Reportagem de Calvin Cousin –
Várias modalidades e histórias memoráveis da dança nas escolas da cidade –
Aula na Escola de Ballet Dicléa: formação na modalidade clássica dura cerca de dez anos (Foto: Divulgação)
Quem olha para um corpo de ballet e não enxerga além da graça e delicadeza apresentadas, nem imagina a imensa dedicação, esforço e técnica aplicados pelos bailarinos. A formação na modalidade clássica dura cerca de dez anos, se iniciada, preferencialmente, por volta dos sete anos de idade. Na cidade de Pelotas existem duas escolas voltadas exclusivamente para o ensino da dança: a Escola de Ballet Dicléa Ferreira de Souza e a PLESS – Studio de Ballet.
Dicléa de Souza, a história do ballet pelotense encarnada
A homônima professora de dança, mestra de ballet, proprietária e diretora da escola (atualmente aos cuidados de sua filha, Daniela) já virou tema de livro e enredo (vencedor) de escola de samba. Recebeu diversos prêmios e homenagens, inclusive o título de Cidadã Pelotense, em 1991. No Rio, integrou a escola de dança Maria Olenewa, do Theatro Municipal, como solista e membro do corpo de baile. Veio às terras sulinas, vinda do Rio de Janeiro, em julho de 1958, após seu casamento. “Cheguei em julho e em agosto já estava trabalhando. Comecei dando aulas no conservatório Angelo Crivellaro, um conservatório de música. Já tinham 118 crianças me esperando, e eu dava uma média de oito horas de aula por dia. Em 1960, abri minha própria escola,” conta a bailarina.
Operando, originalmente, na Rua Félix da Cunha, a primeira grande apresentação da escola aconteceu em 1961, no Theatro Guarany. Nas palavras de Dicléa, “foi um horror”. Em função do tamanho do teatro, não era possível realizar um espetáculo apenas com piano, logo, foi convocado o maestro Tagnin, que precisava de músicos da Orquestra Sinfônica de Porto Alegre (OSPA) para a apresentação, trazendo os três primeiros violinos, o oboé, o violoncelo e alguns outros instrumentos. As partituras vieram do Rio de Janeiro, com segmentos de “Le Sylphides” e das “Bodas de Aurora” (uma parte da “Bela Adormecida”). Durante a apresentação, devido a problemas e atrasos durante os ensaios, o maestro anunciou de capo primo!, que significa “começar tudo de novo”. Dicléa gritou do palco: “dá capo primo! coisa nenhuma! Vai só no piano”. E o restante do espetáculo foi acompanhado apenas pelo piano, enquanto os músicos da OSPA fugiram para a Praça Coronel Pedro Osório, envergonhados.
Isso não impediu a escola de fazer sucesso, recebendo milhares de alunas e alunos ao longo dos anos. Participações vitoriosas em festivais em Joinville fizeram com que o nome Dicléa fosse reconhecido a nível nacional. Hoje, a escola se encontra em um novo endereço, na Rua General Osório, e participa de festivais em lugares mais próximos, “porque as crianças gostam e se sentem importantes ao participarem deles”.
Ensinando, prioritariamente, o ballet clássico, por ser a base de tudo na dança, a escola também dispõe aulas para adultos e baby class, para crianças com menos de sete anos. Utilizam-se muito os ballets de repertório, não apenas pela didática, mas também para aproximar o público da cidade da experiência de ballets profissionais. “Criamos um público em Pelotas, tornando os espetáculos de repertório acessíveis para aqueles que não têm condições de assistir a um ballet fora. No final do ano passado fizemos “O Quebra-Nozes”, que, modéstia a parte, foi um baita sucesso. O público veio abaixo”, lembra a professora.
A escola conta com quatro professoras e, aproximadamente, duzentos alunos, muitos originários do projeto A Magia da Dança, uma parceria com a Universidade Federal de Pelotas – UFPel, para dar aulas de ballet para crianças de bairros periféricos, na faixa dos oito aos 14 anos. Ainda que encontre resistência, o número de alunos homens vem aumentando, muitos deles estudantes universitários. Entre suas duas salas de aula (uma para baby class e outra para o clássico) e a boutique para venda de materiais de dança, a instituição apresenta diversas fotografias em preto e branco de Dicléa em meio de seus repertórios.
