Paiva, uma mulher da classe média-alta carioca, dona de casa, mãe de cinco filhos e, até então, completamente alheia aos assuntos políticos do marido. Interpretado pelo brilhante Selton Mello, Rubens Paiva, além de ser abertamente contra o regime ditatorial, também repassava cartas de pessoas perseguidas e exiladas aos seus familiares e amigos.

Até o fatídico dia em que Eunice vê as garras afiadas e impiedosas da ditadura perfurar dores perpétuas em si e em seus filhos. Após os agentes levarem seu marido, não demora muito para ela também ser levada, juntamente com sua filha Eliana (interpretada por Luiza Kosovski), de 15 anos na época, para serem interrogadas nas dependências do DOI-Codi. Eliana é solta um dia depois. Eunice permanece presa por 12 dias.

Com o marido desaparecido, sob uma farsa arquitetada pelos militares de que ele havia conseguido escapar e fugir do país, Eunice se encontra na posição de provedora e assume o protagonismo, começando a tomar atitudes. Há o choque de que nem sua classe socioeconômica a protege do regime, o choque por ter que passar a criar sozinha seus filhos. Enfrenta dificuldades econômicas, ao mesmo tempo em que é obrigada a encarar o peso imensurável de um luto estranho à consciência humana, o luto incerto do desaparecimento.

 

Fernanda Torres interpreta protagonista que lida com desaparecimento do marido em meio à ditadura militar Foto: Divulgação

 

O filme começa exigindo um pouco de paciência do espectador, pois nos insere na rotina da família antes do acontecido, nas brincadeiras das crianças, nos dias passados na praia, nas festas em que recebiam amigos em sua casa, nos diálogos banais do dia a dia. Coexistem o cotidiano inocente e o prenúncio da dor, uma imagem e semelhança da fragilidade humana. Todos esses contrastes constroem uma atmosfera densa e angustiante até o momento em que essa utopia é destruída.

Angústia seria a palavra ideal para descrever o sentimento despertado pela obra, que graças à composição de diversos aspectos técnicos, consegue transmitir uma sensação de aflição e agonia em todas as cenas. Talvez tenha sido exatamente isso que Eunice Paiva tenha sentido durante toda sua vida. Mesmo 25 anos depois, após receber o atestado de óbito do marido, quando ela finalmente pode reconhecer e viver o seu luto, o buraco deixado nunca seria preenchido. “O não reconhecimento da morte de Rubens foi a forma de tortura mais violenta a que eles poderiam submeter nossa família”, disse Eunice.

Somos colocados como participantes, muito além de espectadores. A direção de arte, desde os figurinos até os cenários, e principalmente a direção de fotografia sabem como nos integrar com aquela realidade. São usados planos abertos, por vezes filmados com uma Super 8, dando um tom intimista para os momentos em família, com tons alegres e vibrantes, que vão perdendo o brilho após a prisão de Rubens, transicionando para o uso de planos mais fechados, com tons mais escuros.

É como se pudéssemos sentir tudo o que Eunice sentia, e isso se deve à atuação fascinante de Fernanda Torres, que é capaz de dar uma dimensão emocional à sua personagem através da pura essência de suas dores, cravando uma introspecção profunda na narrativa. Não apenas ela, como todo o elenco, obtém sucesso em expressar as diferentes camadas psicológicas de seus personagens. Selton Mello dá um toque muito pessoal a Rubens Paiva, representando um pai brincalhão, divertido e afetuoso. Essas cenas, contudo, são um presságio do luto que viria a seguir.

Outro aspecto da obra é que ela decide não seguir um caminho melodramático. Opta-se por um retrato histórico utilizando uma linguagem muito poderosa, a do silêncio. Em “Ainda Estou Aqui”, os silêncios carregam significados. A atriz Fernanda Montenegro interpreta Eunice em seus anos finais de vida, acometida pela doença do Alzheimer. Sem dizer uma única palavra, ela vem deixando salas inteiras dos cinemas completamente silenciosas.

 

       Momentos com forte emoção  ficam  a cargo de Fernanda Montenegro também no papel de Eunice Paiva Foto: Divulgação

 

Em contrapartida, a trilha sonora é muito significativa. A música é usada como um instrumento de protesto, e serve para comunicar as questões emocionais dos personagens, chegando a se integrar junto ao roteiro. A trilha faz um recorte da época retratada, os anos 70 no Brasil, e conta com nomes ilustres da MPB e Tropicália, como Caetano Veloso, Juca Chaves, Mutantes, Gal Costa e Roberto Carlos. No lugar de canção emblemática do longa, está  “É Preciso Dar Um Jeito, Meu Amigo”, composta por Erasmo Carlos, um clássico da sua parceria com Roberto:

Eu cheguei de muito longe

E a viagem foi tão longa

E na minha caminhada

Obstáculos na estrada, mas enfim aqui estou

Mas estou envergonhado

Com as coisas que eu vi

Mas não vou ficar calado

No conforto acomodado como tantos por aí

É preciso dar um jeito, meu amigo

 

Esses detalhes sutis, como o diálogo entre a trilha sonora e o roteiro, enriquecem a narrativa. Outros detalhes se destacam, como as notícias que eram transmitidas pelo rádio ou pela televisão sempre serem cortadas ou interrompidas, representando a falta de informações sobre o paradeiro de Rubens, como uma resposta que nunca chegava. Ou as manchas de sangue no chão da sala de interrogatório em que Eunice é levada no DOI-Codi, os gritos desesperados dos torturados que podiam ser escutados da cela, ou as aparições de prisioneiros nos planos de fundo quando Eunice estava encapuzada.

E, apesar da trama não ter escolha senão esbarrar numa temática tão grotesca e bruta, que é a tortura estendida em seus diversos aspectos físicos e psicológicos, o filme não precisa chocar com cenas gráficas e explícitas para garantir que o público receba a mensagem.

Ficar subentendido já é suficiente, e simboliza a falácia de que “a tortura na ditadura nunca existiu”. Ela sempre esteve presente, mesmo debaixo dos panos, por trás das farsas arquitetadas pelos militares ou por trás da mídia que a encobria. Ela só estava longe da realidade da maioria da população. A tortura era uma realidade muito mais próxima para aqueles que, por motivos descabidos e absurdos, eram considerados uma “ameaça” para o País. Crianças e adolescentes, estudantes ou não, mulheres, gestantes ou não, mães e pais de família como Rubens Paiva. A ditadura e seus algozes não distinguiam vítimas, e não havia nenhuma garantia de que não seríamos os próximos a ser alguém que “um dia simplesmente sumiu, e nunca mais foi visto”.

 

Selton Mello deu um toque muito pessoal a Rubens Paiva, representando um pai brincalhão e afetuoso Foto: Divulgação

 

“Ainda Estou Aqui” vai além do retrato documental de Eunice Paiva. O longa nos mostra as intimidades de sua dor, e consequentemente, as cicatrizes abertas de uma nação inteira. Ela nos obriga a confrontar um dos períodos mais sombrios do nosso país, relembrar tempos que não estão tão distantes de hoje, como se o Brasil tivesse dificuldades em preservar e revisitar sua memória nacional. A arte não existe para ser confortável. Ela deve nos fazer refletir e levantar questionamentos.

No filme, a todo momento paira no ar uma sensação de estranhamento, uma impressão de que os personagens estão sendo observados, um receio de que um “bicho-papão” salte da tela. Esse bicho-papão no mundo real podem ser ideias, discursos e posicionamentos, que são legitimados por nós ao darmos espaço para que esse monstro cresça se alimentando da nossa alienação.

