Sally Rooney e as vivências em um belo mundo em crise

A escritora irlandesa representa com maestria o cotidiano e os dilemas do século XXI   

Por Enzzo Lopes Rodrigues 

    

Sally Rooney lançou seu quarto romance “Intermezzo” em setembro  Fotos: Divulgação

 

No mês passado, em setembro, Sally Rooney lançou mundialmente seu quarto romance, “Intermezzo”. A obra narra a história de dois irmãos com personalidades distintas que buscam reconstruir suas vidas após a morte do pai. A expectativa do público em relação a este lançamento é alta, impulsionada pelo sucesso comercial e pelas críticas positivas que os trabalhos anteriores da autora receberam.

Em uma época em que as crises são constantes, tanto políticas quanto climáticas, Sally Rooney emerge como uma das principais escritoras da geração, contando histórias sobre pessoas normais tentando lidar com seus problemas e com os tumultos do mundo. Com uma abordagem leve e sem muitos plot twists, seus livros trazem à luz discussões relevantes. 

Graduada em Inglês pela Trinity College, em Dublin, Rooney se identifica como uma marxista, que tenta demonstrar em suas obras, entre outras coisas, o papel que o sistema de classes desempenha em relacionamentos, sejam eles românticos ou familiares. Essa temática permeia principalmente suas duas primeiras obras, “Conversas entre amigos” (2017) e “Pessoas normais” (2018), mas não deixa de fazer parte do resto do seu trabalho.

 

Alisson Oliver e Sasha Lane na minissérie “Conversas Entre amigos” baseada na obra da escritora

 

Em “Conversas entre Amigos”, Sally explora a relação de Francis, uma estudante na casa dos vinte anos, e o ator Nick, enquanto ela segue próxima de Bobbi, sua ex-namorada, e a esposa do ator, Melissa. O livro reflete muito sobre os modelos de relações e dinâmicas de poder dentro de vínculos afetivos, enfatizando as diferenças de classes e de idade. A obra foi adaptada em uma minissérie em 2022.

No segundo livro de Sally, “Pessoas Normais”, Connell e Marianne se conhecem na escola, onde um é muito popular e a outra é excluída dos círculos sociais por sua fama de ser “feia” e “irritante”. Ambos começam um relacionamento que dura anos. A premissa do livro publicado em 2018 parece clichê à primeira vista, mas se torna uma história densa que aborda os mesmos temas do primeiro livro de Rooney de maneira mais natural e profunda.

“Pessoas Normais” se tornou o lançamento mais popular da autora, ganhando uma adaptação em 2020, na série produzida pelo Hulu, estrelada por Paul Mescal e Daisy Edgar-Jones. É nessa história que o público encontra uma crítica mais acentuada ao sistema de classes pela autora. Connell é de classe baixa, filho da faxineira Lorraine, que trabalha para a mãe de Marianne. Durante toda narrativa, desde a escola à faculdade, é perceptível como Connell se sente inferior ao resto das pessoas ao seu redor por não possuir o mesmo status social que eles.

O sucesso que esse livro ganhou é justificável. Em pouco menos de 300 páginas, Rooney descreve de maneira excepcional todos os aspectos do crescimento de duas pessoas diferentes, mas que se encontram no sentimento de não pertencer a lugar nenhum. A história contempla temas como amizade, romance, saúde mental, classes sociais e outros pontos que ressoam na vida de muitos.

 

Paul Mescal e Daisy Edgar-Jones em “Pessoas Normais” 

 

Em 2021, na segunda metade de uma pandemia que mexeu consideravelmente com o estado mental do mundo, Sally Rooney surge com a estreia de seu terceiro romance, cujo título traz uma pergunta feita por muitos “Belo mundo, onde você está”. Nele conhecemos quatro pessoas – Alice, Felix, Eileen e Simon – que, no começo dos seus 30 anos, lutam para conduzir suas vidas e suas relações em meio a todas as crises globais.

Rooney captura de maneira precisa o espírito da época recente, quando não se via muitas razões para se ter esperança ou um objetivo definido, enquanto coletivamente deparava-se com um futuro tão incerto. É com isso, e por isso, que os acontecimentos do livro se desenrolam da maneira que acontece.

De que serve ter esperança? Para que se desgastar tentando construir algo? Nessa obra, a irlandesa mais do que convencer, busca demonstrar para o leitor a sua resposta para essas questões, revelando personagens que se apegam uns aos outros em busca de força para seguir em frente. Ela sugere a existência de um mundo metafórico paralelo ao que estamos, onde toda a beleza está nas conexões humanas.

Como em suas obras anteriores, Rooney critica o sistema liberal e o cenário político mundial, trazendo um foco especial para questões ambientais. As análises também tocam na cultura de celebridades, trazendo reflexões da personagem Alice, uma escritora que ganhou notoriedade e que se vê incomodada com as especulações a respeito da sua personalidade baseados unicamente em sua arte.

 

Penúltimo livro da autora foi lançado meio ao período pandêmico

 

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