Juliano Guerra: álbum solo
Texto de Felipe dos Santos Madeira –
CD – Crítica –
“Sexta-Feira” é o segundo álbum solo do músico e compositor canguçuense Juliano Guerra. Lançado em março de 2015, o disco, pré-produzido em parceria com o baterista e percussionista Davi Batuka, além de inteiramente gravado e finalizado em Pelotas, de maneira independente, traz na capa ilustrações de Odyr Bernardi e design gráfico da Nativu Design. O álbum é distribuído pelo selo Escápula Records e está disponível para download gratuito no site do artista, além de venda em lojas de CD’s e serviços de distribuição digital como Deezer, iTunes e Spotify.
“Sexta-Feira” é composto por dez músicas que totalizam aproximadamente quarenta minutos de casamento entre voz e melodia. Interagem nas músicas do disco instrumentos como acordeom, baixo, bandolim, bateria, cavaco, pandeiro, teclado, violino, violão e violão sete.
Guerra, o transeunte em busca de paz, traz uma obra mais madura e delicada. A música que abre o disco, intitulado com o mesmo nome, “Sexta-Feira”, primeiramente evoca alegria e leveza mas, como outras canções do artista, esconde verdades e inquietações. “Um hino” é serena, tanto em melodia quanto em letra e fala de amor de uma forma para além do significado conhecido, carregando uma poesia para além da rima. “Biografia” é sem dúvidas o ápice de “Sexta-Feira”. A intimidade expressa na letra e o ritmo que tende a remeter à música popular brasileira de três décadas atrás solidificam o casamento entre a tristeza e a beleza. “Vi Vir Veio” apresenta um anjo vindo da FEBEM, destroça o vulgar na cor marfim e brinca com tempos verbais, fazendo deles instrumentos para levar sua mensagem de forma mais clara. Amor e ódio deixam de ser polaridades opostas em “Vi Vir Veio”, para confundirem-se no decorrer da canção, tornando-a uma obra aberta, sem delimitações claras e acima dos tempos as quais brinca.
A música “1983” faz uma crítica ao estilo “31 de dezembro”, segunda música do álbum “Lama”, sutil porém forte, e ganha corpo quando, dentre os versos, apresenta-se como resposta a uma outra crítica a qual o músico recebera pelo modo de vida. “20 Cigarros Por Dia” contesta a mídia e a indústria de remédios, que promete curar qualquer coisa, inclusive a tristeza, independente de sua causa. Além disso, a letra vai da oração a uma transmutação da imagem da mulher. “De Improviso”, como diz o nome, traz impressões que vão do improviso à curiosidade inerente ao homem que caminha sem saber ao certo o porquê. As várias vozes em uníssono cantando “Conte Comigo” transferem beleza e especulam a curiosidade já desperta pouco antes, como que querendo brincar com a confusão gerada pelo final da canção: continuação ou fechamento?
“Sexta-Feira” não é um álbum para ser ouvido apenas na sexta-feira, mas em todos os dias que a ideia de um violino e um cavaco juntos não causarem estranheza. “Sexta-Feira” fala sobre fé, sobre o tédio, sobre se perder, vaguear, sobre perigos e altares na caminhada. Inúmeros são os motivos para indicar o álbum, mas, por ora, basta o simples fato de que Guerra brinca com os versos como uma criança brinca com a própria sombra, sem medo de fazer feio e sem pretensão de ser aplaudido. E isso, já é motivo o suficiente para embelezar a obra ainda mais. As músicas também estão disponíveis no YouTube.
