Conheça a trajetória do DJ porto-alegrense que vem realizando eventos musicais na região de Pelotas
por Amanda Marin

Tom Nunes marca sua carreira pela autonomia e a expressão afirmativa da cultura
A cultura eletrônica sempre esteve atrelada a movimentos de resistência, e poucos nomes representam essa interseccionalidade tão bem quanto DJ porto-alegrense, Wellington Nunes da Silva, ou Tom Nunes, como é conhecido. Com uma trajetória marcada por autogestão e identidade, o artista se destaca pelos sets energéticos focados em sets afros e latinos, e pelo ativismo dentro da cena cultural. Como homem negro e LGBTQIA+, Tom utiliza sua arte como espaço de expressão e luta, resgatando as raízes da música eletrônica e ocupando lugares que, historicamente, não foram pensados para corpos como o seu.
Seu primeiro contato com a música veio da infância festiva e rodeada de sons, mas a decisão de se tornar DJ veio de uma necessidade concreta: estar em espaços de festa sem ter dinheiro para isso. A solução encontrada foi coletivizar o acesso à música. “A gente começou a se juntar e colocar um som na rua. Precisava de gente pra tocar, e assim a coisa foi crescendo”, conta. Dessa organização espontânea surgiu a base para a sua atuação como DJ e produtor cultural.
Com influências musicais negras, latinas e LGBTQIA+, seu som passeia por gêneros variados, mas o house é o eixo central de sua identidade artística. “House é música preta. Hoje, quando se fala em eletrônica, é algo muito distante das origens, e a minha caminhada também é essa retomada”, reflete. Essa consciência histórica se reflete tanto nos sets quanto no discurso. A presença digital também é um fator essencial para sua trajetória, sendo um dos elementos que possibilitam a expansão de seu trabalho. “Os artistas hoje são multi coisas. Produzem, cantam, mixam, fazem vídeo. Minha atuação na internet está diretamente ligada à minha carreira, e por isso é tão importante.”, somando assim quase seis mil seguidores no seu Instagram.
Oportunidades e desafios
Dentre os espaços em que se apresentou, um dos mais marcantes foi o festival Cabobu, em Pelotas, no qual atuou como DJ e MC, conectando-se com o público de forma mais direta. Entretanto, relata que estar nesses ambientes não é sinônimo de aceitação automática. “Sempre parece que tenho que provar que sei fazer o que faço, que estou no lugar certo”, sobre os desafios enfrentados na cena musical. Em eventos, já foi tratado de forma diferenciada por funcionários e frequentadores, só ganhando reconhecimento após subir ao palco. “Depois que tu tocas, te tratam de outro jeito, é fato e difícil de lidar”.
Apesar dessas barreiras, Tom Nunes segue impulsionado pelo coletivo. Desde os primeiros passos no Arruaça e Turmalina, o trabalho em rede sempre foi fundamental para sua formação, e é nas trocas com outros artistas que ele encontra referências. Ele destaca a importância desses diálogos para a construção de sua trajetória, enxergando na experiência de outros músicos um caminho para fortalecer sua identidade artística. “Hoje tenho o prazer de conversar com pessoas que fazem essa arte preta e LGBTQIA+ há décadas. Gosto muito dos contatos com DJ Helô, de Pelotas, e DJ Malasia, de Porto Alegre”.
Ao longo da carreira, transitou entre espaços culturais alternativos e grandes eventos, notando como a recepção varia conforme o público. “Faço parte de uma cena underground da música eletrônica, mas também transito no mainstream. A resposta do público é diferente. Em espaços culturais, já existe uma predisposição para entender o que eu trago”. Esse contraste revela as diferenças de percepção entre públicos mais nichados e aqueles acostumados a consumir música de forma mais ampla e comercial. Enquanto na cena underground há uma maior abertura para experimentação e inovação, no mainstream, muitas vezes, é necessário encontrar um equilíbrio entre identidade artística e expectativa do público

Set na casa noturna Neue, em Porto Alegre, no ano passado
Mesmo diante dessas diferenças, Tom Nunes mantém sua essência e entende que cada espaço ocupado é uma conquista. Ele percebe que sua presença em eventos de diferentes perfis contribui para ampliar o alcance de sua arte e reforça a necessidade de representatividade dentro da música eletrônica. Sua performance carrega uma mensagem maior, conectando-se com sua trajetória e com a luta histórica de artistas negros e LGBTQIA+.
Para Wellington, a arte é resistência e reconstrução. Sua trajetória reflete a importância da ocupação de espaços por artistas negros e LGBTQIA+, trazendo para a pista de dança tanto a batida, quanto a história de uma cultura que resiste e se reinventa a cada som. Mais do que um DJ, ele se firma como um agente de transformação, ampliando narrativas e reforçando a presença de corpos dissidentes na cena musical.
COMENTÁRIOS
Nossa, fiquei muito feliz e contemplado nessa escrita. Obrigado Arte no Sul por ser esse espaço, tão necessário. A cultura local agradece!
Tom Nunes
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