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BOAVENTURA, MUROS E CUIDADOS PALIATIVOS

Florismar Oliveira Thomaz1

Julieta Carriconde Fripp2

Nós, atuantes e simpatizantes da CuidATIVA: Projeto de Extensão “Integralidade do Cuidado e Qualidade de Vida” – pró Centro Regional de Cuidados Paliativos da UFPel – em construção às avessas, de baixo para cima, estamos na prática trazendo Boaventura de Souza Santos para os Cuidados Paliativos. Esta afirmação diz que seus referenciais teóricos estão sendo apropriados por nossas práticas paliativistas, utilizando pedagogias ativas com Ecologia dos Saberes.

Na modernidade, em função das novas tecnologias, apesar do aumento da longevidade, estão se proliferando casos de depressão, sedentarismo e apatia social, agravadas por doenças degenerativas como câncer, acidentes vasculares e doenças neurológicas, como Parkinson, Alzheimer, escleroses, demências e outras, que atingem não uma pessoa isolada, mas todas as pessoas a ela vinculadas, comprometendo a qualidade de vida de crescentes contingentes humanos.

No contexto político atual, com cortes nos investimentos sociais e ataques aos direitos humanos, às políticas públicas de saúde, educação e seguridade social, envolvendo os três poderes do Estado, para atender interesses capitalistas colonialistas, pessoas acometidas de doenças graves, sem possibilidade de cura, ficam sem a segurança do Sistema Único de Saúde.

Tornada vulnerável, a população vai à procura de soluções de Mercado. Gasta além do que pode, para aliviar sofrimentos e minimizar transtornos familiares. Os mais empobrecidos, sequer conseguem comprar os serviços e produtos ofertados no Mercado. Abandonados pelo Estado e sem interesse econômico, tornam-se vitimas do fascismo social, invisível à sociedade.

Na família patriarcal, resta às mulheres a tarefa de prestar cuidados a pacientes em situação de agravamento físico, social, emocional e espiritual, que buscam soluções a partir dos saberes de seus ancestrais e da cultura de vizinhança, Utilizam entretenimentos, terapias populares e rituais misticos ou sagrados, na esperança de cura ou na perspectiva de aliviar as dores dos pacientes.

Quando alegamos que pacientes que sofrem não podem ser deixados para trás, estamos defendendo o direito à qualidade de vida. As culturas universitárias detém os saberes dominantes, inclusive com acesso às novas tecnologias de atenção à saúde, desde o diagnóstico de enfermidades até as fases mais sofisticadas de tratamento de sintomas. As culturas populares advindas dos lugares onde as pessoas comuns vivem ou viveram, tem também seus próprios acúmulos ambientais e epistemológicos, embora não sistematizados. Segundo Boaventura, todos os saberes são singulares, próprios de cada lugar, com valores distintos, nem maiores nem melhores, cada um tão importante quanto o outro, em cada particularidade de atuação.

Esta diversidade, escancara o estranhamento e os muros existentes entre saberes e leituras da realidade, obrigando os gestores universitários, suas comunidades e movimentos internos, comprometidos com Boaventura de Souza Santos, a praticarem o diálogo com as comunidades e seus movimentos externos, historicamente ignorados ou rejeitados, como os quilombolas, indígenas, agricultores familiares, favelados, negros mulheres, LGBTs, deficientes físicos, doentes crônicos e outros.

Boaventura aponta à necessidade do aprofundamento do diálogo intra e extra muros, na busca do entendimento, num esforço solidário de construção participativa de caminhos, atentando à Ecologia dos Saberes, no sentido da Pluriversidade acadêmico- popular, para remoção dos muros que recaem sobre todos/as nós, não somente sobre os Cuidados Paliativos, mas sobre todas as relações que envolvem os saberes acadêmicos e populares.

1Professor aposentado da ESEF \ UFPel, Mestre em Bases Biomŕdicas da Educação Física pela UFRJ, Especialista em Treinamento Esportivo pela UFPel, Presidente da ADUFPel \ SS (1985-87), Vice Presidente Regional RGS do ANDES – SN (1986-88), Fundador e Presidente da CUT Regional Sul do RGS (1987-89), Diretor da ESEF \ UFPel (1990-93), Diretor do DESP – Departamento de Desporto \ Gov RS (1999-2001), fundador e Coordenador da UNIPERIFERIA – Universidade da Periferia – Pelotas \ RS (2005-2011), Responsável pelo Projeto Casa Brasil – Loteamento Dunas – Pelotas \ RS (2005-11), Criador e Coordenador do Fórum Social das Periferias – Loteamento Dunas – Pelotas \ RS (2006-11), Atual Voluntário da CuidATIVA – pró Centro Regional de Cuidados Paliativos / UFPel

2Especialista em Medicina Paliativa e Medicina Intensiva AMB/AMIB, Docente da Disciplina Cuidados Paliativos – FAMED/UFPel, Médica TAE – Rede de Cuidados Paliativos UFPEL, Especialista em Gestão Hospitalar – IEP/HSL, Lider do Grupo de Pesquisa LEP-RCP, Doutora em Ciências UFPEL, Coordenadora da Unidade Cuidativa FAMED – UFPEL, Colaboradora do Programa Melhor em Casa Pelotas junto ao MS

Publicado em 21/06/2018, nas categorias Notícias, Sem categoria.