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DunasCine: cinema e reflexão
Reportagem de Maiara Marinho –
Projeto visa a produção cinematográfica como uma forma de compreender a realidade social –
A cultura expressa através do cinema, da literatura, do teatro e outras tantas formas de manifestação é uma ferramenta também de construção de significados e contribuição para o imaginário social. Dessa forma, ela é feita com alguma intenção: desde demarcar um espaço de privilégio até a resistência política. Mas, também, como forma de emancipação. Assim surge o projeto DunasCine. Realizado no Centro de Desenvolvimento do Dunas (CDD), em Pelotas, o projeto tem como objetivo uma prática cinematográfica através de oficinas de fotografia, audiovisual, edição de vídeos e, também, de construção de roteiro com uma temática sobre o próprio bairro. Tudo isso vai gerar um documentário feito por estudantes de 12 a 17 anos, das escolas do bairro Dunas. O autor do projeto, Felipi Pimentel, conta que a ideia surgiu através de uma cadeira que teve no curso de cinema sobre cinema e educação. Felipi é estudante de Filosofia da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), mas reconhece no audiovisual um espaço importante de inclusão e participação cidadã. Ele relata que aprendeu a usar o cinema como uma ferramenta pedagógica, e a fazer cinema como um aprendizado de vida. “Aí eu tava com a ideia, procurei alguns editais, tinha um da Secretaria da Cultura, me inscrevi e passei”, descreve.
O primeiro encontro foi realizado no dia 13 de outubro no próprio CDD, local utilizado durante todo o projeto. Um espaço em comum do bairro onde outras iniciativas são realizadas. Alice, estudante do sexto ano da escola Saldanha da Gama exclama que quer “aprender tudo”. “Principalmente do audiovisual, sempre gostei de fotografar”, diz a estudante que tem como sugestão de tema a violência e as drogas. João também sugeriu o debate da violência, mas enfatizou que é “pra falar o que não falam, falar a realidade”. Estudante do nono ano da escola Jornalista Delgar Soares, João tem interesse nas entrevistas em audiovisual e afirma com relação às imagens mostradas no início das atividades: “Quero fazer que nem eu vi no vídeo”.
A expectativa de Felipi Pimentel é que seja possível aprender junto e se aprofundar dos temas que vão surgir como sugestão para o documentário que será feito pelos próprios estudantes. Assim, como alguns levantaram o tema da violência, é importante fazer uma discussão de por que as pessoas consideram esse bairro o mais violento. Ele é ou não é violento? Por que sim? Por que não? Por que as pessoas pensam que é? “Eu acho que tem que fazer uma reflexão acerca disso e não só expor algum fato, mas pensar sobre ele e formar uma opinião de forma mais consistente, uma forma que consiga analisar as coisas e não só dar uma visão direta”. Com isso, o projeto DunasCine fala, através de sua prática, sobre cidadania. Com previsão para ocorrer até o final deste ano, está dividido entre oficinas práticas de fotografia, audiovisual, edição, construção de roteiro e debates sobre as temáticas apresentadas. Até o momento participam do projeto cerca de 10 estudantes e os encontros acontecem toda segunda-feira.
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Clubes culturais negros
Reportagem de Juliana Rossler Ramires –
Entidades têm valor histórico e sua importância está na valorização de uma identidade cultural –
A finalidade principal dos clubes culturais negros no Brasil era reunir os afro-brasileiros que não tinham possibilidade de frequentar outros lugares que proporcionassem lazer e sociabilidade. Hoje esses locais se tornaram espaço de convivência e de preservação das práticas culturais, assim como um espaço de resistência para os movimentos negros na luta e manutenção dos direitos. Em Pelotas, dois clubes ganharam destaque pela sua trajetória histórica, o Chove não Molha e o Fica Ahí Dizendo.
A cidade de Pelotas é uma cidade histórica, cujo seu primeiro registro como local de moradia faz referência a junho de 1758. Seu ápice econômico aconteceu no século XIX, sua principal fonte de riqueza, na época, eram as charqueadas que exportavam carne salgada para os demais estados brasileiros. Se o produto era a carne salgada, a força motriz da economia pelotense era a mão de obra de escrava.
De acordo com Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico do Estado (IPHAE), Pelotas no século XIX, abrigava cerca de 10 % da população negra da Província, devido aos trabalhos nas charqueadas. No pós-abolição, em princípios do século XX, a formação dos clubes sociais e cordões carnavalescos, representavam a busca de novas formas de inserção em sociedade desigual e fortemente discriminatória.
