Edneia Brazão traz o talento cabo-verdiano para o sul do Brasil

Das festas da infância à trilha premiada no Festival de Gramado: a jornada musical da cantora e compositora   

Por Isadora Jaeger    

 

Artista mescla em seu repertório músicas do seu país de origem e de outras nacionalidades       Foto: Acervo Pessoal 

 

Edneia Brazão é uma artista de 25 anos, natural de Cabo Verde, na África. Formada em Ciências Musicais pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel), ela atua como professora de canto, compositora e artista independente. Com o desejo de levar a cultura cabo-verdiana ao mundo, a cantora incorpora em sua arte elementos da música africana, que hoje compartilha com o público brasileiro por meio de suas canções.

Nascida na Cidade da Praia, na Ilha de Santiago, Edneia passou grande parte de sua infância na Aldeia SOS, onde viveu desde os quatro anos. A instituição, presente em mais de 130 países e territórios, com cerca de 570 unidades no mundo, oferece acolhimento a crianças e adolescentes que perderam ou estão em risco de perder o cuidado parental. Apesar de ter crescido na Aldeia, Edneia manteve contato com sua família biológica, parte de sua inspiração, já que cresceu cercada da música tradicional cabo-verdiana. Ela conta que, aos três anos de idade, fugia de casa para dançar em festas da vizinhança, mesmo sabendo da desaprovação da mãe.

O desejo de estudar no Brasil surgiu enquanto estava na instituição. Edneia conheceu o Brasil por meio das telenovelas e ficou encantada com o país. Ela conta que é comum os cabo-verdianos mudarem de localidade para cursar a faculdade, e que a Aldeia SOS incentivava as crianças a pensarem nos seus planos para o futuro. Desde então, seu interesse pelo Brasil virou assunto nos encontros do Plano de Desenvolvimento da Criança. No final do seu ensino médio, foi a visita da Embaixada do Brasil na feira de profissões que lhe aproximou de seu sonho. A partir disso, ela decidiu se preparar melhor: embora já dominasse o português desde a infância, seu contato com a língua era com o português falado de Portugal, o que exigiu uma adaptação ao vocabulário e às expressões brasileiras, já que algumas palavras têm significados diferentes ou, conforme o caso, até ofensivos no Brasil.

Após concluir seus estudos em Cabo Verde e ser aprovada para estudar no Brasil, aos 18 anos, Edneia ingressou no curso de Bacharelado em Ciências Musicais da UFPel, em Pelotas, no qual desenvolveu seus talentos e encontrou oportunidades para expandir sua carreira artística.

Apaixonada pelos ritmos cabo-verdianos, a artista cita como referências artísticas nomes Ildo Lobo, Mayra Andrade e Sara Tavares, cantora portuguesa de ascendência cabo-verdiana que foi peça fundamental no movimento da “nova música africana”. Com canções cantadas em português, crioulo cabo-verdiano e inglês, a obra de Sara Tavares auxiliou na construção da mescla de culturas nesse novo gênero.

Segundo Edneia, sempre que ela tem a oportunidade, ela apresenta a música cabo-verdiana, já que é uma manifestação cultural que tem muito a oferecer. “Eu acho que é uma forma de as pessoas conhecerem a cultura cabo-verdiana sem estar lá, sem estar presente em cada dança, em cada batimento de um tambor (…) Eu quero muito mostrar isso para o Brasil. É uma das coisas que eu tenho como objetivo da minha vida e que eu espero concretizar”, diz.

Na última semana de maio, Edneia fez apresentações em dois eventos comemorativos da Semana da África. Um deles a Terceira Edição da Semana da África do Coletivo de Estudantes na Universidade Federal do Rio Grande (FURG), na cidade do Rio Grande, e a Semana Africana de Pelotas. Em ambas ocasiões, ela interpretou canções de ritmos africanos, especialmente ritmos cabo-verdianos como a morna e a coladeira.

 

Apresentação no evento do Coletivo de Estudantes Africanos em Rio Grande             Foto: Acervo Pessoal

 

Embora levante a bandeira de Cabo-Verde com orgulho, Edneia também usa de inspirações de diversas culturas em sua arte. Ela acredita na música como uma linguagem universal, e sua paixão por outros idiomas faz com que ela busque sonoridades em diversos outros países. Sua admiração pelo pop norte-americano também se faz presente em seu repertório, com nomes como Whitney Houston, Beyoncé e sua favorita: Taylor Swift.

Assim como sua maior inspiração, Taylor Swift, Edneia nutre uma paixão profunda pela composição. Seu repertório autoral inclui canções como “Love Alwayse “Made My Way, parceria com a artista Taís Dewulf, ambas disponíveis no YouTube. “Eu escrevo muito o que eu sinto, o que eu passo. Eu tento trazer o que eu vivo na minha música”, diz.

No entanto, engana-se quem pensa que as conquistas de Edneia param por aqui. Suas habilidades como intérprete e compositora abriram ainda mais portas para a cultura africana no sul do Brasil. Por meio de um curta-metragem premiado, Edneia encontrou mais uma oportunidade de mostrar parte de suas raízes.

 

Edneia recebe prêmio de Melhor Trilha Sonora no 52º Festival de Gramado Foto: Edison Vara/Agência Pressphoto/Divulgação

 

O curta-metragem “Não Tem Mar Nessa Cidade, dirigido por Manu Zilveti e protagonizado por Edneia e Paulo N’Dermei, conquistou o prêmio de Melhor Trilha Sonora no 52º Festival de Cinema de Gramado. A trilha sonora, assinada por Pedro Erler, conta com a voz de Edneia nas canções. Em seu website, Pedro conta que Edneia lhe apresentou ritmos e artistas cabo-verdianos ao longo do processo de composição.

Edneia destaca que a participação no curta surgiu de forma inesperada, através de uma indicação de um amigo por meio das redes sociais, mas aceitou o desafio. “Eu sempre gostei muito da atuação. Quando era pequena, vivia brincando de atuar”, relembra. “Gosto muito dessa área, e quando recebi o convite, aceitei na hora. A gente fez um filme muito bacana — e agora ele está aí, no mundão.”

Enquanto desenvolve sua carreira, a artista não perde oportunidades de trabalhar com o que ama, seja música ou atuação, e já conta com mais uma produção nas telonas. Edneia protagonizará mais um curta-metragem com estudantes da UFPel, começando as gravações neste mês.

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COMENTÁRIOS

Muito legal conhecer a história da Edneia. Admirável a sua coragem, para buscar a realização de seus sonhos, apesar de tantas dificuldades pessoais. Excelente matéria jornalística.

Ana Maria Fuhro Louzada

Amei, matéria linda! 👏🏻👏🏻

Artur Prado

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