O cenário político atual do Brasil é um caso à parte, mas nunca estamos tão longe do golpe quanto gostaríamos. Ao nos depararmos com grandes esquemas articulados por militares de alta patente e políticos de extrema direita, orquestrando assassinatos de presidentes e tomadas de poder através de documentos detalhados com planos de ação, “Ainda Estou Aqui” se faz muito necessário. Ainda estamos aqui, combatendo esse mesmo mal.

E ao contrário de alguns críticos afirmarem que o sucesso da obra é um ufanismo exagerado ou apenas badalação da mídia, ou que o viés ideológico e as críticas políticas são o seu maior alicerce, é positivo que a mídia esteja exaltando a produção. É positivo que estejam falando sobre a ditadura, sobre o golpe que ocorreu no nosso país e sobre as suas vítimas. Como um longa-metragem que retrata a história de pessoas tão afetadas por um regime ditatorial não teria a crítica política como maior alicerce? Existe alguma crítica diferente da negativa à Ditadura Militar Brasileira? Desconsiderando aqueles que de alguma forma foram beneficiados por ela, ou aqueles que estavam dentro das salas do DOI-Codi com o dedo no gatilho.

Mesmo que o filme saia de cartaz muito em breve, as reflexões levantadas por ele devem ser perpetuadas. A frase “um povo que não relembra sua história está fadado a repeti-la” pode ser clichê, mas continua se provando verdadeira.

A construção da memória de Eunice Paiva deve ir além da viúva da ditadura. As citações à sua pessoa estão sempre atreladas ao seu marido. Eunice se colocou além da tragédia pessoal e lutou pela verdade, pela dignidade humana e pelos direitos civis. Advogou contra a violência e expropriação indevida de terras indígenas. Ela arriscou a sua vida, mesmo correndo risco sob o regime, pois não enxergava uma alternativa a não ser questionar e contestar as leis vigentes que ainda amparam torturadores e seus crimes.

Em entrevista para o Cine Ninja, Fernanda Torres destaca: “Na dramaturgia, há diferença entre um melodrama e uma tragédia. O que eles vivem é uma tragédia. Na tragédia, não dá pra ficar num canto, chateado, triste, choroso. A tragédia obriga você ou a se matar, ou a seguir. E ela não tinha nem como ter autopiedade, do melodrama, e nem como sumir, porque ela tinha cinco filhos. Precisávamos ser fiéis a ela”.

Mesmo acometida pelo Alzheimer, Eunice não permitia ser diminuída por conta da doença, segundo relata seu filho: “Jamais sentiria pena de si mesma. Nem queria que sentíssemos pena dela. Jamais pediu ajuda.  Recentemente, uma nova fala cheia de significados entrou no seu repertório, especialmente quando um turbilhão de emoções a ataca, como rever uma filha que mora na Europa ou segurar no colo o meu filho, o que mostra uma felicidade e um alerta, caso alguém não tenha reparado: Eu ainda estou aqui. Ainda estou aqui” (de Ainda Estou Aqui, livro de Marcelo Rubens Paiva que inspirou o filme).

 

Eunice se colocou além da tragédia pessoal e lutou pela verdade, pela dignidade humana e pelos direitos civis    Foto: Arquivo Pessoal

 

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“II Recital de Piano para Amigas e Amigos” com Virgínia Mello Alves

Além do seu compositor preferido Ludovico Einaudi, repertório da apresentação nesta sexta, dia 6 de dezembro, traz composições clássicas, músicas populares e trilhas sonoras       

Por Paulo Pereira da Silva     

  

Virgínia Alves concilia suas atividades acadêmicas de Física e Astronomia com a arte musical

 

Do retorno à prática de pianista durante o longo período de isolamento, na pandemia, despertou a musicalidade adormecida desde a infância e adolescência da professora de Física Virgínia Mello Alves, interrompida pela atividade profissional e maternidade. Assim, do Departamento de Física e Matemática da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), ela compartilhou seus momentos em vídeos e lives constantemente com amigos da universidade, familiares e colegas que a vida lhe presenteou. A arte musical integrou-se às atividades extra-curriculares da docente, que preza pela interação entre diversas formas de conhecimento.

Com o fim da pandemia, Virgínia passou a realizar recitais. E, nesta sexta-feira, dia 6 de dezembro, a pianista apresenta o “II Recital de Piano para Amigas e Amigos”, às 19h30, no auditório do Conservatório de Música da UFPel na (Rua Félix Xavier da Cunha, 651, no Centro de Pelotas). O recital é um momento de troca, afeto e momentos de sensibilização, de uma artista da música amadora que toca, sabe tocar e ama o que toca.  O evento é aberto, livre para todo o público, com entrada franca.

 

 

Na apresentação deste ano, o repertório refaz as composições clássicas já consagradas pelo público, “Le Lac de Come” de C. Galos, “Sonata ao Luar” de Beethoven, “Ierè Gymnopedie” de Erik Satie e “2me Nocturne” de Frédéric Chopin. Traz também as reconhecidas músicas populares “A Thousand Years”, de Valerie Nater, “Sing of Guy”, de Elton John, “Bohemian Rapsody”, de Fred Mercury, e a trilha sonora “Somewhere in Time”, de John Barry.

Virgínia reserva um bloco para execução de uma seleção de músicas do seu autor preferido, o compositor Ludovico Einaudi, com as obras: “Berlin Dong”, “Dietro Casa”, “Primavera Nightbook”,  “High Heels”, “Love is a Mystery”, “Nuvole Bianche”, e “I Giorni”. É um brinde à diversidade com títulos clássicos e populares.

 

Este será  o segundo recital de Virgínia no Conservatório de Música da UFPel após a pandemia


 

Dos momentos de troca nas apresentações musicais online com o reconhecimento e estímulo dos ouvintes, Virgínia resgatou sua habilidade instrumental, aprimorou-se e evoluiu para sua primeira apresentação solo presencial, realizada em 30 de novembro de 2023 no Conservatório de Música da UFPel, com apoio da Reitoria da UFPel, do Centro de Artes e também do Theatro Sete de Abril.

É professora e pesquisadora, estando às vésperas de apresentar seu memorial acadêmico para se tornar titular. Começou pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), como professora temporária. Em seguida, foi efetiva no Instituto Federal do Rio Grande do Sul (IFSul), até ingressar na UFPel em 1995. Foi pioneira nas palestras para divulgação científica do Instituto de Física e Matemática (IFM) da UFPel.

Praticou piano quando criança no Instituto Musical Americano de Porto Alegre, com a professora Erica Rosado Gobbato. Também estudou teoria musical na Escolinha da OSPA na juventude e no Coral da UFRGS até ingressar na universidade. Depois de longo período afastada da música, voltou a praticar regularmente quando o piano teve o seu espaço em uma casa maior.

Durante sua carreira na instituição, contribuiu na formação de professores de graduação, na extensão e pesquisa acadêmica, e recentemente na pós-graduação, com o mestrado profissional, voltado a professores no ensino de Física, na Universidade Federal do Rio Grande (FURG). Paralelo à docência, esteve ativa na administração como coordenadora de curso, com o desafio de formatar as diretrizes curriculares e homologar no MEC o reconhecimento do curso de Física.

Através do seu trabalho na parte de ciências, entre as coordenadorias e a Pró-Reitoria de Graduação, fez o treinamento em toda a região de Pelotas para a implantação da reformulação dos novos parâmetros nacionais da educação básica. Foi convidada para o cargo de diretora de ensino da Pró- Reitoria de Graduação em 2005, atuando no programa de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni), quando o número de 6 mil estudantes saltou para mais de 20 mil na UFPel.

