Como o multilinguismo torna a pessoa superpoderosa?

O multilinguismo, de forma geral, é o uso de três ou mais línguas pelo indivíduo. Esse fenônemo pode ser estudado a nível social e individual. Em seu mais recente livro, “The Power of Language: How the Codes We Use to Think, Speak, and Live Transform Our Minds” (2023), a Professora Viorica Marian (diretora do Laboratório de Bilinguismo e Psicolinguística, Universidade Northwestern, nos Estados Unidos), multilíngue de origem moldava, busca dissecar as principais características e os benefícios do multilinguismo no comportamento humano e na mente. A partir de exemplos de fenômenos culturais e, especialmente, experimentos científicos, a autora expõe as principais complexidades do multilinguismo com relação à cognição, bem como seus efeitos na experiência e interpretação de realidade individuais e subjetivas.

Como mostra a pesquisadora, ser multilíngue significa possuir diversos “poderes”, que muitas vezes não são reconhecidos e apresentados na mídia e na cultura popular. Isso faz com que os falantes multilíngues não tenham consciência de seu próprio potencial. Consequentemente, a maioria das pessoas não sabe da importância de aprender línguas. Portanto, a professora Viorica se empenha em expor os diversos poderes do multilinguismo, sendo alguns deles:

  • Diminuir o preconceito: valorizar a aprendizagem de uma nova língua pode fazer com que o indivíduo também enxergue valor em sua cultura e povo. Dessa forma, a pessoa pode se tornar mais tolerante e aberta às diversas realidades culturais existentes.
  • Fomentar relações interpessoais e profissionais com novas pessoas: utilizar diversas línguas pode auxiliar a ampliar a variedade de pessoas do seu círculo, seja no âmbito profissional, aumentando as possibilidades de emprego; ou no âmbito pessoal, como no caso de amizades e outros relacionamentos.
  • Servir como um “presente a si mesmo”: o processo de aprender uma nova língua é mais divertido e fácil do que as pessoas imaginam, e seus efeitos são mais do que favoráveis ao indivíduo em comparação com as dificuldades. Além de poder colher os vários bens advindos do estudo de línguas, o indivíduo pode fazê-lo com um sentimento de realização pelo seu próprio esforço. 
  • Diminuir a chances de ser manipulado linguisticamente: um dos efeitos do estudo da língua é compreender a sua importância não somente na vida pessoal, mas também em nossa sociedade. Consequentemente, isso faz com que o indivíduo perceba os padrões e nuances no uso da linguagem em diversas situações de possível manipulação, como, por exemplo, política ou religiosa.
  • Estimular a criatividade: falantes de múltiplas línguas costumam fazer mais conexões entre itens diferentes, devido à vasta quantidade de palavras e conceitos em seu sistema linguístico. Essas associações contribuem para o nascimento de novas ideias, uma maior abertura a novas experiências e fortalecem a habilidade de resolver problemas. Além disso, pesquisas sobre criatividade cognitiva mostram que relações interculturais também contribuem para aumentar a criatividade, como em inovações no ambiente de trabalho e empreendedorismo, e criatividade ao escolher nomes para produtos de marketing.
  • Fortalecer a capacidade cognitiva: o conhecimento de múltiplas línguas não é o único meio de melhorar a saúde cerebral, mas é capaz de reforçar todos os benefícios cognitivos encontrados em outras atividades, como, por exemplo, a capacidade de fazer conexões entre palavras e sentidos (encontrado no hábito de leitura) e o atraso na manifestação da demência (encontrado na atividade física). Conforme a pesquisadora, a mente multilíngue faz uma espécie de “ginástica cerebral” por conta da constante troca de informações entre as línguas.

Ao ter em vista os diversos proveitos psicológicos, sociais e profissionais advindos do multilinguismo, é possível reconhecer a importância do conhecimento e do estudo de línguas. O multilinguismo é uma habilidade valiosa não apenas para o indivíduo, mas também para a sociedade como um todo, ampliando a compreensão e o apreço entre pessoas de diferentes culturas.