O Ballet Fitness
Um estilo cuja popularidade tem crescido (inclusive entre famosos, como Grazi Massafera e Flávia Alessandra) é o Ballet Fitness, criado pela bailarina Betina Dantas, após uma lesão que a impossibilitou de seguir praticando o ballet clássico. Para não ficar parada, a profissional aproveitou sua formação em Educação Física para criar uma aula que misturasse movimentos do ballet com exercícios do mundo das academias. Alguns estabelecimentos de Pelotas ofertam aulas da modalidade, como a Escola Dicléa, sob o nome de moving dance, e a Academia Spazio, cuja professora é Nicole Gonzales. Formada em Educação Física pela UFPel, com mestrado na área pela mesma instituição, Nicole explica como funcionam as aulas:
“São realizados abdominais, exercícios para braços e glúteos, além dos movimentos dos ballets tradicionais, como pliés (dobras dos joelhos), tendus (esticar uma perna ao lado do corpo enquanto a outra fica estática) e frappés (pousar um pé sobre o tornozelo do pé de apoio).” Os alunos realizam movimentos na barra, no chão e no centro, sem acompanhamento de música clássica ou apresentações externas, por ser uma atividade incluída nos currículos das academias como alternativa para quem quer se exercitar e tem gosto pelo ballet, mas não por exercícios com pesos. A modalidade é aberta para aqueles que nunca praticaram a dança, ajudando no fortalecimento muscular, na queima de calorias e na melhoria do equilíbrio, respiração, postura e flexibilidade.
O Ballet Fitness é uma franquia, embora muitos professores utilizem de seus conhecimentos em educação física e ballet clássico para darem aulas, como é o caso de Nicole. “O curso de master só é realizado em capitais e, assim, possui um custo muito elevado para participar”. Contudo, diversos países, como os Estados Unidos, o Canadá e a Espanha, apresentam modalidades semelhantes, mas que trabalham com outros nomes, como Ballet Workout, Ballet Beautiful ou Barre Ballet. Mesmo com as inovações, o Ballet Fitness reforça a ideia de que, realmente, o clássico não cai, como diria Dicléa de Souza.
Um novo espaço para bailarinos
O Studio PLESS, fundado em março de 2013 por Diego Porciúncula e Jean Coll, tem por objetivo a formação de bailarinos a nível técnico e artístico. Jean estudou com Dicléa, já na fase adulta, assim como Diego, que trabalhou com a mestra como professor de ballet, além de ter participado da companhia do Teatro Guaíra, em Curitiba. Ao voltar para a cidade, abriu a escola para ter maior autonomia e explorar o lado artístico da dança. “O técnico é aquilo que se aprende como matéria, mas ele fica muito frio no palco, então exploramos o artístico para trabalhar com a expressão facial e emotiva do bailarino”, afirma Jean.
Com três modalidades, cinco professores e cerca de 120 alunos, a PLESS é uma escola exclusivamente de ballet. O ballet clássico de formação é dividido em níveis, que se estendem por cerca de dez anos, o período ideal para a formação de um bailarino clássico, que pode desempenhar papéis de destaque em qualquer ballet.
Um diferencial do Studio é a carga horária de ensaio maior do que a de outros grupos da região. Utilizando como referência escolas do exterior ou companhias como a Bolshoi, que possui um centro em Joinville onde os bailarinos ensaiam cinco vezes por semana, algumas vezes durante todo o dia, a PLESS busca aproximar a realidade do ballet gaúcho com as de outros centros mais estabelecidos. São realizados três treinos semanais de uma hora e meia, ao invés das tradicionais duas aulas de uma hora. Para Jean, o correto para se obter um bom desempenho técnico seria pelo menos três horas de ensaio por dia, embora seja muito difícil consagrar a prática na região, devido ao preconceito e às questões do nativismo. “Quanto mais estudares, mais aperfeiçoado tu vais estar.”
Ainda, a escola disponibiliza o Ballet Adulto, tanto para aqueles que nunca dançaram quanto para aqueles que praticaram durante a juventude, mas passaram muito tempo parados, e o Ballet Funcional, sem restrição de idade, desenvolvido pelo próprio professor Diego. Essa modalidade é composta por aulas de ballet que funcionam como exercícios físicos sem alto impacto ou os grandes saltos que existem nas outras duas categorias. A ideia do Ballet Funcional é semear os benefícios físicos da dança, como o tônus muscular, a boa postura e questões cognitivas, pela alta exigência que as bailarinas têm em se concentrar para contar a sequência de passos e o tempo de música. A categoria se diferencia do Ballet Fitness pelo fato de a segunda modalidade apresentar exercícios de alto impacto, impróprios para pessoas de mais idade ou com problemas de saúde.
Por ser uma companhia nova, a PLESS apresentou poucos espetáculos, sendo eles “Cinderela” e, no final de 2016, “O Quebra-Nozes”, assim como a escola de Dicléa. A obra apresenta, em seu segundo ato, uma visita do “Quebra-Nozes” e da personagem Clara à Terra dos Doces, ou seja, Pelotas. Ao se apresentarem na cidade, as escolas mostram que a vida, algumas vezes, imita a arte.
- Escola de Ballet Dicléa Ferreira de Souza
Localização: Rua General Osório, 1427
Contato: (53) 3225-7975
- Academia Spazio – Fitness & Wellness
Localização: Rua General Telles, 710
Contato: (53) 3222-0491
Localização: Rua Santa Cruz, 2589
Contato: (53) 3028-0029
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