“The Bear” desacelera e testa o apetite do público por novas histórias

A nova temporada afrouxa o ritmo que a consagrou, mas mantém viva a mistura de afeto, trauma e memória          

por Maria Clara Goulart          

 

 

Quando se trata de comida e memória, poucos programas exploram tão bem essa conexão como a série “The Bear” (2022). Aquela mistura íntima entre afeto, trauma e sobrevivência sempre foi o cerne emocional dessa atração. Mas daquela urgência crua do início, a produção evoluiu para algo mais introspectivo e, por vezes, contemplativo.

Nas primeiras temporadas, cozinhar era um grito: caos, xingamentos, comida no chão e uma bagunça que não parecia ter fim. Hoje, a cozinha de “The Bear” é limpa, organizada, e esteticamente refinada, mas o peso do legado continua lá, como se as lembranças intensas que o lugar carrega não tivessem sofrido com reformas. A transformação visual da antiga “The Beef” em “The Bear” marcou uma virada narrativa, revelando que o lugar não é só um restaurante: é um altar para as memórias de Mikey e uma maneira de consertar as fraturas familiares dos Berzattos.

Nesta quarta temporada, o foco se desloca ainda mais para os conflitos internos dos personagens. Carmy, interpretado por Jeremy Allen White, encarna um anti-herói consumido pela própria busca de perfeição. Sua relação com a cozinha, antes vista como vocação, se mostra enraizada na culpa e na perda. O restaurante é mais que um trabalho: é um funeral perpétuo. E, assim como Carmy parece não se reconhecer fora dele, ficamos perguntando: por que ele continua naquele lugar?

 

Cena de 4º temporada de “The Bear” (2022) com Sydney Adamu e Adam Shapiro Fotos: Divulgação/IMBD

 

O conflito interno central da temporada, e que divide opiniões entre críticos, é encenado com técnica refinada, mas com o mesmo ritmo lento que não prende o espectador por mais uma temporada. Apesar dos insights de grande valor sobre ansiedade, relação familiar, ambiente de trabalho e os diferentes temas abordados, a temporada ainda soa cansativa entre o que já é servido. O excesso de introspecção e o tom monótono que substituiu o humor e a energia das temporadas anteriores, ainda que melhor que a terceira, a trama parece repetir-se sem avançar de verdade.

A despeito disso, a antiga “The Bear” ainda é reconhecida entre as frestas brilhantes desta temporada. “Episode 4”, co-escrito por Ayo Edebiri e Lionel Boyce e dirigido por Janicza Bravo. Destaca-se justamente por um diálogo leve e reflexivo, que revisita questões do passado de forma a serem resolvidas, não prolongadas. Ao acompanhar Sydney em um dia de folga, cozinhando e interagindo com a filha da amiga Chantel, o episódio prova que “The Bear” funciona melhor quando expande sua perspectiva para além de Carmy e dá espaço a narrativas de crescimento e desenvolvimento dos personagens.

 

Carmy Berzatto na cozinha do restaurante 

 

O que se percebe é uma abertura para novas dinâmicas e caminhos criativos que podem revitalizar a trama, especialmente após momentos em que a série parecia girar em torno dos mesmos dilemas emocionais e operacionais. Essa decisão narrativa funciona quase como um respiro, uma chance de reconfigurar a energia do enredo e escapar da repetição que ameaçava tornar a série previsível.

Ao colocar a coletividade em cena, “The Bear” reforça sua identidade como drama humano, no qual a cozinha é apenas pano de fundo para histórias sobre pertencimento, amadurecimento e reconstrução. Essa mudança de perspectiva pode muito bem ser o ingrediente que faltava para reacender o frescor que consagrou a série desde sua estreia.

FICHA TÉCNICA

Título: The Bear (Season 4) (Original)

Ano produção: 2025

Direção: Christopher Storer Janicza Bravo

Produtores: Christopher Storer e Matty Matheson

Elenco Principal: Jeremy Allen White, Ayo Edebir e Ebon Moss-Bachrach

Duração: 368 minutos

Gênero: Comédia Drama

País de origem: Estados Unidos

Sinopse: Carmy, um jovem chef do mundo da alta gastronomia, volta para casa em Chicago para administrar a lanchonete de sua família. Enquanto ele luta para transformar a loja e a si mesmo, ele trabalha ao lado de uma equipe áspera que acaba se revelando como sua família escolhida.

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