Dez grandes momentos do futebol brasileiro

Por Luis Artur Janes Silva

Oito equipes de todos os continentes disputaram a Copa do Mundo de Clubes da FIFA (Federação Internacional de Futebol Associado). De seis a 16 de dezembro, os Emirados Árabes Unidos receberam a nata do futebol mundial, que lutou para conquistar o título de melhor time de futebol do planeta na temporada 2017.

Mas este Mundial de Clubes foi diferenciado, porque pela primeira vez o torneio organizado pela FIFA teve dois campeões planetários entre os seus participantes. O Real Madrid, que conquistou a Copa em 2014 e 2016, foi acompanhado pelo Grêmio, que nunca venceu o certame administrado pela FIFA, mas teve neste ano de 2017 o reconhecimento oficial da Copa Intercontinental, conquistada em 1983, como um legítimo Campeonato Mundial.

O reconhecimento oficial da FIFA em relação às conquistas da Copa Intercontinental e sua equivalência ao Mundial foi um processo que começou em junho de 2017, quando Alejandro Dominguez, presidente da Confederação Sul Americana de Futebol (CONMEBOL) enviou uma carta ao principal mandatário da FIFA, o suíço Gianni Infantino. Neste documento, Dominguez iniciava sua cruzada, segundo suas próprias palavras, no sentido do justo reconhecimento da FIFA aos clubes sul-americanos e europeus que ganharam a Copa Intercontinental e que sempre foram considerados campeões do mundo.

A solicitação do dirigente de futebol da América do Sul foi analisada na reunião do Conselho da FIFA, realizada no dia 27 de outubro, na cidade de Calcutá (Índia), sendo aceita com restrições. A entidade máxima do futebol reconheceu todos os vencedores das edições da Copa Intercontinental como campeões mundiais, mas não aceitou a unificação deste torneio com a Copa do Mundo de Clubes, realizada pela primeira vez no ano 2000, e desde 2005 de forma ininterrupta em país-sede determinado.

Assim, tricolores e merengues travaram uma disputa histórica em gramados da Península Arábica, pois além de termos dois campeões mundiais na edição do campeonato, também presenciamos uma encarniçada disputa entre brasileiros e espanhóis no sentido de confirmarem a sua posição de maiores vencedores de títulos mundiais entre clubes. Tudo isso porque com o reconhecimento dos triunfos dos clubes que conquistaram a Copa Intercontinental, o Brasil passou a ser dono de 10 conquistas planetárias contra nove títulos da Espanha.

A seguir relembraremos as dez conquistas brasileiras, momentos em que os torcedores de alguns dos principais clubes nacionais puderam dizer com orgulho, que sua agremiação chegou ao topo do futebol mundial.

SANTOS – 1962 e 1963

O time do Santos que conquistou o mundo em 1962 e 1963. Fonte: Sempre Peixe/Reprodução.

O mundo do futebol nos anos 1960 era preto e branco, tanto nas telas da televisão, que nem de longe tinha a repercussão dos dias de hoje, quanto nas cores do uniforme do principal time do Brasil daqueles tempos, o Santos Futebol Clube de Pelé, Pepe, Coutinho, Dorval, Mengálvio, Mauro, Gilmar e Zito.

Este esquadrão ganhou dois títulos mundiais consecutivos (1962 e 1963), feito inédito na época. E as conquistas foram contra grandes equipes europeias daqueles tempos, esquadrões dignos de respeito da parte dos amantes do futebol.

Em 1962, o Santos bateu o Benfica de Portugal, timaço comandado pelo craque Eusébio e pelo cerebral Coluna, ambos nascidos na África, mas que defendiam as cores portuguesas. O Santos venceu as duas partidas da decisão com direito a uma grande goleada (5×2) no segundo jogo, realizado no mítico Estádio da Luz, em Lisboa. Neste jogo Pelé marcou três vezes e quem viu a atuação do Rei, jura que esta foi a partida da sua vida, a melhor apresentação da sua carreira.

No ano seguinte, o Santos enfrentou o Milan da Itália, times dos brasileiros Mazzola e Amarildo (destaque da Copa de 1962) e dos italianos Cesare Maldini e Giovani Trapattoni, futuros técnicos de futebol. O campeonato foi decidido na terceira partida, quando o Santos venceu o Milan pelo placar mínimo, sem a presença de Pelé e com um gol feito por Dalmo, jogador que não tinha o brilho dos principais astros envolvidos na disputa.

FLAMENGO – 1981

Adílio marca e Zico comemora, o Flamengo de 1981. Fonte: Peter Robinson/ Getty Images

Um esquadrão comandado por um dos maiores craques da história do futebol brasileiro e, certamente, um dos três principais futebolistas nacionais depois da Era Pelé. Este era o Flamengo de Zico, vencedor da Copa Intercontinental de 1981. Mas este Flamengo também contava com outros grandes jogadores no seu elenco, assim nomes como Leandro, Raul, Júnior, Adílio e Andrade faziam o jogo baseado no toque de bola da equipe carioca fluir com uma naturalidade que deixaria a seleção espanhola, campeã mundial de 2010, encabulada, pois o Flamengo de 1981 combinava posse de bola e objetividade, personificada no eficiente centroavante Nunes, o “Artilheiro das Decisões”, que marcou duas vezes na final contra o Liverpool.

