Eleger uma mulher como deputada estadual no Rio Grande do Sul custou duas vezes mais do que um homem

Nove mulheres foram eleitas deputadas estaduais pelo Rio Grande do Sul. Na montagem, Franciane Bayer, Juliana Brizola, Kelly Moraes, Luciana Genro, Silvana Covatti, Sofia Cavedon, Zila Breitenbach, Any Ortiz e Fran Somensi

Por Mariana Hallal, Marina Amaral e Natalia Quintas

Os homens receberam 82,3% dos votos para deputado estadual pelo Rio Grande do Sul nas eleições deste ano. É o que revela um levantamento feito pela reportagem com base nos dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Os números por trás das escolhas dos gaúchos nas urnas mostram, ainda, que as mulheres precisaram gastar mais para assumir uma cadeira na assembleia legislativa. Candidatos do sexo masculino tiveram 2,4 vezes mais chances de se eleger do que um concorrente do sexo oposto.

O voto em uma mulher custou aproximadamente R$ 3,44 a mais do que o voto em um homem

Neste pleito, apenas nove das 55 vagas da Assembleia Legislativa foram preenchidas por mulheres. O número representa 3,5% das candidatas aptas a assumir o cargo de deputada estadual. Entre os homens, o índice chega a 8,4% de aproveitamento. O abismo também aparece quando comparados os custos por voto entre os eleitos de cada sexo. Cada uma das novas parlamentares precisou desembolsar, em média, R$ 9,15 por voto conquistado. Os homens, em comparação, gastaram pouco mais da metade: R$ 5,71.

Um dos fatores que motivam essa diferença é o baixo número de candidatas. Das 798 pessoas que concorreram ao cargo de deputado estadual pelo RS, 252 eram mulheres. A proporção, de 31,8%, é ligeiramente maior do que o mínimo estipulado pelo TSE. A lei 12.034/09, conhecida como Minirreforma Eleitoral, determina que haja um certo equilíbrio entre os sexos na hora de distribuir as vagas. Ao menos 30% das candidaturas precisam ser preenchidas por mulheres. Na prática, a norma tem como objetivo incentivar a participação feminina na política.

A cientista política Elis Radmann explica que o baixo número de candidatas se deve a uma conjuntura histórica. Como os homens estão inseridos há mais tempo neste universo, eles tendem a ter nomes mais consolidados entre os eleitores. “Tem um valor de marca neste debate que cria naturalmente uma desvantagem para quem está começando”, analisa Elis. “Na prática, as mulheres estão adentrando neste mercado e precisam ter uma proposta de valor e divulgar a sua marca para terem o mesmo reconhecimento dos homens”, avalia.

Candidatas mulheres gastaram em média R$ 5.500 a menos que candidatos homens

Apesar das tentativas do TSE para tornar a corrida eleitoral mais equilibrada – neste ano, o órgão determinou que 30% do fundo partidário deveria ser aplicado em candidaturas femininas -, as mulheres recebem proporcionalmente menos dinheiro que os homens para bancar suas campanhas. Cada candidato gastou cerca de R$ 52 mil durante o período eleitoral. Entre as mulheres, a média ficou em torno de R$ 46,5 mil. Como as mulheres precisam gastar mais para conquistar cada voto, a conta não fecha. Além disso, os dados dessa eleição mostram que, em comparação aos homens, as candidatas precisam de 15% mais votos para se eleger.

Longo prazo

Elis Radmann explica que as candidaturas de mulheres ainda são novidade no cenário político. E, para dominar a área, elas devem entender como funciona o jogo. “A política é a arte do convencimento e da persuasão. Para a mulher ser bem sucedida neste campo, precisa compreender os códigos e atuar dentro deles”, fala. Ela comenta também que a escolha política perpassa as questões de gênero. Por isso, o argumento de que as mulheres devem votar em mulheres não possui muita força. “Para ganhar o voto de outras mulheres, a candidata precisa ter uma plataforma, precisa dizer o que pretende e a diferença que fará”, diz.

