Zudizilla: a luta, a vida e a obra do rapper pelotense

por Caroline Albaini

O fácil acesso aos meios de gravação tornou mais simples a popularização mundial de diversos gêneros musicais, sendo um deles o rap. Saído dos guetos e mesclando um ritmo intenso com rimas poéticas o Rhythm and Poetry (ritmo e poesia, rap) migrou para os centros urbanos após desenvolver-se nas margens da sociedade norte-americana. Em Pelotas são incontáveis artistas que compõem o cenário da categoria musical, lançando suas mixtapes, seja por CD ou disponibilizando seus trabalhos na internet. Um apaixonado pelo gênero é o rapper Zudizilla, que através de rimas, busca expressar seus pensamentos sobre assuntos com os quais se depara nas ruas, como o preconceito, por exemplo.

Designer por profissão, grafiteiro por essência, artista plástico de coração e mc por excelência, a arte sempre esteve presente na vida do cantor. Antes dos 18 anos já tinha exposto seus desenhos em locais importantes como o espaço da Secretaria Municipal de Cultura (Secult) e no saguão nobre da prefeitura pelotense. A proximidade com o âmbito urbano e suas mais variadas vertentes fez com que Zudizilla experimentasse superfícies maiores para expressar sua arte – dos traços de um desenho para as letras de uma composição. A partir daí, transitou entre o hardcore e o punk antes de encontrar-se no rap, sem nunca esquecer nenhuma das influências que hoje o tornam um mc diferenciado, não apenas pela forma de cantar e vestir, mas pelas atitudes, sempre acompanhadas de sua personalidade forte e muitas vezes classificada como revoltada.

O nome artístico vem de Godzilla Africano, os povos da África do Sul. Para compor suas rimas, o cantor inspira-se no ciclo da vida, nos estímulos que vêm das ruas e na influência que as drogas têm na juventude. No campo musical, suas inspirações não são delimitadas: “não tenho um ídolo em especial, mas acho que muita gente boa vive e viveu, cada qual em sua expressão me influenciaram”. Em Pelotas, o rapper também tem suas referências, como em um cenário que considera o mais versátil do país. “Curto uma rapaziada, quase todos, e tenho o Pok Sombra como referência. Mas curto o Johnguen, Bova, Fill, Guido, Guigo, Guile, Zumbi, enfim, uma galera”. Zudizilla conta ainda que há cerca de sete anos o rap era só um hobbie para boa parte dos músicos da cidade, que não se importavam muito com a qualidade de suas produções. Hoje essa visão mudou, mas o mercado continua difícil. “Tá a mesma merda e é para todo mundo. Quem se permite relaxar não prospera! Quem está no topo não dorme e quem está começando não pode vir por menos. A não ser que almeje menos”. Ao ser questionado como se tornou músico, Zudzilla contesta: “não virei, não sou e não me sinto como um”.

Zudizilla. Imagem: Divulgação

Zudizilla.
Imagem: Divulgação

Remando contra o estereótipo do rap nacional, Zudizilla não se incomoda com o preconceito que o acompanha seja pelo estilo – os dreads de seu cabelo – ou a cor negra da pele. Como um guia, leva consigo a seguinte frase: ”não é o que fizeram de você, mas o que você faz do que fizeram de você”. Enquanto dribla as críticas, almeja desvendar os caminhos desconhecidos através de sua arte — “quero chegar na plenitude da minha coerência, no ápice da criatividade, no auge da minha expressão, no máximo da minha capacidade como alguém que pode e deve ajudar pela palavra”. Apoiado por uma série de amigos, parceiros e sonhadores, Zudizilla busca em seu trabalho agregar valores que possam ser oferecidos por possíveis companheiros que compactuem do ideal. Esses valores nada têm a ver com financeiro, vale muito mais um parceiro que aposte no ideal da música.

Seu último trabalho – intitulado “Luz” – foi lançado em 2013. Uma mixtape produzida dentro do município de Pelotas com algumas poucas colaborações externas, não por bairrismo, mas para que sirva como prova física, para os artistas locais, sobre o quanto é grande a força do “querer”. Mas seus outros projetos já têm continuidade. Com previsão de lançamento para o ano que vem, Zudzilla está produzindo e compondo as canções da sua próxima mixtape, “Faça a coisa certa”.

