Do Dunas aos Estados Unidos

Por André Pereira

A história de um brasileiro que deixou a periferia para se aventurar na terra do tio Sam

    Dezembro de 2015. Brasil. Rio Grande do Sul. Pelotas. Areal. Loteamento Dunas. Rua 19.  Daniel dos Santos se levanta para mais um dia de trabalho. Sai de casa, desvia da valeta e vai até o ponto de ônibus, pega o veículo vazio, cumprimenta o motorista, roda a catraca e se senta, ao chegar no seu ponto ele desce e caminha algumas quadras até o trabalho. O lugar pode variar, a forma de ir para o trabalho também, mas essa é a rotina de grande parte dos brasileiros. Em um dia desses Daniel resolveu mudar de vida.

   “Conheci os missionários da igreja dos mórmons e com 14 anos acabei me tornando membro da igreja. O missionário que me batizou era um skatista profissional de Las Vegas. Desde esse momento eu comecei a fantasiar na minha mente o sonho de vir para cá e ter uma família aqui, um pouco por influência desses missionários”relata Daniel.

    Com 16 anos, Daniel bateu de frente com a realidade e teve que escolher: estudo ou trabalho. Como a maioria, a balança pesou para o lado financeiro pela necessidade do sustento. O trabalho no Mcdonalds – a franquia norte americana que é um dos maiores símbolos do domínio ianque – foi o que ele conseguiu na época.

   Após a primeira experiência, ele foi trabalhar como porteiro. Com mais tempo, Daniel começou a estudar administração à distância pela ULBRA.

   Quando tinha dezenove anos ele foi pela primeira vez para os Estados Unidos como missionário, mas ainda não seria dessa vez que ele realizaria o seu sonho. Daniel voltou e tinha uma razão principal para voltar: Brenda. A namorada que se tornou esposa.

   Enquanto ele trabalhava e fazia a faculdade à distância, ela também trabalhava e estudava. Até aí uma história relativamente normal. Dois jovens começando a vida e ralando para chegar ao seu lugar ao sol.

  Aí que tudo mudou: Brenda ficou grávida.

  “Eu estava desesperado! Eu e ela morávamos na casa da minha mãe, em um quartinho nos fundos. Nós dois trabalhando, cada um com seu salário de cerca de mil reais, nós não conseguíamos manter nem a gente mesmo direito! Nós não passávamos dificuldade, mas era tudo contado: alimentação, ajuda com as despesas da casa, gasolina da minha motinho e etc. E aí pensar na vinda de um bebê?! Ia mudar tudo. Ela não poderia trabalhar, provavelmente teria que abandonar a faculdade e meu sonho de vir para cá seria realmente impossível. Mas ela começou a me animar dizendo: Daniel, agora é a hora de arriscar e tentar ir para os EUA! Porque se ela nascer lá, ela vai ser cidadã americana e então as portas vão se abrir para nós, porque seremos pais de uma cidadã americana”.

   Da dificuldade surgiu uma alternativa e então Daniel começou a fazer as contas. Claro, a conta não fechava. Custos de visto, passaporte e tudo que incluí uma viagem internacional, sem contar no tempo que se esgotava com um bebê a caminho.

   Foi aí que a solução caiu dos céus, mais precisamente em uma página da internet: “varrendo a internet atrás de informações eu li uma matéria sobre brasileiros que faziam vistos americanos no consulado em Montevidéu.”

   Os gastos se encaixaram no orçamento e lá foram os dois. Ônibus até Jaguarão, depois uma caminhada até o lado uruguaio e outro ônibus até Montevidéu. O sonho já começava a tomar forma, mas ainda faltava a tão temida entrevista para ganhar o visto.

(Foto: Divulgação)

“Eu fui com uma pastinha cheia de folhas somente para dar volume pra parecer que tínhamos bastantes documentos que mostrasse vínculo com o Brasil… Mas na verdade eram só folhas em branco e torcemos os dedos pra que eles não nos pedissem pra ver quais documentos nós tínhamos.”

   Seja pela pasta cheia de folhas em branco, pelo portunhol gaguejado ou pelos dois: deu certo. O visto de turista foi dado e em alguns meses os dois iriam tentar a vida no exterior. A comemoração veio do jeito mais brasileiro possível: “quando saímos do consulado pulamos e gritamos. Era um sentimento muito bom!”

   Março. Estados Unidos. Utah. Salt Lake City.

    Daniel se levanta para mais um dia de trabalho. Sai de casa e vai até o trabalho como marceneiro. Faz um ano que o sonho improvável de morar nos Estados Unidos virou realidade. De lá pra cá, os dois ganharam a companhia de Lilian: a bebê que foi um dos motivos de Daniel e Brenda entrarem nessa aventura. “Nunca senti tanta alegria quando recebi o certificado de nascimento dela… Uma emoção que não tem como descrever, apenas por saber que ela é cidadã de um país onde ela vai ter oportunidades e viver uma realidade extremamente diferente da que eu vivi.”

    Seja no Brasil, nos Estados Unidos ou até na China, os pais sempre vão querer um futuro melhor para seus filhos, Daniel é uma exceção. Uma bela exceção. Um homem que agarrou com unhas e dentes as oportunidades que a vida lhe deu e, além disso, criou boa parte dessas oportunidades graças a sua intensa vontade de ser o melhor pai e marido possível. Do Dunas aos Estados Unidos, do sonho a realidade.

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