Entre as suas atividades de extensão e ensino de Física, destaca-se a divulgação da Astronomia e o projeto do planetário físico. Os equipamentos foram adquiridos em 2009 e aguarda-se a construção do prédio para a sua instalação. Sendo a única professora com habilitação no ensino de Física e única astrônoma, tem-se voltado a trabalhos interdisciplinares com a Museologia, artes e demais áreas da ciência.

Em 2016, através do Fórum de Práticas Interdisciplinares da Faculdade de Física, participou do recital “Timbrar Bach Sonatas & Partitas”, de flauta e piano, com Raul Costa e Lucia Cervini, unindo-se à participação especial de Paulo Krebs com as projeções astronômicas das galáxias e do sistema solar. Essa iniciativa ressalta a relevância das interconexões entre as áreas de Música e Astronomia.

 

O projeto “Timbrar Bach Sonatas & Partitas” buscou as internexões entre a arte da Música e a ciência da Astronomia

 

Virgínia propõe um espaço dentro da Universidade para que a comunidade acadêmica possa mostrar outros conhecimentos e habilidades não vinculados formalmente, com relação às artes, esportes, política e linguagens, entre outros, como política consistente de trocar experiências. Neste “II Recital de Piano para Amigas e Amigos” tem o apoio do Conservatório de Música com a disponibilidade do espaço.

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Exposição reflete sobre os tempos passados em Pelotas

Última exposição do ano do 4 Galeria de Arte e Café convida a população a explorar a identidade da cidade por meio de fatos históricos e lendas       

Por Bruna Farias        

Trazendo uma imersão histórica, a mostra “Memórias Reveladas: Lendas e Verdades Pelotenses”, do 4 Galeria de Arte e Café, mistura fotografias, vídeos e áudios que contam sobre a história e as lendas de Pelotas. Organizada pelo fotógrafo Wiliam Clavero, o pesquisador e historiador Nikolas Corrêa e a professora de história Suéllen Cortes, conhecida como “Profe Suka”, a exposição tem curadoria de Mariana Rachinhas e fica em exibição gratuita até final do ano no 4 Galeria de Arte e Café, localizado na rua Santos Dumont, nº 125.

Visando gerar mais conhecimento e visibilidade para o passado da cidade, a ideia da exposição surgiu quando a curadora da mostra e dona do 4 Galeria, Mariana Rachinhas, percebeu que os túneis subterrâneos do local sempre geram curiosidade nas pessoas: “A galeria está localizada em um lugar histórico da cidade e sempre tiveram muitos mitos e lendas ao redor dela, então, eu sempre quis trazer uma exposição que tivesse um contexto teórico sobre a história e os mitos de Pelotas”. A partir dessa percepção, Mariana convida Nikolas, William e Suka, com quem já havia trabalhado anteriormente, e nutrem o mesmo interesse de realçar as singularidades de Pelotas.

 

Os idealizadores da exposição: Mariana Rachinhas; Wiliam Clavero; Nikolas Corrêa e Suéllen Cortes   Fotos: Bruna Farias

 

A exibição conta com mais de 100 fotografias em preto e branco e em tons de sépia, remetendo a outros tempos, e mostram os detalhes dos prédios históricos da cidade que passam muitas vezes despercebidos na correria do dia a dia. Para o fotógrafo das obras, Wiliam Clavero, é importante que a sociedade preste mais atenção à arquitetura e cultura encontrada nos prédios. “É importante que a sociedade na totalidade tenha um interesse para saber por que um prédio está fechado, por que o outro não está; por que esse foi restaurado, por que o outro não foi. E é se importando com essas questões, fazendo que isso acabe sendo fomentado, que a gente consegue uma Pelotas com mais prédios arquitetônicos abertos e em funcionamento para a sociedade pelotense”, relata Clavero.

 

Algumas das fotografias de Clavero que fazem parte da exposição mostram os detalhes arquitetônicos da cidade

 

Paralelo às fotografias, áudios com a narração e falas de Nikolas Corrêa podem ser ouvidos na parte secundária da exposição, que aborda lendas e mitos da cidade. “Eu venho de uma família de muitos contadores de história. E é muito bonito quando a gente consegue preservar as narrativas de forma oral, passando adiante e valorizando isso”, conta Nikolas, que há mais de 10 anos pesquisa sobre a história de Pelotas e, desde 2019, compartilha curiosidades e histórias no Instagram com o Pelotas Antiga.

No ano passado, inspirado pelo Porto Alegre Mal Assombrada, Corrêa deu início ao tour Pelotas Mal Assombrada, no qual os participantes percorrem as ruas da cidade, enquanto Nikolas explora lendas e fatos históricos que aconteceram em Pelotas.

Esta ideia visa trazer reflexões, o que também é o objetivo da exibição “Memórias Reveladas: Lendas e Verdades Pelotenses”. “Quem somos nós como seres humanos enquanto estamos em Pelotas? Eu acho que a nossa vivência gera essas perguntas, porque, ao mesmo tempo que a gente constrói a cidade, ela nos constrói”, afirma Nikolas.

Além disso, a produção audiovisual de Suéllen, a “Profe Suka”, ajuda a resgatar o contexto e histórias da cidade que se entrelaçam com as fotos de William. A profe Suka começou a fazer vídeos informativos para as redes sociais ao ver que muitas pessoas não conheciam a história e a cultura pelotense. “Eu sou professora de história e eu vi que tinha uma demanda dos meus alunos que não viviam e não conheciam a sua própria cidade. E foi por isso que comecei a fazer os vídeos, porque se tu não conheces a cidade, tu desconheces a tua própria história e, então, tu não cuidas, tu não preservas, tu não te relacionas com aquilo, né?”, declara a professora.

 

Vídeos da Profe Suka integram exposição e também podem ser acessados por  QR Codes que estão junto às obras expostas

 

Outras atividades relacionadas à exposição, como rodas de conversa e oficinas, também estão programadas para acontecer ao longo do período de exibição. “A gente vai fazer várias atividades relacionadas para movimentar a questão histórica e cultural da cidade. É importante dar visibilidade ao que a gente tem de melhor, que é a nossa história, a nossa cultura, a nossa arte”, ressalta Mariana.

A visitação à exibição “Memórias Reveladas: Lendas e Verdades Pelotenses” é gratuita e tem horários de abertura aos sábados e domingos, das 14h às 21h, e de quarta a sexta-feira, das 9h às 20h, no 4 Galeria de Arte e Café. Mais informações sobre a exposição podem ser encontradas nas redes sociais do 4 Galeria @4galeria.co.

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Átila Bee e Carol Duarte conversam com plateia sobre filme “Malu”

Na Cinemateca Capitólio, atores refletem sobre o processo de criação de seus personagens e semelhanças com a produção nacional “Ainda Estou Aqui”       

Por Murilo Schurt Alves         

 

Atores Carol Duarte e Átila Bee agradecem presença do público na Cinemateca Capitólio antes da sessão começar Fotos: Murilo Schurt Alves

 

No dia 25 de novembro, a Cinemateca Capitólio, em Porto Alegre, recebeu os atores Átila Bee e Carol Duarte para a sessão comentada de “Malu”, longa-metragem dirigido e escrito por Pedro Freire. Após uma bem-sucedida trajetória em festivais nacionais e internacionais, incluindo o Festival de Sundance, e a conquista do prêmio máximo no Festival do Rio, o filme estreia nos cinemas e convida o espectador a refletir sobre conflitos intergeracionais, traumas familiares e os desafios do trabalho artístico-cultural no país.

