Por Ronaldo Luis
Espaço público histórico da cidade sofre dificuldades com a pandemia
O Mercado Público Municipal de Pelotas, “foi construído a partir de 1846, quando Dom Pedro II, em passagem pelo Estado, veio à cidade. Essa visita do monarca foi determinante para irradiar no povo pelotense o desejo de tornar a cidade desenvolvida e próspera. O local escolhido para a construção do Mercado era um terreno próximo à Praça da Regeneração (atual Praça Coronel Pedro Osório)”. Esta passagem do livro “Mercado Central de Pelotas 1846- 2014”, do jornalista Klécio Santos, evidencia a importância desta edificação que tem importantes significados simbólicos e históricos. Atualmente, não apenas a direção ou proprietários de bancas, mas também o povo pelotense vem enfrentando a pandemia do coronavírus, Covid-19, o que vem se refletindo nas atividades comerciais e culturais do Mercado.
Foto antiga com vista da edificação no Centro da cidade
Nosso Mercado sempre ofereceu atrações artísticas aos seus visitantes, hoje prejudicadas pelos constantes decretos municipais e estaduais em função da pandemia que vivemos. O local, além de exercer sua função de centro comercial, também proporcionava shows à população local. Infelizmente a pandemia zerou completamente essa prática cultural artística, deixando as empresas literalmente com as mesas vazias. Os proprietários estão desesperados querendo trabalhar, mas entendem a importância da necessidade de distanciamento social. A hora não é propícia às aglomerações. “Aos poucos o Mercado está reagindo e talvez num breve momento tudo volte à normalidade e as mesas voltem a sorrir”, disse a cliente Margarida Prestes.
De janeiro de 2020 para cá, tudo foi fechado e os proprietários sujeitos às multas caso decidissem por reabrir e causar aglomerações. Com isso as relações dos empresários com os músicos ficaram deterioradas. Hoje teriam dificuldade de contratar e pagar caso resolvessem recomeçar com atividades artísticas.
De acordo com o empresário Antonio Souza, ex-locatário de uma banca no Mercado, seu espaço comercializava produtos variados de várias partes do Brasil, como o queijo de Minas e o melado de Santa Catarina, além de alguns itens vindo do exterior, como bananas que vinham de Montevidéu devido sua qualidade. Quando aconteceu o início da pandemia, com o distanciamento social, fechou as portas do seu estabelecimento e nunca mais abriu a banca.
Espaço urbano em torno do Mercado é voltado para programações artísticas Foto: Ronaldo Luis
Construção e história
A população local considera o Mercado um símbolo de tradição histórica do povo pelotense, localizado no sul do País. Naqueles dias de áurea época social, a cidade começava a ser desenvolvida e próspera. Suas sucessivas administrações sentiram a necessidade de realizar obras dando estrutura para todo o comércio ribeirinho, as charqueadas, e o que vinha do interior trazendo insumos para a população e abastecimento dos navios que aqui vinham, em busca do charque, e seguiam rumo ao continente europeu.
Junto ao desenvolvimento local, o comércio também reivindicou um local para as trocas entre os produtores e vendas dos produtos. Surge assim a imponente construção iniciada em 1846 do Mercado Público de Pelotas. Atendeu durante séculos às necessidades da população pelotense, que ali comercializava todos os produtos alimentícios. Junto a esse crescimento veio também o desenvolvimento regional com a formação populacional dos bairros em torno do centro da cidade de Pelotas.
As obras do Mercado foram finalizadas em 1852, sendo considerado por muitos viajantes que passaram pela cidade como sendo superior ao Mercado Público de Porto Alegre e Rio Grande, comparado ainda com o Mercado da Candelária no Rio de Janeiro. Atualmente a edificação é o mais antigo remanescente do País. No entanto, ao longo dos 170 anos de existência do local, o mesmo foi sofrendo degradações, tanto naturais como provocadas pelo descuido do ser humano.