Em 27 de fevereiro de 1921, foi criado o Cordão Carnavalesco Fica Ahi Pra Ir Dizendo, como um dos blocos negros de Pelotas. Diferentemente dos demais grupos, a iniciativa perdurou o carnaval e em 1948, o Cordão virou clube carnavalesco. No ano seguinte foi fundada a Academia de Samba Fica Ahí, que posteriormente assumiu uma identidade autônoma. No ano de 1953, o Fica Ahí finalmente torna-se clube cultural e passa a desenvolver uma série de atividades de cunho social para os seus associados. Desde de 1954, o clube está localizado na Rua Marechal Deodoro n° 368.
O clube Chove não Molha foi fundado no dia 26 de fevereiro de 1919, com a ideia apenas organizar um grupo para festejar o carnaval, posteriormente, foi criado o Grupo Carnavalesco Chove não Molha. Em 1966, houve seu reconhecimento como utilidade pública, passando a denominar-se Clube Cultural Chove Não Molha.
Atualmente nos espaços físicos dos clubes, são desenvolvidas atividades culturais relacionadas à temática negra. O Fica Ahi Pra Ir Dizendo foi tombado no âmbito estadual por representar um espaço de memória e preservação da cultura afro-brasileira no pós-abolição.
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El Arte Es Revolucion!
Reportagem de Estevan de Freitas Garcia e Mariana Argoud –
Criação artística, gastronomia e América Latina: o projeto Mucha Arte do Madre Mia! –
EL ARTE ES REVOLUCION! Essa frase, escrita na parede do local, expressa a importância da arte dentro do bar, restaurante e galeria de arte Madre Mia!. Por lá, a arte está por todo lugar: no balcão, nos pratos, nos apoios de copo e nas paredes, com obras de artistas latino-americanos. Com a proposta de “RestoArte”, o sócio-proprietário do local, Raul Garré, quer que o restaurante vá além da gastronomia, com projetos criativos e uma galeria de arte. O Madre Mia! vem se tornando um importante espaço artístico e cultural da cidade de Pelotas.
A galeria faz parte do projeto Mucha Arte, iniciativa que conta com a curadoria de Rafael Barros e convida, de seis em seis meses, artistas de toda a América Latina a expor nas paredes e, assim, também fazer parte da identidade visual do restaurante. O Mucha Arte tem como objetivo, também, mostrar a evolução da produção criativa tanto da cidade quanto de todo “mundo latino”, além de fazer a arte mais acessível e, conforme anunciam as paredes do local, “…revelando o sentimento, a energia e alma sobreposta em cada trabalho”.
Rafael Barros conta que, para fazer parte de uma exposição, basta ter uma produção, algumas séries já desenvolvidas. Ainda, conforme o curador, entre os critérios levados em conta para os artistas fazerem parte de uma exposição, o principal é a afinidade dos trabalhos com o espaço. “Normalmente o convite parte de nós mesmos, mas também recebemos indicações, ou o próprio artista é quem entra em contato com a gente”, afirma. Outro ponto que Rafael destaca é a importância de dar oportunidade a artistas novos, convidando-os para expor: “Em todas as edições do projeto, sempre tiveram um ou mais artistas que estavam expondo pela primeira vez. Isso é muito importante para nós, pois nos sentimos parte dessa evolução, sabendo que depois da primeira exposição, muitas outras surgirão naturalmente. Estamos sempre atentos às novas produções!”, ressalta.
Pablo Conde, artista e ilustrador pelotense, expôs duas vezes no local e afirma: “Expor no Madre Mia! transformou o meu trabalho!”. Ele conta que começou a desenvolver uma produção artístico autoral a partir do convite de participar de uma exposição no Madre Mia!, no início do projeto. Para ele, fazer parte da galeria proporciona algo que vai além da visibilidade: “Possibilita a convivência e troca de experiências com artistas de todo o País. Eu já dividi uma parede com o Rafael Sica, por exemplo, que é uma referência nacional como quadrinista”, destaca.
