A obra do cineasta André Luis Porto Macedo tem fortes raízes nos quadrinhos, tiras e charges
Por Vanessa Centeno Ferreira

O professor André Macedo começou sua trajetória fazendo desenhos com cópias em papel carbono Foto: Reprodução/Instagram
O professor do Curso de Cinema de Animação do Centro de Artes UFPel, André Luis Porto Macedo, é conhecido como o criador do Betinho e Libório, ambos personagens de tiras e charges muito lidas na região Sul gaúcha. Hoje o seu trabalho também vem ganhando versões audiovisuais, mas é inegável a importância de seu trabalho inicial com quadrinhos, charges e tiras. No ano passado, na Feira do Livro de Pelotas, o personagem Betinho recebeu uma homenagem com a sua escultura ao lado da de Mafalda, criação dos quadrinhos que completou 60 anos.
Em 2006, seu curta-metragem de animação “O jogo do osso” recebeu menção honrosa no Granimado (Festival de Animação de Gramado). Ele também é autor das animações “Irene na Casa do Blau” (2018). “Salada Mista” (2017), “Granmero & Flor” (2016), “Square Down” (2010), “Demoiselle” (2009), e “Melancia e Coco Verde” (2007).
Em uma conversa muito mais que legal, o professor André, natural de Pelotas, do bairro Simões Lopes, lembrou dos momentos da sua trajetória. Quando criança, desenhava amigos, familiares e animais de estimação. Fazia seus desenhos em papel carbono e distribuía para a população e, assim, divulgava o seu trabalho.

Uma das tiras com o personagem Betinho Imagem: Reprodução/Instagram
Naquela época, era difícil trabalhar em um jornal, mas aos poucos ele foi conquistando um lugar no meio profissional da imprensa. Trabalhou com jornalismo, fazendo tiras de quadrinhos, durante 35 anos. Começou como freelancer para o jornal Diário Popular de Pelotas, que infelizmente fechou suas portas em 12 de junho de 2024, sendo o terceiro mais antigo do Rio Grande do Sul. Desde a sua fundação em 27 de agosto de 1890, o veículo foi o principal jornal diário da Região Sul por anos.
O professor trabalhou com outros jornais simultaneamente, dez anos no Correio do Povo, em Porto Alegre, 15 anos no jornal de Ijuí e realizou alguns trabalhos fora do Estado por um período mais curto, além de jornalista em quadrinhos. Publicou 22 livros, entre eles, a obra mais vendida foi a coleção “Curtas e Grossas do Betinho e do Libório” (1996). O projeto Garapa, criado em 2002, promoveu a distribuição de edições nas escolas, chegou a bater um recorde nacional, com 400 mil exemplares. A grande maioria dos seus livros foi publicada em quadrinhos.

Livro “Carne Viva” aborda complexidade dos grupos sociais
O livro “Carne Viva” (2018), com 362 páginas e mais de dois mil desenhos, foi publicado pela editora UFPel. Fala da torcida do time de futebol Pelotas e o contraste de desigualdade social na sociedade. É uma novela gráfica que conta histórias de uma sociedade em ebulição. Mas tudo disposto nas arquibancadas do estádio de futebol Bento Freitas, sede do Grêmio Esportivo Brasil (Xavante). Apesar do vínculo com um clube esportivo, o livro não fala sobre futebol. Toda a narrativa se volta para a natureza humana e para os múltiplos perfis que povoam e se coletivizam no estádio. Outra publicação recente de André foi “Irene: o pão de Mia e a Tuba Velha”, lançada em 2022.

Um auto-retrato ilustra a página do Instagram de André Imagem: Reprodução/Instagram
Betinho e sua turma
Os personagens Betinho e a sua família são bem conhecidos e fazem a alegria dos leitores pelotenses em tiras e charges. Há também os personagens sugeridos pelas torcidas e times de futebol, que são as equipes pelotenses do Xavante e do Lobo. A inspiração para a criação dos personagens são pessoas que André conheceu ao longo da sua vida nas mais diversas situações. O Libório, por exemplo, tem os pés de alguém que ele conheceu em um dia de inverno, na parada de ônibus para o bairro Pestano, em Pelotas. Com todo o frio, o homem estava de ponche, mas com um chinelão e com o dedão de fora. Esse senhor, visto em um rápido momento, tem a sua lembrança eternizada através do personagem Libório desenhado por André.

Libório e sua esposa Jurema garantem diversão com suas histórias
O seu Campêlo era dono de um boteco, onde se vendia muitos produtos, desde cigarros até revistas usadas. André costumava comprar ali edições de quadrinhos usadas por vinte centavos. Esse senhor que atendia no estabelecimento também é uma parte da personalidade de Libório.
Já o personagem Betinho é o mais curioso e agitado, pertencente de uma tribo indígena. Recentemente a Prefeitura de Pelotas, através da Secretaria da Cultura (Secult), fez uma homenagem a essa criação com uma escultura em um dos bancos da praça Pedro Coronel Pedro Osorio, inaugurada durante a Feira do Livro do ano passado. André se alegrou muito e disse que isso está contribuindo para a divulgação do seu trabalho pelo mundo inteiro. Betinho está na praça ao lado de Mafalda (personagem criada pelo argentino Quino em 1964).