Ouça, abaixo, a faixa “Slow”, do EP “Foda-se”:

Gírias do gênero musical:

Mixtape: uma seleção de canções, normalmente com copyright e adquiridas de fontes alternativas. As músicas podem ser encontradas em sequência ou de forma agrupada por características comuns como ano de publicação, gênero e outros aspectos mais subjetivos. Como consequência também tem surgido mixtapes de vídeos.

MC: tendo suas raízes no DJ (dee-jay) jamaicano, o MC no gênero rap é um artista ou cantor que normalmente compõe e canta seu material próprio e original (não deve ser confundido com DJ, o qual interpreta a música de início e cria mixagens para ela).

Beatbox: a partir do inglês significa, literalmente, caixa de batida e refere-se a percussão vocal do hip-hop. Consiste na arte em reproduzir sons de bateria com a voz, boca e cavidade nasal. Também envolve o canto, imitação vocal de efeitos de DJs, simulação de cornetas, cordas e outros instrumentos musicais, além de outros efeitos sonoros.

Freestyle: o modo de cantar o rap de forma improvisada. Colocando versos feitos na hora, baseados nos versos dos seus adversários. Geralmente os MC’s participam de rachas, disputas de free style onde um tenta ser melhor do que o outro.

Flow: definido como “ritmos e rimas” de letras de uma do hip-hop e de como elas interagem.

Rap: um discurso rítmico com rimas e poesias, que surgiu na década de 1960 quando após a criação dos sistemas de som, que eram colocados nas ruas dos guetos jamaicanos para animar bailes. Esses bailes serviam de fundo para o discurso dos “toasters”, autênticos mestres de cerimónia que comentavam, nas suas intervenções, assuntos como a violência das favelas de Kingston e a situação política da Ilha, sem deixar de falar, é claro, de temas mais prosaicos, como sexo e drogas. No início da década de 1970 muitos jovens jamaicanos foram obrigados a emigrar para os Estados Unidos, devido a uma crise económica e social que se abateu sobre a ilha, o que levou a disseminação do estilo. O rap é um dos cinco pilares fundamentais da cultura hip hop, e não utiliza melodias e motivos decorativos e harmônicos com arranjos elaborados dos instrumentos, mas vale-se somente em quão rápido o cantor narra a sua “fala” com muito pouca musicalidade adicionada a sua poesia.

 

Outros Nomes:

As influências de Zudizilla também são influenciadas por ele.

Guido CNR: Guido nasceu e foi criado nas periferias de Pelotas. Iniciou sua Carreira como músico no ano de 1997, dando inicío ao Grupo Banca Cnr (Consciência Negra Rappers). Em seus 16 anos no Rap, Guido CNR lançou 4 cd’s com o Grupo: “Sabedoria de vida”, “Seja bem vindo”, “A banca” e “Rap, Mulheres e Drinks”. Os músicos ganharam ainda o prêmio “Lança de Ouro”, como melhor grupo do interior. Em 2013, Guido CNR lançou seu primeiro trabalho solo com o disco “Fúria”. Suas letras relatam um pouco da sua história, entre o cotidiano em seu ponto de vista, com revoltas e reivindicações pelo descaso do governo, a violência extrema nas periferias e outros. Após, laçou o EP “Loucos viciados e Revolucionários” e também o disco “#G2_cnr”, com seu colega de trabalho Glauco Cnr. No momento atual trabalha no disco #100lIMITES lançado agora no fim de 2014.

Guido CNR. Imagem: Divulgação

Guido CNR.
Imagem: Divulgação

Garcez DL conheceu rap e reggae ao mesmo tempo, no bairro onde morava. A relação com a música é antiga, a avó tocava piano e ele acompanhava, cantando. Compôs pela primeira vez aos 15 e, depois disso, não parou mais. A escolha pelo rap foi pelo acaso, pois sempre gostou de todos os estilos musicais. “Sempre me chamou a atenção a questão do protesto, ter uma mensagem. Mostrar algumas falhas no sistema e apontar perspectivas de mudanças”, afirma. Garcez não vive só da música: vende camisetas, CDs, faz artesanato e até trabalhos publicitários, área em que é formado.

Garcez DL. Imagem: Divulgação

Garcez DL.
Imagem: Divulgação

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