Dessa forma, as cotas criadas pelo TSE servem mais como um marco institucional. “O debate precisa ser muito mais amplo e perpassar a educação e a cultura política”, aponta Elis Radmann. A cientista política frisa que a discussão precisa ser feita em outros espaços como a família, a escola e o trabalho. “Temos que quebrar com o estigma de que a política não presta”, pontua, frisando que a descrença é maior entre a mulheres.

Elis reconhece que ampliar a participação feminina na política é um processo histórico onde os resultados só surgem a longo e médio prazo. E, se as pessoas reconhecerem seus deveres e direitos como cidadãos, ela acredita que a adesão das mulheres tende a aumentar naturalmente. “Esse é um grande tema de casa e transcende a questão de gênero”, finaliza.

As escolhidas
No topo, entre os 55 eleitos, elas conquistaram apenas 16% das vagas. Todas as deputadas estaduais eleitas pelos gaúchos têm um traço em comum: a ligação prévia com a política. Nenhuma caiu de paraquedas na vida pública. Todas já tinham uma trajetória percorrida.

Das 798 pessoas que concorreram ao cargo de deputado estadual pelo RS, 252 eram mulheres

Any Ortiz (PPS), a mais votada, entrou para a política em 2005. Concorreu à prefeitura de Porto Alegre em 2008, à Assembleia Legislativa em 2010 e, finalmente, elegeu-se vereadora em 2012. O primeiro mandato como deputada estadual foi assumido em 2014, com tímidos 22.553 votos. Ainda no primeiro ano de casa, propôs um projeto de lei que pode ter sido responsável por sua votação expressiva em 2018. O PL 22/2015 foi aprovado por unanimidade na Assembleia e marcou o fim da pensão vitalícia a ex-governadores do Estado. Além da carreira, Any possui raízes na política. A advogada é filha de um ex-prefeito da cidade de Palmares do Sul, localizada no litoral norte do Rio Grande do Sul. Antes de se aventurar na carreira solo, ela também assessorou o então deputado estadual Luciano Azevedo, hoje prefeito de Passo Fundo.

Silvana Covatti (PP) foi eleita para a Assembleia Legislativa pela primeira vez em 2006. Em 2010, foi reeleita como a parlamentar estadual gaúcha mais votada, com 85.604 votos. Em 2014 foi campeã de votos entre os deputados estaduais do Partido Progressista, com 89.130 votos, sendo a quarta votada em todo o Estado. Silvana se tornou a primeira mulher a assumir a presidência da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul e, no ano passado, foi governadora em exercício durante quatro dias. Sua trajetória política iniciou enquanto acompanhava Vilson Covatti, seu esposo, eleito vereador de Frederico Westphalen em 1982, sendo eleito deputado estadual e federal desde então. A candidatura de Vilson Covatti a vereador em Frederico Westphalen, em 1986, foi a primeira experiência de Silvana nos bastidores políticos. O filho do casal, conhecido como Covatti Filho, é deputado federal desde 2015 e foi reeleito no último mês de outubro. A deputada também trabalhou como voluntária durante 12 anos na Assembleia Legislativa.

Luciana Genro (PSOL) iniciou sua vida política no movimento estudantil da Escola Estadual Júlio de Castilhos, onde estudou. Luciana é filha do ex-governador do Rio Grande do Sul e ex-prefeito de Porto Alegre Tarso Genro. Seu avô, Adelmo Genro, foi cassado pela ditadura enquanto vice-prefeito de Santa Maria. A deputada teve um filho com o historiador Roberto Robaina, candidato ao governo do Estado pelo PSOL nas últimas eleições. Em 1994, aos 24 anos, foi eleita deputada estadual pela primeira vez pelo Partido dos Trabalhadores, sendo reeleita para o próximo mandato. Após a expulsão do PT no início dos anos 2000, Luciana foi uma das fundadoras do PSOL.