Mafalda e Betinho são as novas esculturas que integram Centro Histórico de Pelotas Foto: Rodrigo Chagas/Divulgação
Esta realização foi por iniciativa da professora Luciane Martins, do Centro de Letras e Comunicação da UFPel, que tem pesquisado a personagem Mafalda. Viabilizadas com recursos de instituições privadas e apoio da Prefeitura, as esculturas marcam os 60 anos da Mafalda e os 40 do curso de Letras, do Centro de Letras e Comunicação da UFPel (CLC). A iniciativa fez parte de um projeto Mundial de Mafaldas, com esculturas em homenagem à menina sexagenária espalhadas pelo mundo.
O professor André ficou muito feliz com a iniciativa da então prefeita Paula Mascarenhas, em 2024, e pelo convite de sua colega no Centro de Letras. O professor continua atuando com narrativas, quadrinhos e cinema, de tudo um pouco, sempre produzindo.

Um dos maiores sucessos editoriais do autor traz uma conhecida família de personagens
Jornalismo em quadrinhos
O mundo do jornalismo em quadrinhos para alguns leitores leigos pode soar como algo infantil por ter uma linguagem mais simples e mensagens de fácil compreensão. Mas é primeiramente um modo de escrever jornalismo ou apresentar os fatos de uma maneira em que a imagem desenhada e o texto interagem. “É como aquele conhecido provérbio, uma imagem vale mais que mil palavras”.
O início do desenho de imprensa no Brasil teve um pioneiro gaúcho, Manuel de Araújo Porto-Alegre, que fazia charges e caricaturas. Pode-se fazer, no entanto, uma viagem no mundo do jornalismo em quadrinhos. Essa prática profissional já tem lá seus cento e cinquenta e seis anos de história e foi em 30 de janeiro de 1869 na revista Vida Fluminense que foi publicado o primeiro jornalismo em quadrinhos no Brasil, “As Aventuras de Nhô-Quim”. E o seu criador foi ítalo-brasileiro Angelo Agostini. Nhô-Quim era um típico representante do homem comum, com suas situações cotidianas e aspectos da sociedade, o autor retratava temas sociais, políticos e culturais do Brasil daquela época.

O personagem Nho-quim de Angelo Agostini marca o início das histórias em quadrinhos no Brasil
Apesar do trabalho de Agostini, quem aparece como pioneiro nas reconstituições históricas, geralmente é o norte-americano Richard Felton Outcault, com seu personagem Yellow Kid, criado em 1896. Ele é citado como o primeiro a publicar histórias em quadrinhos no mundo, pois o nosso querido Angelo Agostini não foi considerado como tal pelo fato de suas histórias em quadrinhos não conterem balões, o que caracterizaria esse tipo de jornalismo. Mas há outros precursores de outras nacionalidades. Em 1833, a criação do jornalismo em quadrinhos começou com o suíço Rudolf Töpffer com “Historie de Mr. Jabout” e o alemão Willhelm Busch, com “Max und Moritz”, de 1865, traduzidos no Brasil em 1950 e 1960, respectivamente.

Charge “A campainha e o cujo”, de Manoel de Araújo Porto-Alegre Imagem: Reprodução/Biblioteca Nacional
Presença rio-grandense
No jornalismo desenhado, há o gaúcho Manoel de Araújo Porto-Alegre nascido em 1806 na cidade gaúcha de Rio Pardo. Ele começou estudando pintura e desenho aos 16 anos de idade, momento que adota o sobrenome Porto-Alegre em referência ao estado que nasceu. Mudou-se para o Rio de Janeiro em 1827, ingressando na Academia Imperial de Belas Artes, onde estudou com o francês Jean-Baptiste Debret. Em 1831, viaja com Debret para a Europa, tendo lições com outros grandes mestres da França, da Itália, da Inglaterra e da Bélgica. Por lá conheceu as publicações humorísticas de caricaturas políticas que circulavam no continente.
Ao regressar ao Brasil em 1837, Porto-Alegre publica no Jornal do Commercio do Rio de Janeiro, no dia 14 de dezembro. A charge intitulada “A campainha e o cujo” era uma crítica contra a prática do governo de cooptar jornalistas para trabalhar no Correio Oficial.
Assim como Porto-Alegre, o professor André, atualmente é uma inspiração para quem sonha em trabalhar com animação, jornalismo em quadrinhos, tiras ou charge. Ele ainda vivenciou a época antes da internet, em que as publicações impressas eram a maior oportunidade para os desenhistas, embora com limitações. Ele foi para além disso, e seu sucesso sempre está em saber observar o cotidiano, a cultura local e expressar suas vivências e pontos de vista através dos quadrinhos.
Veja os links para acompanhar os trabalhos de André Macedo:
Instagram, Youtube, Facebook e Site.
COMENTÁRIOS
Parabéns André Luis ! Meu sobrinho querido mereces todo o sucesso e homenagens recebidas.Fi fizeste por merecê-las com teu talento e criatividade. Fico muito feliz quando leio sobre tua trajetória brilhante. Nossos queridos no mundo espiritual devem também estar orgulhosos do teu sucesso. Te amo e não esqueço da tua infância quando morávamos juntos, às vezes, com tuas travessuras, deixavas tua mãezinha preocupada e nós também. Tua história é um exemplo de que, quando se tem um sonho, não há dificuldade que nos faça desistir dele. És um vencedor! Quem sabe a gente um dia se encontra ainda nesse plano, se não der, será no mundo espiritual. Recebe o meu carinho. Bjo.
Zeila Macedo de Lima