Em seus aproximados 100 minutos de duração, acompanhamos a história de Malu (Yara Novaes) na década de 1990, uma atriz desempregada que, vivendo no ostracismo, precisa conviver com Lili (Juliana Carneiro da Cunha), sua mãe conservadora, numa comunidade da zona oeste do Rio de Janeiro. Esse estado de descontentamento é potencializado com o retorno de sua filha, Joana (Carol Duarte), também atriz, após uma temporada nos palcos parisienses, trazendo questões existenciais e novos embates para a vida da protagonista. Embora de cunho ficcional, o filme é uma homenagem do diretor à sua mãe, Malu Rocha, atriz paulista com uma extensa carreira no teatro e na TV que faleceu em 2013, por complicações de uma doença neurodegenerativa.

 

Sessão comentada contou com participação dos atores Átila Bee e Carol Duarte e mediação do jornalista Roger Lerina

 

Após a exibição do filme, o jornalista Roger Lerina conduziu a discussão com o público, ressaltando a influência de John Cassavetes e Ingmar Bergman na abordagem dramatúrgica do diretor Pedro Freire. Sob esse viés, a atriz Carol Duarte menciona o uso de uma técnica de Stanislavski para a preparação do elenco, que consiste em ler as cenas e improvisar a partir das ações para, somente depois, decorar o texto. Para ela, esse método foi imprescindível para o entrosamento dos atores e, por consequência, para o andamento das filmagens: “O Pedro tinha pouco tempo. Sem romantizar filmes de baixo orçamento, a gente não precisa fazer tanto ‘na guerra’, mas foi um filme que foi feito em três semanas. Se a gente não tivesse afinado, três semanas seria quase impossível”. O ator Átila Bee complementa a reflexão: “Experimentar aquilo que se entendeu para depois decorar o texto e ir para o set é a perfeição do processo”.

No que diz respeito aos personagens, Duarte destaca que a construção de sua personagem é a junção dos filhos de Malu da vida real: “O Pedro constrói o roteiro muito a partir das memórias dele e da irmã, selecionando o que ali era potente para o cinema e o que não era. […] A Joana é mais quieta, ela pouco fala. Talvez seja esse o desafio desse trabalho para mim”. Além disso, a atriz cita “Sonata de Outono” como uma das referências utilizadas para a construção de sua personagem, filme dirigido por Bergman que retrata um acerto de contas entre uma mãe negligente e sua filha emocionalmente fragilizada.

Nesta dinâmica entre três mulheres, o personagem Tibira serve como um contraponto na história. Interpretando o amigo da protagonista que mora nos fundos do terreno, o jovem ator reflete sobre o seu papel no decorrer da narrativa: “Eu tive muito medo no início, eu fiquei muito inseguro de ser essa figura que vai ocupar uma cota preta no filme. Nesse caminho, fui entendendo a importância daquele personagem. Eu acho que todos nós temos um amigo, uma pessoa importante na vida que a gente precisa para seguir de pé, juntos”.

Outro aspecto discutido no debate foi a experiência dos entrevistados com Yara de Novaes e Juliana Carneiro da Cunha, duas veteranas da indústria cinematográfica: “Eu sinto pelo cinema brasileiro de ter descoberto Yara a essa altura, acho que ela brilha muito em Malu. Ao mesmo tempo, eu me lembro quando eu era adolescente e assistia Juliana Carneiro. Quando o Pedro falou que seriam elas, eu fiquei bem chocada, muito ansiosa e muito feliz”, comenta Carol.

 

Atores responderam às perguntas e curiosidades do jornalista Roger Lerina e do público presente

 

Como último ponto de discussão, o mediador aponta semelhanças de “Malu” com “Ainda Estou Aqui”, filme dirigido por Walter Salles também lançado recentemente. Carol aponta as coincidências das obras, principalmente por retratar o período da ditadura militar: “São duas atrizes incríveis, personagens muito bons, contadas por filhos de alguma maneira, porque o livro [de “Ainda Estou Aqui”] parte da perspectiva do Marcelo Rubens Paiva, ele conta a história da mãe também. É interessante analisar essas duas mulheres contando um passado terrível que é o nosso”.

Ao final do evento, Duarte e Bee agradeceram ao público pela presença e reforçaram a importância da divulgação boca a boca para atrair mais espectadores ao filme, destacando que as primeiras semanas de exibição são cruciais para sua continuidade no circuito nacional de cinema. Nesse contexto, Malu segue em cartaz na Cinemateca Capitólio (Rua Demétrio Ribeiro, 1085, Centro Histórico, Porto Alegre), com sessões diárias às 17h, até o próximo sábado (7 de dezembro).

Ficha Técnica:

Direção: Pedro Freire

Roteiro: Pedro Freire

Fotografia: Mauro Pinheiro Jr.

Montagem: Marília Moraes

Som: Marcel Costa

Desenho de som: Daniel Turini

Direção de arte: Elsa Romero

Elenco: Yara de Novaes, Juliana Carneiro da Cunha, Carol Duarte, Átila Bee

Produção: Tatiana Leite, Léo Ribeiro, Sabrina Garcia, Roberto Berliner

 

A Cinemateca Capitólio está localizada na Rua Demétrio Ribeiro, 1085, no Centro Histórico de Porto Alegre 

 

Veja o thriller do filme:

 

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Dança do Grupo Mariana Espilman reflete sobre a dualidade dos sentimentos neste domingo

Espetáculo  “Dual: Entre a Luz e a Sombra – Descubra a Essência de Ser” promete encantar público no Theatro Guarany    

 Por Renata Ávila    

O espetáculo de dança “Dual: Entre a Luz e a Sombra – Descubra a Essência de Ser”, do Grupo Mariana Espilman, busca refletir sobre a jornada da construção dos sentimentos e emoções humanas por meio da dança. A apresentação acontece no Theatro Guarany, no dia 8 de dezembro, domingo, às 20h30.

 

 

Dividido em dois atos e com o total de 23 coreografias, o tema do espetáculo deste ano vem de um desejo antigo da fundadora e demais professoras da companhia. “A gente tem visto que é preciso falar de emoções e educação socioemocional, havia um forte indício de que o espetáculo deste ano falaria sobre isso. Quando saiu o filme Divertidamente 2 nos cinemas, dando mais ênfase para se falar sobre o assunto, tivemos certeza que o Dual viria a tratar sobre isso”, explica Mariana Espilman, fundadora do Grupo que leva o seu nome.

No ensaio geral, era nítido o entusiasmo das jovens bailarinas para o grande dia da apresentação. Em rotina de ensaios intensos desde o final de agosto, a dançarina Lara Hernandorena Spiering, 11, não esconde o misto de sentimentos de estar no palco novamente. “É muita emoção, o coração acelera muito. É nervosismo, medo de errar e depois a alegria de acertar”. Já para a bailarina Valentina Machado Nascimento, 11, as coreografias são o grande diferencial do espetáculo deste ano. “A coreografia que eu mais gosto se chama Medo. Ela é muito bonita de assistir, com vários movimentos sincronizados, e tem tudo a ver com o tema do espetáculo”, relata.

 

Por meio dos movimentos é feita uma reflexão sobre a construção dos sentimentos e emoções humanas Foto: Renata Ávila

 

Indo além de uma simples atividade extracurricular, a dança é uma grande aliada no desenvolvimento pessoal das dançarinas. Para Glendia Martin, mãe da adolescente Bianca, de 14 anos, é nítida a importância do Grupo Mariana Espilman na vida da sua filha. “Participar do Grupo moldou o jeito dela de ser, ajuda na questão da disciplina e autocontrole, é uma atividade bem interessante e ela gosta muito”.