O Madre Mia!
O Madre Mia!, além da galeria de arte, é um restaurante focado na cultura latina, com pratos e bebidas típicas. Durante o ano, realiza eventos de rua com temas diversos, que conta com música, comidas e torneiras de chope. Fica localizado em Pelotas, na rua Santa Cruz, 2200, e fica aberto de segunda a segunda. As exposições são divulgadas na página do Facebook do RestoArte.
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Teatro promove inclusão social
Reportagem de Carina Reis e Rafael Viana –
O Grupo Evangélico de Teatro Sentinelas pertence à Igreja do Evangelho Quadrangular de Arroio Grande –
Não é de hoje que a arte expressa diversos tipos de sentimentos, fruto de muito estudo e cuidado. Preparar um cenário, contar uma boa história e ter o talento para interpretação são algumas das características que fazem do teatro um grande disseminador de ideias e influenciador. Sua prática também contribui para a inclusão social.
Transformando-se em uma grande ferramenta de transmitir mensagens, o teatro ocupa diferentes espaços, inclusive em ambientes até então inusitados, como por exemplo, a igreja. Na cultura religiosa, sempre houve manifestações artísticas, como música, dança e o teatro, porém, as peças teatrais neste ambiente tinham como objetivo retratar cenas de celebrações, como o Natal e a Paixão de Cristo.
Atualmente o teatro tem crescido e ganhado reconhecimento nesse ambiente, que ultrapassa as barreiras religiosas e emerge como um canal de mensagens, promovendo a criação de novas companhias que praticam e estimulam o estudo desse tipo de arte, servindo assim como instrumento de inclusão social. É o caso do Grupo Evangélico de Teatro Sentinelas, que pertence à Igreja do Evangelho Quadrangular de Arroio Grande e desenvolve um trabalho com os jovens da comunidade.
O grupo surgiu da necessidade de consolidar os talentos que já se apresentavam de maneira informal. Por isso, no ano de 2013, eles assumiram a responsabilidade de estudar mais sobre técnicas de teatro, e desde então toda semana promovem as aulas de expressão corporal, expressão facial, memorização, improvisação, criação de personagens, canto, dança e demais métodos que são utilizados nas apresentações.
Os espetáculos do Grupo Sentinelas não são restritos aos templos. Eles ingressam em eventos promovidos pela Prefeitura de Arroio Grande e programações realizadas por escolas. De acordo com Clayton Reis – diretor do Grupo de Teatro Sentinelas -, o trabalho da equipe é baseado na famosa Companhia de Teatro Jeová Nissi, que se apresenta no mesmo segmento e com grande sucesso, inclusive com a produção de filmes e peças que circulam todo o País. Uma das ações, através de uma parceria entre os dois grupos, foi a vinda da equipe Jeová Nissi à Arroio Grande, no qual o público pode prestigiar a apresentação.
Arte que Transforma
Um dos grandes objetivos do Grupo Sentinelas está em descobrir novos talentos na prática teatral. Um dos fatores relatados por Clayton é que já, no primeiro contato, através das oficinas de preparo, os participantes perdem a inibição através da interatividade com o grupo, além de despertar o interesse pelas técnicas abordadas nos ensaios. O Grupo, formado em sua maioria por jovens, apresenta roteiros adaptados ou de autoria própria, sempre primando por passar uma mensagem de conscientização sobre temas que envolvem a sociedade, e promovendo a transformação do indivíduo com base nos conceitos bíblicos. O diretor do grupo avalia que o teatro é uma das melhores ferramentas para transmitir a mensagem proposta. “Através do teatro, conseguimos entrar em lugares que normalmente a igreja não consegue ter acesso”, afirma Clayton Reis.
