Everson Zoio e a cultura do estupro
Por Júlia Müller
Em setembro do ano passado, o youtuber Everson Zoio, que tem mais de 600 milhões de visualizações no próprio canal, participou de um vídeo intitulado “Putaria +18” contando em detalhes como estuprou uma mulher. Na última sexta-feira (27/7) o relato veio a tona e a discussão sobre o ato sem consentimento tomou conta das redes sociais. Hoje (28/7) ele se pronunciou a respeito.
Na tarde de hoje, o youtuber publicou um vídeo sobre o caso dizendo que o caso é uma mentira e que queria ‘aumentar’ a história. “Homem é assim, homem sempre aumenta as coisas. Nada aconteceu mas ele quer aumentar, quer acrescentar”, relata.
Foi preciso um ano, dez meses e nove dias para que algum usuário assistisse o relato do homem de 26 anos e pudesse descobrir o ato velado em meio a tantas risadas. No vídeo, com pouco mais de quatro minutos, a história da violência sexual é contada entre um grupo de quatro homens, posicionados em frente a uma câmera que reproduziu os dizeres obscenos para os mais de nove milhões de inscritos no canal do YouTube de Everson.
“Era pra ser uma brincadeirinha. Mas eu fiquei tão sem graça quando ela acordou que acabei indo dormir” diz Everson. A história foi contada no vídeo em que os amigos do youtuber aparecem nas imagens e dão gargalhadas, em nenhum momento repreendem o homem acerca do ato sem consentimento. “Ela devia tá gostando, ia acordar sorrindo”, diz um dos rapazes.
Segundo o vídeo, a mulher disse que não queria uma relação sexual naquele dia por estar cansada, o Youtuber relata “beleza. Não vou te forçar, não sou ‘estrupador’”. O caso veio a tona e diversos usuários do Twitter comentaram o fato. Como pode ser visto no vídeo, apesar de falar ao jovem que não queria transar, ela foi desrespeitada e o homem conta a história como se o consentimento dela não fosse relevante. O vídeo publicado hoje pelo canal do youtuber Everson Zoio, em que ele desmente a história e se diz “arrependido pela piada de mau gosto”, revela a cultura do estupro.
Cultura do Estupro
A cultura do estupro é uma construção social que faz todas as práticas que violam os corpos femininos – como assédio e violência sexual – parecerem normais. Apesar da negação da mulher sobre a prática sexual, o homem diz que abaixou “o pijaminha fininho” e depois colocou a calcinha pro lado, “pra não acordar a ex-namorada”, como Everson relata no vídeo, e ainda completa “tá ligado aquele esqueminha, né?”. Histórias como essa mostram o quanto a mulher é diminuída socialmente, como se responder “sim” ao pedido de namoro fosse a assinatura de um contrato em que permite a liberdade de uso do corpo feminino.
Como pode ser visto no vídeo publicado hoje, a violência sexual foi normatizada a ponto de receber diversos comentários de outros usuários rindo da história e de outros tantos apoiando Everson, comentando com a #ForçaZoio.
Segundo David Marques, pesquisador do Fórum Brasileiro de Segurança Pública – que auxiliou o desenvolvimento do Atlas da Violência 2018 -, existe um tabu muito grande quando o assunto é estupro, principalmente se a mulher quiser denunciar o agressor. Em 2016, quase 50 mil mulheres foram estupradas. De acordo com o Atlas da Violência, isso representa apenas 10% dos números reais. Por conta da desconfiança nos serviços públicos e do tratamento que irão receber nas Delegacias, Marques acredita ser tão difícil trabalhar com números precisos em relação à violência sexual.
Em sua conta oficial do Twitter, o Ministério Público de São Paulo afirmou que o caso está sendo investigado.
Olá, Alex! Bom dia! O caso já está sendo investigado pelo MPSP 😉
— Ministério PúblicoSP (@mpsp_oficial) July 28, 2018