Joseane Rusch da Silva, mãe de duas bailarinas – Júlia, quatro anos, e Luiza, 12 anos – fica encantada ao ver suas filhas se apresentando com o Grupo. “Não tem palavras para descrever, é emocionante. Elas gostam e se divertem, lógico que a mais velha já se preocupa na função de acertar e fazer bonito, mas ver a pequena dançando com alegria é muito bom”, enfatiza Joseane.

 

Professora e fundadora do Grupo, Mariana Espilman, conversa com as alunas após o fim do ensaio geral Foto: Renata Ávila

 

“A mensagem que o Dual quer passar para as pessoas é de que nós podemos e devemos sentir todos os tipos de emoções. Nem sempre a gente precisa estar bem, ou nem sempre a gente precisa estar ruim, é essa dualidade que nos torna única e essencialmente humanos”, enfatiza a fundadora da companhia que convida toda a comunidade a prestigiar a apresentação. Os ingressos para o espetáculo podem ser adquiridos pela plataforma PagTickets por R$40.

 

Conheça o Grupo Mariana Espilman

Fundado em 2016, a companhia surgiu da necessidade da professora de dança Mariana Espilman de ter seu próprio espaço e ensinar dança com afeto. “Geralmente nesse meio de desempenho esportivo, a gente sabe que há muita cobrança. Eu arrisco dizer que no Mariana Espilman a gente ousa, porque ensinamos dança com amor e afeto”, conta.

O Grupo Mariana Espilman possui turmas de Baby Class, Jazz e Kpop e está localizado na Avenida Fernando Osório, n.º 4510. É possível obter mais informações sobre o trabalho da companhia pelo Instagram @grupomarianaespilman.

Evento: Espetáculo de Dança “Dual: Entre a Luz e a Sombra – Descubra a Essência de Ser”

Dia: 8 de dezembro de 2024

Horário: 20h30

Local: Theatro Guarany, rua Lobo da Costa, nº 849

Ingressos: R$40

Onde comprar: Plataforma Online PagTickets.

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A Cena Drag em Pelotas: muito além da Parada da Diversidade

A 23ª Edição do Dia do Orgulho LGBTQIAPN+ ocorreu no dia 24 de novembro na cidade        

Por Larissa Rodrigues   

  

Gloria Crystal foi a convidada especial porto-alegrense que prestigiou o evento em Pelotas

 

No brilho das luzes e no som vibrante das ruas, a 23ª edição da Parada da Diversidade de Pelotas, realizada no dia  24 de novembro, reuniu milhares de pessoas para celebrar e reivindicar direitos. O evento é mais do que um desfile; é um palco para as vozes que, muitas vezes, permanecem silenciadas, reforçando a importância da luta LGBTQIAPN+ para a sociedade e para aqueles que ainda não compreendem o tamanho da sua magnitude.

Com uma programação diversificada, a Parada contou com apresentações artísticas que incluíram shows, DJs locais e performances marcantes. Entre os destaques, estiveram as performances de Glória Crystal e das drag queens Anahí, Camilla Duarte, Lolla Hills, Lorena Drag, Maddivah, Miss Yan Future, Myah, Sá Biá e Sawanah, que transformaram o espaço em uma celebração vibrante de arte e resistência.

 A história das drag queens é rica e remonta a séculos, sendo marcada por contextos culturais, artísticos e políticos em diferentes partes do mundo. Desde que o mundo é visto como mundo, pessoas que performam a diversidade sexual seguem lutando e quebrando os paradigmas.

Desde a Grécia Antiga, quando o teatro surgiu, até o tradicional Kabuki japonês, os papeis femininos sempre foram interpretados por homens, tendo em vista que as mulheres eram proibidas de subir e se apresentar nos palcos de teatros. Hoje, depois de anos, com a arte drag reinventada e cheia de novas possibilidades e oportunidades, isso mudou. As performances femininas transcendem barreiras culturais e se afirmam como uma expressão de identidade, liberdade e resistência.      

Para muitos, a arte drag é vista com desconfiança, descriminalização ou, muitas vezes, reduzida a uma performance sem profundidade, ignorando a rica história cultural que estes artistas carregam há anos e as barreiras que precisam enfrentar dia após dia. Desde o início de sua vida, com a rejeição familiar, até a discriminação nos espaços públicos, ser uma drag em um país marcado por altos índices de violência contra a população LGBTQIAPN+ é um ato de coragem, de ser diferente e ser quem quiser ser.     

A presença de drag queens e travestis em eventos como a Parada é um lembrete de que o preconceito ainda pode ser combatido por meio da arte. Cada salto, maquiagem elaborada, cabelo e roupa carregam um significado que transcende o palco: a expressão de uma identidade que se recusa a ser silenciada.         

Embora os desafios sejam muitos e contínuos, a arte drag tem inspirado mudanças positivas. Sua popularização em plataformas digitais e programas de televisão contribui para desconstruir estereótipos, educar o público e trazer mais representatividade para uma parcela da sociedade que historicamente foi marginalizada.

Entre as apresentações da 23ª Parada da Diversidade de Pelotas estiveram as performances de Anahí e Myah, duas drag queens que encantaram o público com suas produções elaboradas e a energia contagiante que levaram ao palco. Mais do que artistas, elas representam a luta diária de tantas pessoas LGBTQIAPN+ por aceitação, respeito, e espaço em uma sociedade que ainda carrega preconceitos.

 

Anahí inclui seu trabalho artístico na defesa pela liberdade  Foto: Juliano Xavier Tavares

 

Contribuição da arte drag na luta pelos direitos

Em entrevistas, Anahí e Myah compartilharam suas perspectivas sobre a arte drag, os desafios enfrentados e a importância de espaços como a Parada para a comunidade LGBTQIAPN+.

Como a contribuição da arte drag na luta pelos direitos LGBTQIAPN+, Anahí percebe essa expressão artística como uma base fundamental. “Quando a gente rompe com as expectativas sobre o que é ‘masculino’ ou ‘feminino’, o drag questiona construções sociais e promove a liberdade de ser”, diz.

Myah compreende que a arte drag funciona na quebra de padrões que a sociedade impõe. “Ao mesmo tempo que vivo sendo um homem cis, pratico uma arte na qual faço tudo o que me diziam que eu não deveria fazer: colocar maquiagem, usar perucas, calçar salto alto, vestir roupas femininas”, descreve. “Quando nascemos sendo homens cis, há toda essa masculinidade imposta para nós, que precisamos seguir, e isso vai oprimindo uma alma genuína que temos”, pensa.

Para esta performer, “a arte drag surge como uma expressão dos nossos sentimentos, algo que somos forçados a oprimir durante a vida inteira”. Então, quando decide-se fazer drag, abre-se mão de todas essas correntes que prendem e segue-se o que é a sua própria essência. “É uma forma de expressão artística e uma quebra desse sistema de sociedade, onde menino deve ser isso ou aquilo. A arte drag mostra que não é assim, que qualquer um pode ser o que quiser”, defende.

 

Glória Crystal contribuiu para a animar o público pelotense no dia 24 de novembro

 

O cenário drag em Pelotas

Anahí tem notado que o cenário drag em Pelotas é muito rico e diverso.  Há “top drag, drag caricata, drag com ballet”, mas ela acredita que faltam oportunidades e lugares para as drags desenvolverem e colocarem em prática as suas ideias. Para Myah, o cenário drag em Pelotas é incrível. “A gente tem vários artistas extremamente talentosos de vários nichos diferentes, cada uma com a sua especialidade”. Ela lembra que já teve o privilégio de estar junto com várias drags com ótimas performances, em diversos eventos, só que, assim como Anahí, lamenta que há pouquíssimas oportunidades.