Kelly Moraes (PTB) está na política desde 2002, quando se elegeu deputada federal. Em 2008 assumiu a prefeitura de Santa Cruz do Sul e, em 2016, foi vereadora da cidade com 2,3 mil votos, tendo a maior votação daquela eleição. Neiva Teresinha Marques ficou conhecida como Kelly Moraes ao se casar com Sérgio Moraes, que foi vereador da cidade de Santa Cruz do Sul na década de 1980, deputado estadual na década de 1980 e prefeito municipal de Santa Cruz entre 1997 e 2004. Sérgio foi eleito em deputado federal 2006 e se reelegeu por três mandatos. O filho do casal, Marcelo Pires Moraes, foi eleito deputado estadual em 2014 e, no último pleito, deputado federal pelo Estado.

Juliana Brizola é filiada ao PDT desde os 18 anos. Em 2008, se elegeu vereadora na maior votação do partido em Porto Alegre, cidade onde a política nasceu. Já em 2010, foi eleita deputada estadual com um expressivo número de 61.305 votos; novamente, a mais votada. Nas eleições de 2018, Juliana foi, mais uma vez, eleita deputada estadual com 0,76% dos votos válidos, totalizando 43.822. O sobrenome é conhecido. Juliana é neta de Leonel Brizola e irmã gêmea do também político Leonel Brizola Neto, do PSOL do Rio de Janeiro. Ela carrega o nome da família e governa seguindo a linha do seu avô, com propostas baseadas na educação. O projeto Escola de Tempo Integral, por exemplo, foi implementado no Estado após uma emenda constitucional proposta por ela.

Apenas 16% dos deputados estaduais eleitos no RS são mulheres

Já Franciane Bayer (PSB) é uma cara nova na política. Servidora pública e natural de Santa Maria, ela nunca havia ocupado um mandato eletivo. Porém, seu sobrenome também é conhecido no âmbito político. Franciane é irmã de Liziane Bayer (PSB), que exerceu mandato na Assembleia Legislativa e foi eleita como deputada federal neste ano. Agora, Franciane atuará como sua sucessora, dando seguimento aos seus projetos na Assembleia. Ambas são evangélicas e têm como uma de suas medidas o material de saúde preventiva, que deve ser reeditado. Além disso, uma das bandeiras defendidas por Franciane é o combate à violência contra a mulher.

Sofia Cavedon (PT) é filiada ao seu partido desde 1987, sendo eleita vereadora em Porto Alegre pela primeira vez em 2000, estando atualmente no quinto mandato. Em 2011, presidiu a Câmara de Vereadores de Porto Alegre, sendo também a primeira Procuradora da Mulher no Legislativo no Estado. Sofia criou a primeira Procuradoria da Mulher do Legislativo no Estado, exercendo a sua Presidência por duas gestões. Aprovou a Lei do Passe Livre/Vou à Escola, que garante transporte escolar gratuito para alunos dos Ensinos Fundamental e Médio.

Fran Somensi, deputada estadual eleita com 15.404 votos, é esposa do prefeito de Farroupilha, Claiton Gonçalves (PDT). Francis filiou-se ao PRB em abril deste ano. Natural do Paraná, Fran Somensi estudou Farmácia em Pelotas antes de se mudar para Farroupilha e casar-se com o médico Claiton, também formado em Pelotas.

Zilá Breitenbach (PSDB) é natural de Três Passos e foi prefeita do município entre 1997 e 2004. Desde 2006 é deputada estadual pelo PSDB, obtendo em 2014 a primeira suplente da coligação PSDB, Solidariedade e PRB, com 29.216 votos. Zilá foi secretária da Educação e da Saúde de Três Passos e obteve sucesso em seus mandatos como prefeita, quando implementou uma gestão participativa com a comunidade. A parceria gerou projetos, conferindo-lhe destaque nacional como Prefeita Empreendedora.


Créditos das fotos: Franciane Bayer: Divulgação; Juliana Brizola: Divulgação – PDT; Kelly Moraes: Divulgação – PTB; Luciana Genro: Agência Brasil; Silvana Covatti: Divulgação – AL/RS; Sofia Cavedon: Divulgação – Câmara de Vereadores de Porto Alegre; Zila Breitenbach: Divulgação – AL/RS; Any Ortiz – Divulgação; Fran Somensi: Agência RBS; Gráficos: reportagem

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