Neste exato momento você está usando algum produto que só chegou a suas mãos graças a alguns motorista. No mínimo, a roupa que está em seu corpo foi transportada por algum sistema logístico para chegar a suas mãos. Não só os motoristas ligados aos tranportes de produtos são importantes no nosso dia-a-dia. Há ainda aqueles profissionais que nos ajudam a chegar melhor e mais rápido ao nossos destinos e compromissos. Contudo, a rotina de trabalho destes profissionais pode ser muitas vezes desafiadora e muitas vezes nem nos damos conta disso.
Durante cerca de um mês, a equipe de reportagem de um jornal mineiro (O TEMPO) acompanhou de perto a rotina de motoristas de ônibus, trocadores, caminhoneiros e taxistas e radiografou um quadro crescente de adoecimento e afastamento do trabalho causado por longas jornadas, clima hostil, ambiente estressante e estrutura precária. O que eles descobriram é um quadro triste e alarmante no que se refere à condições de trabalho.
Abaixo tem uma amostra do texto da reportagem. Leia a reportagem completa, veja os vídeos e confira todos os detalhes website da notícia. Foi realmente um ótimo trabalho que estes jornalistas fizeram.
Boa leitura!!
Prof FRANZ
“Não temerá o terror noturno, nem a flecha que voa de dia. (…) Mil cairão a seu lado, e 10 mil a sua direita, mas nada o atingirá”. Agarrada à Bíblia, Fernanda de Souza, 34, lê o Salmo 91, seu preferido, e chora, enquanto ainda tenta exorcizar de dentro da cabeça as lembranças reais de mais de dez assaltos vivenciados entre 2005 e 2013, quando trabalhou de trocadora em ônibus da rede de transporte da capital mineira.
Diagnosticada com depressão profunda e síndrome do pânico, ela está há três anos sem trabalhar e luta para retomar uma vida normal, apesar da batelada de medicamentos e dos fantasmas do passado. Lembrar o episódio mais traumático, a bordo do ônibus azul da linha 4102 (Serra/Aparecida), ainda dói muito para a ex-trocadora.
“Começamos a corrida à 0h40. Um minuto depois, no primeiro ponto, o rapaz já entrou e colocou o revólver na minha cabeça. Queria dinheiro, mas a gente tinha acabado de sair. Não tinha nada. Ele não aceitava. Ficou me xingando, puxando meu cabelo e ameaçando me matar. Foi horrível”, conta, tremendo e aos prantos, como se estivesse revivendo a cena de terror.
Apesar do impacto psicológico a cada novo assalto, ela e os colegas eram obrigados a continuar rodando normalmente e só fazer o Boletim de Ocorrência (BO) no final da jornada, em média, de sete horas passando pela madrugada. As imagens das câmeras quase nunca eram usadas para identificar os criminosos. “Era muita pressão da empresa. Não podíamos parar. Muitas vezes, dependendo do valor roubado, o prejuízo era descontado no nosso salário. As câmeras estão lá para vigiar o trabalho da gente. Não os bandidos”, critica.
Entretanto, depois daquele dia, Fernanda nunca mais foi a mesma. Nem as orações nem os pedidos de proteção a Deus ao entrar e sair do ônibus surtiram efeito. A disposição para trabalhar e a coragem para sair de casa também haviam sido furtadas. O marido foi quem deu o alerta ao perceber a mudança no comportamento da mulher e a obrigou a ir a um psiquiatra.
Mesmo com o diagnóstico de um quadro psicológico grave e em estágio avançado, durante mais de um ano ela ainda brigou com a empresa de transporte e com os médicos do INSS para não ter de voltar a trabalhar ainda doente. Chegou a ficar sete meses sem receber. Só após vencer uma ação na Justiça, ela conseguiu de volta o salário – na ativa, ela ganhava cerca de R$ 1.100; hoje, de licença, recebe menos.
“Não dou conta de voltar ao transporte coletivo. Mas preciso fazer alguma coisa, minha família também foi afetada. Ainda sonho em poder fazer um curso de magistério para poder trabalhar com crianças”, diz Fernanda, sem muita certeza sobre um futuro ainda embaçado pelos olhos cheios d’água.
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