A imparcialidade no jornalismo

Por Ezekiel Dall’Bell

Entrevista com o jornalista César Soares, repórter do site Terra

Um dos temas mais debatidos no jornalismo atual é a questão da imparcialidade. Para quem não sabe o que significa, trata da atuação do jornalista de forma isenta na produção da notícia ou reportagem, ouvindo os dois lados da história sem se posicionar frente ao fato. Assim, deixa para o leitor/ouvinte/telespectador ou internauta fazer suas próprias conclusões, sem induzí-lo a qualquer opinião. Mas, afinal, até que ponto isso é válido? A nossa equipe entrevistou o jornalista César Soares, do site Terra, para saber o que pensa sobre o assunto.

Foto: Reprodução (http://bit.ly/18VuWdc)

Foto: Reprodução (http://bit.ly/18VuWdc)

  1. Você acredita em uma interferência nos textos de notícias devido à opinião do jornal ou jornalista?

Não só acredito, como existe, não digo uma interferência, mas uma aproximação ou identificação com a linha editorial (LE) estabelecida por determinado veículo de comunicação. O que não pode ocorrer é a omissão dos fatos ou a distorção dos mesmos.

  1. Para você, deve haver essa interferência?

Haver ou não haver essa interferência é um tanto relativo: entendo como óbvio que em termos de notícias factuais, a notícia tem que ser “limpa”. Lembrando que a forma de publicação poderá ser a mais variada, obedecendo a LE de cada empresa.

Quanto às questões que envolvem temas políticos, religiosos ou de qualquer natureza em que o posicionamento é a atitude mais coerente, acredito que deve ser feito, sim. Entretanto, reforço que não pode haver o prejuízo da informação ou omissão dos fatos. Como exemplo, cito a recente batalha Globo X Record, em que a TV Record assumiu uma posição diante de uma determinada igreja e combateu uma acusação mostrando as causas que defende, deixando o julgamento para o público. Outro caso recente é o do jornal O Estado de São Paulo que publicou editorial favorável a um dos candidatos à presidência (veja bem, editorial, não quer dizer que todos tenham de seguir ou assumir tal decisão).

Caso essa definição não ocorra caímos no “todos sabem a tendência do jornal tal…”. Na minha ótica, é melhor ter posição definida do que abrir margem para comentários, críticas e até comprometer outros trabalhos.

  1. Você que trabalhou por anos na TV Nativa, poderia nos dizer como ela vê essa tomada ou não de posição em diferentes editorias?

Na ocasião em que fui produtor, editor e repórter da TV Nativa/Record, a tomada de decisão ficava sempre em torno da relevância do fato. Quando o assunto era mais delicado, como em situação de envolver anunciantes, por exemplo, o assunto era discutido em reunião de pauta, e para minha satisfação, os poucos casos que acompanhei, foi decidido pela veiculação da informação.

  1. Há situações em que não há como ficar isento?

Aprendi com a vida e apenas confirmei discutindo e debatendo na universidade que, por ser um ato espontâneo do homem, a comunicação é extremamente antagônica à isenção. Relatar, narrar, descrever um fato, reproduzindo todos os detalhes, por mais fiel que se seja, não pressupõe isenção. Isso só pude perceber na prática.

  1. É é possível ficar isento sem estar de fato? Como fazer isso?

Um tom de voz, uma expressão facial, uma palavra, uma vírgula, uma cena, denuncia, ainda que nas entrelinhas, o nosso “olhar” sobre um acontecimento. Somos seres humanos dotados de sentimentos e isso é praticamente impossível de se omitir. Uma notícia é a descrição de um fato, a reprodução da realidade, nunca será o real. O que tento fazer é me aproximar ao máximo desse real.

  1. Como você enxerga a questão da neutralidade em outras emissoras, como o Grupo RBS?

Neutralidade e isenção são relativos. Depende do momento, da situação, do tema, e principalmente da LE da empresa. Posso apenas emitir um comentário enquanto profissional até porque ainda não trabalhei em nenhum veículo do Grupo. Percebo que eles desenvolvem um trabalho extremamente profissional, valorizando, como qualquer outro grupo, as linhas e posicionamentos que entendem ser os mais próximos de seus princípios, enquanto empresa de comunicação.

  1. Que tipos de assuntos exigem mais cuidados na abordagem?

Pra mim todos os assuntos exigem muito cuidado em sua abordagem. Nunca esquecer de que uma boa reportagem, uma boa matéria, exige, por excelência, uma boa fonte. Existe um fato, ele pode gerar uma notícia ou não, tudo vai depender da percepção do jornalista, e das informações de sua fonte. Não existe jornalista sem fonte. Entenda-se por fonte desde o pipoqueiro, até o político ou policial mais graduado.

Editorias mais delicadas são sempre as de polícia e denúncias. Uma vírgula mal colocada pode gerar processos, reações, ou causar grandes transtornos. Casos que envolvam crianças e doenças também precisam ser bem estudados.

  1. Quando é mais fácil nos depararmos frente a um jornalista posicionado?

O posicionamento do jornalista se tornou recorrente no momento em que ele passou a atuar como personagem da narrativa que vai contar. A gente vê isso a partir da consolidação do jornalismo literário, por exemplo, quando há o trabalho no jornalismo investigativo, propriamente dito.

  1. Os telespectadores, na maioria, são favoráveis ou contra o posicionamento?

Às vezes a gente confunde o narrador daquilo que é narrado. Uma simples observação pode ser contextualizada como uma participação ativa e efetiva nos fatos. O posicionamento é algo que muitas vezes nem percebemos. Ele está de forma tão implícita no texto que o telespectador não repara isso.

  1. Como você vê a questão da responsabilidade do jornalista em meio a tudo isso?

Esse posicionamento do jornalista como contador de história deve ser especialmente considerado se a gente lembrar que lidamos com notícias que visam prioritariamente a informação. Elas não devem ser deformadas para se encaixarem nos padrões literários. A responsabilidade aqui vai além de contar bem ou saber escrever uma história. Eu acredito que deve haver uma nova maneira de narrar, atingindo as pessoas de um modo diferente, ultrapassando aquilo que o jornalismo padrão alcança e provoca.

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