Se o Twitter fosse um filme

Filme “Morte Morte Morte”, lançado no Brasil há menos de duas semanas, traz uma narrativa controversa e personagens egocêntricos.

Por Jaime Lucas Mattos

Pôster nacional do filme / Foto: Divulgação/Sony Pictures Brasil

“Morte Morte Morte” (no original, “Bodies Bodies Bodies”) é classificado como um filme dos gêneros terror slasher e comédia. Sua estrutura, de fato, flerta com os dois gêneros, mas não segue o padrão do que se espera de ambos. O filme foi produzido pela A24, uma produtora conhecida por dar liberdade à equipe criativa na direção e roteirização dos filmes. Por este fato, “Morte Morte Morte” não segue uma estrutura padrão para fazer sucesso imediato. A narrativa traz também uma sátira ao gênero do slasher, mas principalmente à futilidade de discussões da Geração Z na internet.

A história traz como personagens alguns jovens de 20 e poucos anos que se reúnem na mansão de um deles para um fim de semana de festa e bebida. No meio da noite, os jovens decidem brincar de Morte, Morte, Morte, um jogo que consiste em que um dos participantes seja o “assassino” e tenha que “matar” os outros, com as luzes desligadas. Cada vez que um jogador é “assassinado”, todos os outros devem se reunir para discutir e decidir quem é o assassino.

No entanto, as coisas começam a dar errado quando um dos jovens aparece com a garganta cortada. Em meio a uma tempestade que resultou em uma queda de energia, juntamente com a falta de um meio de transporte para pedir ajuda em outro local, os jovens se reúnem dentro da mansão para se salvarem, mas suas questões problemáticas de relacionamento resultam na separação de personagens e mais mortes acontecendo.

Elenco em uma das cenas iniciais do filme / Foto: Divulgação/A24 Films

 

O filme traz uma narrativa controversa, com um final que pode lhe deixar entre dois extremos – “amo” ou “odeio” – enquanto os personagens são fúteis o suficiente para não fazer o público se interessar por nenhum deles. Essa futilidade, egocentrismo e falta de carisma dos personagens, à primeira vista parece apenas falta de compromisso do roteiro, no entanto, com o desenrolar da trama, entende-se que a intenção do filme é exatamente a de retratar esses personagens dessa forma.

Caricatos, os personagens de “Bodies Bodies Bodies” são egocêntricos ao ponto de se importarem mais se seus sentimentos estão sendo feridos do que com seus amigos que estão morrendo. O filme aproveita essa temática para abordar os diálogos e argumentos rasos dos jovens da Geração Z, que por muitas vezes entram em discussões na internet que não levam a lugar algum.

O Twitter, citado no título, é o melhor exemplo de rede social onde essas conversas fúteis acontecem com frequência. Uma das personagens do filme, interpretada pela excelente Rachel Sennott (“Shiva Baby”), parece a personificação do jovem do Twitter, tomando cuidado com cada palavra, para não usar termos ofensivos, no entanto, ao mesmo tempo essa mesma personagem acusa os amigos de assassinato de uma forma que não condiz com sua linguagem “polida”.

Rachel Sennott (Alice) é destaque na atuação / Foto: Divulgação/A24 Films

Essa crítica ácida ao comportamento raso da Geração Z na internet se estende à viralização de conteúdos. No filme, plataformas como o TikTok são utilizadas para evidenciar a obsessão nada saudável dos jovens pelas redes sociais.

Apesar da – proposital – falta de personagens carismáticos, que pode levar o espectador a uma dificuldade de se envolver na trama, a direção do longa é muito inteligente e usa muito bem os recursos e liberdade que a A24 dá, para criar cenas diferentes do padrão.

Um ponto destaque na criatividade da direção é o uso inteligente da iluminação. A narrativa permite que boa parte do filme se passe em cenários sem uma boa iluminação, no entanto, a direção dribla o que poderia ser um desastre na tela para o diferente uso de fontes de iluminação, usando desde a moderna-clássica lanterna de celular até acessórios neon utilizados por uma das personagens. A iluminação da tela do celular nos rostos dos personagens também foi uma saída inteligente para que possamos ver suas reações.

As diferentes fontes de iluminação mostram uma direção criativa / Foto: Divulgação/A24 Films

Outro destaque vai para um plano – claustrofóbico – feito dentro de um carro, com a câmera girando em 360º, mostrando tudo o que estava acontecendo no interior do veículo, bem como as reações de cada personagem ante uma situação de desespero, o que lembra levemente uma clássica cena de “Cujo” (1983).

Com técnicas criativas e personagens nada carismáticos, “Morte Morte Morte” pode causar um sabor amargo no público, já que foge de uma padronização do que se espera de uma narrativa de slasher. Rachel Sennott, Maria Bakalova e Amandla Stenberg são destaques na atuação.

“Morte Morte Morte” está em cartaz nas salas de cinema no Brasil.

Comentários

comments

Você pode gostar...