O Ciclo de Conversas na Biblioteca Negra de Pelotas teve seu último encontro neste sábado (24). Convidada a falar sobre Shakespeare e Racismo, a professora do CLC Beatriz Viegas Farias trouxe dados de autoras que pesquisam o tema tanto no Brasil como no exterior. Elas são unânimes em afirmar que Shakespeare foi um autor que refletia sobre as condições de vida do “outro” (os não ingleses), e isso é fácil de detectar em sua obra dramatúrgica. Conforme a palestrante: “Na Inglaterra elisabetana, a escravidão de indivíduos africanos era um fato, bem como a exploração das colônias americanas, e no reinado de Elizabeth I tanto negros como judeus foram extraditados. A percepção que Londres tinha dos não brancos (africanos, mouros, sarracenos, indianos, persas etc) era algo confusa, uma mistura de características de mais de uma etnia. Quanto aos judeus, que não se diferenciavam dos brancos pelo fenótipo, naquela época deviam usar na indumentária elementos que os diferenciassem dos europeus.”
Ela acrescentou que o racismo de então era muito mais vinculado a diferenças religiosas (o que implicava em diferenças de costumes). “A peça exemplar de Shakespeare quanto ao tema da negritude é Otelo (c.1604), e o dramaturgo é ousado ao colocar em cena um general da nobreza moura casado com uma moça branca da nobreza europeia e bem mais jovem. O grande vilão da peça (personagem das mais cruéis de Shakespeare) é um soldado branco. Por outro lado, O mercador de Veneza (c.1595) apresenta um judeu que constrói o discurso mais bem acabado que conheço sobre a injustiça gritante que se traduz em preconceito: ‘Se vocês nos furam, não sangramos? Se nos fazem cócegas, não rimos? Se nos envenenam, não morremos?’ (3.1), além de uma fala que denuncia o trabalho escravo: ‘Os senhores têm entre vocês muitos escravos, que os senhores compraram e que, como se fossem seus jumentos, seus cachorros, suas mulas, os senhores usam de modo abjeto, em tarefas nojentas. Porque os senhores os compraram.’ (4.1).”
O Ciclo de Conversas na Biblioteca Negra acontece todo ano e é aberto à comunidade em geral. O projeto tem apoio da área de Espanhol e da Câmara de Extensão do CLC, bem como da Comissão de Combate ao Racismo e Discriminação na UFPel.