Precisamos falar sobre o assédio nas universidades

Nugen e NUPAD encabeçam o combate ao assédio na UFPel. Cartaz: divulgação/Nugen

Por Rafaela Dutra

O Núcleo de Gênero e Diversidade Sexual (Nugen) e o Núcleo Psicopedagógico de Apoio ao Discente da Pró-Reitoria de Assuntos Estudantis (NUPAD/PRAE), têm promovido conscientização de assédio no ambiente acadêmico, sob o comando da professora Eliane Pardo (NUGEN) e psicóloga Lisandra Berni Osório (NUPAD/PRAE). Além da campanha, os núcleos promovem rodas de conversas abertas para discussão com a presença de especialistas. Os eventos abrem portas para um debate importante sobre as maneiras silenciosas, e muitas vezes silenciadas, que assédio acontece. A psicóloga Djeniffer Coradini, especialista em saúde presente na roda que aconteceu no dia 25/09 no Salão de Atos do Direito  acredita que “Falar sobre o assédio é a forma que podemos combatê-lo. Precisamos garantir às pessoas o direito de serem acolhidas em suas queixas, ter espaços de troca e diálogo”.

Mais de quinze denúncias de assédio foram registradas na Universidade esse ano e o evento aproveitou para reforçar a importância de realizá-las. “Procurar a direção ou a ouvidoria, até mesmo NUGEN e o colegiado do seu curso, fazer a denúncia e solicitar encaminhamento. A denúncia é fundamental e, caso haja medo, ela pode ser anônima num primeiro momento ou sigilosa se for o caso”, afirmou a professora Eliane Pardo sobre a prática que acontece em diferentes vertentes dentro das instituições brasileiras.

Os chamados os trotes acadêmicos, que teve como intenção inicial integrar os recém-chegados nas universidades, podem acabar se tornando constrangedor e até mesmo violento em determinados casos. Um exemplo disso é o caso de Vinicius Alexandre Reis, que em 2016 teve seu corpo queimado pelos veteranos do curso de Agronomia da Faculdade da Amazônia (FAMA). Na época os alunos responsáveis pelas atividades chegaram a dizer que nenhum dos alunos era obrigado a participar dos trotes, mas que quem não participasse seria totalmente excluído das outras atividades. Além dos assédios diretos, práticas também “comuns” são as relacionadas a outros tipos de violência contra as minorias, como as ‘marchinhas’ cantadas pelos alunos em época de jogos estudantis que expressam diversas falas machistas e preconceituosas, listas das calouras mais bonitas e ações como o “O rodeio das gordas”, onde alunos têm como objetivo se aproximar de mulheres gordas para derruba-las e ficar o máximo de tempo possível em cima delas”. Ainda em 2016, alunas da Universidade Estadual da Bahia (UNEB) denunciaram um professor por abuso sexual depois de investidas e insistentes conversas constrangedoras do mesmo, que apesar de negar foi afastado do cargo na época.

Os assédios tem ligação direta com a saúde mental e pode influenciar diretamente a trajetória acadêmica das vítimas. “Os maiores sintomas apresentados são a ansiedade e a depressão, o que pode trazer muitos prejuízos para vida pessoal e acadêmica do aluno. Existem mais de 10 tipos de assédio, e nesse contexto, em que a universidade cresce em suas diversidades, podemos considerar, o preconceito, o racismo, a homofobia, por exemplo, como tipos de comportamentos agressivos que geram algum tipo de abuso alusivo a um assédio”, pontua a psicóloga Lisandra Berni Osório.

Katia Pereira, aluna do curso de Ciências Sociais da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) foi vítima de assédio durante uma troca de e-mails com o, até então, professor. Ela conta que o acontecimento e o não apoio dos colegiados envolvidos é desmotivador e fez com a perdesse a confiança em suas capacidades e até mesmo estímulo para continuar estudando. “A Universidade constrange aqueles que denunciam, são rotulados pessoas problemáticas e difíceis. Tentam desconstruir nossa imagem perante seus pares e nossos colegas”. Apesar disto, Katia realizou a denúncia e ganhou a causa judicial: “Agora a busca é por um posicionamento da Universidade, cujo silêncio autoriza, veladamente, essas práticas excludentes”.

Levando em consideração os tipos mais comuns de assédio, as palestrantes abordaram os aspectos psicossocial e legal de como devemos tratar casos de assédio, a importância de realizar a acusação e combater essa prática. Djeniffer Coradini ressalta importância de não naturalização do assédio. “Na ocorrência deste evento, punir exemplarmente os envolvidos, protegendo as vítimas, resguardando os seus direitos e integridade”. As participantes orientaram também a reunir o máximo possível de provas e anotações sobre o ocorrido, para facilitar a efetuação da denúncia, levando em consideração que esta, juntamente com o falar sobre o assunto, são as maneiras mais eficazes de  combater a prática. Para a psicóloga Lisandra Osório: “Uma das formas de se combater seria identificar essas formas de assédios e suas nuances para que se possa evidenciar, reunir provas, no sentido de denunciá-las, seja por meio de ouvidora, seja por outros meios cabíveis”.

Falar sobre assédio nas universidades é falar sobre a saúde mental dos universitários. O combate a esse, e outros tipos de crimes pouco discutidos, se torna mais fácil quando se tem conhecimento do assunto. Já existe a pretensão de novos eventos e campanhas para conscientização do problema, organizados pelo NUGEN, NUPAD/PRAE na universidade.

“Não podemos admitir a hierarquização das relações sociais – intra e/ou extra muros acadêmicos – pautada em status econômico, postos de comando e/ou titulações, adquiridos à custa de processos marcados pela desigualdade social, ampla subordinação e “redução” da nossa condição humana. Falar sobre, é desnaturalizar essas formas de opressão”, ressalta a acadêmica de ciências sociais, Katia Pereira.

As denúncias de assédio na Universidade feitas no Sistema de Ouvidorias do Poder Publico Executivo Federal são enviadas diretamente para o Ministério da Educação MEC. Imagem: reprodução

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