“Eu digo isso porque eu tenho meus anos de carreira e, mesmo já tendo feito várias coisas, ainda tenho dificuldades para fechar um evento ou coisas assim aqui em Pelotas. Às vezes, é mais fácil fazer e fechar evento lá em Porto Alegre. Mas, aqui em Pelotas, é difícil, muito difícil trabalhar. O nosso público não sabe se consome artista local ou o que mais. Eu tive que tirar leite de pedra, sabe? Tive que mover montanhas”, relata Myah.

Ela achava engraçado quando ouvia pessoas falando: “Nossa, eu via seus shows e pensava, nossa, ele está tentando fazer tanta coisa”.  Mas Myah sempre fez muitas coisas. “Eu queria muito fazer isso, queria fazer shows grandes. Acabou que, por eu fazer muitas coisas, eu consegui ter meu público. É exatamente isso. Eu tive de mover montanhas para chegar nesse nível de satisfação do meu trabalho hoje”, considera.

“Só que eu consigo ver que essa não é a realidade para outras drags, porque existem poucas oportunidades para nós aqui em Pelotas. É muito difícil crescer em uma cena assim, se desenvolver. Eu consegui porque criei minhas próprias oportunidades, fiz muitos eventos próprios, embora isso seja mais desgastante, estressante. Eu sempre fiz muitas coisas, mas o sistema de arte aqui em Pelotas é difícil”, avalia.

 

Anahí inspira-se nos musicais da Broadway para criar suas coreografias         Foto: Fly Camera Pelotas

 

Criando apresentações, personificações e shows

Apaixonada por teatro musical, Anahí colhe muitas das suas referências em musicais (dos teatros da Broadway, por exemplo). Transforma a sua visão dessas produções norte-americanas tendo em conta a sua própria realidade. “Também gosto bastante de usar cantoras e atrizes negras como referência na minha montagem e nas minhas performances”. Para Anahí esta batalha é constante, cada vez mais é preciso lutar para obter seus espaços.

Myah vê as suas criações sempre como parte de algum conceito, ambientação e cenário. “Storytelling, sabe? Há uma história, alguma narrativa ali. Porque eu gosto muito de criar uma performance que tenha contexto visual; assim, a pessoa fica presa, assistindo”, explica. Para ela, é o tipo de performance que sempre gostou mais. “Eu me envolvo muito. O teatro também tem muita brincadeirinha, um senso de humor meio irônico, sabe? É bem assim. Às vezes, eu digo que é ‘camp’, sabe? Uma coisa exagerada. Sim, porque ‘drag’ é isso”.

Ao lado do exagero, ele observa que também há um lado minimalista. “Às vezes, sou eu e o bailarino apenas dançando, porque eu também adoro dançar. Então, as minhas performances são muito compostas por coreografias e danças, com bailarinos também, mas basicamente isso. Eu crio a partir de um som; tenho que ver o que quero performar. Às vezes, escuto uma música, e na mesma hora já me vem toda a ideia. Ou, então, preciso misturar algo para fechar a narrativa”.

Myah se considera muito exigente, até mesmo chato, com a criação do áudio. “Para mim, o som é muito, muito importante, porque é a primeira coisa que as pessoas vão perceber quando estamos performando. Sempre fui muito crítico em tentar deixar o meu áudio coeso, com uma narrativa. Depois dessa parte de criar o áudio, eu passo várias horas escutando em loop infinito até conseguir polir todas as ideias. Tento visualizar tudo na minha cabeça primeiro; só depois começo a desenvolver a coreografia, se tiver”.

Podem fazer parte elementos tecnológicos, tipo projeção com datashow. Quando se decide por uma coreografia, tudo é gravado no seu celular e enviado para os dançarinos que podem estar disponíveis. “Depois, começamos a ensaiar e ensaiamos bastante”, destaca.

Quando precisa fazer os figurinos, Myah passa uns dois ou três dias nesse processo. Depois, é só apresentar. “Tudo é completamente artesanal. Não tem nada que não seja feito à mão no meu trabalho. Por mais que me inspire em outros figurinos, acredito que, por ser eu quem os faço, acabo, inconscientemente, mudando algo para agradar a minha visão. Acho que isso coloca meu DNA ali”, diz.

Na coreografia, também acontece algo semelhante. Ele se inspira muito nas coreografias originais, mas sempre cria uma versão alternativa ou algo original. “Não sou um coreógrafo e bailarino formado, mas, às vezes, me aventuro a coreografar”.

“É um processo lindo, incrível. Eu amo ver as apresentações tomarem vida. É como se eu tivesse tido uma premonição e trabalhado para torná-la realidade. Quando se realiza, é incrível”, exclama.

Myah avalia que desenvolveu um grupo de bailarinos extremamente talentosos, que está com ela desde 2021. “Esse grupo só cresceu, e juntos fazemos coisas cada vez mais lindas. É incrível, sabe? Trabalhar com eles torna o processo muito melhor e mais divertido. Definitivamente, muito mais divertido”, elogia.

As drag queens, com sua arte vibrante e performances carregadas de significado, são muito mais do que protagonistas nos palcos: elas são símbolos de resistência e expressão. Na 23ª Parada da Diversidade em Pelotas, sua presença reforçou a importância de lutar por um mundo onde todos possam ser quem realmente são. Entre maquiagem, figurinos e aplausos, elas trazem à tona histórias de coragem e resiliência que continuam a inspirar não apenas a comunidade LGBTQIAPN+, mas toda a sociedade. Em um cenário onde a arte se encontra com a luta por direitos, as drags nos mostram que transformar é, acima de tudo, um ato de amor e resistência.

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Segunda edição da Vivência do Sopapo: Memórias da Ancestralidade começa sábado em Pelotas

Estão abertas inscrições para evento que homenageia legado cultural afro-gaúcho e ocorre também em Caçapava do Sul e Porto Alegre

 

O sopapo é um instrumento musical que conecta à ancestralidade africana               Fotos: Luis Fabiano

 

Às vésperas do feriado da Consciência Negra, dia 20 de novembro, começa a segunda edição da Vivência do Sopapo – Memórias da Ancestralidade promove uma jornada cultural que explora e valoriza a importância do tambor de Sopapo na construção da identidade afro-gaúcha. O evento acontece nos dias 16 de novembro em Pelotas, 23, em Caçapava do Sul, e 30 de novembro, em Porto Alegre. São três cidades com fortes laços com a ancestralidade gaúcha e com a tradição do Sopapo. Cada localidade sediará atividades culturais que reforçam o valor do sopapo para a comunidade afro-sul-riograndense, com performances artísticas, convidados especiais, palestras e rodas de conversa.

Financiado pelo Ministério da Cultura e Governo do Rio Grande do Sul, através da Lei Paulo Gustavo, com apoio da Sedac/RS, Casa de Cultura Mário Quintana e Lunar do Sopapo (POA), Clube Harmonia (Caçapava do Sul), ONG Cuidando de Nós e Núcleo de Teatro UFPEL (Pelotas), o projeto apresenta uma diversidade de apresentações artísticas, como teatro, música e poesia, focadas nas vivências de cada um com o Sopapo como símbolo de resistência e conexão com a ancestralidade.

 

 

Abertas ao público e gratuitas, as inscrições são feitas antecipadamente on-line

 

Como participar

As atividades são gratuitas e abertas ao público, mas é necessário realizar uma inscrição prévia. O formulário de inscrição está disponível online e também pode ser acessado pelo Instagram. É importante que os interessados se inscrevam na cidade em que desejam participar. Aos que desejarem colaborar, o evento estará arrecadando uma doação voluntária de um quilo de alimento não perecível. As contribuições serão destinadas aos asilos municipais das cidades participantes, com o objetivo de apoiar as instituições que acolhem idosos.