Reformas acrescentam torre e farol
Em 1912, o Mercado sofreu a primeira grande reforma, na qual modificou a fisionomia do prédio, o projeto na ocasião foi do arquiteto Manoel Barroso Assumpção. No período de 1911-1914, o Mercado sofreu uma reformulação profunda em termos de plantas e fachadas, obras dirigidas pelo engenheiro Manoel Itaqui; nesta fase o prédio recebe, além de mudanças de acessos, a torre do relógio e o farol de ferro, importados de Hamburgo, na Alemanha, fazendo uma alusão à Torre Eiffel de Paris. Do farol emergia luz de uma poderosa luminária rotativa, que espargia raios para todos os quadrantes. Vista de longe, identificou a cidade por muitos anos. Contam moradores da Cascata e Três Cerros que, à noite, era possível ver o famoso farol do Mercado.
Torre foi acrescentada à edificação no início do século XX Foto: Ronaldo Luis
Na planta anterior, os acessos eram apenas pelas esquinas em chanfro coroados por um frontão triangular. Já, na planta de 1914, o partido e a volumetria modificaram-se, tornando os acessos centralizados nas fachadas e torreões nas esquinas, com suas circulações internas em cruz, com um arcabouço central apoiado em 74 colunas de ferro, com tesouras ligadas por vigorosas vigas de ferro abertas em ogivas e com vitrais nas ogivas laterais.
Na planta de 1914 acessos são centralizados nas fachadas e torreões nas esquinas Foto: Ronaldo Luis
O primeiro prédio é de linhas simples apresentando um ritmo de cheios e vazios marcados pelas vergas em arco pleno no vão das portas. No seguinte os torreões recebem na platibanda ornamentos com guirlandas de flores e frutas em relevo, em estilo Art-Nouveau. Contava com 120 lojas dos mais variados tipos. O relógio e o sino existem até hoje.
Degradação e reforma recente
O Mercado foi perdendo sua função como polo comercial, passando por péssimas administrações. Tornou-se então um espaço sujo, mal iluminado e inseguro. Terminou caindo em erros administrativos crassos que o tornaram um espaço desorganizado, cujos produtos comercializados desfocavam das atividades para o qual havia sido criado. As lojas comerciais e os restaurantes estavam ao lado das bancas de peixes, com o seu odor característico nada agradável.
Em face desta deterioração e tendo em vista se valor histórico e simbólico, o nosso Mercado Público foi avaliado e contemplado com o programa Federal denominado, “Monumenta”, em 2001. Esse projeto prometia a transformação do ambiente e consequente revitalização que foi finalizada em 2012.
Novos erros críticos foram cometidos pela administração que aprovou um projeto que transformaria o local do Mercado, até então construído para troca de gêneros alimentícios, num mini shopping com a criação de pequenas lojas e bares restaurantes ao longo de suas galerias internas.
Arquitetura embeleza paisagem urbana de Pelotas Foto: Ronaldo Luis
Começava assim a atual história de um projeto que, mesmo modernizado, deixou de atender às necessidades da comunidade. O local era muito frequentado pela comunidade e visitantes. Porém a população, comercial e consumidora, inicialmente recusou a obra, tendo o local passado por longo período sem a procura de locatários.
Com o tempo, a frequentação ao Mercado voltou gradativamente, tendo em vista os serviços comerciais e turísticos, além das suas atrações culturais especialmente aos fins de semana. O Mercado Público continua sendo um lugar de lazer e compras até hoje, sobrevivendo ao tempo apesar dos erros administrativos e das lojas concorrentes. Junto à beleza plástica da obra arquitetônica do empreendimento, é dada a devida importância para a cultura grega, onde momentos mágicos se manifestam ao contemplar a estátua do deus Mercúrio, localizada na entrada sul do prédio. O período pós-pandemia promete uma nova retomada do Mercado Público com um lugar especial para a cultura da região.
Atuais instalações modernizadas do Mercado Fotos: Ronaldo Luis
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