A volta do que já foi: comércio de discos de vinil em destaque em Pelotas

Por Monique Heemann

Os primeiros vieram quando ainda não tinham onde ser tocados. In Utero e MTV Unplugged in New York, dois discos da banda de rock dos anos 1990 Nirvana, iniciaram a coleção de discos de vinil do estudante de jornalismo Diego Macht. A vitrola ter vindo depois dos discos pioneiros, resgatada da garagem da família, é uma situação que pode dizer muito sobre os colecionadores do produto atualmente: mais do que o som – que alguns julgam de melhor qualidade –, discos de vinil referem-se a outras coisas além de lazer. A eles, pertence uma aura que remete à conservação do passado.

O comércio de antiguidades tem crescido nos últimos anos em Pelotas. Mas engana-se quem pensa que tal peculiaridade é exclusividade nossa. A Nielsen SoundScan, sistema de informações que contabiliza os resultados dos mercados fonográficos americano e canadense, apontou que, nos Estados Unidos, o mercado de discos de vinil cresceu mais de 50% em 2014. Segundo o The Wall Street Journal, cerca de 9,2 milhões de LPs foram vendidos no ano passado no país – um aumento de 53% em relação a 2013.

Seguimos, portanto, a tendência mundial. Mesmo contando com apenas uma fábrica de vinis, a Polysom, o Brasil acompanha cada vez mais artistas investirem em lançamentos no formato.

(Foto: Divulgação)

(Foto: Divulgação)

O Mercado Livre, site de comércio online, registrou, em 2013, um aumento de 6% na venda de discos de vinil – que hoje respondem por 27% do volume no seu setor de música. “O mercado no Brasil evolui de forma muito parecida com o americano e o europeu, onde praticamente 100% dos artistas lançam seus discos simultaneamente em vinil”, afirma o consultor da Polysom João Augusto.

            As livrarias são pontos em que a venda desse tipo de produto costuma ter êxito. O diretor comercial da Livraria Cultura, Rodrigo de Castro, conta que o comércio de LPs novos teve um aumento de 35% só no primeiro semestre de 2013.

Incentivo ao comércio de antigos

Quem passa pelos arredores do Mercado Público de Pelotas aos sábados, entre o horário que antecede o almoço e a tarde, certamente notou a movimentação incomum que há algum tempo invade o Largo Edmar Fetter. O Mercado das Pulgas, feira que tem acontecido na cidade desde maio de 2014 e que mudou-se para a praia do Laranjal durante o verão, acontece das 10h às 17h e tem a maior parte de seu acervo composta por objetos antigos e usados – são discos de vinil, livros, móveis e outras quinquilharias que disputam a atenção de quem visita o local.

            O comerciante Marco Cunha vende discos de vinil há 15 anos. Distribuídos em incontáveis caixas por sua loja, Woodstock, em Pelotas, os LPs usados são seu principal produto, apesar de também trabalhar com novos. Ele encontra na internet a possibilidade de revender os produtos de maior valor e raridade, os quais poderiam ficar escondidos de um potencial comprador se fossem oferecidos apenas na loja física. Além do Mercado Livre, Marco possui um blog onde divulga suas novas aquisições.

            Marco acredita que o aumento na procura por esse tipo de objeto aumentou, em grande parte, em razão das reedições. Muitos antigos colecionadores, a partir delas, retomaram suas coleções. Quando perguntado sobre a relação emocional que estabelece com os “bolachões” e seu peso na hora de vendê-los, ele relata orgulhoso que hoje, 15 anos depois, dificilmente encontra algo que não tenha. “Se é algo que quero e ainda não tenho, não vendo”, confessa. A participação no Mercado das Pulgas é algo que ajuda a divulgar seu acervo e também atrai novos clientes.

Revolução online

            Se antes objetos usados ficavam em estocados em prateleiras, muitas vezes escondidos de possíveis compradores, hoje a internet tem revolucionado o comércio desses produtos. Tal crescimento, que se dá através da comercialização de itens de valor relativamente baixo, é possível graças à “cauda longa”, termo inventado pelo jornalista americano Chris Anderson. Para Anderson, produtos em volumes baixos, que nem sempre interessam a grandes varejistas, podem ser um ótimo negócio se reunidos na internet. Quando isso é projetado em um gráfico, percebe-se que, mesmo que os produtos tenham pequeno valor por item, o comércio envolve uma quantidade quase infinita em número de itens, o que forma o desenho de uma longa cauda – a origem do termo.

            Há quem atribua a grande procura por objetos antigos a uma reação que busca equilíbrio em relação ao nosso mundo moderno, em que tudo é fugaz, fluido, líquido – como diria o filósofo polonês Zygmunt Bauman, autor da obra Modernidade Líquida, lançada no Brasil pela editora Zahar. Existe também quem defenda as vantagens da revenda de itens usados por acreditar em um consumo sustentável. E há, ainda, quem acredite simplesmente na importância de resguardar a história de alguns objetos, e que preza, portanto, pela preservação do que já foi. De qualquer modo, o que parece mais importante é saber encontrar o melhor de dois mundos: aproveitar o que a modernidade nos oferece mas, também, saber conservar o passado e os frutos que ele deixou.

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