O legado do Sopapo

Originário das charqueadas Pelotenses no século XIX, o sopapo nunca foi apenas um instrumento musical, mas um elo que conectava os escravizados à sua ancestralidade, religiosidade e sua pátria mãe, a África, aliviando, por meio de suas batidas, o horror da escravidão.

Durante o século XX, o sopapo sofreu um processo de “carioquização” que quase o levou à extinção. Seu resgate se deu a partir de 1999 com o projeto CaBoBu, liderado pelo Mestre Giba Giba (in memorian), Mestre Baptista (in memorian) e Mestre José Batista, em Pelotas. Em 2021, o sopapo foi reconhecido como Patrimônio Imaterial da Cultura Pelotense pela Lei Ordinária 2.822/2021.

 

Esta herança artística e cultural tem sido cultivada e defendida por várias personalidades

 

Homenagem aos guardiões da tradição

Esta edição do evento presta homenagem aos ancestrais que preservaram a tradição do Sopapo, incluindo figuras históricas como Mestre Giba Giba (in memorian), Mestre Baptista (in memorian), Mestra Sirley Amaro (in memorian) e Dona Maria Baptista, esposa do Mestre Baptista e mãe de José Batista, que além de proponente do projeto, também será o palestrante. Mestre José Batista, também autor do livro “O Sopapo Contemporâneo – Um elo com a ancestralidade”, foi o responsável por desenvolver o modelo cônico do instrumento, perpetuando sua relevância cultural para as futuras gerações.

 

A Vivência do Sopapo ocorre em Pelotas, Caçapava do Sul e Porto Alegre

 

Programação em Pelotas

Eliana Cardoso Barcellos, anfitriã do projeto em Pelotas, compartilhou a expectativa pelo evento: “Estamos extremamente honradas e orgulhosas em sediar tal evento. Fazer ressoar as batidas do grande tambor nesse território sagrado que é o Passo dos Negros, através do Centro de Educação, Esporte, Cultura e Lazer Cuidando de Nós, fortalece toda uma caminhada ancestral que pulsa em cada rua, cada viela, em cada morador de nossa comunidade. O evento dará grande visibilidade, vez e voz a toda uma comunidade que anseia por reconhecimento de sua grandeza geográfica, histórica e atemporal”, antecipa.

Data: 16 de novembro de 2024

Local: ONG Cuidando de Nós (Av. Cidade de Rio Grande, 1904 – Comunidade Passo dos Negros)

13h30: Abertura do espaço ao público

14h00: Abertura com o toque do Sopapo

14h10: Apresentação musical com Jay Djin e Maíra

14h20: Performance do texto “Arcano sem nome” com Duma

14h40: Mesa com convidados especiais (Fernanda Tomiello, Josiane Dias, Francisca Jesus e Andréa Terra)

15h45: Palestra com Mestre José Batista

16h45: Coffee break

17h00: Esquete teatral “Memórias de um Quilombola” com Cid Branco

17h15: Roda de conversa

17h45: Toque de Sopapo

18h00: Encerramento

Programação em Caçapava do Sul

Cátia Cilene, representante de Caçapava do Sul, também destaca a importância de receber o evento. “Nós temos as melhores expectativas, porque conhecemos o trabalho do mestre José Batista e o impacto social do sopapo é fortalecer os elos. O sopapo, além de ser o nosso grande tambor, tem um sagrado que nos fortalece, que unifica, que agrega e inspira. Precisamos que as pessoas reconheçam o tambor de sopapo em cada canto da cidade, que tenham plena consciência do que ele significa não só para a comunidade negra, mas para toda a sociedade. O impacto é positivo, é bonito, é lindo. Ele nos remete a uma ancestralidade única”, diz.

Data: 23 de novembro de 2024

Local: Clube Harmonia (R. Barão de Caçapava, 925)

13h30: Abertura do espaço ao público

14h00: Abertura com o toque de Sopapo

14h10: Apresentação musical com Jay Djin e Maíra

14h20: Performance do texto “Arcano sem nome” com Duma

14h40: Mesa com convidados especiais (Cátia Cilene e Mestre Tio Cida)

15h45: Palestra com Mestre José Batista

16h45: Coffee break

17h00: Esquete teatral “Memórias de um Quilombola” com Cid Branco

17h15: Roda de conversa

17h45: Toque de Sopapo

18h00: Encerramento

Programação em Porto Alegre

A diretora do Instituto Estadual da Música de Porto Alegre, Adriana Sperandir, expressa sua alegria em sediar o evento. “Para a Casa de Cultura Mário Quintana, é uma felicidade imensa receber um dos encontros do ‘Vivência do Sopapo’. O Instituto Estadual da Música (IEMRS) vem buscando encontros que valorizem e fomentem nossa ancestralidade, diversidade cultural e nosso patrimônio histórico. O Vivência do Sopapo faz esse resgate de forma poética, através de trocas de saberes que ficam na nossa memória. Estamos muito felizes em recebê-los”, afirma.

Data: 30 de novembro de 2024

Local: Casa de Cultura Mário Quintana – Sala Luis Cosme – 4º Andar (R. dos Andradas, 736 – Centro Histórico)

13h30: Abertura do espaço ao público

14h00: Abertura com toque de Sopapo

14h10: Apresentação musical com Jay Djin e Maíra

14h20: Performance de “Arcano sem nome” com Duma

14h40: Mesa com convidados especiais (Edu do Nascimento, Lucas Kinoshita e Gustavo Türk)

15h45: Palestra com Mestre José Batista

16h45: Coffee break

17h00: Esquete teatral “Memórias de um Quilombola” com Cid Branco

17h15: Roda de conversa

17h45: Toque de Sopapo

18h00: Encerramento

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Vitor Ramil lança o álbum “Mantra Concreto” em Porto Alegre

 

Show  acontece nesta quinta-feira, no dia 24 de outubro, no Salão de Atos da PUCRS

 

      Vitor Ramil foi contaminado pela poesia de Leminski e compôs um grupo de canções interligadas em “Mantra Concreto”  Foto: Divulgação/Marcelo Soares

 

O show de lançamento do novo álbum de Vitor Ramil, “Mantra Concreto”, será nesta quinta-feira, dia 24 de outubro, às 21h, no Salão de Atos da PUCRS (avenida Ipiranga, 6681, Prédio 4, Partenon, Porto Alegre).  No novo trabalho, o compositor e intérprete gaúcho reúne 15 músicas criadas por ele com base nos versos do poeta curitibano Paulo Leminski. Além dessas novas canções, o show terá no roteiro grandes sucessos de Vitor: “Loucos de Cara”, “Não é céu”, “Astronauta lírico”, “Foi no mês que vem”, “Tierra”, “A ilusão da casa”, “À beça”, “Estrela Estrela” e “O velho León”. Tem destaque a nova versão de “Natália em Coyoacán”, composta em parceria com Paulo Leminski e gravada originalmente no disco “Tambong” (2000).

