CRÔNICA: O Euvangelho segundo São Umbigo

Por Marcelo Nascente

Ando impressionado com a quantidade de coisas que acontecem nas ruas e ninguém vê. Ou se veem, elas não se espantam mais ninguém. Os loucos, que antigamente ficavam famosos por seus comportamentos peculiares (O “A Cores”, por exemplo), já não têm mais destaque algum, tal é a concorrência que enfrentam de todas as espécies e correntes migratórias.

A loucura virou o glamour; os desajustados ficaram confusos. Pensando, inclusive, que talvez sejam “normais”. E os “normais”, por sua vez, parecem não lembrar totalmente do que o conceito sugere como comportamento aceitável.

Parece existir uma espécie de involução, disfarçada com perfume comprado no Uruguai e avatares felizes de Facebook. (Se por acaso você ainda não souber do que se trata – o que eu duvido -, o Facebook é um lugar onde é possível tornar-se a pessoa perfeita, sem fazer qualquer esforço). Diferente da vida real, onde nossa capacidade de aturar estupidez é posta à prova diariamente, no Facebook simplesmente exclui-se a pessoa do convívio. Muito mais fácil! É lógico que algo assim faria sucesso…

Lá o avatar ama os bichos, a natureza, tem saudade dos amigos e demonstra sua fé, amor e gratidão pelo sol que brilha. Mas, infelizmente, ali do outro lado da parede, as coisas não são bem assim. Seu comportamento é competitivo, mesquinho, rancoroso. Pela convenção da fé, professam seu Euvangelho com leis próprias e total falta de consideração ao próximo. É o que quer “levar uma vantagenzinha”, o que está atento à falha do outro para poder se beneficiar dela de alguma forma. O que rouba o tempo do próximo em troca de um salário e por isso acha que respeito é desnecessário.

É o que joga seu lixo na rua, sabendo que não é dia (ou horário) de coleta. Ciente de que os cachorros de rua (que também não são seu problema) vão rasgar as sacolas e espalhar pelas ruas seus papéis higiênicos usados e outras maravilhas da sua vida idiota. Mas o que lhe importa? Ele tira o lixo de dentro de casa. E esperar mais do que isso seria piada…

É uma espécie de gente que habita o mundo como se lhe fosse um direito adquirido. E aos outros, lhes bastam aceitá-lo. Pode ter qualquer idade, sexo, religião. Provavelmente tem um deles aí perto de você… Talvez seja você mesmo. Ou eu.

Outro dia, falando com meu amigo Murruga (ele recolhia a roupa, enquanto a fumaça do churrasco do vizinho tomava conta do seu pátio), perguntei qual a opinião dele sobre isso, sobre essas pessoas, enfim…

            Me disse: “bicho, pois é… é o umbigo! O São Umbigo”.

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