Por que o Grammy ainda boicota artistas negros?
A edição de 2024, que ocorreu no dia 04/02, mostrou que a premiação continua com as mesmas injustiças referente a artistas negros e que não irá mudar esse critério
Por Marisa Campos / Em Pauta
No último domingo (4), ocorreu a 66ª cerimônia do Grammy Awards, principal e importante premiação de música do mundo nos Estados Unidos. O prêmio de 2024, que consagra trabalhos lançados em 2023, contou com diversas apresentações musicais, a mais esperada sendo de Miley Cyrus, o grandioso tapete vermelho com os looks dos artistas e quais seriam os vencedores de cada categoria.
Porém, a premiação segue com os mesmos critérios ultrapassados, conservadores e considerados por muitos como racistas: o boicote de artistas negros na categoria de “Melhor Álbum do Ano”. Basicamente, artistas negros só ganham Grammys na categoria de gêneros majoritariamente negros, como o Rap, R&B e até mesmo Urbano, fora a questão geográfica, pois existe paralelamente o Grammy Latino, separando artistas latinos que fazem sucesso nos Estados Unidos.
A maior injustiçada com esse critério é Beyoncé. A última mulher negra a conquistar o Grammy de melhor álbum do ano foi Lauryn Hill, com “The Miseducation of Lauryn Hill” em 1995, ou seja, fazem 29 anos que uma mulher negra conquistou o maior prêmio da noite. Além disso, muitos devem lembrar da edição de 2017, no qual Adele conquistou o gramofone com o seu álbum “25”, e disse no seu discurso que “Lemonade” de Beyoncé merecia ganhar.
Entretanto, Beyoncé não foi a única a perder nos úlitmos anos, Kendrick Lamar, Tyler, The Creator e Rihanna foram alguns artistas descaradamente boicotados, tanto que em 2020 Tyler, The Creator criticou a premiação e o fato do seu álbum “IGOR” ter sido considerado apenas como Melhor Álbum de Rap. Drake, outro rapper mundialmente famoso, também fala abertamente sobre a academia e boicota a premiação, o artista não comparece no evento e nem inscreve mais os seus trabalhos para avaliação do conselho desde 2021.
Na edição de 2023, “Renaissance” álbum de Beyoncé lançado em 2022, foi indicado 7 vezes, inclusive como melhor álbum do ano, mas ganhou apenas nas categorias “Melhor Música de R&B”, “Melhor Gravação Dance”, “Melhor Álbum de Dance/Eletrônica” e “Melhor Performance Tradicional de R&B”, assim batendo um recorde com o total de 32 grammy’s até o momento. O vencedor daquele ano foi Harry Styles, com o álbum Harry’s House, e novamente o mundo ficou chocado com mais uma derrota descarada de Beyoncé.
Na premiação deste ano, a “Queen B” não foi indicada, mas a cantora de R&B, SZA, foi uma das grandes apostas e destaques, já que seu álbum “SOS” recebeu 9 indicações, mas conquistou apenas 3. Obviamente, o melhor álbum do ano foi para a jovem, afirmando mais uma vez a postura racista do Grammy. O disco de SZA, logo nos seus primeiros dias de lançamento, alcançou grandes números nas plataformas de streaming e muitos elogios da crítica especializada, porém continuou limitado apenas nas categorias “negras”, sendo “Mindnights” de Taylor Swift, o vencedor da noite, um trabalho que mal possuiu tanto destaque desde que foi lançado e com sonoridade mediana.
Outro destaque da noite foi o discurso de Jay-Z, marido de Beyoncé, rapper e empresário de sucesso, homenageado com o “Dr. Dre Impacto Global”, um gramofone para artistas que impactam a indústria musical. Em seu discurso, Jay-Z cita o fato de Beyoncé ser a recordista da premiação e não possuir nenhum prêmio de álbum do ano, e que essa conta não fecha.
Jay-Z tem toda a razão. Como um prêmio, que existe há seis décadas, ainda continua com critérios claramente racistas de escolha? Como fecham os olhos para os números de trabalhos artísticos de cantores negros e acham que apenas consagrar na “categoria de negros” seria o suficiente em sessenta e seis edições? O problema e as críticas não são direcionadas para Adele, Harry Styles e Taylor Swift, mas para a premiação que não aceita que o trabalho de um negro foi superior a de um branco.
Os números não mentem, os shows lotados não mentem, a crítica especializada não mente. Os álbuns de Beyoncé foram os melhores, os álbuns de Rap podem sair da bolha do Rap e o álbum da SZA foi o melhor de todo o 2023. Todos sabem disso. Mas o Grammy não.
Ao que tudo indica, a atitude não mudará tão cedo. A Academia gosta disso, visto que toda a polêmica gera uma grande audiência e todo ano o Grammy é criticado pelo mesmo motivo. Então, qual é o problema de aceitar uma crítica construtiva? Ou entender que estamos em 2024 e certas coisas não serão mais toleradas? Bom, não fico mais espantada quando um artista negro perde a categoria de Melhor Álbum do Ano, mas espero que isso mude algum dia.