Eles Não Usam Black-tie – Uma obra atemporal sobre família, trabalho e sindicalismo.
Tobias B. / Em Pauta
Um clássico do cinema brasileiro, fruto de um grande diretor do cinema novo, Leon Hirszman, Eles Não Usam Black-tie (1981) ainda é forte e impactante nos dias de hoje, é uma lição sobre se manter resiliente diante da infindável crueldade capitalista. O filme se passa no Rio de Janeiro, no fim da ditadura militar, e conta uma parte turbulenta da vida de Tião (Carlos Alberto Riccelli), um homem jovem que ao descobrir a gravidez de Maria (Bete Mendes), sua namorada, decide que irá se casar o quanto antes, contudo uma greve causa atritos que se estendem do seu trabalho até a sua casa.
Feito em um dos períodos mais cruéis da história do Brasil, a ditadura militar, a obra contempla diversos problemas sociais do período e entrega uma visão pró movimento dos trabalhadores. Além de ousado, a estética da fome, comum aos filmes cinema novistas, aparece aqui. Contemplamos uma vida que beira o miserável, profundamente marcada pelas adversidades de um Brasil que assegura para as autoridades o direito de violentar o povo, enquanto a maioria nada pode fazer senão se organizar. A obra também conta com a participação de um elenco rico em personalidades famosas para a história do cinema brasileiro, como Fernanda Montenegro e Milton Gonçalves.
Otávio (Gianfrancesco Guarnieri), pai da família que protagoniza o filme, é a representação máxima da força que os desesperançosos têm, a capacidade de se unir pró melhora do povo, ele é um sindicalista que trabalha na mesma fábrica que seu filho, Tião, e está disposto a lutar pelo que acha certo, mesmo já tendo sofrido consequências terríveis no passado.
O ponto mais forte do filme é o roteiro, adaptado da peça de teatro homônima de Gianfrancesco Guarnieri. Diálogos carregam a trama até o fim, produzindo debates humanos, com pontos de vista que se sobrepõem a todo momento. A covardia, a necessidade de lutar pelo justo, o medo, os traumas, as decepções são sentimentos que cadenciam conversas reflexivas acerca da opressão que vivemos, mas muitas vezes não conseguimos entender, ou simplesmente recusamos questionar.
Eles Não Usam Black-tie retrata a vida de um homem que esconde sua covardia através de suas convicções. Tião, ao furar a greve, trai sua classe e sua família, com medo de perder o emprego ele acaba destruindo tudo ao seu redor. Essa anedota pode ser interpretada como a representação máxima de como o medo destrói até os seus laços mais profundos.
Em tempos que somente a união pode fortalecer as nossas reivindicações, esse filme dos anos 80, exemplifica a força que uma luta que só pode ser travada coletivamente tem. O poder de se manter fiel aos interesses do seus é a única forma de lutar contra uma opressão que vem de cima. Um conto que, mesmo com 40 anos de diferença, ainda é atual.