CRÔNICA: A síndrome dos preocupados

Por Marcelo Nascente

Eles andam pelas ruas, nos ônibus, nos supermercados. Vão à padaria, compram roupas, postam no facebook.

Eles abastecem seus carros nos postos de gasolina, vão à aula, assistem o jogo na tevê. Fingem fazer parte da sociedade, mas na verdade, o que querem é se preocupar.

Se preocupam com os números, as contas, os resultados. Mas, principalmente, se preocupam com a vida dos outros. Se preocupam com o que podem fazer para se preocupar mais. Porque não há tempo. É preciso ser preocupado.

No dia do julgamento final, os mais maduros, aqueles que chegaram à conclusão de que o importante era se preocupar, estes serão salvos. E conduzidos ao Vale da Preocupação Eterna. Onde gozarão felizes da liberdade de preocupação.

Mas, enquanto isso, é preciso saber o que se passa com todo mundo. Telefonar para avisar aos incautos, que por acaso ainda não souberem. A sobrinha do Beto foi morar junto com um cara estranho, todo tatuado.

– Eu sabia que ia dar nisso! Tanto que eu avisei. Me preocupei com essa guria a vida inteira…

O tempo é cada vez mais escasso. Não existem outras saídas a não ser se preocupar. Com coisas ou pessoas. Com os dois. Com a torneira que não para de pingar e com a chuva que a previsão do tempo anunciou.

Você já se preocupou hoje? Ainda dá tempo. Com o despertador que pode não tocar, com a luz da geladeira que parou de acender. Qualquer coisa pode ser um motivo em potencial. A lanterna do carro, o preço do gás, a fuga de investimentos do exterior.

De maneira alguma você pode ser um sujeito que queira viver sem se preocupar com alguma coisa importante, como o ganhador do reality show, a falta de papel higiênico no banheiro da faculdade. Sei lá… pode escolher. O que não pode, mesmo, é querer fugir disso, porque é uma falta de sensibilidade. Estamos no século XXI, tudo corre, os anos passam em oito meses, como assim você não vai ter pressa? Pelamordedeus!

Não basta se preocupar com o prazo de entrega do trabalho, com o cliente, com a fatura. É preciso mais. É preciso se preocupar com quem se preocupa com as suas preocupações (os que querem ajudar e os outros), com as normas, as regras de etiqueta. É preciso dispor de tempo para se preocupar em responder às expectativas. Em sorrir quando tem dor de barriga.

Eles sugam o mundo, sem tirar nada deste. Estão sugando o tempo de si mesmos. Ponteiros giram, alucinados. E as rugas se apossam de pedaços do rosto. Por que isso não preocupa os preocupados?

Não quero me preocupar com isso…

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