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Vídeo: Meu Tio Matou um Cara
Texto de Rafael Mirapalheta –
DVD – Crítica –
Do diretor Jorge Furtado, ‘‘Meu Tio Marcou um Cara’’ é um exemplo de como uma narrativa simples e genuína pode dar muito certo. A trama se foca no adolescente Duca (Darlan Cunha), que precisa lidar com as questões sociais da vida de um garoto de 15 anos como amigos, paixões e família. Tema recorrente nas produções de Furtado, como em “Houve Uma Vez Dois Verões” (2002) e “O Homem que Copiava” (2004). Mas a trama não se resume a isso, já que o arco central que desencadeia toda a história é o suposto assassinato confesso pelo tio Éder (Lázaro Ramos). A grande sacada do longa é a de não se fixar apenas na comédia. A premissa de uma confissão como a mencionada seria normalmente tratada exclusivamente ou pela comédia ou pelo drama. Mas o que o filme faz aqui é explorar a linha tênue entre essas duas possibilidades. Dosa de forma exemplar os acontecimentos cômicos com o drama vivido por Duca em relação à paixão não correspondida pela melhor amiga Isa. Esta, por sua vez, é apaixonada por Kid, amigo de ambos.
Um aspecto notório logo de cara é o da mistura de gêneros. Nos é apresentado pela história a realidade de Duca, menino negro que por várias vezes analisa situações através do ponto de vista étnico. Como por exemplo a sua piada sobre saber que jamais iria ser ofendido em seu colégio composto majoritariamente de pessoas brancas, pois elas ficariam receosas de serem acusadas de racismo. Questões como essas são sempre tratados com leveza e naturalidade, o que causa no espectador uma sensação agradável.
Porém uma grande virtude da obra de Furtado é a maneira como ela lida com os adolescentes. Aliás, de modo geral, o filme é sobre eles. Os jovens são destacados sempre como pessoas de ótima percepção, que são capazes de ver o mundo de forma crítica e inteligente, na medida que se mostram adaptáveis às mais diversas situações. Nada mais do que um retrato da sociedade em que vivemos, onde os jovens possuem cada vez mais afinidade com tecnologias, com a internet, e com as mais diversas tarefas do dia a dia. Como exemplos disso no longa-metragem destacam-se as cenas em que Duca sugere ao advogado da família o que deveria ser feito para que a polícia não suspeitasse de alguma mentira de seu tio. E também todas as iniciativas de Duca e Isa para contratar um detetive particular e as descobertas decorrentes disso. A narrativa feita pelo personagem principal, constante em todo filme, é uma artimanha que nos faz perceber tudo isso. Ela também cumpre o papel de exercer uma proximidade entre o Duca e o espectador, fundamental para nos apegarmos aos acontecimentos.
Por se tratar de um retrato de pessoas de classe média/baixa do Brasil, para o filme ser fiel à realidade, ele precisaria ter necessariamente diálogos genuínos. Aspecto que não se encontra tão facilmente no mundo do cinema e televisão brasileiro. Aí que entra o grande diferencial da obra; ela liga todos os pontos levantados e se encaixa com todo o contexto apresentado. Os diálogos são muito bem escritos e executados. Você consegue assistir e se identificar com o modo de falar dos personagens, com as expressões utilizadas, com as frases simples que são roteirizadas. Retratando exatamente como é feita a comunicação por grande parte da população, ao invés de textos caricatos que jamais condizem com a realidade de diálogo dos brasileiros e que vimos tão frequentemente por aí em novelas, séries e outros filmes brasileiros. Méritos também para as produções da Casa de Cinema de Porto Alegre, que sempre preza pela qualidade de diálogos em suas obras.
O filme vai chegando ao seu clímax com o afunilamento dos dois arcos centrais: a investigação do assassinato e a relação de Duca e Isa. A forma como elas foram interligadas se mostrou uma solução fácil para o roteiro, mas ainda assim bem executada. Após toda a revelação do caso, a interpretação de Lázaro Ramos funciona bem, pois o ator se mostra confortável no papel para maximizar suas caras e bocas. Não só ele, como também Aílton Graça, Dira Paes, Sophia Reis, Renan Gioelli, Deborah Secco e todo o elenco de apoio estabelecem um domínio seguro sobre seus personagens.
