Brasil e Coreia unidos no filme “Fortaleza Hotel”

Drama brasileiro apresenta uma história simples, mas com nuances provocativas  

Por Giéle Sodré  

Clébia Sousa interpreta a personagem protagonista  “Pilar”             Foto: Jorge Silvestre/Divulgação

“Fortaleza Hotel”, o segundo longa de Armando Praça, maestro do sensível “Greta” (2019), traz uma história cheia de enlaces culturais e paralelos entre seus personagens e narrativa. Nele, Pilar (Clébia Sousa) é uma camareira que está perto do sonho de se mudar do Brasil para a Irlanda em busca de uma vida melhor quando conhece Shin (Lee Young-lan), uma mulher coreana de meia-idade, cujo marido que trabalhava no Brasil acaba de cometer suicídio. Shin está no país para resolver a cremação e traslado das cinzas do marido para casa, mesmo que ela mesma já não veja a Coreia como lar, tendo seu sonho de viver uma vida diferente no Brasil destruído com a morte do marido. Para conseguir transitar na cidade, pede a ajuda de Pilar, que fala inglês, para entender a linguagem e se movimentar pelo desconhecido de Fortaleza.

Ao mesmo tempo, Jamille (Larissa Góes), a filha que Pilar teve muito nova e que negligencia com frequência, envolve-se com pessoas problemáticas na área pobre onde vivia com a mãe. Está sendo mantida em cárcere até que uma quantia de 10 mil reais seja paga para a sua liberação. E é aí que o sonho de Pilar também desmorona, tendo que escolher entre o futuro que desejava e sua filha. Descobre-se em uma situação de desespero.

De alguma forma, as duas mulheres, Pilar e Shin, apresentam-se como reflexos e confortos uma da outra durante o filme. Shin é a imigrante que teve suas vontades e ideias despedaçadas pelas escolhas do marido, influenciadas fortemente pela própria cultura asiática de não tolerância à vergonha e ao fracasso. Tem apenas a escolha de voltar para a casa sozinha após navegar em um mundo que não conhece e ao qual não se adapta. Pilar, por outro lado, tem seus sonhos despedaçados em frente à imagem do que poderia ser, da frustração do desconhecido e descontente. Mesmo assim, as duas ainda encontram consolo uma na outra de uma forma quase agridoce.

Lee Young-lan e Clébia Sousa como Shin e Pilar         Foto: Jorge Silvestre/Divulgação

“Fortaleza Hotel”, no entanto, ainda é uma história sobre individualismo: Pilar constrói suas escolhas em volta de um sonho, aposta até mesmo em deixar a filha sozinha e, ao longo da trama, vai deixando cada vez mais seus ideais em prol das decisões que precisam ser feitas. O marido de Shin deixa-a sozinha, tomado pela vergonha ou pelo medo, fugindo de todos os problemas e acabando com todos os planejamentos e esperanças que haviam construído em conjunto.

E os padrões continuam, as cenas de solidão dos personagens ainda são muito construídas com trabalho de câmera, mantendo as protagonistas em bolhas até mesmo durante os diálogos, focando apenas em suas reações e expressões, mesmo quando outros personagens se tornam relevantes na trama.

E os trabalhos de fotografia e câmera continuam a mover a ambientação quando mostram uma Fortaleza longe das belezas naturais, os cenários são pouco chamativos, constroem um ambiente real e melancólico que demonstra o mundano de uma cidade normalmente exaltada como praiana e colorida, tendo seus ápices de beleza cinemática nos momentos mais melancólicos e solitários de Shin, a peça que não encaixa na narrativa brasileira e resiliente da trama.

O diretor Armando Praça faz novamente uma narrativa delicada e vívida, porém se perde um pouco quando tenta usar das figuras ao invés de explicar. A fórmula segue agridoce, sem a satisfação que normalmente se espera ao final de uma trama.  Porém somos levados a questionar sempre o certo e o errado de toda a história. Há uma pergunta com uma resposta muito difícil que é traduzida muito bem dentro de todas as nuances e desenvolturas de “Fortaleza Hotel”.

O filme está disponível no YouTube, GooglePlay Filmes, Apple TV e Telecine.

PRIMEIRA PÁGINA

COMENTÁRIOS

Comments

comments