A cultura da tatuagem no século XXI
Por Estevan Garcia
Mesmo sendo uma prática milenar, as tatuagens ainda causam dúvidas na sociedade contemporânea.
Arte, estética, personalidade, marcas de etapas da vida, destruição da pele, absurdo, marginalidade. Essas são algumas das opiniões e compreensões possíveis de muitas pessoas sobre tatuagens. Essas diversas formas de ver o que cada um faz com a sua pele causam dúvidas e receios a quem gosta e pretende se tatuar. Incertezas quanto à aceitação no mercado de trabalho, e a possibilidade de sofrer preconceito de terceiros são alguns desses medos.
Diferente do que alguns podem pensar, as tatuagens não são meros modismos dos séculos XX e XXI, usados por jovens para demonstrar sua rebeldia. O registro mais antigo sobre tatuagens é o do Homem de Ötzi, múmia com mais de 5300 anos encontrada no Vale Ötztal, na Austrália. A múmia possuía mais de 50 tatuagens que, segundo estudiosos, tinham significados religiosos. Além deste caso, também podemos citar as descobertas de uma múmia egípcia, do sexo feminino, que viveu entre 2160 e 1994 a.C. Esta possuía traços e escritas na região abdominal, o que se leva a pensar que seria algum ritual de fertilidade. Os nativos da Nova Zelândia, os Maoris, por exemplo, se tatuavam a fim de distinguir os integrantes de diferentes classes sociais. Entre os anos de 509 a.C. e 27 a.C. os imperadores romanos tatuavam seus prisioneiros e escravos para que não fossem confundidos com súditos mais afortunados.
Depois de Cristo as tatuagens deixam seus registros entre os séculos 15 e 17, quando ocorreu a invasão da Bósnia e Herzegovina pelos turcos otomanos. Nesse episódio da história, os católicos faziam tatuagens de cruzes para evitar ter de rezar para Alá. Um dos primeiros projetos de máquina de tatuar foi criado em 1875 pelo inventor Thomas Edison (1847- 1931), o mesmo a inventar a lâmpada. Em 1891, Samuel O’Reilly aperfeiçoou a criação e a patenteou. Durante a Segunda Guerra Mundial, os nazistas tatuavam um número no corpo dos judeus, a fim de identifica-los nos campos de concentração. No ano de 1998, a empresa de brinquedos Mattel lançou a Barbie Butterfly Art. A mesma vinha com tatuagem lavável. Entre altos e baixos, a tatuagem foi se consolidando na sociedade e hoje atinge grande número de pessoas.
Pessoas tatuadas sofrem preconceito no século XXI?
Apesar do crescimento do número de tatuados, o preconceito sofrido por quem decide tatuar a pele ainda existe. Muitas vezes é sofrido na própria casa de quem se tatua. Samanta Pedroso, porteira da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), três tatuagens, é exemplo disso. “Meus pais ficaram dias sem falar comigo depois que me tatuei”.
Em contrapartida a isso, o tatuador Pierre Moraes, 24 anos, afirma que o preconceito está diminuindo. “Tatuei muitas pessoas esse ano, e o número vem crescendo cada vez mais”. Ao ser questionado sobre o perfil de quem decide tatuar a pele, o tatuador afirma que hoje em dia não existe mais um estereótipo, pois pessoas de todas as idades aderem a pratica, sendo as mulheres a maioria.
Rejane Ferreira, 51 anos, professora de filosofia e sociologia, é uma delas. Com 13 tatuagens espalhadas pelo corpo, sendo a primeira feita aos 21 anos, e todas as outras depois dos 30, ela afirma que nunca sofreu preconceito. “O máximo que recebo, às vezes, são comentários de colegas. Eles dizem ‘Como teve coragem?’, ‘Tatuagem é para sempre!’ e ‘Quando eu ficar velhinha, como vai ser?’. Já os alunos adoram, acham muito legal uma professora com muitas tattoos”.
Eduardo Argoud, 27 anos, diretor de arte, três tatuagens, conta que em seu ramo as tatuagens são muito comuns: “Como é uma área que trabalha com criatividade acho que é uma forma de mostrar as referências estéticas e criativas da vida de cada pessoa, uma forma de comunicar quem somos, como um “outdoor” ambulante com uma narrativa visual de elementos que fazem sentido na vida do profissional.” Quanto ao preconceito no mercado de trabalho, Eduardo afirma que na sua área não existe, diferente de áreas mais conservadoras.
Quem são os tatuados do Brasil?
Por incrível que pareça, não existe um censo oficial sobre pessoas tatuadas no Brasil. Porém, a revista Super Interessante, em março de 2014, se propôs a fazer isso. Segundo a pesquisa, feita nas redes sociais, que entrevistou cerca de 80 mil pessoas, a maior parte dos tatuados no país são mulheres.
A idade dessas pessoas é entre 19 e 25 anos, formados ou no ensino superior. Ainda segundo a pesquisa, 43,5% afirmam não ter religião. No ano de 2010, entre as tatuagens mais feitas estão símbolos (20,2%), frases (15,6%) e animais (12,9%).
Se as tatuagens são uma moda, é a moda mais antiga e duradoura do mundo. Com o grande crescimento do número de tatuados, pode-se concluir que se o mercado de trabalho ainda não está adaptado às pessoas com desenhos pelo corpo, vai ter que se adaptar. Uma coisa é certa: a prática veio para ficar.