A máquina flamenguista passou por cima de todos os adversários no final de 1981, pois entre o final de novembro e a metade de dezembro daquele ano conquistou o Campeonato Carioca, a Libertadores e o Mundial, enfrentando neste último torneio os ingleses do Liverpool, que formavam uma verdadeira seleção da Grã-Bretanha, liderados pelos escoceses Dalglish e Souness. Arrogantes, os britânicos não foram páreo para o toque de bola do time brasileiro, que liquidou a fatura na etapa inicial.

GRÊMIO – 1983

Grêmio, campeão mundial de 1983. Fonte: Gremiopedia/Reprodução.

Se o Flamengo de 1981 enchia os olhos, o próximo time brasileiro campeão mundial lembrava os pragmáticos europeus. O Grêmio suou sangue para conquistar a América em julho de 1983, diante do sempre temível (pelo menos naquela época) Peñarol, do vizinho Uruguai. Contando com a liderança do goleiro Mazzaropi e do zagueiro Hugo De León, com a técnica de Tita, campeão mundial de 1981, e com a impetuosidade de Renato, o Tricolor bateu o Peñarol por 2×1, no Estádio Olímpico.

A partir do dia seguinte à conquista da América, a direção gremista passou a planejar o passo a passo da conquista do mundo, que atingiu o seu auge no dia 11 de dezembro, quando o Tricolor dos Pampas bateu o Hamburgo da Alemanha Ocidental, 2×1, na prorrogação.

A conquista do Grêmio deu-se por causa da atuação destacada de dois jogadores, um deles o inesquecível Mário Sérgio Pontes de Paiva, o Vesgo, uma personalidade controversa, polêmica, por vezes arrogante, mas acima de tudo um grande jogador, que cadenciou a decisão da Copa Intercontinental ao seu ritmo, preparando o terreno para que Renato Portaluppi, hoje técnico do Grêmio, brilhasse e fizesse os dois gols que garantiram a maior glória da história do Tricolor de Porto Alegre.

SÃO PAULO – 1992 e 1993

Raí e o São Paulo, duas vezes melhor do mundo. Fonte: Peter Robinson/Getty Images

Um ajuste de contas com a história, assim pode ser definido os títulos mundiais conquistados pelo São Paulo, no início da década de 1990. Este ajuste recolocou o técnico Telê Santana no panteão dos grandes treinadores da história do futebol brasileiro. Injustamente acusado de ser pé-frio, depois de ter sido eliminado prematuramente nas Copas de 1982 e 1986, mestre Telê conquistou os torcedores são-paulinos e reconquistou a torcida brasileira, ainda ressabiada com o homem que havia comandado o esquadrão canarinho de 1982, e tinha sido derrotado pelos italianos, antes de chegar à final da Copa do Mundo.

O São Paulo de Telê lembrava em alguns momentos a Seleção Brasileira de 1982, mas revestido de um pragmatismo que permitiu que conquistasse o mundo enfrentando o Barcelona (1992), que contava com o dinamarquês Michael Laudrup, o búlgaro Stoichkov, o holandês Koeman e os espanhóis Zubizarreta, um senhor goleiro, e Guardiola, que foi um craque e atualmente é um craque como técnico. Todas estas feras eram comandadas pelo lendário Johann Cruyff.

O bicampeonato veio contra um não menos estelar Milan, que tinha Baresi, Paolo Maldini e os franceses Dessaily, futuro campeão do mundo em 1998, na seleção francesa, e Papin. Além disso, no banco de reservas, os milaneses contavam com o técnico Fábio Capello, um dos grandes treinadores do mundo nos anos 1990.

Mas engana-se quem pensa que o São Paulo resumia-se apenas a um grande técnico, a base de jogadores do Tricolor contava com Raí, que jogou apenas em 1992, mas fez os dois gols da decisão, Müller, Cafu, Zetti e Toninho Cerezo, o jogador mais criticado da seleção de 1982, mas que alcançou a redenção quando conseguiu ser o melhor jogador da decisão de 1993.

CORINTHIANS – 2000 e 2012

Emerson Sheik com o troféu do Mundial de Clubes de 2012. Antes disso, em 2000, o Corinthians já havia conquistado a primeira Copa do Mundo de Clubes. Fonte: FIFA/Reprodução.

O Corinthians de 2000 foi um campeão mundial histórico, pois conquistou a primeira Copa do Mundo de Clubes organizada pela FIFA. Um Mundial controverso, pois os critérios de classificação à competição não foram claros. Para se ter ideia das incertezas que rondavam a organização do campeonato, o Real Madrid foi convidado para participar do torneio, o Vasco conseguiu sua vaga por ter sido campeão da Libertadores de 1998, quando o Palmeiras havia conquistado este mesmo campeonato em 1999 e o Corinthians foi convidado por ter sido campeão do país-sede da competição.

