Vida de cão não, porque tá bom para cachorro!
Por Vanessa Lija
Eles vão ao salão de beleza, cortam unhas, fazem hidratação nos pelos e, muitas vezes, os produtos utilizados são mais caros do que os utilizados pelos seus donos. Sim, os animais domésticos, hoje em dia, são tratados com todos os luxos dignos de seres humanos.
Há alguns anos, popularmente, a maioria dos animais se alimentava da comida que os donos comiam, ou alguma ração comum. Dormiam em casinhas na rua e banhos eram dados com sabonetes anti-pulgas. Hoje, sabemos que animais não devem consumir comidas que contenham sal, as rações são específicas para porte e raça, e ainda existe uma vasta opção de alimentos complementares como bifinhos, comidas frescas enlatadas e biscoitinhos. Alimentos de alta palatabilidade, que caem no gosto dos animais, muitas vezes são utilizados como estratégia de adestramento, dados ao animal perante uma atitude correta.
Além disso, a maioria dorme dentro de casa porque apresenta maior sensibilidade a fatores externos, sendo vulneráveis a doenças. Banhos que eram dados em casa, passaram a ser dados em “pet shop”. Salões de beleza onde eles passaram a utilizar shampoo, condicionador, e dependendo do pelo, até máscara de hidratação. Perfume, talquinho, lacinhos no caso das fêmeas e gravatinhas para os machos, complementam o banho.
O mercado pet vem crescendo de maneira estrondosa, e por mais que tenhamos bichinhos de estimação e se tenha carinho pelos animais, ainda soa estranho para algumas pessoas a compreensão de toda essa mudança. Cada vez mais comum, o serviço de hotéis para cães vem crescendo no Brasil, devido à necessidade de viagens de seus donos e o receio de deixar seus mascotes sozinhos em casa. Ou, muitas vezes, o motivo para a procura desses serviços resume-se à vontade de reservar alguns dias para ficar com o animalzinho de estimação em um lugar destinado a ele, onde tenham atividades direcionadas ao mascote e ao proprietário . Alguns hotéis assemelham-se a resorts, ambientes de muito conforto com intuito de viabilizar a boa estada, principalmente ao cãozinho.
Animais ganham espaço nos veículos de comunicação
Além de todo esse tratamento VIP, cães já contam com uma revista só para eles, a Cães&Cia, criada para esclarecer todas as dúvidas recorrentes à criação de animais de estimação.
Feiras e conferências internacionais direcionadas aos produtos pets são comuns no eixo Rio-São Paulo. Enquanto isso, nos EUA já existe a “DOGTV”, canal por TV a cabo que transmite imagens exclusivamente de animais, com fundo sonoro tranquilizante. Mantendo o animal entretido e tranquilo, enquanto seus donos precisam trabalhar. O conteúdo é cientificamente adaptado ao público de quatro patas. Com sons, cores e ângulos projetados de modo que sejam mais apelativos aos animais. A ideia fez tanto sucesso que o projeto caminha para distribuição nacional. Enquanto isso não ocorre, cães que não residem na Califórnia podem ser agraciados por seus donos com uma assinatura no valor de US$9,99 por mês.
O que instiga é o motivo que fez com que surgissem cada vez mais opções no mercado pet. E a disposição das pessoas a pagar por esse tipo de serviço. Que vão desde o cuidado com a higiene, vaidade com a compra de roupas e acessórios, até atrações televisivas. Apesar de serem uma ótima companhia e merecerem excelência em tratamento, esses recursos não custam pouco.
Para a proprietária do Pet Shop Mundo entre Patas, Naura Funchal, esse desenvolvimento mercadológico na área pet tem se dado de uns sete anos para cá, antes não era comum estabelecimentos comerciais com essa finalidade. Hoje, já são mais de quarenta pets registrados na cidade de Rio Grande, número bastante acentuado se considerarmos o tamanho da cidade, e também a quantidade de estabelecimentos trabalhando sem registro. E garante que os proprietários estão satisfeitos com a demanda de serviço, denotando a probabilidade de uma contínua expansão nessa área.
Segundo Naura, esse aumento deve-se a consequência de uma vida muito corrida, que incentiva as pessoas a escolher animaizinhos que darão amor e serão companheiros, ao invés de terem filhos. “Conheço vários casais que ao cogitarem ter filhos, escolheram ter um animalzinho de estimação”. Filho exige um cuidado muito mais frequente, uma atenção redobrada, e uma dependência muito maior. Então, os casais costumam optar por um animalzinho de estimação, até encorajarem-se a ter filhos em meio à correria da vida cotidiana. “Se a pessoa precisa sair, o cão pode ficar sozinho, já um bebê não pode ser deixado sozinho nem por um minuto”.
De animais de estimação a membro das famílias
Sendo comum a criação de animais para suprir o desejo de ter uma criança em casa, o sentimento atrelado a esses bichinhos é enorme, fazendo com que seus donos não meçam esforços nem gastos para mantê-los da melhor maneira possível. Assim, aproximando-o da condição humana. São tratados como membros das famílias e não como animais de estimação. Então, toda novidade que surge no mercado e que vise o bem estar do cão faz sucesso. Sejam hotéis para cães, roupas que se assemelham a roupas de pessoas, ou produtos para cuidado e higiene.
A médica veterinária, Roberta Miranda, considera preocupante essa maneira exagerada de tratar os cães como seres humanos. “Obviamente que concordo e espero que cães e todo e qualquer animal seja bem cuidado, seja alimentado e receba tudo que merece, mas ultimamente essa relação me parece preocupante.” As pessoas parecem perder o limite, desenvolvem demasiado amor ao animal, sem considerar que a vida do animal não é muito longa. Ao perder um “companheirinho”, muitas pessoas entram em depressão e enfrentam vários transtornos psicológicos.
Ao perguntar a médica como está sendo vista a saúde dos animais domésticos e as inovações em tratamentos para animais, Roberta afirma que ao apresentar alguma característica não habitual, 90% dos proprietários levam seus animaizinhos direto ao veterinário. Com isso, o índice de morte por negligência diminuiu bastante, confirmando a ideia de que os cuidados e preocupações com os animais estão cada vez mais acentuados. Ao falar sobre novos tratamentos, a veterinária diz que as cirurgias e tratamentos feitos em humanos hoje são feitos em animais também. As populares castrações, apresentam valores acessíveis, já cirurgias mais complexas podem ser mais caras do que se realizadas em seres humanos.
Roberta ainda comenta sobre um projeto que está sendo desenvolvido pelo curso de Medicina Veterinária, na Universidade Federal de Pelotas, que visa uma sala equipada para tratamentos como quimioterapia, radioterapia e até acupuntura. O projeto tem a intenção de formar profissionais preparados para ministrar esse tipo de tratamento aos mascotes. Complementos para cura de alguns tipos de doenças, onde a cirurgia não seria a solução mais indicada.