Pichação: Desabafo social ou problema social?

Por: Estevan Garcia e Vanessa Kleber

Arte ou vandalismo? Artista ou criminoso? Desabafo social ou problema social? Essas são algumas das questões que envolvem o ato de escrever, ou “rabiscar”, em propriedade alheia: a famosa pichação. A prática vem desde a antiguidade, onde ficaram registros desses atos nos muros da cidade de Pompéia, antigo império Romano e, até hoje, divide opiniões.

A pichação é uma forma única de expressão que se divide basicamente em três tipos, podendo ser separados historicamente em três fases. No entanto, nos dias atuais vemos todos esses tipos presentes nas paredes das cidades. A primeira forma de pichação no Brasil veio nos anos 60, junto com a ditadura militar. Era uma pichação de cunho político, contra a ditadura e sem preocupação estética com as letras (qualquer pessoa alfabetizada poderia ler). A segunda forma veio nos anos 80, junto com o movimento punk. As pichações eram voltadas para frases poéticas. A terceira e última forma de pichação vem nos anos 90. É voltada para o ego do pichador, para deixar sua marca registrada na cidade. Tem grande preocupação estética.

Quanto às possíveis causas da pichação, nos deparamos com três possibilidades: reconhecimento social, lazer/adrenalina e protesto. Uma das alegações a favor da prática e que, sim, faz todo o sentido, é a questão da voz social. Vivemos em uma sociedade de regime capitalista, onde grande parte das decisões gira em torno do capital. Dessa forma, quem não possui o capital é excluído dessas decisões. Uma forma de conseguir opinar nas questões de importância na sociedade (protesto) e obter certo reconhecimento social (pichação de nomes, voltada para o ego do pichador) é através da pichação. A alegação contra a prática é que é vandalismo, não é arte. Que “destrói” e depreda a propriedade pública e privada.

Uma questão importante de se considerar é o conceito de arte. Segundo o site significados.com, Arte é “a atividade humana ligada a manifestações de ordem estética, feita por artistas a partir de percepções, emoções e ideias, com o objetivo de estimular esse interesse de consciência em um ou mais espectadores, e cada obra de arte possui um significado único e diferente”. Como podemos ver, o conceito é, de certa forma, subjetivo. Não temos uma definição de arte direta ou fechada. Levando em conta que a pichação é uma manifestação de ordem estética, pode ser feito através da percepção, emoção ou ideias, tem o objetivo de estimular o interesse de consciência em um ou mais espectadores, e que cada pichação possui um significado único e diferente, concluímos que sim, pichação pode ser arte.

Uma possível explicação da revolta contemporânea contra as pichações é a dificuldade de lidar com diferenças que fujam dos padrões. O padrão estético das construções contemporâneas é “branco” ou liso. Qualquer forma que interfira nesse padrão é considerada uma agressão. O mesmo exemplo pode ser dado em muitos casos. Um homem que anda de saia na rua pode ter sua atividade considerada uma agressão, pois está fora dos padrões da sociedade, que diz que saias devem ser usadas por mulheres. Vale ressaltar que esses padrões podem – e devem – ser quebrados.

Entrevistamos Jéssica Porciúncula, 23 anos, estudante de artes visuais da UFPel, que nos falou um pouco da sua opinião sobre pichação: “A cidade se expressa, a cidade grita, e é nos muros que a gente ouve! Eu amo a sensação de ver no desabafo de um desconhecido um sentimento mútuo e/ou novo, seja numa crítica social ou no íntimo significado de uma poesia ou desenho. A pichação pra mim é um vômito, uma brecha pra respirar, apesar de ilegal ou pelo fato de ser ilegal. E além de necessária ela é parte da poética de uma cidade. É a cidade sendo gente e a gente sendo cidade. Uma cidade sem pichação é uma cidade sem arte”.

Já a estudante de jornalismo da UFPel, Renata Fraga, de 23 anos, tem uma opinião contrária: “Sou de opinião contrária às pichações, porque mesmo que algumas sejam em forma de protesto ao governo – o que na maioria das vezes não são, e sim apenas nomes e apelidos rabiscados – eu não acho que seja sujando a cidade que se consiga mudar algo. Diferente dos grafites que trazem cor, cultura e arte para quem estiver passando. Pichar os muros, na minha opinião, é só para demarcar um território que não é de direito de quem pichou e sujar um lugar que é nosso e que deveria ser bem cuidado e preservado”.

Contra ou a favor, uma coisa é certa: a pichação vai muito além de apenas sujeira e destruição. Pichação envolve questões socioculturais que precisam ser muito bem analisadas antes de um julgamento.

O documentário “Pixo”, lançado em 2010, feito pelo diretor João Wainer, retrata muito bem a história da pichação em São Paulo. Além disso, mostra os reflexos socioculturais dessa prática. Assista e se informe.

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