O sangue e o sonho do estrelato em Pearl

Gravado ao mesmo tempo que X – A marca da morte, filme nos leva ao passado de uma das personagens do longa.

Por Giéle Sodré 

Poster do filme./Foto: Divulgação/A24

Dirigido por Ti West, assim como X – A marca da morte, mas dessa vez com produção e roteiro de Mia Goth, que interpreta a protagonista que dá nome ao filme e a antecessora (ou sucessora, já que Pearl se passa antes de X – A marca da morte) Maxxine, Pearl segue uma temática um pouca mais lúdica. 

Ainda recheado de sangue e cenas possivelmente impróprias, Pearl muda sua narrativa ao acompanharmos os sonhos transformados em delírios de nossa protagonista, filha de fazendeiros alemães que moram nos EUA em plena segunda guerra mundial. 

Além de uma mãe estrita, Pearl tem um pai paralisado após sofrer com a gripe espanhola que necessita de cuidados integrais. Essa situação a faz ficar cada vez mais desesperada pelo sonho de se tornar uma dançarina; uma estrela. No filme, nos vemos cada vez mais caindo nos delírios e enlouquecimento da personagem que demonstra pontas de crueldade desde o início, se desdobrando no começo de uma carnificina digna do gênero, mas ainda cheia de ódio e ressentimento. 

A edição de Ti West deixa um pouco a desejar em sua tentativa de dar um ar mais sonhador ao filme, mesclando pouco das fantasias com a narrativa da queda de Pearl para a completa loucura e barbárie. 

Mia Goth como Pearl./Foto: Divulgação/A24

Mas a atuação de Mia Goth se mostra incrível em um roteiro com muito mais espaço para que a atriz desenrole as emoções da personagem, seguindo monólogos muito interessantes e que constroem ainda mais a história que ali vemos. Desde as frustrações da mãe de Pearl serem comparativas as dela mesma, até a forma como sua construção de vida pode ter levado ao seu despencar.

Podemos, inclusive, atribuir mais dessa sensibilidade à própria escrita da atriz no roteiro já que não vemos o mesmo em seu predecessor. Ainda que Mia seja brilhante tanto em sua atuação de Pearl no primeiro filme como sendo a protagonista Max, que irá ganhar seu próprio longa na trilogia em breve. 

E ainda, além desse lado sensível tornar a trama mais interessante, a nossa experiência também fica muito mais desconfortável. Encarar o olhar perdido, porém beirando ao psicótico de Mia Goth nos leva ao mesmo sentimento dos personagens de dentro do filme com relação à principal: o medo e a angústia de saber que Pearl tem a capacidade de se tornar um monstro.

Talvez Pearl possa ser visto como um filme de liberdade e raiva femininas, uma temática repetitiva nos dois filmes. Suas frustrações com os sonhos e as constrições de suas épocas se desenrolam em ódio e violência, mas também alimentam uma solidão mais do que melancólica. Pearl sofre com a falta do amor e do apoio de sua mãe, sem conseguir se identificar com a vida difícil da mais velha e ainda sofrendo com o trabalho árduo e as comparações de sua rotina com as das meninas da cidade, desesperada por uma vida que é impossível ter. 

Seu desespero por aprovação a leva a cometer atos de violência, inclusive contra aqueles que mais deveria amar e vemos todo o escalonamento de maus tratos a pequenos animais até assassinato a sangue frio. Pearl é um filme de ânsias e desejos se tornando mórbidos, levando a loucura mais plena possível. E cria pontos em comum entre Pearl e Max, suas criações e seus desejos mais profundos acabando em sangue e dor. 

Mia Goth como Pearl./Foto: Divulgação/A24

No fim, Pearl é um ótimo complemento para a trilogia e mesmo com os pontos fracos em sua edição e a lentidão de desenvolvimento até mais da metade de sua duração, características de Ti West, consagra um lugar nos filmes de terror com melhor atuação e construção de personagem dos últimos tempos, trazendo ainda uma fotografia de deleitar os olhos e cenas inesperadamente belas para um longa de terror. Prometendo também lançar Mia Goth para novas alturas com sua atuação bem acima da média e talvez trazendo uma nova atriz queridinha para as telas do horror ou até mesmo da Hollywood tradicional. 

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