“Meu Tio Matou um Cara” é um exemplo de como uma narrativa simples e genuína deu muito certo. O filme é mais um grande acerto de Jorge Furtado e uma vitória em prol de um retrato realista do povo brasileiro, principalmente dos jovens. Uma recomendação mais do que indicada para os adoradores de filmes brasileiros.
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Terror 100% pelotense
Reportagem de Matheus Garcia –
Filme de terror produzido pela J&J Filmes e TC Cidade deve estrear em breve –
Uma novidade aterrorizante está para ser lançada em breve na cidade. Um longa-metragem de terror está sendo produzido em Pelotas desde janeiro deste ano. “O Filme” é uma produção totalmente local da produtora J&J Filmes, dos cineastas José Mattos e Julio Furtado. “Já fazia muito tempo que o Julio e eu queríamos fazer algo na área do terror porque é um gênero que nos interessa muito e do qual não temos muitas produções aqui”, disse o produtor e diretor José.
O roteiro foi pensado entre a J&J Filmes e o escritor André Rodrigues, que já havia participado de outras produções dos cineastas. “O André fez uma novela na TV Cidade uns anos atrás conosco. E como precisávamos de alguém para por no papel o esboço da nossa ideia, resolvemos chamar ele por conta do talento e da criatividade que tem”, contou Julio.
A TV Cidade é parceira da J&J Filmes na produção do longa e, segundo a diretora executiva do canal, a jornalista Fernanda Puccinelli, além da produtora cinematográfica ter uma relação estreita com a emissora, o apoio se dá pelo fato da valorização das produções locais. “A TV Cidade, por ser um canal totalmente local, não teria por que não ser parceira deste filme que é cem por cento pelotense e que está sendo produzido com toda qualidade e profissionalismo que o Zé e o Julio têm e eu conheço de cor”, disse Fernanda.
Seleção do elenco
Depois do roteiro pronto, foi a hora de escolher o elenco e como não poderia deixar de ser, a preocupação era em achar um elenco composto por atores locais. O anúncio foi feito via redes sociais e várias pessoas, com experiência ou não na arte de atuar, compareceram nos testes de elenco. Foram três noites de seletivas e a partir daí foram escolhidos os nomes que integrariam o filme. “Tínhamos uma preocupação com a escolha do elenco masculino porque os homens em filmes de terror têm uma postura viril, de proteção e essa foi nossa maior dificuldade” contou José. “A gente pensou em algo para o teste que fosse despertar a parte do improviso e que não fosse nada muito forçado para vermos como seria a reação e expressão de cada um”, falou Julio.
Os testes ocorreram nos estúdios da TV Cidade, onde um quarto sombrio foi montado. Os candidatos vinham arrastados pelo corredor e eram acorrentados em uma cama toda ensanguentada. Depois, um mascarado atacava cada um com uma furadeira, sem a broca, é claro! “Nessa parte era que queríamos ver as expressões e a capacidade de cada um de reagir em uma situação de pânico porque as pessoas chegavam sem saber do que ia acontecer, era tudo no improviso”, contou José. Foram escolhidos quatro homens e oito mulheres e, destes, apenas dois já haviam tido experiências com atuação.
Com o elenco já formado, foi a hora de buscar mais parcerias para o filme e, como diretora de fotografia, foi escolhida a fotógrafa Luísa Planella. Para as locações onde aconteceriam as cenas externas, a parceria foi firmada com o C.T. Caudilho Paintball, um campo de paintball (jogo americano que utiliza marcadores de ar comprimidos com balas de tinta) localizado na antiga fábrica de papel, do Coronel Vinholes. E as sequências internas do filme foram gravadas nos estúdios da TV Cidade.
