Cidade conta com jovens organizadores de batalhas de rima que movimentam cultura hip-hop às quartas e quintas-feiras
Por Giovana de Sá e Khadija Bakkar
O cenário do rap no Brasil vem crescendo e tomando forças desde os anos 2000, com as batalhas de rima. Desde 2019, em Rio Grande, no coreto da Praça Tamandaré, às 19h, todas as quintas, ocorre a Batalha do Cassino. Consiste em um encontro de MC’s que se enfrentam em desafios de improvisação, criando rimas de temas variados, enquanto são avaliados por jurados e pelo público. Também há a novidade da Batalha das Gurias nas quartas-feiras.
A mestranda Carolina, conhecida nas batalhas como Cacau, conta sobre a importância do rap em sua vida. Desde os 13 anos, Cacau aprecia conteúdos de hip-hop e, ao entrar no curso universitário de Letras, teve vontade de inserir o rap em seus estudos. Segundo ela, o rap, por ser muito vasto, torna possível a criação de uma linha atemporal sobre várias manifestações culturais.
“Eu comecei a fazer mestrado em História da Literatura e minha pesquisa é sobre literatura marginal periférica, essa ligação do rap e da literatura. Fui me inspirando nisso para as minhas poesias, usando algumas referências, aí, no ano passado, resolvi colocar meu nome para participar das batalhas. Eu estou aprendendo muito, porque já tenho 26 anos e, com a rima, você acompanha a gurizada de 17 e 18 anos e acaba aprendendo muito com eles’’, comenta.
Além das batalhas, a semana do “Rap contra o frio” também é uma ação que movimenta a cena hip-hop da cidade, unindo solidariedade e arte. O evento geralmente conta com uma programação de oficinas, batalhas de beatmakers e bailes em Rio Grande e Pelotas, tudo em prol da arrecadação de agasalhos e alimentos.
Apesar dessas ações, o cenário hip-hop ainda enfrenta muitos desafios no município de Rio Grande. Segundo Cacau, o rap é um movimento cultural que está mudando a vida dos adolescentes, mas que infelizmente não é valorizado pela gestão da cidade. “Eu acho que a grande massa de Rio Grande deveria reconhecer muito mais o hip-hop, porque ainda existe um preconceito muito grande das pessoas em enxergar o hip-hop como um agente cultural que está mudando e salvando vidas,” afirma. E reitera: “A gente tem a estética marginal, com orgulho, porque estamos à margem da sociedade, mas nós estamos fazendo o ‘corre’ certo e tem tudo para quem governar a cidade começar a valorizar.”
Batalha das Gurias
As batalhas de rap também vêm ganhando força no meio feminino, e as mulheres estão crescendo cada vez mais na cena. Para Amanda Jotacê, a paixão surgiu quando rimou pela primeira vez aos 14 anos, em uma tarde, sem planejamento nenhum para participar da batalha. Logo ela se identificou com essa arte e com a adrenalina que ela traz, podendo se expressar em cada rima improvisada.
A cena hip-hop é muitas vezes tratada como um ambiente exclusivamente masculino. E as mulheres podem ser vítimas de machismo mesmo no rap. Já que este pensamento dificulta a participação feminina nas rimas, as MC’s da cidade criaram a Batalha das Gurias, uma iniciativa para atrair mais meninas para a cena. Com a primeira edição, vinculada à Batalha do Cassino, tendo alcance no movimento, elas resolveram criar a própria batalha, com organização e convicção delas. Assim, a Batalha das Gurias ocorre quinzenalmente, nas quartas-feiras, a partir das 19h, no Coreto da Praça Tamandaré.
Iniciativas como essa incentivam as meninas que ensaiam suas rimas sozinhas em casa a perder o medo e mostrar seu talento fora do seu quarto. A participação desses novos talentos é essencial para dar força ao movimento feminino no rap, ainda predominantemente masculino, e para ganhar o respeito da plateia, que é o termômetro de votação das batalhas.
Amanda Jotacê comenta que o público e outros MC’s já estão habituados a ver mulheres rimando, mas que ainda é comum ouvir nesse meio comentários e discussões sobre o papel das mulheres durante as rimas femininas, o que desvia a atenção dos versos. Jotacê confessa achar a repetição dessas situações cansativa. “A gente carrega, sim. uma pauta. Mas não somos somente isso. Em todo lugar que eu estiver, vou trazer a pauta das mulheres, porém é muito triste ver que, muitas vezes, a nossa rima perde um pouco do valor devido a isso e que as pessoas não conseguem se abrir neste sentido.”
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