Referência
MARIAN, V. The Power of Language: How the Codes We Use to Think, Speak, and Live Transform Our Minds. 4. ed. New York: Dutton, 2023.

Como criar um filho bilíngue?

Para a autora do livro “The Power of Language: How the Codes We Use to Think, Speak, and Live Transform Our Minds” (2023), Prof. Dra. Viorica Marian (diretora do Laboratório de Bilinguismo e Psicolinguística, Universidade Northwestern), línguas são super-poderes. É através da língua que agimos no mundo e sobre o mundo. 

Criar crianças bilíngues/multilíngues é, nesse sentido, muni-las de super-poderes. A Prof. Dra. Claudia Maria Riehl, da Universidade Luís Maximiliano de Munique na Alemanha, elencou, em texto de 2006, algumas vantagens do multilinguismo precoce, tais como: maior facilidade em trocar entre as línguas, melhor entendimento de regras gramaticais, aprendizagem de leitura facilitada e capacidade aprimorada de reconhecimento das palavras.

Se você quer criar seus filhos de modo bilíngue ou multilíngue, não há receitas, mas podemos dar algumas dicas, sugeridas pela pesquisadora Marian (2023):

1. Aumente a quantidade de estímulo linguístico

Quanto maior for o estímulo linguístico oferecido à criança, maior será seu vocabulário e melhor o seu desenvolvimento gramatical – logo, maiores as chances de adquirir a língua. Exponha seu filho à língua tanto quanto possível!

2. Aumente a qualidade do estímulo linguístico

Estímulos vindos de outras pessoas são mais benéficos do que as telas. Interaja com a criança na língua-alvo: converse, leia livros e brinque com ela. Varie as palavras que você usa com as crianças.

3. Conte com a ajuda de amigos e família

Interagir com múltiplos falantes da língua-alvo pode ajudar no desenvolvimento bilíngue. Tios, primos, avós e amigos podem ser aliados dos pais nessa tarefa.

4. Encontre estratégias que funcionem para sua família

Não existe um método perfeito ou infalível para criar filhos bilíngues. Escolha a abordagem que funcione melhor para a sua família. Citamos alguns exemplos abaixo, mas você pode desenvolver suas próprias estratégias:

  • Um pai, uma língua: ou seja, cada cuidador falará uma língua com a criança. Por exemplo: a mãe falará espanhol e o pai, português. Essa é uma estratégia comum quando os pais possuem línguas maternas diferentes.
  • Língua de casa vs. língua da rua: dentro de casa, uma língua é falada pela família (normalmente, uma língua minoritária ou de herança). Na escola e nos demais ambientes de convívio social, ela irá adquirir a língua majoritária.

5. Observe a criança e dê comandos claros

Preste atenção na criança e em seus interesses. Há maior chance de a aprendizagem ser bem sucedida se as atividades envolvendo a língua forem interativas e interessantes. No entanto, às vezes, é necessário dar comandos para que a criança use uma língua ou outra. Os pais podem dar um comando social a mais, como “Tira o dedo da tomada, pega o garfo e fala na língua X.”

6. Considere uma educação bilíngue, se possível 

Escolas com programas bilíngues ou cursos de idiomas para crianças também são boas opções e auxiliam na manutenção de um bilinguismo/multilinguismo precoce. 

7. Continue pesquisando sobre desenvolvimento bilíngue

Existem muitos mitos sobre a criação bilíngue. Procure informações em fontes confiáveis. 

Referências
MARIAN, V. The Power of Language: How the Codes We Use to Think, Speak, and Live Transform Our Minds. 4. ed. New York: Dutton, 2023.
RIEHL, C. M. Aspekte der Mehrsprachigkeit: Formen, Vorteile, Bedeutung. In: HEINTS, D.; MÜLLER, J. E.; REIDBERG, L. (Eds.). Mehrsprachigkeit macht Schule. Kölner Beiträge zur Sprachdidaktik: Reihe A. Duisburg: Gilles und Francke Verlag, 2006. v. 4. p. 15–24.