Em um texto, Ramil resgata o processo criativo do novo álbum desde 2021, justamente o período de isolamento da pandemia. Ele considera que, neste momento, foi contaminado mesmo pela poesia de Paulo Leminski (1944-1989). “Certo dia, enquanto lia o poema ‘Sujeito Indireto’, passei a mão no violão e minha imunidade baixou. ‘Quem dera eu achasse um jeito, de fazer tudo perfeito’ logo virou canção. Nos dias subsequentes, a cena se repetiu com outros poemas. Em três semanas, treze poemas, treze canções: ‘De repente’, ‘Teu vulto’, ‘Administério’, ‘Amar você’, ‘Profissão de febre’, ‘Palavra minha’, ‘Um bom poema’, ‘Anfíbios’, ‘Será quase’, ‘Sujeito indireto’, ‘Minifesto, Caricatura’ e ‘Mantra Concreto’.”

“A contaminação fora brutal. Não demorou para que o contagiante repertório tomasse meus pensamentos. Eu nunca criara um grupo de canções tão coeso em tão pouco tempo”, revela o cantor. 

O disco é uma homenagem a Paulo Leminski, sendo gravado e lançado em 2024, ano em que, por coincidência, o poeta completaria 80 anos. “Eu não sabia dessa efeméride, que me pareceu meio mágica, feito o meu surto criativo. O que, sim, sabia, era que cada aspecto do trabalho deveria estar contaminado pelo autor e sua poesia”, escreve.

Vitor Ramil, que canta e toca violões e viola, estará no palco com Alexandre Fonseca (bateria, tablas, percussão e programações) e Edu Martins (baixo sintetizador e baixo acústico). Os dois músicos também dividem com Vitor a produção do álbum em lançamento, colaborando na gravação de quase todas as músicas. 

Além deles, o disco conta ainda com as participações de Carlos Moscardini (violão), André Gomes (sitar e guitarra), Santiago Vazquez (kalimba), Toninho Horta (guitarra), Vagner Cunha (violino e arranjo), José Milton Vieira (trombone) e Pablo Shinke (violoncelo). Vagner, José e Pablo também fazem participações especiais no show. 

A iluminação do espetáculo é de Isabel Ramil, a concepção de vídeo e animação de Vini Albernaz e o som de Lauro Maia e André Colling.

Os ingressos estão à venda no Campus da PUCRS e na plataforma Sympla. Adquira aqui o seu ingresso.  Ouça neste link o álbum “Mantra Concreto”.

Serviço  

  • Classificação Indicativa: Livre 
  • Ponto de venda de ingressos sem taxa de conveniênciaCampus da PUCRS – Av. Ipiranga, 6681, Saguão do Living 360º, Prédio 15, em frente à PUCRS Store (de segunda a sexta-feira, das 13h às 19h). Nos dias 03, 04 e 24 de outubro, a venda física de ingressos acontece diretamente na Bilheteria do Salão de Atos da PUCRS, Campus da PUCRS, Prédio 04, a partir das 13h até o horário de início do espetáculo do dia.
  • Tarifa especial de estacionamento no Campus da PUCRS: R$25,00 para compra antecipada pelo site da Indigo:

https://indigoneo.com.br/pt/booking/999901058 Código promocional: 10CEPUC24

Valor dos Ingressos: 

  • Plateia Baixa R$250,00 
  • Plateia Alta R$200,00 
  • Mezanino R$80,00  

 

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Como o Brasil seleciona um filme para o Oscar?

O longa “Ainda Estou Aqui”, de Walter Salles, foi o escolhido para representar o país em 2025        

Por Gabriel Veríssimo   

   

Fernanda Torres vive na tela a história real de quem sofreu na pele os dissabores do período ditatorial no Brasil   Foto: Divulgação

 

A Academia Brasileira de Cinema anunciou no dia 23 de setembro, o filme que representará o Brasil na corrida por uma vaga na categoria de Melhor Filme Internacional do Oscar 2025. O longa “Ainda Estou Aqui” (2024), dirigido por Walter Salles, foi selecionado por unanimidade pela comissão de especialistas e já desponta como uma das grandes apostas do País para a competição mundial. Levando em conta a produção brasileira recente de filmes, o título está passando por algumas etapas antes de chegar à indicação definitiva à cerimônia em Los Angeles.

A trama de “Ainda Estou Aqui se ambienta no Brasil, em 1970, e adapta o livro autobiográfico homônimo de Marcelo Rubens Paiva, que narra a vida de sua mãe, Eunice Paiva (Fernanda Torres). Na trama, uma mulher casada com um político influente tem sua vida transformada quando o marido, Rubens Paiva (Selton Mello), desaparece durante a ditadura militar. De dona de casa, ela passa a lutar como ativista dos direitos humanos.

A estreia no Brasil está marcada para ocorrer durante a 48ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, que começou nesta quinta-feira, dia 17 de outubro. O lançamento comercial nas salas de cinema do País está previsto para 7 de novembro. No cenário internacional, o longa já acumula reconhecimento: venceu o prêmio de Melhor Roteiro no prestigiado Festival de Veneza e foi exibido nos festivais de Toronto e San Sebastián, onde recebeu aclamação da crítica.

Como é o processo de seleção para o Oscar de Melhor Filme Internacional?

A escolha de “Ainda Estou Aqui” como representante brasileiro no Oscar seguiu um rigoroso processo de seleção estabelecido pela Academia Brasileira de Cinema e Artes. Para concorrer à vaga, o filme precisa atender a uma série de requisitos estabelecidos tanto pela academia brasileira quanto pela Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood, que organiza o Oscar.

Em primeiro lugar, a produção deve ter sido lançada no Brasil durante um período pré-definido. Além disso, o filme precisa ter sido exibido em um cinema comercial por pelo menos sete dias consecutivos e não pode ter sido transmitido previamente na televisão ou em plataformas de streaming.

Após o lançamento comercial, cabe à produtora do filme inscrever a obra no site da academia, apresentando documentos como o Certificado de Produto Brasileiro (CPB), emitido pela Ancine, e comprovações da exibição nos cinemas, como críticas ou reportagens. O filme também não pode ter concorrido no ano anterior, o que garante que apenas novas produções entrem na disputa.

O filme passa pelo filtro do comitê de seleção da Academia Brasileira de Cinema e Artes Audiovisuais. Ele é composto por 25 membros, 21 escolhidos por votação entre os integrantes da organização, e quatro escolhidos pela diretoria, visando diversidade. Este comitê fica responsável por assistir todas as obras elegíveis que se inscreveram no processo seletivo, aberto no site oficial para que as produtoras possam enviar seus candidatos.

Uma vez definido o representante, a Academia Brasileira de Cinema e Artes informa sua escolha ao comitê de Hollywood, e a inscrição final na premiação fica a cargo dos produtores da obra escolhida.

O anúncio dos cinco filmes finalistas que concorrerão ao Oscar será feito no dia 17 de janeiro de 2025, após uma pré-lista de finalistas, que será divulgada em 17 de dezembro de 2024.

Filmes brasileiros indicados ao Oscar de Melhor Filme Internacional

Embora o Brasil tenha submetido diversos filmes à categoria de Melhor Filme Internacional ao longo dos anos, apenas quatro produções conseguiram a cobiçada indicação final à cerimônia do Oscar. O primeiro a disputar a estatueta foi “O Pagador de Promessas” (1963), de Anselmo Duarte. O segundo, “O Quatrilho” (1996), de Fábio Barreto, e o terceiro a alcançar a indicação foi “O Que é Isso, Companheiro?” (1998), de Bruno Barreto. A quarta produção foi “Central do Brasil” (1999), de Walter Salles, que trouxe grande reconhecimento ao cinema nacional e ainda garantiu uma indicação de Melhor Atriz para Fernanda Montenegro.

Agora, com “Ainda Estou Aqui”, o Brasil renova suas esperanças de retornar à lista dos finalistas e, quem sabe, conquistar sua primeira estatueta. A 97ª edição do Oscar será no dia 2 de março de 2025.

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