A disputa sem fim pela independência da Catalunha
Por Roberta Muniz
Nunca se ouviu falar tanto sobre a Catalunha como nos dias atuais. O povo e o governo catalão lutam pela sua independência há alguns anos. Porém, o governo espanhol se mostra totalmente contrário e decidido em não permitir que isso ocorra.
A cada dia que passa, um novo desdobramento dessa história acontece. Na última quinta-feira (2), o Ministério Público da Espanha decretou a prisão de ex-conselheiros do governo da Catalunha, que se negaram a responder perguntas em um primeiro interrogatório. Na investigação, os réus são acusados por crimes de rebelião, apropriação indevida de fundos públicos e perturbação da ordem. Esse é apenas mais um dos impasses entre a defesa catalã e a espanhola.
O brasileiro residente em El Vendrell, município da província de Tarragona em uma comunidade autônoma da Catalunha, Rai Santos, conta que sente muito a tensão nas ruas por conta da questão da libertação da região catalã. Ainda, diz que a presença de policiais pelas ruas é bem maior do que se via antes de todo esse movimento, como se estivessem em clima de pré-guerra. “Sim, muito medo. Principalmente aqueles que são contra e se expressaram abertamente. Mas o medo principal é de entrar em uma crise ou desatar um conflito”, desabafa Rai, ao ser indagado sobre se o povo se sente amedrontado. A respeito da crise econômica, o brasileiro relata que muitas empresas estão deixando a região por causa da incerteza política.
Alguns dias antes do último ocorrido, em 27 de outubro a Catalunha havia declarado sua independência da Espanha, por meio de uma votação secreta entre os parlamentares. Logo depois, o Tribunal Supremo da Espanha suspendeu a declaração de independência. Após essa decisão, o Senado espanhol autorizou o governo do primeiro ministro, Mariano Rajoy, a intervir na região.
Outro momento de extrema tensão entre ambos os lados dessa luta, foi quando o povo catalão foi às urnas. Em votação ao referendo de independência, 90% dos votos foram favoráveis à separação da Catalunha. No dia da votação, em 1º de outubro, ocorreram ataques por parte da polícia espanhola contra os eleitores que decidiram votar. Foram mais de 800 feridos, em agressões que impactaram o mundo. “Foi chocante ver pessoas que não esboçaram nenhuma atitude violenta, tomar porrada por estarem sentados na frente da escola para a polícia não passar a retirar as urnas”, diz Rai acerca deste dia.
Ambas as posições dessa disputa têm as suas razões e, ao que tudo indica, essa luta parece que ainda vai levar tempo para se assentar. “Eu sou separatista. Eles [os separatistas] lutam pela liberdade de seu povo ser reconhecido. Por ter o seu próprio idioma, mesmo ele sendo proibido por mais de vinte anos e não terem perdido sua língua, seus costumes e origens. Os catalães nada tem a ver com os espanhóis. São povos diferentes”, diz a graduanda de enfermagem, Ângela Trentin, que nasceu no Brasil mas tem descendência catalã em razão de seus pais serem da região. Ainda sobre a importância da separação, ela conta que a Catalunha ganha identidade e que isso seria um fato histórico muito importante.
Como iniciou a luta pela independência
Na Constituição Espanhola de 1978 da Espanha, que é ainda a atual constituição que rege o país, as regiões do País Basco, Galiza e Catalunha foram definidas como “nacionalidades”. Também, foi permitido à Catalunha o direito automático de autonomia. Em 1979, a partir dessa autonomia, surgiu o Estatuto de Autonomia da Catalunha. Tanto a Constituição Espanhola quanto o Estatuto de Autonomia estabelecem que a Catalunha, como nacionalidade e língua própria, exerce seu próprio autogoverno.
Em 2006, os catalães aprovaram uma nova lei ao Estatuto de Autonomia, a qual atribuía mais poderes ao seu governo, definindo a Catalunha como nação. Entretanto, o Partido Popular, partido conservador da Espanha, fez enorme campanha contra essa nova lei por meio de recurso no Tribunal Constitucional espanhol. Isso acarretou em cortes consideráveis no Estatuto Catalão e a não autorização do uso do termo “nação”. Nesse momento, começava o acirramento do atrito entre Catalunha e Espanha.
Quatro anos depois, em 2010, a Espanha passava pela crise econômica mais profunda já registrada, que afetou com intensidade o território da Catalunha. Esse impacto teve maior repercussão na região, uma vez que é uma das mais ricas do país, e para onde grande parte da população migrou em busca de oportunidades de emprego. A partir de então, a luta pela independência só se intensificou e vem aumentando progressivamente.