Conquistar o mundo antes dos 20 e poucos anos

A agência Em Pauta ouviu 40 jovens de diferentes gêneros, idades, lugares e graus de escolaridade para entender como as pressões externas os afetam

Por Rafaela Stark

A geração Y – nascidos entre 1981 e 1996 – é caracterizada pela escritora Anne Helen Petersen como a “geração do burnout”, em decorrência da constante necessidade de obter sucesso em suas vidas. Isso se dá graças à educação que esses indivíduos receberam, sendo preparados incessantemente para o mercado de trabalho desde a infância. A autora ressalta que os millenials sofrem com comportamentos de competição e comparação o tempo todo, os levando a desenvolver doenças mentais, como a depressão.

Entretanto, as pressões da sociedade para alcançar o sucesso não se concentram apenas na geração passada. Jovens nascidos a partir de 1997 já começam a sentir os impactos que algumas cobranças externas podem acarretar, sendo elas casamento, filhos, graduações entre outras. 

A fim de entender melhor as preocupações desse grupo, a agência Em Pauta ouviu cerca de 40 jovens de diferentes lugares, gêneros, idades e escolaridades. Por meio de um questionário anônimo, os indivíduos responderam a questionamento sobre suas idades, gênero e grau de escolaridade. Cerca de 72% dos entrevistados se identifica como sendo do sexo feminino.

De acordo com as respostas cedidas, boa parte acredita que poderia estar mais satisfeita com a vida que leva no atual momento. Os desejos variam, conforme a faixa etária – de 15 a 29 anos – em que se encontram. Alguns relatam que gostariam de morar em uma casa maior ou adquirir uma. Outros dizem que desejam viver sozinhos, pelo menos durante um período, para que assim consigam entender como funcionam enquanto pessoas independentes. 

A vontade de estar só apareceu mais de uma vez entre as resoluções, pode-se afirmar que essa ânsia vem de uma necessidade de independência, derivada da pandemia. Durante pouco mais de dois anos, uma parcela considerável dos entrevistados viveu com seus pais ou responsáveis, o que acarretou no descobrimento de confluências nos hábitos de vida. Isso causou atritos entre os jovens e suas famílias, que nunca haviam convivido por tanto tempo no dia a dia.

Todavia, a insatisfação pessoal não é o maior problema para o grupo, e sim quando esse sentimento vem de terceiros, tais quais, a família. Dos vinte e sete consultados, ao menos cinco apresentaram dilemas similares: não se tornar bem sucedido até os 30 anos. 

“Sinto que a maioria das pessoas acredita que se você não for bem sucedido antes dos 30 você nunca mais será. Parece que sua vida acaba ali, não sei.” – Anônimo

“Sinto que devo me formar, ter um trabalho e salário relativamente estável antes dos 30. E também ter casa própria, o que pra mim é algo que ainda está MUITO longe e parece ser impossível” – Anônimo

Além do descontentamento, a comparação é algo constante na vida dos jovens entrevistados. Seja com as clássicas frases, relatada na pesquisa, “seu primo tem a sua idade e já está fazendo mestrado” e “na sua idade, eu já estava casado e com filhos”. Ainda que quem profira essas declarações diga que não, quem as escuta afirma sentir uma forte cobrança para alcançar os objetivos impostos pela sociedade conforme a idade que estão. 

Segundo um dos interrogados, apesar de estar feliz e em paz com seu estado atual de vida aos 20 anos de idade, ele expõe um certo incômodo com a maneira que terceiros se referem a si. Sentenças como “já está na sua hora de namorar” e imposições a cerca de casamento e filhos aborrecem a entrevistada, visto que elas vêm como a ideia de que falta algo para a jovem ser “completa”.

Tenho um exemplo muito bom de quando fui no chá de bebê e eu fiquei com o famoso último papel de presente – que indica que seria a próxima a engravidar/ter filhos – e disse em alto e bom som que ninguém iria me ver com filho até daqui há uns 10 ou 15 anos e simplesmente todas as mulheres mais velhas acham isso um absurdo ou um ultraje eu ter em mente a ideia de ser mãe aos 30/35 anos e passaram a discutir qual seria a idade perfeita para ser mãe. Tipo, como assim você acha um absurdo, uma jovem que recém completou 20 anos, mora com os pais, não têm renda própria e está no meio da sua graduação, não querer ter filhos agora? – Anônimo 

Concepções como a exposta pela jovem são hoje consideradas arcaicas, já que com o avanço da luta feminista e dos direitos das mulheres, entende-se que não é dever de toda mulher ter filhos, ainda mais tão precocemente. Além das pressões comentadas, esmagadora parte dos entrevistados compartilha um mesmo medo, o de fracassar. 

Constante medo do fracasso 

O medo é um sentimento inerente do ser humano, não há como evitá-lo, pois é um mecanismo de defesa do corpo. Contudo, ele pode se tornar um grande empecilho para o desenvolvimento de atividades, desde as mais simples do cotidiano até a realização de grandes feitos.

Um dos entrevistados, ao ser questionado se sentia-se pressionado a conquistar certos objetivos antes dos trinta anos, disse que seu pai e irmã, aos 21, já haviam realizados grandes feitos científicos, enquanto ele não. O caso apresentado é mais comum do que deveria, pessoas extremamente jovens que acreditam estar “atrás” em comparação aos seus familiares ou personalidades de referência. 

Outro relato, similar ao anterior, é de um indivíduo que vem de família razoavelmente grande, irmão mais velho de sete. Por vir de uma comunidade, ele sente a obrigação de ganhar o mundo, ser bem sucedido. O medo de fracassar frente às expectativas é, segundo ele, “complicado”.

O pavor dito por muitos, gera distúrbios de ansiedade e até mesmo pânico nas pessoas, podendo levar a doenças como a depressão. A agência percebeu que um número expressivo de entrevistados possui doenças e/ou transtornos mentais diagnosticados.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que cerca de 800 mil pessoas morrem por suicídio ao ano. Os mais afetados, segundo esse dado, são jovens entre 15 e 29 anos, mesma faixa etária que a pesquisa realizada pelo Em Pauta abrange. Durante a pandemia, a OMS crê que houve um aumento de 25% nos casos de depressão e ansiedade ao redor do mundo. 

Na amostragem acima, é possível perceber que quase metade dos entrevistados tem, ao menos, um transtorno mental ou desconfia que pode ter. A Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS) avalia que aproximadamente 85% das pessoas em países de baixa renda – caso do Brasil – que sofrem com transtornos mentais não têm acesso a tratamentos pelo sistema de saúde. E mesmo quando possuem esse amparo, ele não é de qualidade.

A OPAS também assume que transtornos como os identificados na pesquisa, tais quais depressão, ansiedade, pânico, transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) e o transtorno do déficit de atenção e hiperatividade (TDAH), podem atrapalhar o dia a dia. Metade dos questionados afirmam sentir, em algum nível, que seus diagnósticos são obstáculos para conquistar determinados sonhos e objetivos. 

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