Livro que narra histórico de violência policial da Rota ganha versão para a televisão
Por Vitor Valente
Quando se fala em jornalismo literário no Brasil, é impossível deixar de citar o clássico “Rota 66 – A história da polícia que mata”, escrito pelo jornalista Caco Barcellos. Lançado em 1992, faturou no ano seguinte o Prêmio Jabuti, maior honraria da literatura brasileira. A investigação que gerou o livro-reportagem começou após a morte de três jovens de classe média de São Paulo em razão da ação de uma unidade das Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota), esquadrão de elite da Polícia Militar. Trinta anos depois, a história do livro foi adaptada para a televisão. A série foi lançada pela plataforma de streaming Globoplay no final de setembro e conta com oito episódios.
Criada por Maria Camargo e Teodoro Poppovic, com direção artística de Philippe Barcinski, a série explora o potencial narrativo de uma história cujo tema permanece atual. A investigação obstinada e a pesquisa minuciosa de Caco Barcellos, interpretado na série pelo ator Humberto Carrão, rendeu dezenas de relatos de casos sombrios e devastadores de violência policial. Ao recontar as histórias, o jornalista gaúcho jogou luz sobre eventos que seriam esquecidos e varridos para debaixo do tapete. De outra forma, as versões oficiais dos policiais seriam impunemente tratadas como verdade.
A estudante de jornalismo Joanna Manhago conta que após assistir a série, decidiu ler o livro “Rota 66”. “Eu já conhecia o trabalho do Caco, mas ainda não tinha despertado o interesse pela leitura”, explica a estudante. “Quando comecei a assistir a série, achava que ela não abordaria tanto o trabalho do Caco, que seria mais sobre a realidade da polícia em si. [A série] fala muito daquilo também, mas aborda principalmente como o Caco trabalhou na construção do livro. Como jornalista, gostei muito disso, para entender o processo de produção, criação e de estudo”, completa Joanna.
Segundo o especialista em jornalismo literário Eduardo Ritter, o livro “Rota 66” é uma obra fundamental para o gênero no Brasil. “Foi um caso em que o jornalista colocou em prática, de maneira quase que perfeita, algumas premissas do jornalismo literário como a pesquisa, o texto de fôlego, a narrativa criativa e a linguagem”, valoriza Ritter. “Mas, principalmente, um dos pontos que diferencia de outros gêneros da literatura é a apuração. O trabalho do Caco como jornalista, a pesquisa, as consultas a documentos, entrevistas, levou bastante tempo até ele conseguir juntar todo aquele material para escrever o livro. Isso o diferencia”, complementa.
O professor Eduardo aponta, ainda, a importância do reconhecimento do nome e da credibilidade de Caco Barcellos para o destaque do trabalho realizado. “O fato de ele ser um repórter conhecido do grande público ajuda, pois muitas vezes o jornalista literário esbarra na questão do reconhecimento midiático, por melhor que seja o trabalho. Excelentes trabalhos literários sofrem com esse obstáculo”, conclui.
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