Projeto elabora Programas de Acessibilidade para os museus de Pelotas

Por Roger Vilela

Com equipe integrada por estudantes da UFPel, documentos serão entregues aos museus em dezembro

Para elaborar os Programas de Acessibilidade de seus museus institucionais – Museu do Doce, Museu de Ciências Naturais Carlos Ritter (MCNCR) e Museu de Arte Leopoldo Gotuzzo (MALG) – e adequá-los à lei, a Pró-Reitoria de Extensão e Cultura (PREC) e a Rede de Museus da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) deram início ao projeto “Um museu para todos: Programas de Acessibilidade”.

Além dos três museus institucionais, participam do projeto o Memorial do Anglo, localizado no Campus Porto da UFPel, e o Museu da Baronesa, pertencente à Secretaria da Cultura da Prefeitura de Pelotas. O projeto, coordenado pela professora Desirée Nobre, iniciou suas atividades em outubro de 2019. Sua equipe é formada por estudantes – todas mulheres – de diferentes cursos da UFPel – da Terapia Ocupacional a História, da Museologia a Pedagogia. Todas as integrantes atuam como voluntárias.

As integrantes do projeto “Um museu para todos” com a equipe do Museu da Baronesa durante visita guiada Fonte: Rede de Museus da UFPel

Sobre essa convivência de diferentes disciplinas em um mesmo projeto, Nobre comenta que a “acessibilidade é uma área interdisciplinar e sendo os museus instituições que englobam, também, muitas áreas do conhecimento, é fundamental que estas áreas conversem entre si, dentro de suas especificidades, para que juntas consigam trabalhar de forma mais efetiva para alcançar a universalidade do acesso”.

O que é um Programa de Acessibilidade?                                                                         

Um Programa de Acessibilidade consiste em um conjunto de políticas institucionais que buscam promover o acesso universal aos museus.

Com a sanção da Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146), em julho de 2015, foi incluída no Estatuto dos Museus (Lei nº 11.904/09) a obrigatoriedade para os Planos Museológicos dos museus de todo o País apresentarem um Programa de Acessibilidade.

Um Plano Museológico é o documento que, segundo o Instituto Brasileiro de Museus (Ibram), “define conceitualmente a missão, a visão, os valores e os objetivos da instituição, e alinha, por meio de um planejamento estruturado e coerente, seus programas, seus projetos e suas ações”.

Etapas de criação
Em novembro do ano passado, as integrantes do projeto visitaram os museus com o objetivo de realizar o diagnóstico das condições de acessibilidade para pessoas com deficiência. Os resultados das análises foram apresentados às equipes dos museus entre os meses de julho e agosto de 2020.

Devido à pandemia do novo coronavírus e a necessidade de distanciamento social, a apresentação dos resultados dos diagnósticos e as etapas posteriores do projeto foram realizadas on-line, por meio de webconferência. 

A acessibilidade é um conceito que está dividido em sete dimensões, que são: acessibilidade atitudinal, arquitetônica, comunicacional, metodológica, instrumental, programática e web.  

Nas instituições analisadas pelo projeto foram encontradas fragilidades em todas as dimensões. Problemas que a professora Nobre atribui à falta de recursos humanos e financeiros.

Com os diagnósticos feitos e as fragilidades identificadas, a próxima etapa do projeto se constituiu na realização de oficinas de capacitação em acessibilidade cultural, que tiveram como público-alvo as equipes dos museus (outros servidores e estudantes também puderam se inscrever). Foram sete no total, que abordaram temas levantados pelos próprios servidores das instituições. Entre os assuntos tratados, estavam o uso de linguagem simples, a descrição de imagens e a acessibilidade nos museus no pós-pandemia.

No fim do mês de setembro, começou o desenvolvimento dos Programas de Acessibilidade, a última etapa do projeto, que foi dividida em duas partes. A primeira – que ainda está em andamento – é uma série de encontros (dois com cada museu) entre a equipe do projeto e os servidores das instituições. Para as reuniões, as integrantes do “Um museu para todos” se dividiram em duplas interdisciplinares.

Cada dupla é responsável um por museu. Nos encontros são discutidos temas referentes à acessibilidade e às instituições. A segunda parte é a elaboração dos Programas de Acessibilidade, que serão produzidos pelas voluntárias do projeto a partir dos resultados dos diagnósticos e das reuniões. A entrega dos programas para os museus está marcada para acontecer em dezembro.

Nada sobre nós sem nós
No final do século 20, nos Estados Unidos, surgiu o lema “Nada sobre nós sem nós” (“Nothing about us without us”, em inglês), que se tornou um símbolo da luta pela inclusão e dos direitos da pessoa com deficiência. 