O roteiro conta a história de uma turma de cinema que está terminando o curso e precisa fazer um curta-metragem de terror como trabalho de conclusão. Os alunos têm três dias para entregar a tarefa e resolvem gravar todo o material em apenas uma noite no campo de treinamento de um dos colegas. Chegando lá, coisas sobrenaturais começam a ocorrer e o público terá certa dificuldade para saber o que realmente acontece ou que é encenado no filme produzido pelos universitários. “Por isso escolhemos esse título porque temos um filme sendo produzido dentro de outro filme. O que é mais legal desse longa-metragem é que os personagens foram criados em cima de características dos próprios atores e isso dá uma liberdade para eles serem mais naturais diante da câmera. E o fato de não ter um roteiro fixo para eles decorarem, as cenas são esboços e surgem no improviso, facilita ainda mais”, disse Julio. “A galerinha vem nos surpreendendo positivamente, está sendo muito legal trabalhar com eles porque dão o melhor de si e rendem bastante no vídeo, mesmo que muitos deles nunca tenham atuado nem estado diante de uma câmera”, afirmou José.
Rodagem
As gravações começaram no início de março e todas acontecem aos finais de semana e à noite, pelo fato de que muitos estudam ou trabalham e não têm muita disponibilidade para gravar durante a semana. A primeira parte do filme, filmada nos estúdios da TV Cidade, aconteceu apenas em uma noite. “Foram cenas simples que serviram como uma espécie de introdução da história e de cada personagem”, disse Julio. Para o papel do professor da turma de cinema foi escalado o ator Chico Meirelles, já bastante conhecido do público pelotense pelas aparições em peças e produções cinematográficas da cidade, além de coordenar alguns projetos artísticos em escolas do município.
Infelizmente, como em toda produção cinematográfica, vários imprevistos pegaram de surpresa os diretores. Alguns atores, por motivos pessoais, tiveram que declinar do projeto e foram substituídos no decorrer das filmagens e as condições climáticas influenciaram negativamente nas gravações. Como o inverno foi muito rigoroso este ano, uma longa pausa foi dada nas filmagens, porém, já se tem aproximadamente 55 minutos de filme pronto. “Precisamos agora de mais uns cinco dias de gravação e terminamos as filmagens do longa. Queremos fechar ele em 90 minutos mais ou menos”, disse José.
Uma última integrante do elenco foi definida no início de outubro. A estudante do sexto semestre de Teatro da Universidade Federal de Pelotas, Laís Souza, foi convidada para fazer uma participação na primeira cena do filme, que se passará no início da década de 1970. “Para mim vai ser um prazer participar desse longa pela experiência que nunca tive na telona e também porque amo filmes de terror e sempre quis participar de algo do gênero”, contou Laís que, nessa cena, vai atuar ao lado de Chico Meirelles, em uma sequência de tirar o fôlego, segundo os diretores. “Queremos ousar muito nessa cena, mostrar o que queremos com esse filme já no primeiro take”, contou José.
O clima das filmagens é bastante descontraído, segundo uma das atrizes de “O Filme”, Lizi Fonseca. “Embora a gente grave só à noite e no fim de semana, passamos horas no set e vamos madrugada adentro filmando, é uma experiência bastante divertida e vai enriquecer o meu currículo como atriz. Todo mundo é muito alto astral e se dá bem, o que influencia no clima leve de gravação. Não tem essas guerrinhas de ego porque todo mundo tem seu espaço e todos os personagens são muito importantes para a construção da história. E também não tem essa de ter medo porque estamos mexendo com o sobrenatural, falando de espíritos e nos banhamos de sangue… Gravando, a gente mais ri do que se assusta (risos)”, contou Lizi que, assim como Laís, também é aluna de Teatro da UFPel.
A previsão de lançamento é para breve. “Está sendo tudo feito com muito cuidado e queremos que seja um sucesso. Vai ser porque estamos todos colocando muito amor e dedicação em cima desse filme, é algo novo e o público já está amando desde já e está super ansioso pela estreia”, ressalta José. “Queremos fazer algo bem legal para o dia do lançamento, chamar bastante gente, até tentar parceria com os cinemas da cidade para passar nas sessões. Vamos bombar”, almeja Julio. Algumas cenas de “O Filme” podem ser vistas no YouTube.
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