Mas o título corinthiano ficou acima destas questões até porque foi merecido e premiou o melhor time brasileiro do final dos anos 1990. Treinado por Oswaldo de Oliveira, o esquadrão alvinegro contava com Edílson (melhor jogador do Mundial), Rincón, Ricardinho, Marcelinho Carioca e Dida. A final realizou-se no Maracanã e acabou decidida nos pênaltis e o adversário do Corinthians foi o Vasco, que contava com Romário e Edmundo. Em suma, tivemos um campeonato dos sonhos nesta primeira edição de Mundial de Clubes organizada pela FIFA.

Já em 2012, a conquista corinthiana foi abençoada previamente pelo título da Libertadores, vencido diante dos tradicionais argentinos do Boca Juniors. O Corinthians do técnico Tite foi campeão invicto da competição sul-americana, algo que não acontecia desde 1978.

No Mundial, quem brilhou foi o peruano Guerrero, que fez os dois gols do Timão na competição, nas vitórias de 1×0 sobre o egípcio Al-Ahly e o inglês Chelsea, equipe de Lampard, Cech, David Luiz e Fernando Torres, que foi parada na final pela estupenda atuação do goleiro Cássio, intransponível naquele jogo.

SÃO PAULO – 2005

Amoroso e Júnior comemoram a conquista do Mundial de Clubes de 2005. Fonte: FIFA/Reprodução

O único clube brasileiro que venceu a Copa Intercontinental e o Mundial de Clubes da FIFA merece um destaque maior. O Tricolor paulista teve a honra de conquistar a Copa do Mundo de Clubes na edição em que o torneio passou a fazer parte definitivamente do calendário do futebol mundial.

Campeão da Libertadores de 2005, o São Paulo teve dificuldades para passar da semifinal do Mundial, jogada contra o saudita Al Ittihad. Uma atuação acima da média do goleiro Rogério Ceni, que até fez gol nesta partida, garantiram o São Paulo na final, que foi disputada contra o Liverpool, do técnico Rafa Benitez e de Steven Gerrard, Dudek, Cissé e do desengonçado artilheiro Peter Crouch.

O time de operários do São Paulo contava com um único craque, Rogério Ceni, todos os outros jogadores lutavam e davam o melhor de si para o time. Lugano, Danilo, Amoroso e Josué incansáveis, prepararam o espetáculo que foi arrematado pelo gol do volante Mineiro, o motor são paulino, 1×0 e título garantido, apesar da pressão da equipe inglesa.

 INTER – 2006

O Inter, do saudoso capitão Fernandão, conquistou o mundo em 2006. Fonte: FIFA/Reprodução

Embora os colorados sempre lembrassem que a Copa Intercontinental de 1983, conquistada pelo Grêmio, não fosse um Mundial, é notório que depois deste título Tricolor, a corrida por um caneco internacional passou a ser uma obsessão para a torcida e também para todos os dirigentes que comandaram o clube do Beira-Rio, de 1983 em diante.

E a redenção chegou em 2006, quando o Inter, comandado por Abel Braga, derrotou o São Paulo na decisão da Libertadores e garantiu vaga para disputar a Copa do Mundo de Clubes, que seria realizada no Japão, em dezembro deste mesmo ano.

As perdas de Rafael Sóbis, Bolívar e Jorge Wagner, jogadores essenciais para a conquista da América, foram compensadas pelo esforço do grupo de jogadores, focados no Mundial e pelo surgimento de uma possível estrela, que prometia desequilibrar em terras japonesas, o garoto Alexandre Pato.

A caminhada do Internacional durante a competição não foi fácil, porque até mesmo na semifinal, diante do egípcio Al-Ahly, o time gaúcho teve que dar o seu máximo para vencer o jogo. O placar, 2×1, foi construído com gols marcados pela revelação Alexandre Pato e por Luiz Adriano, outra prata da casa.

Mas o maior obstáculo seria o adversário da final, o todo poderoso Barcelona, treinado pelo ex-craque holandês Rijkaard e que contava com Ronaldinho Gaúcho, melhor jogador do mundo em 2004 e 2005, mas também ex-ídolo do Grêmio. Além dele, o Barça tinha o luso-brasileiro Deco, o eficiente Puyol e Andres Iniesta.

Diante deste super-time o Colorado superou-se, encaixou o sistema de marcação e não deixou a equipe espanhola trocar passes de forma tranquila, cada jogador do Barcelona era fustigado por um atleta do Internacional. Controlando as movimentações defensivas, o Inter golpeou o Barcelona de forma mortal com um gol feito por um improvável jogador, saído do banco de reservas, Adriano Gabiru, que era execrado pela torcida e tornou-se um mito eterno na galeria dos ídolos do Inter.

A vitória de 1×0 garantiu o caneco ao Inter e premiou jogadores do quilate do saudoso Fernandão, mas também Clemer, Edinho, Rubens Cardos, Índio e outros operários que colocaram o Colorado no mapa dos grandes campeões do futebol mundial.

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