Inquietação narrativa

Carol Pinho / Em Pauta

Holden Caulfield, o controverso personagem criado por Salinger, diz que um bom livro é aquele que, ao terminar a leitura, causa a vontade de pegar o telefone e ligar para o autor. Ao terminar O Apanhador no Campo de Centeio, a vontade que fica é de ligar para o célebre J. D Salinger para ter uma conversa sobre a sua principal obra.

Jerome David Salinger foi um escritor norte-americano que começou a escrever ainda criança e a partir de 1940 publicou diversos contos. Salinger serviu na Segunda Guerra Mundial e, após isso, estudou contos na Universidade de Columbia, universidade de grande prestígio nos Estados Unidos. Publicou o seu primeiro e mais famoso romance em 1951, O Apanhador no Campo de Centeio, que foi primeiro publicado em forma de série entre 1945 e 1946. A obra foi recebida muito bem desde o primeiro momento, e viria a se tornar um Best-seller aclamado pela crítica. É considerado um livro muito polemico, principalmente devido ao fato do assassino de John Lennon ter alegado que tirou da obra o incentivo para praticar o crime. Apesar disso, é até hoje um livro de sucesso e lido por muitos jovens e leitores no geral. J. D Salinger morreu em 2010, aos 91, devido causas naturais. Quando o autor morreu ele estava já em reclusão.

O enredo do livro é apresentado de forma cronológica. Narrado em primeira pessoa, o protagonista, Holden Caulfield conversa com o leitor diversas vezes. Inclusive, a primeira frase do livro é se comunicando com o leitor “Se você quer mesmo ouvir a história toda (…)”. Através do uso de diversas gírias e de uma linguagem particular, o livro flui rapidamente junto com os acontecimentos. A maneira que Salinger discorre causa, por vezes, um desconforto ao leitor, uma vez que o personagem mais de uma vez vagueia sem rumo pela cidade, deixando várias possibilidades abertas para o seu futuro.

O Apanhador no Campo de Centeio não possui acontecimentos muito grandes ou significantes, mas um apanhado de ocasiões quase banais, que se tornam profundas ao estarem acompanhadas dos pensamentos complexos do problemático protagonista. Essas cenas simples descritas por Salinger, como a cena final da irmã mais nova de Holden andando em um carrossel, causam grande inquietação no leitor, e isso se da principalmente pelos apontamentos do icônico personagem. Com o discorrer do livro, o leitor fica aflito esperando as atitudes contraditórias de Holden, que descreve os acontecimentos de maneira crua e direta.

Apesar de não ser uma obra autobiográfica, é possível notar características do autor na personalidade de Holden. O personagem principal é um jovem revoltado com a sociedade, que não consegue se encaixar nas diversas escolas que frequenta, segue sendo expulso das escolas e prefere se manter sozinho. O personagem dialoga com outros em diversos momentos na trama, mas sempre demonstrando sentimentos como tédio ou raiva direcionado aos que ele chama de “fúteis”. O próprio autor demonstrava esse aspecto antissocial, tendo se isolado da sociedade em várias ocasiões. Salinger fugia de todas as maneiras da fama, tendo publicado poucas obras após O Apanhador.

O Apanhador no Campo de Centeio é uma obra que vale a pena ser lida, é divertida e intrigante, e é uma das primeiras obras a abordar e focar especialmente na vida do jovem. Teve grande impacto nos Estados Unidos e ao redor do mundo, mas não chegou a ser adaptada ao cinema por preferência do próprio autor, que se isolou completamente da mídia e nunca permitiu que tal feito acontecesse. Ainda sim, o final de semana de Holden narrado em 256 páginas (224 no original), não precisou de adaptação cinematográfica para marcar diversas gerações e permanecer sendo lido até hoje, quase 70 anos após sua publicação.

 

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