Existe futebol sem política?

Anúncio do presidente do Grêmio de que não concorrerá ao governo do estado reacende velho debate

Por Luis Collat 

Presidente do Grêmio Romildo Bolzan em entrevista coletiva no último dia 12/ Foto: divulgação – Grêmio TV

“Nesse momento eu disse a eles que não poderei aceitar, que vou concluir o mandato no Grêmio”. Essa foi a declaração de Romildo Bolzan, presidente do Grêmio, em entrevista coletiva na última semana sobre o convite do PDT, partido em que é filiado, para concorrer ao cargo de governador do Rio Grande do Sul.

A sua candidatura é um desejo antigo do partido, que sempre expôs essa vontade publicamente e não havia recebido resposta definitiva de Romildo até o presente momento. De acordo com o presidente gremista, essa demora pode ter afetado diretamente o ambiente interno de trabalho no Grêmio e também aumentado o descontentamento da torcida.

Na entrevista, o presidente destacou que sempre deu prioridade ao Grêmio e em nenhum momento dividiu seu foco com a possibilidade de se candidatar. Disse que nunca cumpriu agenda como pré-candidato, mas não abdica do direito fundamental de ter uma vida política fora das dependências do clube.

Para o torcedor que viveu uma montanha russa de emoções na gestão do atual presidente, chegando a um título da Libertadores em 2017 e disputando a Série B do Campeonato Brasileiro em 2022, nada do que poderia ser dito nessa entrevista iria soar completamente positivo, afinal, a moral de Romildo se mostra cada vez mais baixa com os gremistas.

No dia da coletiva, uma hashtag pedindo a saída de Romildo do cargo de presidente foi levantada no Twitter, chegando aos 10 assuntos mais comentados do dia. O argumento mais recorrente era de que “a política não pode se misturar com o futebol” e que “Romildo usou o Grêmio como palanque”.

Pegando carona nas críticas ao presidente, alguns torcedores direcionaram suas palavras também ao técnico Roger Machado por suas manifestações e pediram sua saída. Recentemente, Roger falou em entrevista sobre o combate ao racismo no futebol e destacou que muitos racistas se sentem respaldados pelas falas e condutas de Jair Bolsonaro para proferirem o seu discurso de ódio, o que desagradou a muitos apoiadores do Presidente da República. 

Enquanto parte da torcida usa da situação para reforçar sua ideia de que o esporte não é um espaço onde pautas políticas podem existir, outros acreditam que ambos não podem ser separados pelo fato do futebol não estar alheio à sociedade. É o caso de Arthur Fagundes, torcedor do Grêmio e filiado ao PCB.

Perguntado sobre o motivo de posicionamentos como os de Roger incomodarem tanto alguns torcedores, ele aponta o fato desses assuntos ainda não serem debatidos com frequência no meio futebolístico: “Não me recordo muito da última vez que as problemáticas da nossa sociedade tenham entrado em pauta no futebol. Pelo menos não de forma tão assídua. Talvez poderia citar as campanhas que o Bahia tem feito nos últimos anos”.

Arthur também aponta que o uso das pautas sociais como mercadoria é algo ineficiente na conscientização da população e não deve ser considerado positivo pelo seu viés comercial. “Lembrando também que existe marketing e existe campanha de conscientização, não podemos nos perder nesses movimentos. Precisamos de debates profundos sobre o racismo, machismo e lgbtfobia no futebol. E não de propagandismo puramente para vender. Que tenham trabalhos sérios dos clubes no combate a esses assuntos. Por falta desse tipo de ações que aparecem esses comportamentos dentro de certos núcleos, nas torcidas. Que por sua vez só refletem a despolitização da nossa sociedade ao longo dos anos”.

Em relação ao caso de Romildo, ele também se mostra insatisfeito com a gestão e diz acreditar que a possibilidade de candidatura do presidente gremista pode ter sido prejudicial ao clube. “Não sou daqueles que acreditam que política e esporte não se misturam, muito pelo contrário. Porém a institucionalização de um clube da magnitude do Grêmio e na situação que o mesmo se encontra,  deve ser tocada de forma exclusiva, sem nenhum desvio. Não foi um movimento de quem tenha lido a conjuntura atual do estado e do país, muito menos de quem está 100% focado em tirar o clube desse lugar desconfortável”, completou.

Independentemente dos questionamentos feitos pela torcida, Romildo Bolzan deve cumprir todo seu mandato, que tem duração até o final deste ano.

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