Amor e Loucura: Coringa e Arlequina em Delírio a Dois

Filme está em cartaz nos cinemas de Pelotas e traz história complexa com mistura de humor e tragédia      

Por Júlia Koenig 

    

Lady Gaga e Joaquin Phoenix dão carga psicológica aos personagens principais        Fotos: Divulgação

 

“Coringa: Delírio a Dois” é uma continuação do aclamado filme “Coringa” de 2019, dirigido por Todd Phillips e, assim como na versão anterior, o diretor traz o ator Joaquín Phoenix encenando o aclamado vilão da DC. O filme, que estreou em meio a muitas críticas negativas, traz uma nova camada à história do Coringa, focando em sua relação tumultuada com a Arlequina (interpretada por Lady Gaga) e mergulhando na complexidade dessa relação, onde amor, obsessão e loucura se entrelaçam num misto de humor e tragédia. À medida que o Coringa enfrenta em júri a consequência de suas ações cruéis, Arlequina luta para encontrar um lugar ao seu lado, criando uma dinâmica que provoca reflexões sobre a natureza da insanidade e do afeto. A produção pode ser vista atualmente nas salas de cinema de Pelotas

Todd Phillips, que já tinha estabelecido um tom sombrio e realista no primeiro filme, mantém essa abordagem em “Delírio a Dois”. Sua direção mescla elementos de thriller psicológico com números musicais. O diretor explora as nuances entre loucura e romance, utilizando uma paleta de cores vibrantes que contrasta com a escuridão das temáticas abordadas. A direção de arte e a fotografia contribuem para uma atmosfera que intensifica as emoções dos personagens.

Passado e presente

A estrutura narrativa é não linear, intercalando momentos do presente com flashbacks que revelam a infância e os traumas de Arthur Fleck (o nome de fato de Coringa). Essa técnica permite que o público compreenda a origem de seus problemas psicológicos e a evolução de sua relação com Harleen Quinzel, a Arlequina, que é o ponto central da narrativa. A história se desenvolve em um ritmo acelerado que mistura momentos de tensão e fragilidade emocional, essa dinâmica é aprofundada por situações que revelam as fraquezas de ambos, ampliando o entendimento sobre o que os une e os separa.

O filme apresenta uma crítica social que se manifesta através das interações de Arthur com figuras como os guardas da prisão, que por diversas vezes abusam de sua autoridade, culminando numa cena de violência cruel. Além disso, o júri a que se submete representa uma crítica a como são tratados casos de saúde mental em varas criminais. Esses encontros não apenas expõem as falhas do sistema criminal e carcerário, mas também refletem a alienação e a frustração de Arthur em um mundo que não o aceita.

Nesse universo, Phoenix entrega uma performance que humaniza o personagem. No filme, ele lida com questões de amor, aceitação e a fragilidade de sua sanidade. A relação com Harleen traz uma nova dimensão ao coringa, revelando uma vulnerabilidade que contrasta com sua personalidade caótica. Em “Coringa” (2019), a interpretação do ator foi aclamada por sua profundidade. No entanto, “Delírio a Dois” se distancia do tom puramente trágico do primeiro filme, incorporando elementos de humor e romance que relembra a representação do Coringa em adaptações anteriores, como a de Heath Ledger (“Batman, o Cavaleiro das Trevas”/2008), e também oferece uma nova perspectiva ao explorar o lado humano do vilão.

Enquanto isso, Gaga oferece uma interpretação intensa e multifacetada, mostrando uma Dra. Quinzel que se vê atraída não apenas pela complexidade de Arthur, mas também por sua própria instabilidade emocional. A dinâmica entre os dois personagens é um dos principais motores da narrativa, desafiando os limites da obsessão e da dependência emocional.

Questionamentos sociais

Os personagens secundários não apenas enriquecem a narrativa, mas também refletem os temas centrais do filme, como a busca por amor, aceitação e a crítica à sociedade. Cada um deles contribui para a construção do mundo interno de Arthur e sua trajetória. Essa abordagem faz com que o público não apenas compreenda a transformação de Arthur, mas também se questione sobre os contextos sociais que produzem figuras como o Coringa. A exemplo disso, o filme explora o passado de Arthur através de personagens que aparecem em flashbacks, como sua mãe, Penny Fleck (Frances Conroy). Ela representa a fonte de traumas e conflitos internos que impulsionam Arthur. As memórias com Penny são marcadas por uma mistura de afeto e manipulação, revelando as raízes de sua instabilidade emocional.

A estética do filme é uma extensão da sua narrativa. Visualmente, o longa impressiona, com uma estética sombria que reflete a desordem do mundo interno dos protagonistas, a paleta de cores que vai do sombrio ao vibrante retrata as oscilações emocionais dos personagens e cenas sombrias contrastam com momentos mais iluminados, especialmente nas interações entre Arthur e Harleen. A câmera, muitas vezes, aproxima-se dos rostos, capturando expressões sutis que revelam a fragilidade emocional e a profundidade da performance dos atores.

 

Filme desafia a audiência  a confrontar suas próprias percepções sobre o que significa ser humano

 

A trilha sonora também contribui para a atmosfera, intensificando a tensão e a emoção com números musicais, apesar de estes, por vezes, tornarem a narrativa cansativa e serem grande alvo críticas negativas em relação ao filme. As composições variam de clássicos do jazz a canções originais e ajudam a estabelecer o tom emocional de cada cena. O uso de música em momentos-chave, como os números musicais que surgem na relação entre Arthur e Harleen, cria uma atmosfera que destaca a linha tênue entre a realidade e a fantasia na mente de Arthur.

Em suma, as escolhas narrativas e estéticas em “Coringa: Delírio a Dois” se entrelaçam, criando uma experiência completa. A profundidade emocional da narrativa, combinada com uma estética visual e sonora, provoca reflexões sobre temas universais e sombrios. Essa combinação desafia os espectadores a confrontarem suas próprias percepções sobre o amor e a luta pela aceitação em uma sociedade que frequentemente marginaliza os vulneráveis. Essa abordagem faz com que a obra desafie o público a confrontar as suas próprias percepções sobre o que significa ser humano em um mundo muitas vezes cruel e indiferente. Apesar dos pontos positivos o longa deixa a desejar no que toca a apresentar um final bem amarrado e coerente para com a riqueza do enredo. Não há como ignorar as pontas soltas e o frustrante desfecho entre os personagens principais, que termina de maneira fria e abrupta. Para além das críticas, o filme entrega boas reflexões e o desempenho dos atores é digno de elogios.

Ficha Técnica

Nome Original: Joker: Folie à Deux

Dirigido por Todd Phillips

Elenco: Lady Gaga, Zazie Beetz, Catherine Keener, Joaquin Phoenix ,

Distribuição Warner Bros.

País de Origem: EUA

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