Verde, amarelo, azul e vermelho
Por Gabriel Bresque
Em 15 de dezembro de 1989, Fernando Collor de Melo e Luís Inácio Lula da Silva participavam do primeiro grande debate entre candidatos à presidência da televisão brasileira. O programa durou quase três horas e foi transmitido pelas quatro maiores emissoras do país na época. Esse debate ofereceu também o primeiro grande choque político da história brasileira. Era um confronto de ideias e posturas extremamente opostas, que dividiram a sociedade brasileira ao meio.
De um lado, Collor representava a visão da social democracia brasileira. Com uma campanha cheia de verde e amarelo e jargões nacionalistas, era a vertente que defendia o livre comércio, o valor das virtudes conservadores e a imagem do verdadeiro brasileiro. Seu discurso era baseado na derrubada da visão socialista que assombrava o mundo com teorias absurdas e que, como o próprio candidato expressou nesse debate, traria para o Brasil o horror totalitário que atingia o leste europeu.
Já Lula, defendia o que chamava de socialismo democrático. Abordava fortemente as questões sociais, a distribuição de renda e melhoria nos ganhos das classes mais esquecidas do país. Representava os interesses dos trabalhadores e dos emergentes movimentos sindicais e populares que tomavam conta do Brasil. Foi um momento de clara divisão nacional, que contrapunha visões completamente diferentes de sociedade.
De lá pra cá, a disputa pela Presidência da República seguiu rumos parecidos. O PT de Lula enfrentou em todas as eleições o PSDB. O Partido da Social Democracia Brasileira surgiu como representante fiel das ideologias liberais. Porém, tanto o discurso de um lado como de outro se tornou menos radical ao longo dos anos. A estabilidade trazida pelo plano Real e o fim do medo da estatização das grandes empresas, virou o jogo. Depois da vitória Petista em 2002, os planos sociais, antes tão temidos, se tornaram a realidade brasileira; aquela que é impossível vencer sendo contra. Por não saberem se posicionar de forma coerente sobre esses temas, José Serra e Geraldo Alckmin perderam eleições sem grandes dificuldades. E também, sem grandes oposições de ideia.
A história trouxe o Brasil, mais de 25 anos depois do histórico debate de 1989, o último debate desse segundo turno de 2014. E assim como naquele ano, a divergência entre as ideias e as posições sobre o futuro é clara. Aécio Neves e seus seguidores apostam no renascimento do espírito nacionalista, nas noções de amor às cores brasileiras e às coisas da nossa terra. O candidato tem um programa baseado no corte de gastos e em uma melhora agressiva da inflação e do crescimento, baseados em investimentos em capitais mais livres e mais ousados para o país. A ideia de uma revolução nacionalista cresceu, quando começou a trabalhar contra a corrupção. É proposta de um governo limpo, branco, apaixonado pelas coisas da nossa terra.
Enquanto isso, o PT mudou bastante desde 1989. Tornou-se situação, desligou-se das ideias socialistas mais fortes, mas não abandonou o vermelho e a força popular em suas campanhas. Em 12 anos de governo, o Partido dos Trabalhadores expandiu vertiginosamente os programas sociais, recuperou para o estado algumas empresas que foram privatizadas por Fernando Henrique Cardoso e aumentou consideravelmente o salário mínimo. Porém, enquanto a reeleição de Lula foi tranquila, Dilma vai terminando seus quatro anos de governo de forma mais instável. A inflação que se manteve estável por anos subiu, o crescimento do País estagnou e as denúncias de corrupção abriram espaço para um novo crescimento de um discurso nacionalista.
A ideia de um governo limpo e puro entre as manchas sofridas pelo Estado só consegue sua força em comandos fragilizados. Usando a forte mídia contra esses escândalos, o programa do PSDB declarou guerra aos desvios financeiros e, consequentemente, ao PT. Seu apoio nas ruas mora nesse descrédito popular ao partido que comanda o Brasil.
A campanha de Dilma, por outro lado, apostou na divisão da elite contra o povo humilde. Para ela, essa revolução nacionalista existe apenas nas classes mais altas, aquelas que não se beneficiaram com os avanços sociais do país. Distanciou a figura de Aécio Neves daquela de brasileiro simples, com fortes raízes na sua cultura, e o demonstrou como um menino mimado do subúrbio.
É nesse espírito de divisão entre elite e povo que acontece hoje o último debate entre os candidatos à presidência da República. Dilma e Aécio trocaram acusações em todos os debates e demarcaram claramente quais são as suas visões para os próximos quatro anos do Brasil. O povo brasileiro se dividiu em blocos, como não acontecia há muito tempo. Será assim, como foi entre Collor e Lula, uma batalha de ideologias econômicas e sociais na televisão. Promete também ser um confronto de dois países diferentes: o nacionalista contra o popular, entre as cores do Brasil e o vermelho revolucionário.