Como aprimorar a sua aprendizagem de línguas estrangeiras?

Com base no livro “The Power of Language: How the Codes We Use to Think, Speak, and Live Transform Our Minds” (2023), da Prof. Dra. Viorica Marian (diretora do Laboratório de Bilinguismo e Psicolinguística, Universidade Northwestern, nos Estados Unidos), elencamos algumas estratégias que podem ser aplicadas para aprender um novo idioma na vida adulta:

1. Faça aulas

Além dos cursos particulares, muitas universidades e/ou instituições públicas oferecem cursos de idiomas. Existem várias boas opções! A Universidade Federal de Pelotas promove cursos de línguas presenciais de alemão, espanhol, francês e inglês a baixo custo. Para quem prefere aulas online, a plataforma Kultivi oferece cursos de várias línguas gratuitamente. Outra opção são as aulas da iniciativa Idiomas sem Fronteiras, que oferece cursos online e presenciais de seis idiomas diferentes em várias universidades do país. 

2. Use aplicativos

Se você não tem tempo para fazer aulas, a tecnologia é sua aliada. Existem vários aplicativos para você escolher (por exemplo, Duolingo, Babel e Wlingua). Muitos deles contam com uma proposta de gamificação, que estimula a produção de serotonina e dopamina e torna a aprendizagem mais divertida. 

3. Viaje, se possível 

Imersão e contato com falantes nativos são excelentes modos de aprender uma língua. Busque por programas de intercâmbio junto à sua universidade ou agências privadas. A UFPel, por exemplo, possui uma série de universidades parceiras, com as quais estabelece acordos de mobilidade. Programas de voluntariado ou AuPair também são boas opções. 

4. Se relacione com falantes de outras línguas

Interaja com pessoas que falem outras línguas! Essa é uma das maneiras mais fáceis (e divertidas!) de aprender outra língua, ao mesmo tempo em que amplia seu círculo social. Algumas universidades possuem grupos de conversação em língua estrangeira. Você também pode praticar através do Tandem. Nesse método de aprendizagem, um falante nativo ou estudante da língua “A” que está aprendendo a língua “B” se encontra com um falante nativo ou estudante da língua “B” que está aprendendo a língua “A” para conversarem e aprimorarem suas habilidades linguísticas. Isso pode acontecer presencialmente ou online através do aplicativo

5. Crie hábitos

Faça da aprendizagem uma parte do seu dia a dia. Consistência é a chave! Mas não é preciso estudar através dos livros ou de aulas todos os dias. Ouvir músicas, assistir a filmes ou jogar jogos na sua língua-alvo também são formas de se expor à língua. 

6. Use técnicas mnemônicas e associações

Mnemônicos são técnicas de memorização. Existem vários mnemônicos: músicas, acrósticos, acrônimos, siglas etc. Um mnemônico com o qual muitos estudantes de alemão se deparam, por exemplo, é o acrônimo “TeKaMoLo” – uma técnica para lembrar a ordem das informações em uma frase (tempo, causa, modo e local). Para os aprendizes de inglês, há o acrônimo OSASCOMP, que refere-se à ordem dos adjetivos – opinião, tamanho (size), idade (age), formato (shape), cor, origem, material e propósito. Além disso, faça associações entre palavras parecidas entre as línguas (por exemplo, information e informação), crie pontes e narrativas que funcionem para você.

7. Encontre estratégias que funcionem para você

Existem muitos caminhos para aprender uma nova língua. Escolha aquele que se encaixe no seu dia a dia e no seu estilo de aprendizagem.

Independentemente do caminho escolhido, o maior investimento para aprender uma nova língua é o tempo. Quanto mais tempo a pessoa dedicar com as estratégias corretas, mais rápido e melhor poderá ser a aprendizagem.

Referências
MARIAN, V. The Power of Language: How the Codes We Use to Think, Speak, and Live Transform Our Minds. 4. ed. New York: Dutton, 2023.