A frase, que também representa a luta de outras minorias, significa que todas as decisões que dizem respeito às pessoas com deficiência devem ser tomadas com a participação das próprias pessoas com deficiência. 

Para que um Programa de Acessibilidade seja realmente efetivo, é necessário a participação de uma pessoa com deficiência em sua elaboração, pois será ela quem realmente utilizará os recursos disponibilizados. “Por mais que uma pessoa sem deficiência tenha experiência [na área de acessibilidade], ela jamais saberá qual será a verdadeira necessidade da pessoa que tem algum tipo de deficiência”, comenta Leandro Pereira, pessoa cega, museólogo e consultor do projeto “Um museu para
todos”.

Leandro, que ficou cego na fase de vida adulta, começou a cursar Museologia em 2016. Ele conta que foi no curso que percebeu que o planejamento da acessibilidade nos museus era realizado apenas por pessoas sem deficiência e que isso ocasiona a produção de ações e recursos pouco efetivos.

Os museus: participação das equipes e suas ações
Para as equipes das instituições que integram o projeto, a promoção do acesso universal e igualitário aos museus e seus acervos deve ser um objetivo de toda instituição museológica. “O acesso universal ao conhecimento produzido, divulgado e em potencial que nossos museus [públicos e universitários] possuem, tem que ser encarado dentro de uma lógica que passa pelo direito universal de acesso, pelo pensamento crítico e a transformação da sociedade”, afirma Joana Lizott, museóloga do MALG.

A participação no projeto possibilitou aos servidores dos museus perceberem problemas que antes não estavam evidentes. Carolina Silveira, técnica-administrativa do MCNCR, tem baixa visão e não consegue ler o conteúdo das legendas das peças expostas no museu, devido ao tamanho diminuto das etiquetas. Participando do “Um museu para todos” ela entendeu o quão excludente é esse e outros problemas  existentes na instituição. Para Lizott, participar do projeto foi esclarecedor. “Acredito que contribuiu para rever algumas ideias, corrigir equívocos e na construção das propostas”, comenta.

A museóloga conta que o desenvolvimento do Plano Museológico do MALG ocorreu durante sua participação no projeto. Com isso, foram incluídas nele algumas questões voltadas à acessibilidade. “O programa de acessibilidade elaborado junto ao projeto foi pensado totalmente alinhado com as diretrizes traçadas no plano. As ações que foram elencadas são assim exequíveis e possíveis dentro do planejamento pensado para os próximos dois anos”, explica Lizott. 

O Museu Carlos Ritter, a partir das reuniões com o projeto, elaborou um documento que elenca algumas propostas para a sua política institucional de acessibilidade. Entre as ações presentes no texto, estão oficinas de capacitação para os funcionários e monitores do museu e a instalação de um elevador interno com acesso ao segundo piso. Segundo Silveira, com a recente renovação do contrato de aluguel da sede do MCNCR, a instalação do elevador já foi acordada com o proprietário do prédio.

No Museu da Baronesa, de acordo com a diretora Fabiane Moraes, o foco principal será a capacitação dos servidores, mas que vão buscar, através de editais de fomento, recursos para a aquisição dos equipamentos necessários para a efetivação da acessibilidade na instituição.

A acessibilidade cultural em pauta na UFPel
A acessibilidade cultural começou a ser pauta na UFPel entre os anos de 2011 e 2012, com o projeto de extensão “O Museu do conhecimento para todos: inclusão cultural para pessoas com deficiência em museus universitários”, coordenado pela professora Francisca Michelon, atual Pró-Reitora de Extensão e Cultura da  Universidade.

Em 2018, a Comissão de Apoio ao Núcleo de Acessibilidade e Inclusão (CONAI) solicitou às Pró-Reitorias da UFPel que desenvolvessem planos de acessibilidade. Em julho de 2019, foi publicado o plano da PREC.

O documento, elaborado pela professora Desirée Nobre, prevê uma série de ações a serem realizadas até o segundo semestre de 2021. Entre elas está o desenvolvimento de Programas de Acessibilidade para os museus institucionais da UFPel.

No fim do ano passado, foi lançado o e-book “Um museu para todos: manual para programas de acessibilidade, também de autoria da professora Nobre. A possibilidade de pôr em prática o conteúdo do manual e de cumprir uma das metas do plano de acessibilidade da PREC foram os motivadores para a criação do projeto de extensão “Um museu para todos”.

Capa do e-book “Um museu para todos: manual para programas de acessibilidade” Fonte: Reprodução

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